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MÁSCARAS
ARGUMENTO
Num bairro de periferia vivem algumas famílias. Cabral, depois de muito sacrifício,
consegue terminar as obras de um pequeno bar, que está para ser inaugurado
brevemente. Sua filha Celeste é apaixonada por Datinta, grafiteiro da rua, com quem
Cabral se desentende constantemente, por acusá-lo de ser um pichador. Datinta, artista
crédulo, quer mudar o mundo com seus grafites e Volante, sua irmã mais velha, tem a
malícia dos espertos e cheira de longe a encrenca que se aproxima quando encontra
Armando Traíra, homem nunca visto por aquelas bandas.
Mineta, menina ingênua e solitária atende a todos que lhe dão atenção em troca de um
pouco de carinho.
SINOPSE
Neste mesmo dia surge no bairro Armando Traíra, figura estranha que oferece seus
préstimos a Cabral, que apesar de assustado, aceita com prazer a ajuda oferecida. Traíra
se estabelece na região e interfere na vida de todos os moradores.
Não importa!
Buscando a subversão,
Quero voar!!!
CE: Quero voar, quero voar, quero voar... Para além do caminho, voar, pro terreno
incerto, voar, porque sou muito jovem ainda, porque tenho muito o que falar, porque
tenho muito o que fazer, porque quero aprender, porque quero amar, quero voar! Para
além do caminho voar, para ser bem feliz, para amar! Datinta! Ah, Datinta quem sabe
hoje eu me tomo de toda coragem do mundo, aproveito que meu pai tá feliz e digo: -
"Seu Cabral, tá aqui o cara que me conquistou, tá aqui o cara que me inspira, me acalma
e me faz dar sentido prá tudo. Seu Cabral, tá aqui o Datinta, o cara que eu amo!.....
VO: Quero voar, quero voar! Sem blá, blá, blá, nem ti, ti, ti, é com muito orgulho que
me apresento aqui: Volante é meu nome e vivo nas quebradas desde que nasci. Driblo a
vida como posso: às vezes de forma impactante, outras avoante, seja como for, sigo
adiante. Aí meu irmão, foi um prazer me apresentar, aí meu irmão, essa rima vai pegar,
aí meu irmão, essa rima vai pegar, aí meu irmão (vendo Celeste), Celeste?! Num te
esforça demais no suadouro, mina porque o leite é branco mesmo se misturar com
chocolate.
VO: Morena?
CE: Tô fora desse lance, só quero um lero com teu mano, mas se você puder dar o
recado, falo contigo e tá tudo conversado.
CE: Dessa vez é sério, depois de tanto sufoco, o velho pode sonhar...
CE: Mas ele quer Bar do Cabral. Até pintou na porta, prá todo mundo aprender.
CE: Ãhn?!
VO: Deixa prá lá! Vou marcar presença prá prestigiar! (saindo)
CE: Avisa o Datinta, Volante, avisa teu irmão... E agora? Como é que eu sei se ela vai
avisar ou não vai? (prá Volante) Custa ser minha amiga? Que dureza mané. Eu me
esforço mas a mina me complica!
Você é mais do que sei é mais que pensei é mais que eu esperava, baby.
Se tudo der certo, Datinta, depois da inauguração do bar do Cabral, vou ser tua
namorada. (sai correndo)
DA: Bar do teu pai? Celeste?! E aí, vai rolar? Hoje a noite, será? Ahhhhhhh!!!!!!!! A
noite vai ser boa, de tudo vai rolar. Datinta grafitando o amor de leste a oeste. Este lance
de amor...
MI: Vim atrás do seu Cabral, aliás Datinta, cê não podia me dar uma forcinha numas
paradas nervosas que eu ando fazendo?
MI: Olha só: E aí seu Cabral, tudo legal? Eu tô muito feliz, etc e tal.
O Sr. me contratou e não vai se arrependê. Eu vou mostrar a você o que eu consigo fazê.
O meu nome é Mineta e não gosto de careta, então vô trabalhar certinho prá ganhar um
troquinho e no final do dia sempre espero aquela hora, pelo tão prometido, chiclete
bolim bola.
MI: Que legal, Deus tá comigo sem blá, blá, blá. Já entrei pro bar do seu Cabral, se
entrar pro movimento, etc e tal, aí é astral total!
