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A Cozinha

Brasileira
Multiculturalidade
e regionalismo
História da Alimentação e da Gastronomia
Aula 9
• Quando buscamos uma resposta sobre o que é a
cozinha brasileira, acabamos com enumerações de
pratos que “exemplifiquem” o que ela é.
• Segundo Carlos Alberto Dória, “falta-nos o conceito
que unifique a coleção de receitas ou pratos
rememorados”.
• Segundo o autor, o início sobre o discurso de
unificação da cozinha brasileira, no sentido atual,
teve início apenas após o movimento Modernista
de 1920. Na mesma época em que se “descobre” o
barroco como estilo arquitetônico, desenvolveu-se
um discurso sobre a gastronomia brasileira.
Turismo
• Esse modelo de explicação difundiu-se
pela indústria turística de tal maneira que
as pessoas hoje se movimentam pelo país
como se fossem à busca de uma
característica de uma cozinha regional.
• A ”cozinha brasileira” não se apresenta
integrada, mas como um conjunto de
cozinhas regionais espalhadas pelos
estados divididos.
Gastronomia hoje

• Nos grandes centros urbanos, mais globalizados, o


país passa por uma nova fase de celebração da
culinária brasileira, no entanto, pesquisas indicam
que o hábito de consumo doméstico de pratos
considerados típicos da gastronomia brasileira tem
desaparecido.
O início
• Através do processo de colonização, pouco foi
desenvolvido em relação à construção de símbolos
culinários com capacidade de unificar todo um
território e sua população.
• A burguesia por diversos momentos não poupou
esforços em não construir um território cultural comum
com as demais classes da população, pois não quiseram
se confundir com os nativos, preferindo a identidade da
origem europeia.
• Criou-se portanto, uma dualidade cultural.
• Religião “de negro”, cozinha de “bugre”, eram modos de
falar que expressavam a exclusão.
Dualidade cultural
• A partir da corte de dom Pedro I, o francês se tornou a língua das
elites, e isto também teve o seu reflexo na cultura alimentar.
Comia-se à francesa.
• Tais hábitos foram consolidados no Rio de Janeiro e se
difundiram pelas casas-grande dos engenhos.
• Durante o século 19, após a independência, jornais cariocas
publicavam anúncios a procura de cozinheiros franceses.
• Em mesmo período, nos sertões de São Paulo, comia-se sem
qualquer refinamento. Não se usava o garfo e o que vinha à mesa
era mais próximo a uma cozinha “de bugre” do que qualquer
elemento que remetesse à cultura europeia cortejada.
Miscigenação
• A pergunta “ de onde vem tal elemento? Dos índios, dos
negros ou dos brancos” faz sentido?
• Gilberto Freyre em Casa-Grande & Senzala (1933), pôs fim
à discussão sobre a hierarquia das raças na formação da
sociedade brasileira. Sua tese foi uma revolução na maneira
de compreender a formação do povo brasileiro.
• A miscigenação de brancos, negros e índios sob direção da
grande propriedade rural legitimizou a convicção de que
éramos mestiços por definição.
Regiões culinárias

• Destacam-se hoje no país três regiões


culinárias – A baiana, a nordestina e a mineira.
• Outras tradições culinárias menos
importantes poderiam ser acrescentadas
como a cozinha do extremo norte, com a
predominância de influência indígena, a
cozinha fluminense e norte-paulista, a região
gaúcha, a cozinha de sertão, com áreas
caracterizadas por uma cozinha agreste e a
das florestas do centro do país pela utilização
da caça e do peixe de rio.
As três grandes influências

Se encontram à base das principais cozinhas


regionais brasileiras.

