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1.

O Menino Azul – Cecília Meireles

O menino quer um burrinho


para passear.
Um burrinho manso,
que não corra nem pule,
mas que saiba conversar.

O menino quer um burrinho


que saiba dizer
o nome dos rios,
das montanhas, das flores,
– de tudo o que aparecer.

O menino quer um burrinho


que saiba inventar histórias bonitas
com pessoas e bichos
e com barquinhos no mar.

E os dois sairão pelo mundo


que é como um jardim
apenas mais largo
e talvez mais comprido
e que não tenha fim.

(Quem souber de um burrinho desses,


pode escrever
para a Ruas das Casas,
Número das Portas,
ao Menino Azul que não sabe ler.)
Por isso, não falha nunca:
7. Guarda-chuvas – Rosana Rios
se começa a trovejar,
nenhum dos quatro me vale –
Tenho quatro guarda-chuvas
eu sei que vou me molhar.
todos os quatro com defeito;
Um emperra quando abre,
outro não fecha direito. Quem me dera um guarda-chuva
pequeno como uma luva
Que abrisse sem emperrar
Um deles vira ao contrário
ao ver a chuva chegar!
seu eu abro sem ter cuidado.
Outro, então, solta as varetas
e fica todo amassado. Tenho quatro guarda-chuvas
que não me servem de nada;
Quando chove de repente,
O quarto é bem pequenino,
acabo toda encharcada.
pra carregar por aí;
Porém, toda vez que chove,
eu descubro que esqueci… E que fria cai a água
sobre a pele ressecada!
Ai…
13. As borboletas – Vinicius de Moraes

Brancas
Azuis
Amarelas
E pretas
Brincam
Na luz
As belas
Borboletas.

Borboletas brancas
São alegres e francas.

Borboletas azuis
Gostam muito de luz.

As amarelinhas
São tão bonitinhas!

E as pretas, então…
Oh, que escuridão!
1. Ou isto ou aquilo. Cecília Meireles

Ou se tem chuva e não se tem sol,


ou se tem sol e não se tem chuva!

Ou se calça a luva e não se põe o anel,


ou se põe o anel e não se calça a luva!

Quem sobe nos ares não fica no chão,


quem fica no chão não sobe nos ares.

É uma grande pena que não se possa


estar ao mesmo tempo nos dois lugares!

Ou guardo o dinheiro e não compro o doce,


ou compro o doce e gasto o dinheiro.

Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo…


e vivo escolhendo o dia inteiro!

Não sei se brinco, não sei se estudo,


se saio correndo ou fico tranqüilo.

Mas não consegui entender ainda


qual é melhor: se é isto ou aquilo.
2. A bailarina. Cecília Meireles

Esta menina
tão pequenina
quer ser bailarina.
Não conhece nem dó nem ré
mas sabe ficar na ponta do pé.

Não conhece nem mi nem fá


Mas inclina o corpo para cá e para lá

Não conhece nem lá nem si,


mas fecha os olhos e sorri.

Roda, roda, roda, com os bracinhos no ar


e não fica tonta nem sai do lugar.

Põe no cabelo uma estrela e um véu


e diz que caiu do céu.

Esta menina
tão pequenina
quer ser bailarina.

Mas depois esquece todas as danças,


e também quer dormir como as outras crianças.
6. Leilão de Jardim. Cecília Meireles

Quem me compra um jardim com flores?


borboletas de muitas cores,
lavadeiras e passarinhos,
ovos verdes e azuis
nos ninhos?

Quem me compra este caracol?


Quem me compra um raio de sol?
Um lagarto entre o muro e a hera,
uma estátua da Primavera?

Quem me compra este formigueiro?


E este sapo, que é jardineiro?
E a cigarra e a sua canção?
E o grilinho dentro do chão?

(Este é meu leilão!)


8. Para ir à Lua. Cecília Meireles

Enquanto não têm foguetes


para ir à Lua
os meninos deslizam de patinete
pelas calçadas da rua.

Vão cegos de velocidade:


mesmo que quebrem o nariz,
que grande felicidade!
Ser veloz é ser feliz.

Ah! se pudessem ser anjos


de longas asas!
Mas são apenas marmanjos!
Pessoas são Diferentes. Ruth Rocha

São duas crianças lindas


Mas são muito diferentes!
Uma é toda desdentada,
A outra é cheia de dentes...

Uma anda descabelada,


A outra é cheia de pentes!

Uma delas usa óculos,


E a outra só usa lentes.

Uma gosta de gelados,


A outra gosta de quentes.

Uma tem cabelos longos,


A outra corta eles rentes.

