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Comunicado 122

Técnico ISSN 1983-9731


Campo Grande, MS
Dezembro, 2009

Vacinação, a Importância das


Boas Práticas e a Prevenção
de Doenças de Interesse em
Bovinocultura

Vanessa Felipe de Souza1


Cleber Oliveira Soares2
Samuel da Fonseca Ferreira3

Introdução ção para a região centro-oeste. Entretanto, inicial-


mente serão apresentados alguns cuidados a serem
O objetivo de vacinar os animais é prevenir a ocor- observados durante a vacinação, e o sucesso deste
rência e a disseminação de doenças, mantendo-os procedimento se reflete na alta taxa de proteção
saudáveis e minimizando os prejuízos econômicos. dos animais contra as doenças e no baixo índice
Os cuidados devem ser observados durante todo o de reações vacinais. Para isto é preciso associar o
processo, desde a aquisição, o transporte e a arma- uso de produtos confiáveis, os cuidados durante
zenagem, até a aplicação propriamente dita. o processo e boas condições de saúde, para que
o animal possa desenvolver uma resposta imune
Existe uma grande variedade de vacinas para bo- satisfatória.
vinos disponíveis no mercado, mas a escolha do
produto mais indicado deve estar de acordo com a Os principais problemas com a vacinação ocorrem
legislação específica para cada enfermidade, e com por aplicação incorreta, dentre os quais se desta-
o calendário de controle sanitário adotado na pro- cam as perdas de doses do produto, os gastos por
priedade. Este planejamento deve levar em conside- danificação de seringas e agulhas e as ocorrências
ração as recomendações oficiais para as doenças de de acidentes de trabalho. Nos animais, lesões no
ocorrência na região, o tipo de exploração produ- local de aplicação (abscessos, miíases) e acidentes
tiva, a faixa etária, a movimentação de trânsito de durante o manejo (arranhões, hematomas, fraturas)
animais, entre outros. podem ser comuns nesses casos, o que provoca
prejuízos econômicos por redução no rendimento
Adiante serão apontadas as principais doenças que da carcaça, pela remoção de partes impróprias para
podem ser prevenidas pela aplicação de vacinas consumo durante a toalete e, além disso, inflige
comerciais e um exemplo de calendário de vacina- condições básicas de bem-estar animal.

1 Médica-Veterinária, D.Sc. em Virologia, pesquisadora da Embrapa Gado de Corte, Campo Grande, MS, vanessa@cnpgc.embrapa.br
2 Médico-Veterinário, Ph.D. em Ciências Veterinárias, pesquisador da Embrapa Gado de Corte, bolsista do CNPq, Campo Grande, MS, cleber@cnpgc.
embrapa.br
3 Médico-Veterinário, analista da Embrapa Gado de Corte, Campo Grande, MS, samuelff@cnpgc.embrapa.br
2 Vacinação, a importância das boas práticas e a prevenção de doenças de interesse em bovinocultura

Boas práticas de vacinação em Foto: Vanessa Felipe de Souza

bovinos
Após definido o calendário de vacinação, é reco-
mendável atender alguns cuidados durante o pro-
cesso para obter o máximo de benefícios, os quais
serão abordados nos tópicos a seguir:

Aquisição, armazenamento e transporte


É importante adquirir as vacinas de revendedores
idôneos e verificar as instruções de uso, bem como
a data de validade do produto. A temperatura de
conservação deve ser respeitada, sob pena de perda
de qualidade e eventuais falhas de proteção, sendo
que a maioria das vacinas deve ser conservada em Figura 1. Aplicação de vacina via intramuscular em bovino.

ambiente refrigerado, entre +2ºC a +8ºC, inclusive


no mangueiro, e não devem ser congeladas.

A forma mais indicada de transportar as vacinas é


Foto: Vanessa Felipe de Souza
em caixa térmica, contendo a proporção de três par-
tes de gelo para uma parte de frascos. É recomen-
dável vedar a tampa com fita adesiva e, em caso de
trajetos longos, é preciso repor o gelo derretido.

Aplicação da vacina
Devem ser vacinados os animais sadios. Aqueles
submetidos a atividades desgastantes, como longas
caminhadas ou viagens, necessitam descansar an-
tes, pois é preciso que estejam em boas condições
para responderem adequadamente à vacinação.

Geralmente, o local indicado para aplicação das


Figura 2. Aplicação de vacina via subcutânea em bovino.
vacinas é a tábua do pescoço, ou seja no músculo
(intramuscular – Figura 1) ou embaixo da pele (sub-
cutânea – Figura 2), e isto, junto com a característi-
ca de viscosidade da vacina (oleosa ou aquosa), vai
determinar o tamanho da agulha a ser usada. Como
exemplo, para vacinas oleosas podem ser utilizadas
Foto: Dalízia Montenaro Aguiar
agulhas de calibres 10 x 15 ou 15 x 15 em aplica-
ção subcutânea e 30 x 15, em intramuscular.

A higiene e o estado dos equipamentos são fundamen-


tais, assim devem ser usadas seringas e agulhas limpas
e desinfectadas, o que pode ser feito mediante fervura
durante pelo menos 15 minutos, mantendo-as em local
limpo no decorrer dos trabalhos. Para evitar reações no
local de aplicação, também é indicado trocar de agulha
com freqüência, por exemplo, a cada 10 animais ou
recarga, e a pistola ou seringa deve ser mantida dentro
da caixa de isopor com gelo enquanto não estiver
aplicando a vacina (Figura 3). Ao final dos trabalhos, os
Figura 3. Conservação de vacinas e pistola em gelo durante os
materiais devem ser guardados limpos e secos.
trabalhos de vacinação.
Vacinação, a importância das boas práticas e a prevenção de doenças de interesse em bovinocultura 3

