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As sociedades contemporâneas pós-guerra fria, têm sido cada vez mais impactadas pelo
binômio capitalismo/democracia. Segundo Wallerstein (2005), o próprio fenômeno da
democratização tem aparecido como aliado a uma estratégia para a contenção do declínio do poder
dos Estados Unidos como superpotência global. Em face disso, vivencia-se um ambiente de
incerteza, predominantemente, marcada por disputas territoriais entre nações opressoras e oprimidas.
Trata-se de um contexto carregado de simbolismo ideológico e do inconteste sentido do progresso
científico em que a hegemonia do capitalismo incorpora em seu discurso. No dizer de David Harvey
(2005) de um “novo imperialismo” que se estrutura no sentido de consolidar uma nova ordem mundial
para reestruturação produtiva do capital.
Para aqueles que apostavam no “fim das ideologias” (lutas de classes), novas categorias
se apresentam, a maioria delas, anunciam, (desde a desagregação da URSS e queda do muro de
Berlim) a hegemonia do capitalismo no sistema econômico e social. O desafio do presente trabalho
acompanha o desenvolvimento do atual debate entre diversas vertentes acadêmicas, particularmente
a nova abordagem historiográfica intitulada de História do Tempo Presente.
A abordagem frente aos estudos sobre o tema se justifica diante da análise histórica vivida
pelas comunidades tradicionais quilombolas que têm uma estrutura étnico social própria que ao longo
de sua formação foi negligenciada pelo Estado Brasileiro e que por sua vez intensifica um impacto
negativo das suas relações de equilíbrio com o meio ambiente e coletivo de usufruto comum de suas
terras seculares. Há neste sentido um diálogo com os vários campos de estudo científico (geopolítica,
antropologia, sociologia, história) para assim desenvolver estratégias no âmbito de constituir uma
reflexão e compreensão para tais conflitos nas relações de poder muitas das vezes apresentando um
poder simbólico no campo da ideologia como instrumentos de dominação como “sistemas
simbólicos” (BOURDIEU: 1989, p. 12) que exerce no território de Alcântara-MA.
Desde a implantação do CLA até os dias atuais são marcados por profunda ausência do
Estado, particularmente, das autoridades locais em face dos problemas decorrentes da desagregação
das comunidades tradicionais. Todo o processo de reivindicação tendo à frente inicialmente com o
STR (Sindicato dos Trabalhadores Rurais), tomando ações jurídicas e principalmente manifestações
públicas no intuito de garantir direitos constituídos com a ausência de titulação das terras através da
transferência das famílias destituídas de suas ocupações tradicionais - áreas desapropriadas para o
CLA.
Ao longo do processo de lutas sociais nas zonas de conflitos pelo território de Alcântara
entre as comunidades tradicionais e o CLA, uma nova configuração se constituiu para definir os atores
sociais. Com a formação do Movimento dos Atingidos da Base (MABE) pelo Seminário realizado
em 1999, os remanescentes quilombolas ganharam uma representação mais expressiva, dando um
caráter étnico às reivindicações de seu reconhecimento recente na nova Constituição de 1988, com
base no dispositivo do artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.
Apesar da existência das oscilações vividas pelos movimentos sociais entre as propostas
de lutas institucionais e as ações de manifestação direta, percebe-se recuos e avanços prestigiados nos
últimos tempos trazendo novos significados de como as ideologias, principalmente as ideologias
nacionalistas ganham matizes novas à medida que vão necessitando superar suas fronteiras
geográficas nacionais para incorporarem ações de luta e solidariedade internacional dentro de suas
especificidades como ocorreu com o Plebiscito contra a ALCA em 2002 no combate ao novo
imperialismo estadunidense com o arquivamento da primeira tentativa do acordo de salvaguardas
tecnológica entre o Brasil e EUA, denominando assim um “novo internacionalismo”. (ALMEIDA:
2007) Atualmente, o governo brasileiro apresenta uma nova proposta de acordo de salvaguardas
tecnológicas com os EUA que não muda essencialmente ao modelo apresentado em 2000. A minha
proposta de pesquisa de campo se orientará na região preterida pelo governo federal brasileiro na
expansão do território de Alcântara para o CLA que compreende toda a faixa litorânea do município
tendo já estudos desenvolvidos nas comunidades quilombolas de Baracatatiua e Mamuna.