MI: (arrepiada) Chega aí, simpatia. Toda vez que alguém fala nim escola, os pelinho do
meu braço alevanta, tá ligado?
DA: Aí cê tá por fora, mina. Tem que cavar na escola o teu espaço, tem mano que já
faz isso, Mineta.
MI: Quebradeira?
DA: Tem jeito mais inteligente de usar as mãos, Mineta: bate lata, street dance,
grafite...
Isso tem nossa cara, Mineta é por aqui que tem que começar.
MI: Num sei n....(Entra Cabral) Oi seu Cabral eu vim atrás do senhor.
CA: Que bom, minha filha, (vê Datinta e o ignora) vamos começar...
MI: Ei, que cê tem com isso? Cuida da sua vida que eu cuido da minha...
CA: De trabalhar com dignidade, oras, ela não vai precisar ficar pedindo esmola na rua
prá ganhar a vida.
DA: E a escola?
CA: Escola? Quem precisa de escola hoje em dia? Todo mundo tem televisão, é só ligar
no telecurso!
MI: É isso aí, seu Cabral, eu nem tinha pensado nisso. Estudo pela TV e quando cansar
posso até mudar de canal, taí uma coisa que não dá prá fazer com a professora, Datinta!
DA: Viu só seu Cabral as idéias invertidas que o senhor coloca na cabeça da Mineta?
(sai)
MI: Ô Datinta...
CA: Deixa, minha filha, esse daí já tá perdido. Aproveita você a oportunidade que eu
estou te dando na escola da vida. Vamos trabalhar.
ENTRA ARMANDO TRAÍRA. OLHA AO REDOR PARA RECONHECER O
TERRENO E DECIDE: BOA ÁREA PARA ATACAR.
Mas as asas desse bicho só batem bem fortes se carniça ele traçar.
Vivemos a concretude.
Tudo é opinião,
Tudo é opinião,
CA: Finalmente chegou o dia e é quase hora da inauguração do meu querido, amado,
estimado e tão esperado, Bar do Cabral! É uma felicidade prá essa rua, ter um barzinho
como o meu. Ninguém vai mais precisar ir até o bairro vizinho prá comprar cigarro,
tomar um cafezinho, ou a pinguinha santa de todo dia. A molecada vai comprar
amendoim, paçoca, pipoca doce e todas as porcarias que eles adoram e eu finalmente
vou poder dormir a noite toda na minha cama e não vou mais precisar cochilar na
cadeira dura da portaria, nem ficar correndo atrás daqueles pichadores que adoravam
rabiscar as paredes da escola. (se dando conta) Nem acredito que eu não sou mais o
vigia noturno. Eu não tenho mais que lavar parede pichada! Que se dane a parede! Eu
agora tenho o meu bar, na garagem da minha casinha, construído com tanto sacrifício,
ai, ai, ai, eu agora sou o meu próprio patrão! É muita felicidade...
CA: (com espanto por Traíra saber seu nome) Bem, bem!
AT: E os negócios?
CA: Bem...
AT: Bem?!!
CA: Todos?
AT: O Sr. é famoso, Sr. Cabral. Muita gente o conhece. O Sr. era vigia da escola, famoso
por perseguir os pichadores a mando da diretora, não é?
CA: É, mas...
AT: Economias.
CA: Poucas. Contraí um bocado de dívida prá começar este sonho e se Deus quiser,
ainda vou ter um futuro digno.
AT: Dignidade, Sr. Cabral, muito bem, eis o desejo de todos: dignidade!!
CA: Muito bem, Armando esta é Mineta, que trabalha em meu bar. O que houve,
menina?
MI: Eu num sei o que foi. Eu peguei bem no meio prá num deixar cair no chão...
CE: Pai!
MI: É...
CE: Pai!
CE: Paiê!!
CE: Pai!
CA: Cala a boca Celeste! (p/ MI) Pois você vai descongelar a cerveja nem que seja na
língua!
MI/CE: ?????
CA: Como??
CA: Mas você é um gênio, claro, eu estou nervoso, então vamos indo, criatura, vamos!!
(saem)
CE: Mas quem é esse cara que grudou no meu pai? Cara mal encarado, o que é que ele
tá pensando?