Vale lembrar ainda que não devem ser utilizadas como incidência da doença na região ou rebanho,
agulhas tortas, enferrujadas, com pontas rombudas, em questão e duração da imunidade no rebanho, e
aparência de sujas ou que tenham caído no chão, costuma variar entre seis a 12 meses.
bem como as aplicações não devem ser feitas em
regiões do animal que contenham barro ou ester- As informações contidas a seguir não têm o in-
co. O mesmo vale para os restos de vacinas, que tuito de substituir a ação do médico-veterinário,
precisam ser destruídos, pois a introdução repetida tampouco de laudos de diagnóstico complementar
de agulhas no frasco predispõe à contaminação do de laboratórios. Assim, apresentamos, de forma
produto e pode provocar abscessos nos animais resumida, algumas doenças (Tabela 1) que afetam
vacinados. os rebanhos e para as quais existem vacinas dispo-
níveis no mercado, ficando sua capacidade proteto-
Outro ponto importante e muitas vezes negligencia- ra associada a qualidade do produto informada pelo
do é a contenção dos animais durante os trabalhos, seu fabricante e as condições em que foi utilizada.
sabe-se que uma prática de contenção adequada Portanto, a atuação do médico-veterinário e o exa-
diminui o risco de quebra de agulhas, refluxo, perda me laboratorial para confirmar o diagnóstico são de
de doses e acidentes com trabalhadores e animais, extrema importância para estabelecer os métodos
assim como a aplicação preferencialmente nos de tratamento e prevenção.
períodos mais frescos do dia, com tranqüilidade e
sem correrias, evitando, assim, estresses desneces- Botulismo
sários.
O botulismo é uma intoxicação alimentar causada
A prevenção das doenças por meio pela ingestão da toxina produzida pela bactéria
da vacinação Clostridium botulinum que se caracteriza por uma
paralisia flácida, geralmente fatal. Clostridium
As vacinas disponíveis no mercado são preparadas botulinum é anaeróbico, isto é, só se multiplica na
para proteger os bovinos contra um único agente ou ausência de ar (oxigênio), em carcaças de animais
patógeno (monovalentes) ou um conjunto deles (po- (mamíferos, aves, répteis), matéria orgânica em de-
livalentes). Alguns laboratórios oferecem produtos composição, silagens e conservas mal preparadas.
comerciais para prevenir contra os principais agen- Na presença do ar o agente esporula, como forma
tes causadores de quadros clínicos como diarréia de resistência, mantendo-se, assim, contaminando
dos bezerros, clostridioses, síndromes respiratórias, o ambiente.
doenças da reprodução, entre outros. A vantagem
destes produtos é que todos os antígenos estão Na atualidade, a intoxicação botulínica é uma das
em proporção equilibrada para melhor formação de principais causas de mortalidade de bovinos no
resposta imune, além da facilidade de manejo, com País. A intensificação dos surtos decorre, provavel-
uma única aplicação. mente, da contaminação ambiental crescente pelos
esporos de C. botulinum e da diversificação das
Na maioria dos casos após a primeira dose da fontes dos alimentos utilizados.
vacina contra alguma doença é preciso aplicar uma
segunda dose ou reforço, aproximadamente quatro Os animais se intoxicam ingerindo parte de car-
semanas depois ou a critério do médico-veterinário, caças, alimentos e água contaminados. Além dos
exceto para vacinação contra brucelose, em que bovinos, os cavalos, ovelhas, cabras, galinhas,
uma única aplicação é indicada para fêmeas de três patos, animais de laboratório (camundongos, ratos,
a oito meses de idade, conforme a legislação nacio- cobaios, coelhos) e o homem, são susceptíveis.
nal vigente. Os sintomas são incoordenação motora e fraque-
za, paralisia flácida progressiva da musculatura de
Esse procedimento é importante para alcançar os locomoção, deglutição e mastigação e ainda alguma
níveis desejados de proteção, pois em muitos casos excitação com a aproximação de pessoas ou outros
a resposta a uma única dose pode ser baixa e de animais. As membranas mucosas, os batimentos
curta duração, principalmente quando ainda exis- cardíacos e a temperatura costumam estar dentro
te a presença de anticorpos maternos. O intervalo dos parâmetros normais.
para os reforços vacinais vai depender de fatores
4 Vacinação, a importância das boas práticas e a prevenção de doenças de interesse em bovinocultura

Em geral os bovinos comem restos de animais mortos planta das invernadas e categorias animais; 3) for-
e mastigam ossos que encontram no campo, devido necer água de boa qualidade em bebedouros limpos;
à deficiência nutricional. Assim, como prevenção, em e 4) vacinar todos os animais, anualmente. Alguns
áreas de ocorrência desta doença, deve-se: 1) remo- anos após a adoção destas medidas, quando não mais
ver os cadáveres e queimá-los completamente ou ocorrerem mortes por botulismo e os animais não
enterrá-los de forma que os bovinos e outros animais manifestarem mais sinais de deficiência mineral, a va-
não tenham acesso; 2) manter a mistura mineral cinação poderá ser suspensa. Entretanto, a suplemen-
balanceada de acordo com as características de solo, tação mineral deverá sempre ser mantida à vontade.

Tabela 1. Principais doenças que acometem bovinos e podem ser protegidas por vacinas disponíveis no mercado.
Doença Agente Classificação
Botulismo Clostridium botulinum bactéria
Brucelose Brucella abortus bactéria
Campilobacteriose Campylobacter fetus bactéria
Carbúnculo hemático Bacillus anthracis bactéria
Carbúnculo sintomático Clostridium chauvoei bactéria
Ceratoconjuntivite Moraxella bovis bactéria
Colibacilose Escherichia coli bactéria
Coronavírus Coronavírus bovino vírus
Diarréia viral bovina/Doença das mucosas Vírus da diarréia viral bovina/ doença das mucosas vírus
(BVD/MD)
Enterotoxemia Clostridium perfringens tipo D bactéria
Febre aftosa Vírus da febre aftosa vírus
Gangrena gasosa/edema maligno Clostridium septicum, Clostridium perfringens, bactéria
Clostridium novyi, Clostridium chauvoei e
Clostridium sordelli
Hemoglobinúria bacilar Clostridium haemolyticum bactéria
Leptospirose Leptospira spp. bactéria
Pasteurelose Pasteurella haemolytica bactéria
Parainfluenza bovina tipo 3 (PI3) Parainfluenza bovina tipo 3 vírus
Raiva Vírus rábico vírus
Rinotraqueíte infecciosa bovina (IBR) Vírus da rinotraqueíte infecciosa bovina vírus
Rotavírus Rotavírus bovino vírus
Salmonelose ou paratifo Salmonella dublin, Salmonella typhimurium bactéria
Tétano Clostridium tetani bactéria
Vírus respiratório sincicial dos bovinos Vírus respiratório sincicial dos bovinos vírus
(BRSV)

Brucelose dos gânglios supra mamários; acúmulo de líquido na


articulação dos joelhos; quando não ocorre o aborto,
Doença causada pela bactéria Brucella abortus nascem bezerros fracos; diminuição da produção de
caracterizada pela inflamação dos órgãos genitais e leite; retenção de placenta; infertilidade temporária
membranas fetais, aborto, esterilidade e formação de ou permanente e orquite (infecção e inflamação dos
lesões localizadas em vários tecidos. A doença afeta testículos), e epididimite em touros.
tanto gado de leite como gado de corte e pode ser
transmitida para o homem. O período de incubação, A transmissão é feita por ingestão de alimentos
isto é, o tempo entre a infecção e o aparecimento (pasto, ração), água, urina e secreções contamina-
dos sintomas varia de três semanas a seis meses. O das ou pela cópula. As vacas contaminadas, mesmo
aborto ocorre, na maioria dos casos, no último terço sem abortar, eliminam secreções uterinas e vaginais
da gestação. Os demais sinais clínicos que podem contaminadas com B. abortus. Os touros transmi-
ser observados são mastite; aumento de volume tem para as fêmeas, durante a cópula, o agente
contido no muco prepucial e no sêmen.
Vacinação, a importância das boas práticas e a prevenção de doenças de interesse em bovinocultura 5