As medidas adotadas pelo Estado brasileiro (seja nos regimes políticos ditatoriais ou
civis) sempre tiveram um caráter bastante similar, mesmo em conjunturas distintas. O Estado
brasileiro sempre assumiu investimentos altíssimos para promoverem a construção das infraestruturas
necessárias para que o Brasil assumisse um patamar de modernidade e que se aproximasse dos países
desenvolvidos. Assim que se alcançava a definição em grandes projetos, um processo ou especulação
de privatização rondava em seu entorno. Se institucionalmente não ocorresse, o retorno certo dos
lucros estaria prioritariamente definido ao setor privilegiado da sociedade, a classe detentora do
capital, tanto nacional como a estrangeira.
Segundo o historiador Pieter Lagrou, a história do tempo presente assim como os demais
tempos históricos, surge a partir de uma catástrofe ou de uma grande ruptura, trazendo pistas para sua
formação. Evidentemente que o tempo cronológico são em suma arbitrários dos próprios
historiadores, no entanto, o fim da Guerra Fria, a dissolução da URSS e a queda do muro de Berlim
com a reunificação da Alemanha demonstram o desenrolar de uma Nova Ordem Mundial.
Esse tipo de pressão diplomática configura de modo ainda mais explícito como os EUA
tentam constituir uma política de expansão cada vez mais agressiva para garantir sua hegemonia,
como potência econômica, política e militar, dificilmente contestado após sua consolidação com o
fim da Guerra Fria. Mas contraditoriamente, o mundo mergulhado em instabilidades e incertezas,
questionam sua onipotência tão proferida.
O presente estudo busca trazer uma reflexão, não no sentido de rejeitar em minhas
observações os trabalhos já realizados, quando em sua maioria trazem uma abordagem da micro-
história, dando prioridade a um estudo minucioso das comunidades remanescentes de quilombos, das
agrovilas e daqueles propensos a serem possivelmente remanejados, ricos em detalhes de cunho
antropológico e culturalista. No entanto, em outro prisma, aplicando a economia política, a sociologia,
a geopolítica como referencial teórico-metodológico na perspectiva do materialismo histórico e
dialético, identifiquei uma série de questionamentos de ordem das estruturas políticas
organizacionais, a retórica do direito à Soberania moldada pela esquerda e os movimentos sociais,
em detrimento das políticas de desestruturação socioeconômicas do Estado brasileiro contra as
comunidades tradicionais de Alcântara reféns das políticas de expansão do programa espacial
brasileiro através da expropriação de território para o CLA. Pretende-se assim, podermos ter uma
noção clara de como se fundamenta as contradições impostas na questão da territorialidade em
Alcântara no que tange a expansão do CLA, visto que ao não se abordar os interesses antagônicos
dentro de um discurso conciliador e de neutralidade de tal empreendimento não se pode aferir o que
se tem de concreto e real das relações sociais múltiplos que concerne à sociedade brasileira em seus
antagonismos. Colocar a população brasileira em um patamar de igualdade em direitos é no mínimo
irresponsável não se ter diagnosticado necessidades históricas que as comunidades remanescentes de
quilombos sofrem. A partir de então, quando partimos dos estudos da economia política, por exemplo
apontada por Karl Marx, deve-se ser mais correto “(...) começar pelo que há de concreto e real nos
dados: assim, pois a economia, pela população, que é a base e sujeito de todo o ato social da
produção.” (MARX: 2008, p. 258), contudo, a população torna-se uma mera abstração ao se deixar
de lado as classes que a compõe.
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