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Pablo Neruda

Livro das Perguntas

Onde a lua cheia deixou


o seu saco noturno de farinha?

Se já estou morto e não sei,


a quem devo perguntar as horas?

Me diga, a rosa está nua


ou tem apenas esse vestido?

Há alguma coisa mais triste no mundo


que um trem imóvel na chuva?

A fumaça fala com as nuvens?

Por que se suicidam as folhas


quando se sentem amarelas?

Quantas abelhas tem o dia?

E é paz a paz da pomba?


O leopardo faz a guerra?

Quantas perguntas tem um gato?

Onde estão aqueles nomes doces


como as tortas de antigamente?

Para onde foram as Donanas,


as Felisbertas, as Bizuzas?

Para quem sorri o arroz


com infinitos dentes brancos?
Como a laranjeira e as laranjas
dividem o sol entre si?

Quem gritou de alegria


quando nasceu a cor azul?

Como ganhou sua liberdade


a bicicleta abandonada?

É verdade que no formigueiro


os sonhos são obrigatórios?

Já percebeste que o Outono


é como uma vaca amarela?

Quem canta no fundo da água


na lagoa abandonada?

De que ri a melancia
quando a estão assassinando?

Posso perguntar ao meu livro


se é verdade que o escrevi?

Então não era verdade


que Deus vivia na lua?

Quando o preso pensa na luz,


é a mesma que te ilumina?

Por que vivem em farrapos


todos os bichos-da-seda?

Onde encontrar uma sineta


que soe dentro de teus sonhos?

A quem posso perguntar


que vim fazer neste mundo?

Há coisa mais boba na vida


que chamar-se Pablo Neruda?

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