O diagnóstico clínico é baseado no histórico e si- É comum a campilobacteriose se desenvolver de


nais clínicos observados nos animais, e deve ser forma subclínica, mas altas taxas de retornos ao
feito por veterinário experiente devido ao risco cio e aumento do intervalo entre partos podem ser
de contaminação da pessoa que está manipulan- uma suspeita da presença da infecção. As fêmeas
do os animais doentes ou os fetos abortados. O podem apresentar vaginite mucosa a catarral, endo-
aborto é frequente em novilhas e nos primeiros metrite, e o aborto costuma ocorrer entre quatro e
partos subsequentes. Após esta etapa as vacas seis meses de gestação, sendo as novilhas a faixa
não costumam abortar, porém, dão à luz bezerros etária mais suscetível e nas quais a observação de
fracos que, muitas vezes, morrem pouco tempo retorno ao cio ocorre com taxas mais elevadas. Os
após o nascimento. Mesmo as vacas infectadas touros, em geral são portadores assintomáticos.
que não abortam continuam a eliminar secreções
com o agente, contaminando o pasto, a água e Deve ser realizado diagnóstico diferencial de outras
outros alimentos, além dos touros que as servi- doenças do sistema reprodutivo, como brucelose,
rem. pois os achado de aborto, como placenta edemacia-
da, são comuns em ambas. Somente o diagnóstico
O diagnóstico laboratorial deve ser realizado por laboratorial confirma a infecção por C. fetus subsp.
médico-veterinário habilitado pelo Ministério da venerealis, e este pode ser realizado por sorologia e
Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) ou imunofluorescência, entre outros, além do isolamen-
Serviço Estadual de Defesa Sanitária Animal, o qual to do agente a partir de esmegma prepucial, muco
emitirá os laudos sanitários dos animais testados. cérvico-vaginal e materiais frescos de abortos como
fetos e placentas.
A prevenção deverá ser realizada vacinando todas
as bezerras de três a oito meses de idade, elimi- O tratamento mais comumente adotado, por ser
nando todos os bovinos sorologicamente positivos, considerado mais econômico, está baseado no des-
evitando a entrada de bovinos portadores, exigindo canso sexual das fêmeas por aproximadamente três
o exame sorológico dos animais adquiridos. A vaci- ciclos. O tratamento dos touros pode ser feito por
nação é de responsabilidade de médico-veterinário uso de antibióticos sob orientação do médico-
cadastrado no Serviço Estadual de Defesa Sanitária veterinário.
Animal, o qual emitirá o atestado de vacinação.
O controle da doença por meio da utilização de
A doença é de notificação obrigatória e a determi- inseminação artificial em animais criados em re-
nação do Programa Nacional de Controle e Erradi- gimes extensivos pode se tornar inviável, assim a
cação da Brucelose e da Tuberculose (PNCEBT) é o vacinação de todos os animais em idade reprodu-
abate dos animais positivos. tiva, até 60 dias antes da cobertura, com reforço
ao redor de quatro semanas, pode ser uma alter-
Campilobacteriose nativa. A vacinação dos touros é um tema contro-
verso e sua utilização fica a critério do médico-
A campilobacteriose genital bovina é causada por veterinário.
Campylobacter fetus subespécie venerealis e provo-
ca infertilidade temporária de fêmeas, caracteriza- Carbúnculo hemático (Anthrax)
das por repetição de cio e aborto.
Doença febril aguda causada pelo Bacillus anthracis
Os animais se contaminam por contato sexual dire- que é caracterizada por hemorragias subcutâneas
to ou mesmo, em alguns casos, por práticas vete- e subserosas e morte súbita. Em geral o animal in-
rinárias em que são compartilhados equipamentos fectado é encontrado morto, inchado, com espuma
contaminados entre animais sadios e infectados. O de sangue escuro saindo pelas narinas, pela boca,
macho é tido como fator de perpetuação da doen- ânus e vagina e sem rigor mortis (enrijecimento do
ça no rebanho em sistemas de produção de gado cadáver). A maioria dos animais domésticos são
de corte que utilizam monta natural realizada por suscetíveis, exceto as aves. Trata-se de uma zoono-
touros contaminados, o que pode causar prejuízos se, portanto o homem também pode desenvolver a
econômicos significativos. doença.
6 Vacinação, a importância das boas práticas e a prevenção de doenças de interesse em bovinocultura

Bacillus anthracis esporula na presença do ar, isto A doença é endêmica, em todo o País, portanto, os
é, forma esporos que são altamente resistentes à bezerros devem ser vacinados todos os anos. Deve-
dessecação e aos desinfetantes comuns. A pele e -se iniciar a vacinação dos bezerros entre três a seis
os resíduos do animal morto permanecem contami- meses de idade, podendo-se fazer outra vacinação
nados, assim como o solo à sua volta. antes de completarem um ano e uma terceira va-
cinação antes de completarem dois anos de idade.
As fontes de transmissão são o solo contaminado e Como outros clostrídeos podem estar envolvidos
a vegetação ao redor, inclusive o feno desta ve- (Clostridium septicum, Clostridium novyi e Clostri-
getação; insetos sugadores; aves e outros animais dium sordelli), é recomendável utilizar vacinas poli-
carnívoros; água, especialmente de inundações; e valentes, isto é, que contenham os demais agentes.
farinha de carne e de ossos. Em caso de surtos é recomendável vacinar todos
os bezerros, até dois anos de idade, repetindo-se a
Como medidas de controle é recomendado evitar vacinação em aproximadamente quatro semanas.
abrir o animal cadáver (não fazer a necropsia) no
campo; queimar completamente ou enterrar pro- Ceratoconjuntivite
fundamente (no mínimo dois metros) o cadáver
e as secreções, cobrindo com cal (de preferência A ceratoconjuntivite infecciosa dos bovinos é cau-
queimar para evitar a permanência dos esporos). sada pela bactéria Moraxella bovis e considerada a
Ao manipular o animal devem ser usadas luvas de principal doença ocular dos bovinos. Popularmente
borracha e estas devem ser descartadas e o ma- é conhecida como “doença do olho branco” e pode
terial utilizado esterilizado. Não é recomendado o observar conjuntivite, lacrimejamento intenso, foto-
pastejo em pastagem contaminada por animais não fobia e opacidade córnea (ceratite), uni ou bilateral,
vacinados. principalmente nos animais jovens e que entraram
em contato com outros indivíduos doentes.
Em regiões endêmicas, todos os bovinos e equinos
devem ser vacinados, anualmente, e a vacina forne- Os casos graves podem evoluir para cicatrizes,
ce proteção satisfatória contra a doença. É reco- formação de úlceras profundas, cegueira e perda do
mendada uma dose de reforço por volta de quatro olho comprometido, e os animais afetados costu-
semanas após a primeira. mam apresentar um quadro sistêmico, com perda
de peso e queda da produção de leite e de carne.
Carbúnculo sintomático
Alguns agentes podem predispor à instalação da
Doença febril aguda que afeta, principalmente, doença como poeira, deficiência nutricional (princi-
animais jovens, até dois anos de idade, causada palmente de vitamina A), ação de insetos, defensi-
pela bactéria Clostridium chauvoei, e se caracteriza vos químicos, infecção por IBR e equipamentos de
por manqueira e inchaço crepitante nos músculos uso comum.
da paleta e, às vezes, em outras partes do corpo.
Outros clostrídeos podem estar associados ao pro- O tratamento pode ser realizado pela aplicação de
blema. Além dos bovinos, os ovinos, também, são antibióticos específicos de forma injetável sistêmi-
suscetíveis. ca ou tópica (nos olhos), o qual deve obedecer às
características de sensibilidade do patógeno e se
A doença se desenvolve em até 36 horas. O animal iniciar o mais breve possível, para evitar o desenvol-
apresenta-se deprimido, febril e com manqueira. vimento do quadro e, consequentemente, a perda
Muitas vezes a doença só é percebida ao se en- da visão.
contrar o animal morto. Estes microrganismos são
sensíveis à penicilina. Entretanto, mesmo que medi- Existem vacinas disponíveis no mercado para preve-
cados, muitos animais morrem. nir a ceratoconjuntivite, as quais devem ser aplica-
das antes do estabelecimento dos sinais clínicos, a
Clostridium chauvoei também é anaeróbico e espo- partir dos três meses de idade, com reforço 30 dias
rula em presença do ar, contaminando o solo. Os após.
bovinos se infectam por ingestão de alimentos con-
taminados ou por contaminação de cortes na pele.
Vacinação, a importância das boas práticas e a prevenção de doenças de interesse em bovinocultura 7