• A influência portuguesa manifesta-se hoje


mais fortemente no litoral, do Maranhão ao
Rio de Janeiro e Santos.
• A influência africana sobressai na Bahia.
• A influência ameríndia é mais notável no
extremo Norte.
A feijoada
• Muitos autores que estudaram a feijoada defendem o seu caráter de
resumo da formação social brasileira. O mito da feijoada fala sobre a
opressão, lembrando-nos que aos escravos eram reservados os piores
pedaços do porco para que fizessem o cozido nutritivo com feijão preto.
• Visão entendida por uma perspectiva aristocrática que valoriza o lombo e
o pernil suíno. Outras culturas valorizam as partes de maios concentração
de tecido conjuntivo e gordura.
• Seria a feijoada um prato nacional?
• Levantamentos estatísticos sobre hábitos alimentares do brasileiro
indicam que a feijoada não é um prato do cotidiano.
• Poderia ser um prato cerimonial?
• Podemos dizer que é um prato de caráter popular, “identitário” com a
capacidade de reter o passado de escravidão subvertendo o seu sentido
dramático.
Transição da influência
da península ibérica

Carnes de poco, carneiros, galinhas.


Cozidos, refogados, assados.
Empanados, tortas.

• Ao se embrenhar nos sertões, os colonizadores


necessitaram ajustar a dieta ao que a terra oferecia,
substituindo ingredientes por similaridade e
adicionando-os ao pouco que se importava.
• O resultado foi uma culinária em que resistem caldos e
cozidos, aos quais se acrescentava o pão ou o seu
substituto, a mandioca ou “pão da terra”, dando origem
à pirões e vatapás, numa adaptação das açordas e migas,
ou ensopados e guisados que originaram as moquecas.
• O “assar” se aproximou do modelo indígena, do
moquém e das fogueiras simples.
• Foram incorporados pelos colonizadores o consumo de
vísceras e de pequenos animais (no lugar da carne
bovina)
Transação de
espécies
Chegaram ao Brasil infinitas espécies, vindas de diversos lugares
conquistados., como exemplos:
• Arroz – China (século 17)
• Banana – Ásia
• Carambola – Ásia (século 19)
• Chuchu – América Central
• Coco – Índia
• Coentro – Europa Meridional (século 17)
• Dendê – África (século 16)
• Fruta-pão – Malásia
• Graviola – América Central
• Inhame – Ásia
• Jaca – Índia (século 19)
• Manga – Ásia (século 16)
• Melancia – África (século 16)
• Quiabo – África (século 16)
• Soja – China (século 19)
• Trigo – Ásia (século 16)
Cultura indígena

