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IV SIMPÓSIO INTERNACIONAL DE CIÊNCIAS INTEGRADAS

DA UNAERP CAMPUS GUARUJÁ

Mesa: NEIAB – Projetos de pesquisa e as questões de diversidade


Exposição de:

Priscilla Maria Bonini Ribeiro


Diretora Geral
Unaerp - Universidade de Ribeirão Preto - Campus Guarujá
pribeiro@unaerp.br

Silene Bueno de Godoy Purificação


Docente e Coordenadora Acadêmica
Unaerp - Universidade de Ribeirão Preto - Campus Guarujá
spurific@unaerp.br

Cláudio Cristóvão da Silva


Aluno do Curso de Direito
Unaerp - Universidade de Ribeirão Preto - Campus Guarujá
csilva@unaerp.br

Rosemary Gomes de Souza


Aluna do Curso de Administração
Unaerp - Universidade de Ribeirão Preto - Campus Guarujá
rosouza@unaerp.br

Este simpósio tem o apoio da Fundação Fernando Eduardo Lee

A evolução dos direitos da mulher nas questões éticas


Diversos são os mecanismos estruturais em termos políticos, sociais,
econômicos e legais que engendraram o longo e histórico processo de
exclusão social da mulher. Na história da evolução do homem, da sociedade,
da civilização constata-se que somente a partir da Revolução Francesa, em
1789, influenciada pelos ideais do iluminismo e do jusnaturalismo,
alicerçada no lema da busca de liberdade, igualdade e fraternidade para
todos, é que as mulheres subiram um degrau na evolução da civilização
ocidental, passando a usufruir alguns direitos da cidadania. A partir do
século XIX, com a consolidação do sistema capitalista, ganhou relevância a
luta dos operários e das mulheres em busca de uma vida melhor e da
igualdade entre todos.
Segundo ESPÍNOLA, FERIGOLO e BERNARDES (2003)1, existem três
períodos históricos da relação entre os direitos das mulheres: a primeira fase
teve início em 1919 com a fundação da Organização Internacional do
Trabalho, onde muitos dos tratados celebrados referiam-se aos direitos das
mulheres e inspiraram várias leis, inclusive a Consolidação das Leis do
Trabalho no Brasil; o segundo momento teve como marco a Declaração
Universal dos Direitos Humanos, em 1948, a partir daí as mulheres vão
progressivamente consolidando seus direitos em vários mecanismos de
proteção aos direitos humanos; a terceira e última fase teve como marco a
1
ESPÍNDOLA, A. A. S.; FERIGOLO, L.; BERNARDES, M.B. Direitos das mulheres: uma busca constante
pela (des) construção de conceitos e valores. Revista de Pesquisa e Pós-Graduação – Santo Ângelo,
2003. Disponível em www.uri.br/publicaonline/revistas/artigos/87.pdf
aprovação da convenção para Eliminação de Todas as Formas de
Discriminação Contra a Mulher, em 1979, assinalada não apenas por
proteger as mulheres, mas, sobretudo por obrigar os Estados a adotar
medidas que se oponham a discriminação. A este, outros importantes
encontros se seguiram, entre eles: em 1993, a Conferência das Nações
Unidas sobre Direitos Humanos, em Viena, trouxe como resultado, entre
outros, a Declaração das Nações Unidas sobre a Eliminação da Violência
contra a Mulher; a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e
Erradicar a Violência contra a Mulher, no Brasil, em 1994; a Convenção das
Nações Unidas sobre Mulheres, em Pequim, no ano de 1995 e a IV
Conferência Mundial sobre as Mulheres em 1995, em Beijing.
Entretanto, em que pesem os movimentos contemporâneos em prol de
seus direitos, um número significativo de mulheres encontram-se, ainda,
privadas destes, sendo imprescindível a ação da sociedade para a efetiva
promoção e aplicação de fato desses direitos e garantias sociais e políticas.
Requer-se, assim, o avanço não apenas no que tange às políticas públicas
ancoradas na eticidade, mas a inserção de um novo olhar sobre as condições
de igualdade jurídica em que se fundamentam tais direitos.
E se há tanto para ser feito no campo dos direitos da mulher, muito
mais necessário se faz o real debruçar sobre a condição da mulher negra no
Brasil, onde a exclusão social é estruturada não só no gênero, mas também
no racismo e na pobreza. Não se pode olvidar que é sobre a mulher negra
que recai todo o peso da herança colonial, onde o sistema patriarcal vem
apoiado solidamente na herança do sistema escravista. Conforme o Censo
Demográfico do IBGE em 2000, há 37.602.461 mulheres negras no Brasil,
revelando que a população afro-descendente não é minoria, mais do que as
outras parcelas da população brasileira, a mulher negra está exposta à
miséria, à pobreza, à violência, ao analfabetismo, à precariedade de
atendimento nos serviços assistenciais, educacionais e de saúde,
representando uma maioria sem acesso aos bens e serviços sociais além de,
em muito, exposta à violência de gênero e racial2.
Vinte e cinco por cento da população brasileira é formada por mulheres
negras. Destas, a maioria é analfabeta ou semi-analfabeta. A remuneração
desse grupo no mercado de trabalho é de um salário mínimo, sendo que a
maior parte delas são as provedoras da família, constatando-se que a
maioria das mulheres negras no Brasil, ainda hoje, vive em condição de
pobreza.
Vale lembrar que o Brasil é o país de maior população negra fora da
África; historicamente um país escravocrata onde, de fato, ainda perduram
as idéias racistas nas instituições governamentais e na sociedade em geral,
posto que ser negra no Brasil significa viver em condição de extrema
desigualdade social e racial. Considerando que a mulher no Brasil, até a
Constituição de 1988, era legalmente cidadã de segunda categoria, ser