Colibacilose o quadro já foi descrito em gado de corte criado em


sistema a pasto ou confinado.
A doença é causada pela bactéria Escherichia coli
que afeta, principalmente, os bezerros com me- Em bezerros, a doença é observada mais frequente-
nos de três semanas de idade, e se caracteriza por mente em animais em torno de 1 semana de idade,
diarréia profusa amarelo esverdeada. Costuma se e a diarréia aquosa e amarelada persiste por cerca
ocorrer em ambientes em condições inadequadas de de 4 ou 5 dias. Embora a expoliação causada pelo
higiene, em instalações de confinamento ou pique- coronavírus seja menor do que aquela causada por
tes contaminados. rotavírus, as perdas podem ser significativas, prin-
cipalmente quando ambos os patógenos co-existem
A falha no consumo do colostro nas primeiras horas no animal.
de vida contribui significativamente para o apareci-
mento do problema, além disso é comum a associa- A morbidade costuma ser alta, principalmente em
ção com rotavírus, coronavírus ou Cryptosporidium animais em confinamento, mas a mortalidade é
spp. baixa quando não existe outra infecção subjacente.
Além disso, deve ser realizado diagnóstico diferen-
Dependendo das condições ambientais e de mane- cial de outras doenças como rotavírus, diarréia viral
jo, a morbidade e a mortalidade podem chegar a bovina, coccidiose, salmonelose e paratifo.
100%.
O diagnóstico laboratorial da infecção tanto para
A prevenção é feita com adoção de medidas de corona quanto para rotavírus requer ação imediata
higiene, isto é, manter os bezerros em ambiente lim- e as amostras de fezes precisam ser colhidas em
po, evitar superlotação e estresse. Os casos clínicos cerca de até 12 horas após o início da diarréia, pois
devem ser acompanhados por exames laboratoriais a partir daí o isolamento viral é mais dificultado.
para determinar o agente e a sensibilidade aos anti-
bióticos para tratamento. A estratégia de prevenção mais adotada é a vaci-
nação das vacas, antes da parição, para que estas
As vacinas disponíveis costumam ser polivalentes, secretem anticorpos contra o vírus no colostro.
em geral associando agentes como Salmonella spp.,
Pasteurella sp., Pseudomonas sp., rotavírus bovino, Diarréia viral bovina (BVD)
coronavírus bovino e Clostridium perfringens, ou
combinações destes, responsáveis pelo complexo A diarréia viral bovina pode ocorrer na forma de
vulgarmente denominado “curso”. Em locais que o infecção benigna, sem sinais clínicos evidentes;
problema de diarréia de bezerros é endêmico deve- doença das mucosas (MD), que é altamente fatal e
-se vacinar vacas e novilhas, podendo ser em duas caracterizada por diarréia superaguda; doença he-
doses, sendo uma em 60 dias e outra em 30 dias morrágica; falha reprodutiva; alterações congênitas
antes do parto. A revacinação deve ser anual e dos bezerros ou ainda combinações destas.
seguir o esquema de dose única aproximadamente
A transmissão pode ocorrer por contato direto entre
30 dias antes do parto.
animais e transplacentária, durante a gestação. A
Coronavirose principal fonte de infecção é o animal virêmico, per-
sistentemente infectado. Estes sofreram infecção
A doença é causada pelo coronavírus bovino e cos- intrauterinamente e, posteriormente disseminam
tuma se causar a chamada “desinteria de inverno”, vírus pela saliva, corrimento nasal, lágrima, sêmen,
quando ocorre em bovinos adultos. O quadro clínico fezes, urina e leite.
é caracterizado por diarréia sanguinolenta e/ou es-
verdeada acompanhada de queda acentuada da pro- Como medida preventiva, é recomendável evitar a
dução de leite, alterações respiratórias, depressão e entrada de bovinos infectados e eliminar os bovinos
falta de apetite. As fêmeas jovens prenhes, recém permanentemente infectados. Também é indicado
paridas ou em lactação, pertencentes a rebanhos não utilizar a mesma agulha para todos os animais
leiteiros, geralmente são mais atingidas, entretanto durante as vacinações coletivas, pois neste procedi-
mento há risco de veicular o agente desta e outras
8 Vacinação, a importância das boas práticas e a prevenção de doenças de interesse em bovinocultura