DA: Celeste?!
CA: Já te falei que não quero essa mistura com a gente lá do campinho.
VO: ??!!
MI: Todo mundo tá sabendo do bar, seu Cabral, os de cima e os de baixo e todo mundo
gostou da idéia. Uma birosca aqui é muito bem vinda!
CA: Quase, só falta abrir e esperar o povo chegar! E como eu sou um homem de fé.
Quero dizer uns agradecimentos prá abençoar o meu futuro! Antes de mais nada
agradeço a minha mãe que me colocou no mundo e também agradeço a Deus por ter me
dado este empurrãozinho (vai em direção ao pano branco que está sobre a porta do bar e
quando o puxa, vê que o bar está todo pichado). É com muito orgulho que eu retiro o
pano que cobre a obra de minha vida, é com muito orgulho que eu inauguro o ... (vendo)
BirosCa-bral?!!! Eu não acredito, eles me perseguem, esses malditos pichadores!!
CE: Calma!
CA: Se eu puser as minhas mãos no maldito que... (vendo Datinta que ri)
DA: Eles não dão mesmo trégua, seu Cabral, os caras são rápidos!
DA: Pichadores!
VO: Pega leve seu Cabral, Datinta não faz pichação, já falou.
CA: Pois prá mim pode falar o quanto quiser grafiteiro, pichador é tudo cheiro da
mesma tinta!
CE: Paiii!!!!
CA: Deixa ele comigo que eu dou nele de olhos fechados, delinquentezinho, o que é
que está pensando?...
AT: (empurrando todo mundo prá fora) Hoje é dia de festa, dia de realização, seu Cabral
tá concretizando seu sonho, ninguém tem o direito de destruir o sonho do Cabral, da
família do seu Cabral! (Traíra aproxima Celeste de Cabral)
CA: Um sonho de meia pataca! Perdi a vontade de fazer qualquer coisa. A gente
batalha tanto prá realizar um sonho, um só sonhozinho e quando chega a hora, um
moleque peitudo se mete a besta e põe tudo a perder! Olha o nome do sujeito, Datinta,
o nome já diz tudo!!
CE: Pai!
CA: Não inauguro mais nada! Prá mim chega de amolação! Imagine se um velho
sozinho vai peitar essa molecada.
CE: Pai??!!
CE: Pai.
CA: Num adianta, meu filho. Você é bem intencionado mas...
AT: A gente pode fazer um teste. Eu fico como uma espécie de administrador do seu bar
e tomo conta durante um tempo. Só como experiência, pro senhor não desistir tão rápido
do seu sonho, que tal?
CE: Paiê!
CA: Eu não posso pagar pelo seu serviço, rapaz, um administrador, quem me dera!
CA: Por falta de tempo né meu filho, ou você acha que eu nasci ontem?
AT: Eu fui com a sua cara, além do mais o senhor me lembra meu próprio pai.
CA: Pois pode começar limpando essa sujeira. Assim que tudo estiver em ordem,
reabrimos!
CE: Pai!
AT: Absoluta! Eu sempre sei o que faço. Não se preocupe e pode começar a contar com
o meu serviço.
CA: Mas eu sou um homem de sorte mesmo, imagine só, encontrar esse moço, bem no
dia de hoje!
CA: Como não? Ele é uma ótima pessoa. Solícita e preocupada com os outros. Viu só
como ele me ajudou. Aliás, se não fosse ele, aquele pichador...
CE: O Datinta não pichou o seu bar, ele...
CA: Ele só veio aqui porque você chamou. Que te deu na cabeça, minhoca? Já falei que
não quero saber desse pessoal por aqui.
CE: Esse pessoal mora no bairro, cê não pode impedir eles de virem aqui e eu conheço a
galera, são meus amigos!
CA: Que conversa é essa Celeste? Você tem amizade com pichador, maconheiro?
CA: Artista?
CA: ??? Ora não me enrola, Celeste! Já tá falando do jeito deles, do jeito que ninguém
entende. Eu te proíbo de conversar, de sequer cumprimentar esse pessoal de lá do
campinho.
CE: Você não pode fazer isso, eles são gente boa, pai!
CA: Eu sei quem é gente boa e quem não é, você ainda é muito criança, não sabe o que
é certo e o que é errado.