2
Brasil. Articulação de Organizações de Mulheres Negras Brasileiras/AMNB. Construindo a
equidade: estratégia para implementação de políticas públicas para a superação das
desigualdades de gênero e raça para as mulheres negras. Rio de Janeiro: UNIFEM, 2007.
Disponível em www.criola.org.br/Equidade.pdf
mulher negra e pobre significava não ter os direitos mínimos de cidadania
assegurados juridicamente3.
No âmbito da sociedade escravocrata os homens livres e pobres,
sujeitos ao favor dos senhores de terras, amesquinharam-se na sombra de
suas dádivas e essa cultura política da dádiva sobreviveu à abolição da
escravatura, expressou-se no compromisso coronelista e chegou até nossos
dias4.
De acordo com SALES (1993), são as raízes dessa cultura da dádiva a
expressão política da desigualdade social, mediante a relação de
mando/subserviência cuja manifestação primeira se deu no âmbito do
grande domínio territorial que configurou a sociedade brasileira nos
primeiros séculos de sua formação. A dádiva chega a atual res publica. Os
quatro séculos de evolução no país, os direitos individuais, a liberdade, a
pessoa, o lar, os bens dos homens pobres só estão garantidos, seguros,
defendidos, quando têm para ampará-los o braço possante de um caudilho
local. É o conceito de cidadania concedida, que reporta ao caráter
prescindível do homem pobre na estrutura sócio-econômica, levando-o, em
última instância, a conceber sua própria situação como imutável e fechada,
na medida em que as suas necessidades mais elementares dependeram
sempre das dádivas dos mais poderosos. Quando aboliu-se a escravidão e
implantou-se a República no Brasil, o domínio do liberalismo enquanto
doutrina em pouco ou nada contribuiu para a instauração dos direitos
elementares de cidadania. Nesse sentido, a pobreza do brasileiro não é um
estado que tem a ver apenas com suas condições econômicas. Ela tem a ver
igualmente com sua condição de submissão política e social. E o
compromisso coronelista é que está por trás desse tipo de autojustificação
da pobreza como sendo do interesse dos "grandes" do local, como o meio
mais importante de eles obterem os favores necessários ao moto-contínuo de
seu mando e de sua riqueza. A vinculação pobreza-submissão, mais que
uma marca da cultura política herdada do monopólio do mando pelo
domínio territorial, é uma marca desse estado de compromisso herdado da
República Velha e que subsiste mediante o compromisso entre o poder
público, que pode se traduzir em poder centralizado, e o poder local, que
persiste à custa de favores na forma de dádivas.
Segundo SILVÉRIO (2002), o conceito de igualdade tem uma história
construída paradoxalmente pela observação dos três tipos de desigualdade:
de gênero; étnico e racial; e de posições no mercado de trabalho. Essas
desigualdades estão sempre associadas a desvantagens, quando a entrada
de um grupo no plano de direitos é retardada, esse grupo jamais pode ser
tratado numa lógica de igualdade, uma vez que a igualdade não pode ser
algo falado, ela tem que ser pensada na mesma lógica da história e, na lógica
da história observa-se que o grupo feminino foi barrado em vários momentos
na sua possibilidade de se igualar nessas áreas em que ele leva desvantagem