doenças. O mesmo deve ser observado durante O diagnóstico diferencial deve ser realizado entre
o diagnóstico de gestação, com uso de uma luva doenças associadas com morte súbita ou ainda ma-
descartável para cada animal. Em caso de uso de nifestação nervosa, como intoxicação, encefalites,
inseminação artificial, o sêmen aplicado deve ser de babesiose cerebral, raiva e botulismo, entre outras.
touros livres da infecção.
A mortalidade em geral é alta e o tratamento cos-
Existem no mercado, vacinas polivalentes que re- tuma não ser eficaz em função do rápido curso da
únem diferentes combinações de antígenos contra doença. O uso da antitoxina pode surtir efeito quan-
BVD, rinotraqueite infecciosa bovina (IBR), parain- do administrada nos períodos iniciais ou nos casos
fluenza tipo 3 (PI3), doença respiratória sincicial crônicos da enfermidade, associado com antibioti-
bovina (BRSV), leptospirose, pasteurelose e rota- coterapia.
virose, que são doenças causadoras de problemas
respiratórios e/ou reprodutivos e que, muitas vezes, A prevenção por meio da vacinação de todos os
estão associadas. A recomendação é de vacinar animais costuma ser eficaz. Os produtos comerciais
todos os animais suscetíveis antes do período de oferecem proteção contra enterotoxemia geralmente
cobertura. associada a outros clostrídeos, sendo recomendado
um reforço passado 1 mês após a primeira dose.
Enterotoxemia Outra medida importante é respeitar um período de
adaptação ao consumo do concentrado, aumen-
A doença é causada em bovinos por Clostridium tando aos poucos, além de manter uma proporção
perfringens tipo D e acomete principalmente ani- adequada entre volumoso e concentrado.
mais entre três dias e seis meses de idade, embora
existam relatos de ocorrência em animais adultos. O Febre aftosa
quadro está associado com alteração do ambiente
intestinal provocado pela ingestão de níveis ele- A febre aftosa é uma doença causada por vírus,
vados de carboidratos, dietas ricas em proteína e altamente contagiosa e se caracteriza por febre,
pastagens luxuriantes. aftas na mucosa bucal (gengiva e língua) e nasal,
além de vesículas ulcerativas nos cascos e úbere.
Os sinais clínicos geralmente são manifestados por Em bovinos podem ocorrer erosões na língua, infec-
alterações nervosas e podem variar entre os indiví- ção bacteriana secundária nas lesões da boca e dos
duos doentes. Em casos superagudos, os animais cascos, além de mastite. Embora a mortalidade não
costumam ser encontrados já mortos. Os casos seja alta, quando da introdução do vírus, a morbi-
mais comuns são de natureza aguda, e os animais dade é, atingindo praticamente todo o rebanho com
manifestam incoordenação e prostração, além de conseqüente emagrecimento dos animais e redução
emissão de mugidos sem motivo aparente, manias acentuada da produção de leite.
e convulsões generalizadas, as quais persistem até
que a morte, que geralmente acontece horas mais A transmissão pode ocorrer por contato direto ou
tarde. indireto entre animais (aerossóis); vetores animados
(humanos e outros animais); e vetores inanimados
Em casos subagudos, os animais ficam apáticos e (instrumentos, ferramentas, veículos etc.). São
não buscam alimento nem água. Além disso, alguns consideradas fontes de vírus os animais em período
bovinos manifestam cegueira aparente, apesar de de incubação ou clinicamente doentes; ar expirado,
terem reflexos oculares. Nesses casos é comum a saliva, fezes, urina, leite e sêmen a partir de quatro
coexistência de cólicas e diarréias. dias antes dos sintomas clínicos e até 30 dias de-
pois da cura das lesões; carne e produtos cárnicos
O diagnóstico clínico se baseia no histórico, princi- não tratados pelo calor (56ºC, durante 30 minutos)
palmente em casos de morte súbita de animais sub- ou cujo pH seja superior a seis. O estado de porta-
metidos a regime alimentar com altas quantidades dor pode ser mantido em bovinos, até 30 meses,
de concentrados e em curto espaço de tempo. O ovinos até nove meses, e caprinos e suínos, em
diagnóstico laboratorial pode ser obtido pela confir- curta duração (dias). Os animais selvagens biungu-
mação da presença da toxina em amostras frescas lados podem servir de reservatório do vírus.
de conteúdo intestinal, entre outros.
Vacinação, a importância das boas práticas e a prevenção de doenças de interesse em bovinocultura 9

A prevenção é feita, entre outras, por medidas de internas generalizadas e pode-se observar urina cor
controle de trânsito e vacinação, de acordo com o de sangue ou escura. A doença ocorre em bovinos
calendário determinado pelo Mapa e controlado pe- de todas as idades. No Rio Grande do Sul, está
los órgãos de Defesa Sanitária Animal dos Estados. relacionada com a ocorrência de Fasciola hepática
No caso de suspeita, animais com febre, salivando (conhecida como baratinha do fígado), um parasito
ou com lesões vesiculares na boca, é preciso con- que causa lesões no fígado, abrindo entrada para o
tatar imediatamente o médico-veterinário ou co- clostrídio.
municar ao órgão de Defesa Sanitária Animal mais
próximo. As vacinas disponíveis hoje no mercado A enfermidade pode ser confundida com outras
são de boa qualidade e altamente eficientes, desde clostridioses ou com babesiose, porém o diagnósti-
que sempre conservadas conforme instrução do co específico pode ser feito por achados de ne-
fabricante. crópsia e exames laboratoriais. Entretanto, pode se
diferenciar do carbúnculo hemático porque a rigidez
Gangrena gasosa ou edema maligno do cadáver ocorre rapidamente, e no caso da tris-
teza parasitária dos bovinos, porque no exame de
É uma doença febril aguda, se desenvolve em 24 sangue não se encontram células vermelhas (hemá-
a 48 horas, é causada por Clostridium septicum, cias) contendo parasitos.
Clostridium perfringens, Clostridium novyi, Clostri-
dium chauvoei e Clostridium sordelli e se carateri- O controle é feito por vacinação anual estratégica
za por inchaços debaixo da pele (subcutâneo). O em todos os bovinos, isto é, um ou dois meses
animal pára de se alimentar e apresenta manqueira. antes do verão quando a doença geralmente se
É semelhante ao carbúnculo sintomático, porém manifesta. Os animais vacinados pela primeira vez
ocorre em animais de qualquer idade. Além dos bo- devem receber duas doses, com intervalo 30 dias.
vinos, cavalos, mulas, ovelhas, suínos, cães e gatos
são também suscetíveis. Leptospirose

A bactéria se instala no animal através de cortes, A leptospirose é uma zoonose e pode ser causada
feridas de castração, vacinação com agulhas sujas, por diferentes sorovares de Leptospira interrogans,
ruptura de vagina no parto, uso de aguilhão, feri- como por exemplo, L. wolffi, L. pomona, L. grip-
mentos por cercas de arame farpado, entre outras. potyphosa, L. hardjo, L. icterohaemorrhagiae, L.
tarassovi, L. bratislava e L. canicola.
Em regiões onde ocorre o problema, todos bovinos
devem ser vacinados, anualmente, com vacinas po- Em bovinos a doença se caracteriza por eliminação
livalentes que contenham os clostrídeos menciona- de urina com sangue, o que pode ser confundido
dos. Em caso de surto, os animais doentes podem com hemoglobinúria bacilar, queda importante na
ser medicados com antibióticos conforme recomen- produção de leite, falta de apetite e conseqüen-
dação do médico-veterinário. te perda de peso, anemia e icterícia. É comum o
aborto, o que pode causar confusão com outras
Hemoglobinúria bacilar doenças.