• Os tupi-guaranis com abrangência até a bacia do Prata,


se estendendo até as imediações de São Paulo,
adotaram o uso do milho, enquanto os tupinambás
faziam uso da mandioca.
• Desta forma, um duplo padrão de carboidratos esteve
presente na dieta dos nativos brasileiros.
• Ainda hoje, as populações indígenas da Amazônia tem
em seu costume alimentar formigas içás (cruas ou em
farofas). Tal costume foi bastante marcado também na
São Paulo antiga.
• Em São Paulo a tanajura era vendida em tabuleiros,
sendo iguaria apreciada por todas as classes sociais.
• Pode-se dizer, portanto, que o período
colonial foi de integração dos ingredientes
culinários, graças às dimensões
globalizadas do sistema econômico
desenvolvido pelos portugueses.
• Foi um período de assimilação das técnicas
culinárias europeias, deixando em segundo
plano as técnicas indígenas.
• Das culturas indígenas assimilou-se a
enorme quantidade de frutas e “drogas do
sertão”, e as formas de transformação do
milho e da mandioca.
Drogas do Sertão
• Antes que a colonização brasileira se efetivasse, a Europa mantinha
um grande interesse em especiarias e produtos vindos da Ásia.
Ervas, raízes, especiarias e frutas asiáticas eram utilizadas também
para a produção de remédios, além de temperos para comidas.
• Ao longo da colonização, pode-se observar que a incursão pelo
interior do nosso território abriu caminho não apenas para o
conhecimento de novos espaços, mas também para ciência de novas
espécies vegetais. Frutas, raízes e folhagens que compunham a
vegetação local.
• Nos séculos XVI e XVII, a exploração territorial nacional surgiu como
uma solução para o papel econômico anteriormente desempenhado
pela Índia.
• Em sua maioria, a extração das drogas do sertão era feita pelas
missões jesuítas que se localizavam no interior do território e
aproveitavam da mão de obra indígena. Paralelamente os
bandeirantes também realizavam a mesma atividade.
• Durante esse processo, o contato com as populações indígenas foi
importante para que os colonizadores pudessem conhecer as
potencialidades curativas e culinárias dos produtos.
• Exemplos: Cacau, guaraná, urucum, baunilha, casta do pará...
Contribuição dos escravos negros
para a cozinha brasileira
• A escravidão constituiu uma dissolução dramática dos modos alimentares dos
povos africanos.
• Os negros não trouxeram para o Brasil as espécies nativas da África, elas só
ancoraram aqui porque foram úteis ao comércio do colonialismo, ou seja, sob a
diretriz dos colonizadores e não como um “contrabando” étnico.
• O escravo seria alimentado segundo a diretriz do custo da sua alimentação,
força e longevidade.
• O que marca esta dinâmica alimentar colonial é a fome.
• Figuram como cozinheiros, exercendo uma influência silenciosa através da
cozinha das casas-grande.
• A chamada “culinária africana” que se desenvolveu em Salvador teve seu
surgimento apenas no século 19 (após a abolição), não constituindo herança
colonial.
• Com o consequente relaxamento do controle policial sobre os negros, o
candomblé e sua culinária puderam emergir.
• O candomblé foi fruto da unificação de vários cultos africanos, representando
um produto de sincretismo original dos ex-escravos.
• Transação de espécies,
especialmente botânicas,
envolvendo em um só movimento
a Ásia, a África, a Europa e as
Américas.
• Seria possível abandonar a divisão
sociopolítica da cozinha brasileira,
redesenhando o território
segundo a tipicidade de
ingredientes e produtos?
• Neste ponto de vista, as “regiões”
antes estabelecidas podem ser
substituídas por manchas
culinárias descontínuas e mais
úteis ao conhecimento da
diversidade alimentar, desta
forma teríamos:
A culinária Amazônica: caracterizada pelo uso amplo da mandioca e seus
derivados, além de frutas, peixes de rio e outros produtos da floresta.

A culinária da Costa: Se estendendo do Ceará ao Espírito Santo, marcada


pelo uso de peixes, frutos do mar e do leite de coco.

A culinária do Recôncavo Baiano: tipificada pelo uso do óleo de dendê a


partir do caráter da “cozinha de santo”.

A culinária do Brasil Meridional: Com notável difusão do cuscuz e pratos à


base de milho, além da fartura da carne, além das manchas específicas do
pequi, do mate e do pinhão.

A culinária Caipira: Compreendendo especialmente os estados de São Paulo


e Minas Gerais, calcada no milho, no porco e no frango, além de vegetais e
legumes, com grande assimilação de técnicas portuguesas de preparo.
Amendoim Araruta Babaçu Cacau

Castanha-
Cajú Cará Cupuaçú
do-Pará

Espécies Erva-mate Feijão Goiaba Guaraná

nativas
domesticadas Jabuticaba Jiló Juçara Mamão

Mandioca Maxixe Pimentas Pitanga

Pupunha
Fauna nativa

• Tatus
• Preás
• Antas
• Capivara
• Pacas
• Jacus
• Macucos
Referências Bibliográficas
• Doria, Carlos Aberto. A Formação da Culinária Brasileira. São Paulo: Publifolha, 2009.

• Franco. Ariovaldo. De caçador a gourmet: uma história da Gastronomia. 2ª ed. Rev. São Paulo: Ed
Senac SP, 2001.

• Montanari. Massimo & Flandrin. Jean-Louis. História da Alimentação. 9ªed. Rev. São Paulo: Ed
Estação Liberdade, 2018.

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