3
BRITO, B.R.P. de. Mulher Negra Pobre – a tripla discriminação. Revista Teoria e Debate nº
36. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 1997. Disponível em
www.fundacaoperseuabramo.org.br/td/td36/td36_sociedade.htm
4
SALES, T. Raízes da desigualdade social na cultura política brasileira. In Trama das
desigualdades, drama da pobreza no Brasil. Tese de livre-docência. Unicamp. Campinas,
1993.
e, é somente a partir da década de 80, século XX, que essa discussão entra,
de fato, em questão. Outrossim, não se pode atribuir somente à
desigualdade entre ricos e pobres a proeminência da explicação sobre os
profundos problemas sociais do país, uma vez que as desigualdades são
produtos de uma trama complexa entre o plano econômico, político e
cultural, ou seja, há multiplicidade de fatores e multicausalidade das
desigualdades, em seus aspectos dinâmico e de relações sociais.
Considerando os indicadores sociais que demostram uma confluência entre
desigualdade econômica e desigualdade racial, a dimensão econômica
explica apenas parte das desigualdades, a outra parte é explicada pelo
racismo institucional, tendo o Estado legitimado historicamente o racismo.
Raça não é apenas algo a mais, algo que é adicionado, mas parte
integrante e constitutiva das experiências cotidianas mais comuns e não se
pode negar a importância da raça como fator gerador de desigualdades
sociais. É somente nos anos 90 do século XX que se verifica uma
significativa mudança de postura nos segmentos da sociedade brasileira em
relação ao tratamento das questões da população negra no país, dentre os
quais se destacam: o aumento e a divulgação de pesquisas empíricas; o
surgimento de conselhos de desenvolvimento e participação da comunidade
negra; e o reconhecimento oficial, em 1995, da existência da discriminação
racial e do racismo, com a implantação por meio de decreto do Grupo de
Trabalho Interministerial - GTI, com a função de estimular e formular
políticas de valorização da população negra. Mas, no Brasil, diz ele, negros e
mulheres necessitam lutar para a implementação de políticas públicas e
programas que ampliem sua participação em posições estratégicas do
mercado de trabalho, em paralelo à crítica feita à sociedade que os
inferioriza5.
Inspiradas pela vontade de discutir a desigualdade que atinge mulheres
em todo o mundo, as ativistas dos direitos humanos vêm realizando
significativos ganhos nas últimas décadas, assegurando a maior inclusão do
tema do abuso dos direitos relativos às mulheres e ao gênero nos discursos
dos direitos humanos. E, apesar das lacunas gritantes na informação
disponível sobre mulheres racialmente marginalizadas em todo o mundo, é
possível facilitar a discussão sobre a variabilidade da discriminação contra
as mulheres por meio de modelos provisórios projetados para mapear suas
múltiplas identidades. Para tanto, as instituições devem se envolver nos
esforços simultâneos de investigação das implicações de gênero do racismo,
da xenofobia e de outras formas de intolerância e de maior conscientização
quanto às implicações de raça, etnia, cor e outros fatores que contribuem
para uma combinação de abusos dos direitos humanos que mulheres e, por
vezes, homens enfrentam6.

5
SILVÉRIO, V. Ação afirmativa e o combate ao racismo institucional no Brasil. Cadernos de
Pesquisa, n. 117. São Paulo: BIREME, 2002. Disponível em
www.scielo.br/pdf/cp/n117/15560.pdf
6
Background Paper for the Expert Meeting on the Gender-Related Aspects of Race
Discrimination", Women's International Coalition for Economic Justice, Tradução de Liane
Schneider. Revisão de Luiza Bairros e Claudia de Lima Costa. Disponível em
<www,wuceh,addr,cin/wcar_docs/crenshaw.html e www.unifem.undp.org/progressww/

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