É uma doença aguda, causada por Clostridium ha- A transmissão ocorre pelo contato de bovinos
emolyticum que ocorre, geralmente,principalmente suscetíveis com as bactérias eliminadas pela urina
no verão, em áreas úmidas ou alagadiças e se ca- dos hospedeiros naturais em ambientes favoráveis.
racteriza por depressão, dificuldade de locomoção, Isso se dá pela introdução de bactérias pela pele
tremores musculares, urina de cor escura e fezes e mucosas (oral, vaginal, prepucial), por ingestão
com sangue. A morte tende a ocorrer em 12 a 24 de água ou alimentos contaminados ou durante a
horas. Em geral os bovinos são encontrados mortos cópula. Em solos úmidos, banhados ou pântanos
sem possibilitar a observação dos sinais clínicos. com pH neutro, as leptospiras podem permanecer
infectivas por até 6 meses. Entretanto, as leptos-
A transmissão se dá por via oral, ao ingerirem piras não resistem à seca, pH ácido, radiação solar
esporos do C. haemolyticum que se encontram no e temperaturas inferiores a 7ºC e superiores a 37ºC.
solo. O animal infectado apresenta hemorragias
10 Vacinação, a importância das boas práticas e a prevenção de doenças de interesse em bovinocultura

O tratamento pode ser realizado com uso de antibi- lizada nas vacas no pré-parto e nos bezerros a partir
óticos específicos, entretanto, o alto custo do trata- dos 15 dias de vida, com reforço 30 dias após.
mento, assim como o risco de o animal permanecer
portador desencoraja o procedimento em animais de Parainfluenza tipo 3
produção.
A parainfluenza tipo 3 tem um papel fundamental
O controle, em regiões endêmicas é feito por vaci- no complexo respiratório bovino por aumentar a
nação anual de todos os animais (bezerros e adul- predisposição a infecções bacterianas secundárias,
tos). Os animais que serão vacinados pela primeira como pasteurelose, com a qual está intimamente
vez devem receber duas doses da vacina com relacionado; além de estar comumente associado à
intervalo de um mês. infecção por outros vírus, como IBR e BVDV.

Pasteurelose A doença é de fácil propagação, principalmente


em condições que provocam estresse (transporte,
É uma enfermidade respiratória causada por Pasteu- desmama, castração etc) e contato estreito, como
rella haemolytica e também conhecida como “febre confinamentos. O vírus é eliminado nas secreções
do transporte”. Apesar de estar presente na micro- nasais e oculares dos animais infectados, nos quais
flora da cavidade oronasal dos bovinos, a doença são observados sinais de febre, lacrimejamento,
costuma ocorrer em situações de baixa de imunida- descarga nasal serosa (que tende à mucopurulenta
de, principalmente aquelas causadas por estresse e quando associado à infecção bacteriana), depres-
que permitem a entrada de outros patógenos como são, dificuldade respiratória e tosse. Nos casos mais
vírus e outras bactérias, formando um complexo graves a doença se manifesta como pneumonia
respiratório caracterizado por um quadro importante severa, e em infecções não complicadas, o curso da
de pneumonia. A doença é transmitida por contato doença é de três a quatro dias.
direto, inalação ou ingestão de secreções contami-
nadas. Pela grande variedade de agentes capazes de
causar sinais clínicos semelhantes, a diferenciação
Os sinais mais frequentes são febre, depressão, se- clínica da doença é dificultada. Por outro lado, o
creção nasal e/ou ocular mucopurulenta, dificuldade diagnóstico laboratorial pode ser realizado por meio
respiratória, perda de apetite, redução na conversão de isolamento viral, em casos recentes (após a re-
alimentar, perda de peso e isolamento dos demais. cuperação do animal o vírus raramente é isolado) ou
Os bovinos jovens tendem a ser mais suscetíveis. de técnicas sorológicas ou moleculares.
Além disso, situações que permitem contato próxi-
mo, como confinamento, favorecem o estabeleci- A antibioticoterapia pode ser uma opção no tra-
mento do problema no rebanho. tamento de infecção bacteriana secundária. Em
relação ao controle da doença, as vacinas desenvol-
O diagnóstico laboratorial é importante principal- vidas para prevenir a PI3 costumam estar associa-
mente para avaliar a resistência da amostra encon- das a outros agentes, bacterianos e virais, aos quais
trada aos antibióticos, pois o tratamento pode ser o quadro clínico é semelhante, como IBR, BVD,
realizado por meio de uso de antibióticos específi- BRSV, pasteurelose ou combinações destas.
cos. Na rotina das propriedades rurais geralmente
são utilizados antibióticos de amplo espectro, que Rinotraqueite infecciosa bovina (IBR)
se usados de forma indevida (por menos tempo
que o recomendado, por exemplo) podem favore- É uma doença causada pelo herpesvírus bovino-1,
cer o estabelecimento de resistência do patógeno à que acomete bovinos, e pode se manifestar por
droga. diferentes sinais clínicos, dependendo do subtipo
viral envolvido. O quadro da doença respiratória se
A pasteurelose pode ser evitada por meio de vaci- caracteriza por dificuldade de respirar (dispnéia),
nação, e os produtos comerciais apresentam dife- tosse, corrimento nasal seroso, que pode passar
rentes combinações de formulações para proteger a sanguinolento ou purulento, inapetência e febre.
contra agentes causadores de doenças respiratórias Além disso, a conjuntivite pode estar presente e
e/ou diarréia dos bovinos. A aplicação deve ser rea- agravar quadros de ceratoconjuntivite por Moraxella
Vacinação, a importância das boas práticas e a prevenção de doenças de interesse em bovinocultura 11