CE: Que papo antigo, tô bem crescida seu Cabral, sei muito bem o que é melhor prá
mim!
CA: Se sabe mesmo cala essa boca antes que eu perca as estribeiras!!
CA: Experimenta!! Você não sabe do que eu sou capaz, Celeste! Tenta só me
desobedecer e você vai ver o que te espera. Eu te proíbo de pronunciar o nome desse
delinquentezinho! Se você me desafiar, eu mesmo, com minhas próprias mãos vou te
grafitar inteira, mas é de porrada!!
Você viveu,
Então escuta,
MI: Proibiu?? Mas quem ele pensa que ele é? Ele nem te conhece direito!
CE: Pode crer, Mineta, não me conhece mesmo, ele também não sabe do que eu sou
capaz! (se dando conta) Será que é ciúme?
MI: Teu pai, com aquela carinha? Desculpa aí, Celesta, mas eu sempre pensei que teu
pai fosse o Cabral!
MI: O Cabral?
CE: (enraivecida) Que tudo a ver, Mineta? Então ele me proíbe de viver o meu amor e
tá tudo numa boa?
MI: Não. É que tem a ver o Cabral ser teu pai fraco e o Traíra ser o cara de morte, ser o
cara muito forte!
CE: ???
ENTRA TRAÍRA
MI: Eta bobagem, Celesta, quem aparece demais tem coisa boa prá mostrar, isso sim.
MI: Achá eu posso achar quanto eu quiser, bom mesmo é você provar o que eu tô
dizendo.
CE: Olha aqui moço, eu não caio na sua não, viu? Vem com esse papo maneiro, falando
doce com o coroa, com jeito bem traiçoeiro. Até ofereceu ajuda, em troca de nada?
AT: Você é muito esperta, Celeste, percebeu logo de cara que eu só fiz uma jogada, né?
AT: Prá mim é tudo alegria, gente boa, eu só preciso de trabalho, falô. Só preciso de um
lugar prá ficar, valeu? Aqui parece um bom lugar! Aqui tem gente boa, aqui tem coisa
boa prá quem quiser desenvolver, parece que é só questão de querer.
CE: E daí?
MI: Ah é, o que estraga todo mundo é a tristeza. Olha prá mim, pensa que eu sou assim
mesmo? Olha a Celesta, ela não tem essa cara não, mas ó: tá triste, ficou toda estragada.
AT: A raiva também te estraga. Se o Datinta entrasse aqui agora e te visse assim, desistia
no ato!
MI: Mas que amor resiste a uma cara estragada, Celesta? Com tanta mina por aí...
AT: Tive uma idéia interessante! A gente pode fazer um passeio prá esquecer e ficar bem
numa boa, tranquilizar a alma que arde dentro da cabeça e aperta os miolos, porque não
tem como sair.
MI: Tô nessa, mano e acho uma boa você também estar, Celesta. Cê tá precisando
descansar da raiva! Vamo nessa?
AT: Celeste?
CA: Eu não acredito que esse miserável teve a petulância de voltar ao local do crime.
Veio completar o serviço?
DA: Não tem nada prá completar, seu Cabral, só vim prá falar com a Celeste.
CA: Eu te proíbo! Não quero mais te ver nessa rua, nem do outro lado da rua, nem na
esquina, nem no próximo quarteirão!!
CA: Mas o que está acontecendo aqui? Onde é que vocês estavam? (percebendo que as
duas disfarçam) Então vocês acham que podem me enganar? Eu sou um homem vivido,
vocês pensam que eu nasci ontem? Onde é que vocês estavam?
ENTRA TRAÍRA
AT: Comigo! (todos param e Traíra os rodeia) A gente tava fazendo um passeio prá
tranquilizar a alma que arde dentro da cabeça e aperta os miolos, porque não tem como
sair. A gente só foi dar uma volta prá esquecer, prá deixar tudo prá lá!
EPÍLOGO – "SOCORRO"
Encoberto, disfarçado, multifacetado,
Socorro!
Há um pedido de socorro no
engolido,
cuidado! Perigo!
(bis - 3 vezes)
se não amar-expressar,
engolido,
cuidado! Perigo!
(bis - 3 vezes)