bovis em infecções mistas. O quadro da doença Existem dois tipos de raiva: a raiva paralítica na
reprodutiva está associado à vulvovaginite pustular qual o animal fica abatido, não se alimenta entra em
infecciosa (IPV), que pode causar lesões vesiculares paralisia parcial (paraplegia), progredindo para para-
e necróticas dolorosas; bem como balanopostite, lisia geral, inclusive do músculo diafragma, colapso
lesão inflamatória da extremidade do prepúcio cau- respiratório e morte; e a raiva furiosa em que o ani-
sada pela infecção viral, popularmente conhecida mal fica agressivo, atacando os outros, terminando
como umbigueira. As perdas reprodutivas podem também por paralisia geral e morte.
ser bastante significativas, seja por problemas na
concepção ou abortos propriamente ditos, geral- A transmissão a bovinos se dá principalmente pela
mente no terço final da gestação. mordida do morcego hematófago Desmodus rotun-
dus enquanto este se alimenta. Há relatos de casos
Frequentemente outros agentes infecciosos estão de contaminação do homem por aspiração de ae-
associados, e o diagnóstico diferencial deve ser rossóis em cavernas onde os morcegos costumam
realizado para pasteurelose, infecção por outros ficar abrigados durante o dia, e por contaminação
vírus (BVDV, BSRV, PI3), pneumonias causadas por de lesões da pele durante a manipulação de animais
micoplasmas ou fungos e tuberculose pulmonar, com raiva ou que morreram da doença.
entre outros.
A prevenção tem sido feita pelo combate aos
Geralmente os animais afetados são bezerros após morcegos hematófagos e a vacinação anual dos
a desmama, novilhos para a engorda introduzidos bovinos, dos cães e dos gatos em regiões de maior
em outro rebanho ou confinamento, e bovinos que risco. Os surtos ou casos isolados de raiva ocorrem,
sofreram o estresse de transporte. em sua maioria, no outono, portanto, a vacinação
deve ser aplicada antes deste período, em todos os
O controle é feito por meio de manejo adequado, bovinos a partir de dois meses de idade, em áreas
evitando superlotação e ambientes mal ventilados endêmicas, com reforço em 30 dias e revacinação
e sujos (principalmente em confinamentos e insta- anual.
lações para bezerros em leiterias), assegurando a
ingestão do colostro pelos bezerros nas primeiras A ocorrência ou suspeita de casos de raiva em
horas de vida. Apesar do vírus não ser sensível aos rebanhos deverá ser comunicada imediatamente ao
antibióticos, devido à associação com bactérias, a Serviço Veterinário Oficial.
antibioticoterapia é recomendável no início do surto.
Deve-se fazer o diagnóstico definitivo dos casos, Quando o homem é exposto, isto é, manipula ani-
remetendo material para laboratórios de patologia e mais com raiva ou é mordido por cão suspeito, deve
virologia animal. procurar auxílio médico imediato, pois a doença
normalmente é fatal.
A prevenção é feita por vacinação anual de todos
os bovinos, com mais de três meses, usando-se, Rotavirose
inicialmente duas vacinações com intervalo de 20 a
30 dias. Existem no mercado, vacinas polivalentes A doença é causada pelo rotavírus bovino e é
contra IBR, BVD, parainfluenza, vírus sincicial bovi- considerada uma das principais causas de gastroen-
no e leptospirose, ou combinações destas. Deve-se trite em bezerros, também conhecida como “curso
evitar o uso de vacinas vivas em propriedades onde branco”, assim como o paratifo.
não houve o diagnóstico definitivo, pois dificulta o
isolamento do agente. A doença é observada geralmente em animais
jovens, de uma a oito semanas, raramente durante
Raiva a primeira semana de vida, e apresenta transmissão
fecal-oral. O vírus eliminado nas fezes de animais
A raiva é uma zoonose causada por um vírus que doentes pode sobreviver, nessas condições, por
tem tropismo por tecidos do sistema nervoso (neu- vários meses.
rotrópico) de mamíferos, e se caracteriza por excita-
ção, paralisia progressiva, coma e morte. Fatores como ingestão reduzida ou ausente de co-
lostro, más condições de higiene e superpopulação
12 Vacinação, a importância das boas práticas e a prevenção de doenças de interesse em bovinocultura

de animais podem contribuir para a severidade da estressantes como cirurgias, parto, parasitismo,
doença. transporte, bem como outras doenças infecciosas.
Outras fontes de infecção capazes de propagar a
Os sinais clínicos observados são desidratação, infecção entre bovinos incluem alimento e água
anorexia, prostração e diarréia líquida e profusa. Os contaminados, lixo, roedores e aves.
animais podem se recuperar dentro de três a quatro
dias ou morrerem em decorrência de desidratação A prevenção é feita pela correção dos problemas de
ou complicação por infecção bacteriana secundária higiene. Em locais endêmicos as vacas podem ser
(colibacilose, por exemplo). vacinadas 30 dias antes do parto e os bezerros, aos
15 dias de idade, com as vacinas contra o paratifo.
Como os sinais clínicos não são específicos da
doença, é necessário proceder ao diagnóstico di- Por tratar-se de uma zoonose, o tratamento com
ferencial de outras causas de diarréias, sendo que antibióticos deve ser criteriosamente avaliado, pelo
exames laboratoriais podem contribuir para elucidar risco de contribuir para o desenvolvimento de resis-
a identidade do agente envolvido. tência.

O controle da doença consiste em isolar e tratar os Tétano


animais doentes e adotar medidas de higiene ade-
quadas tanto para o local quanto para o destino das O tétano é uma doença causada pela toxina que se
fezes. A prevenção pode ser realizada por meio de fixa nas células nervosas (toxina neurotrópica) pro-
vacinação das vacas e novilhas, preferencialmente duzida por Clostridium tetani. Assim como outros
60 dias e 30 dias antes do parto, com revacinação clostrídeos, C. tetani só se multiplica na ausência
anual cerca de 30 dias antes do próximo parto. do ar, em ferimentos profundos. Este bacilo é en-
Além disso é fundamental que os bezerros tenham contrado, normalmente, no conteúdo intestinal de
acesso ao colostro nas primeiras horas de vida. diversos animais (principalmente dos equinos) e do
homem. É eliminado pelas fezes e permanece conta-
Salmonelose ou paratifo minando o ambiente em forma de esporos.

Conhecida vulgarmente como paratifo ou “curso Surtos de tétano são ocasionais em bovinos, poden-
branco”, a salmonelose é causada por bactérias do do ocorrer após a castração, falta de cuidados com
gênero Salmonella, principalmente S. dublin e S. o umbigo dos recém nascidos, ou após a aplicação
typhimurium, e se caracteriza por diarréia profusa, de vacinas ou vermífugos quando não são tomadas
desidratação, febre e depressão. as medidas de higiene adequadas.

Na forma entérica, que atinge todo o trato gastrin- Os sinais clínicos geralmente iniciam uma a duas
testinal, os bezerros entre três e seis meses desi- semanas após a infecção do bovino e são caracte-
dratam e podem morrer dentro de três dias após o rizados por espasmos da musculatura, andar rígido,
início dos sinais. Na forma septicêmica a bactéria se pescoço estendido, cauda erguida (em bandeira),
difunde pela circulação atingindo vários órgãos. Nos orelhas eretas, rigidez da mandíbula, prolapso da
bezerros é possível observar febre, dificuldade respi- terceira pálpebra e hiperexcitabilidade. Com a evolu-
ratória, meningite, artrite, pneumonia, seguidas ou ção, os animais deitam de lado (ficam em decúbito
não de morte. A doença também acomete animais lateral) e apresentam a cabeça forçando para traz
adultos, os quais podem manifestar um quadro gra- (opistótono). Após a manifestação dos sintomas a
ve de febre, depressão, queda acentuada na produ- maioria dos casos evolui para a morte.
ção de leite e aborto. As vacas adultas recuperadas
e clinicamente sadias podem servir como fonte de Os currais dos bovinos são utilizados, geralmente,
infecção para a prole e reservatório do agente den- com a tropa. Eqüinos e asininos eliminam grande
tro do rebanho. quantidade de esporos nos currais. A contaminação
vai se intensificando com o decorrer do tempo. Por
Como fatores predisponentes para a salmonelose isto, no caso de eqüídeos, deve-se evitar fazer a
destacam-se ambientes contaminados, com falta castração nos currais, procurando, sempre locais
de higiene e superlotação, associado a condições mais limpos e gramados. Bovinos, geralmente são
Vacinação, a importância das boas práticas e a prevenção de doenças de interesse em bovinocultura 13

castrados nos currais, neste caso deve-se soltar o Elaboração do calendário de


animal logo para o pasto, evitando sua permanên- vacinação
cia no local contaminado. Além disto, aadoção de
medidas de higiene adequadas evitam a infecção do Vale ressaltar que a decisão sobre a utilização de
ferimento. vacinas, o período mais favorável para aplicação,
assim como a escolha do produto mais indicado,
O tratamento pode ser feito no início das manifesta- deve estar embasado na ocorrência das doenças na
ções aplicando-se soro específico, que atua neutra- região, bem como a relação custo-benefício na pro-
lizando as toxinas que ainda não foram fixadas nas dução, levando em consideração a responsabilidade
células nervosas. É recomendado oxigenar a ferida do médico-veterinário e do produtor rural em ofere-
(por abertura e limpeza com água oxigenada) e apli- cer condições sanitárias adequadas aos animais sob
car antibiótico sistêmico. sua tutela.

Para equídeos é recomendado aplicar duas doses De acordo com médico-veterinário cada pecuarista
de vacina antitetânica antes de realizar a castração. deve estabelecer um calendário particular de contro-
Esta vacina contendo o toxóide, isto é, a toxina le sanitário do rebanho. Além disso, para as medi-
modificada (inativada), pode também ser utilizada das de ação compulsória com sanções previstas em
preventivamente em bovinos, quando o problema lei, como aplicação de vacina contra brucelose nas
costuma ocorrer com freqüência na fazenda. fêmeas jovens e febre aftosa em regiões determi-
nadas pelo Mapa, todos os criadores devem estar
Vírus respiratório sincicial bovino atentos para estas datas, procurando, o agente de
(BRSV) Defesa Sanitária Animal de sua região para dirimir
dúvidas.
O BRSV é um dos agentes envolvidos no complexo
respiratório bovino, principalmente entre os animais A apresentação do calendário de vacinação a seguir
mais jovens e em produção de leite. Entretanto, são não tem como objetivo ser uma ferramenta aplicá-
poucos os dados sobre a situação da doença em vel a todas as situações, pois os sistemas de produ-
bovinos no Brasil. ção são dinâmicos e têm características peculiares.
Assim, serve apenas como uma proposta norteado-
A transmissão ocorre provavelmente pelo contato
ra para os ajustes necessários às condições encon-
estreito entre os animais suscetíveis com secre-
tradas em propriedades rurais de criação de gado de
ções do trato respiratório de outros contaminados.
corte no Estado de Mato Grosso do Sul (Tabela 2).
Situações de alta densidade, como confinamento e
agrupamento de bovinos favorecem a disseminação
da doença. Embora muitos casos não sejam detec-
tados por serem assintomáticos, quadros de infec-
ção, principalmente em animais jovens podem ser
observados por apatia, anorexia, febre leve, secre-
ção nasal, tosse, dificuldade respiratória (respiração
bucal), ganho de peso inferior a média do rebanho e
pelagem sem brilho.

O diagnóstico diferencial deve ser feito para presen-


ça de outras doenças causadas por vírus (BVD, PI-
3, IBR) e bactérias envolvidas em quadros respira-
tórios. Embora os resultados obtidos pela vacinação
sejam conflitantes, a utilização de vacina é possível,
e esta pode ser encontrada em combinação com ou-
tros agentes em preparações comerciais.
14
Tabela 2. Exemplo de calendário de vacinação para o Estado de Mato Grosso do Sul.

(1)
Vacina contra febre aftosa na região do Planalto. Abril animais até dois anos. Novembro animais de mamando a caducando. As propriedades localizadas na região do Pantanal têm a opção de vacinar todo o rebanho
ou em maio/junho (1o/5 a 15/6) ou em novembro/dezembro (1o /11 a 15/12). Na Zona de Alta Vigilância (ZAV) vacina-se todo o rebanho bovino e bubalino no período de 1o /4 a 15/5 e de 1o /10 a 15/11. Fonte:
Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).
(2)
A vacinação contra brucelose deve ser realizada em fêmeas bovinas e bubalinas entre 3 e 8 meses de idade, sendo que o período de vacinação poderá ser condensado para facilitar o manejo.
(3)
Vacinas contra clostridioses (botulismo, carbúnculo sintomático, enterotoxemia, gangrena gasosa, hemoglobinúria bacilar e tétano) costumam apresentar recomendações para casos gerais. Entretanto, fica a critério
do médico-veterinário alterá-las conforme a necessidade específica. O reforço após a primeira dose deve ser em torno de 30 dias após (o exemplo do quadro considera a primeira vacinação aos 4 meses de idade). A
revacinação deve ser anual.
(4)
A vacina contra o carbúnculo hemático não deve ser aplicada antes dos 4 meses de idade. Vacinar a fêmea antes da cobertura e o reforço em torno de 30 dias após. A revacinação deve ser anual.
(5)
As vacinas contra essas doenças costumam ser polivalentes e aplicadas 60 dias e 30 dias antes da cobertura (em caso de primeira vacinação) e nos bezerros a partir dos 6 meses de idade, com reforço em 30 dias. A
revacinação deve ser anual.
Vacinação, a importância das boas práticas e a prevenção de doenças de interesse em bovinocultura

(6)
Estas vacinas devem ser aplicadas antes do parto para que a fêmea secrete anticorpos no colostro para proteger o bezerro.
(7)
A vacina antirrábica deverá ser realizada em bezerros a partir dos 4 meses de idade, com reforço 30 dias após, em regiões onde a doença é endêmica e com notificação ao Serviço de Defesa Oficial local. A revacina-
ção deve ser anual.
Vacinação, a importância das boas práticas e a prevenção de doenças de interesse em bovinocultura 15

CGPE 8537

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1a edição Expediente Supervisão editorial: Ecila Carolina N. Zampieri


Versão online (2009) Lima
Revisão de texto: Lúcia Helena Paula do Canto
Editoração eletrônica: Ecila Carolina N. Zampieri
Lima

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