Não queira que sejam iguais,


Aliás, nem mesmo tentes!
São duas crianças lindas,
Mas são muito diferentes!
Segredo. Ruth Rocha

Andorinha no fio
escutou um segredo.
Foi à torre da igreja,
cochichou com o sino.

E o sino bem alto:


delém-dem
delém-dem
delém-dem
dem-dem!

Toda a cidade
ficou sabendo.
Pomar.
Menino - madruga
o pomar não foge!
(pitangas maduras
dão água na boca.)

Menino descalço
Não olha onde pisa.
Trepa pelas árvores
Agarrando pêssegos.
(Pêssegos macios
como paina e flor.
Dentadas de gosto!)

Menino, cuidado,
jabuticabeiras
novinhas em folha
não agüentam peso.

Rebrilha, cem olhos


agrupados, negros.
E as frutas estalam
- espuma de vidro -
nos lábios de rosa.
Menino guloso!

Menino guloso,
Ontem vi um figo
mesmo que um veludo,
redondo, polpudo,
E disse: este é meu!
Meu figo onde está?

- Passarinho comeu,
passarinho comeu...
(Henriqueta Lisboa)
O Bicho . Manuel Bandeira

Vi ontem um bicho
Na imundice do pátio
Catando comida entre os detritos
Quando achava alguma coisa
Não examinava nem cheirava
Engolia com voracidade
O bicho não era um cão
Não era um gato
Não era um rato
O bicho, meu Deus, era um homem.

Os poemas. Mario Quintana

Os poemas são pássaros que chegam


não se sabe de onde e pousam
no livro de quem lês.
Quando fechas o livro, eles alçam vôo
como de um alçapão.
Eles não têm pouso
nem porto
alimentam-se um instante em cada par de mãos
e partem.
E olhas, então, essas tuas mãos vazias,
no maravilhoso espanto de saberes
que o alimento deles já estava em ti...
Quadrilha da sujeira. Ricardo Azeredo

João joga um palitinho de sorvete na


rua de Teresa que joga uma latinha de
refrigerante na rua de Raimundo que
joga um saquinho plástico na rua de
Joaquim que joga uma garrafinha
velha na rua de Lili.

Lili joga um pedacinho de isopor na


rua de João que joga uma embalagenzinha
de não sei o que na rua de Teresa que
joga um lencinho de papel na rua de
Raimundo que joga uma tampinha de
refrigerante na rua de Joaquim que joga
um papelzinho de bala na rua de J. Pinto
Fernandes que ainda nem tinha
entrado na história.
Guaraná com canudinho. Sérgio Capparelli.

Uma vaca entrou num bar


e pediu um guaraná.

O garçom, um gafanhoto,
tinha cara de biscoito.

Olhou de trás do balcão,


pensando na confusão.

Fala a vaca, decidida,


pronta pra comprar briga:

– E que esteja geladinho


pra eu beber de canudinho!

Na gravata borboleta,
gafanhoto fez careta.

Responde: vaca sem grana


se quiser vai comer grama.

– Ah, é?, muge a vaca matreira,


quem dá leite a vida inteira?

– Dou leite, queijo, coalhada,


reclamo, ninguém me paga.

Da gravata, a borboleta
sai voando, satisfeita.

Gafanhoto leva um susto,


acreditando, muito a custo.

E serve, bem rapidinho,

guaraná com canudinho.


TEMPESTADE. Henriqueta Lisboa

- Menino, vem para dentro,


Olha a chuva lá na serra,
Olha como vem o vento!

- Ah! Como a chuva é bonita


E como o vento é valente!

- Não sejas doido, menino,


Esse vento te carrega,
Essa chuva te derrete!

- Eu não sou feito de açúcar


Para derreter na chuva.
Eu tenho força nas pernas
Para lutar contra o vento!

E enquanto o vento soprava


E enquanto a chuva caía,
Que nem um pinto molhado,
Teimoso como ele só:

- Gosto de chuva com vento,


Gosto de vento com chuva!
Maria Campaniça. Manuel da Fonseca.
Debaixo do lenço azul com sua barra amarela
Os lindos olhos que tem!
Mas o rosto macerado
De andar na ceifa e na monda
Desde manhã ao sol-posto,
Mas o jeito
Das mãos torcendo o xaile nos dedos
É de mágoa e abandono...
Ai Maria Campaniça,
Levanta os olhos do chão
Que eu quero ver nascer o sol!

Retrato Cecília Meireles

Eu não tinha este rosto de hoje,


assim calmo, assim triste, assim magro,
nem estes olhos tão vazios,
nem o lábio amargo.

Eu não tinha estas mãos sem força,


tão paradas e frias e mortas;
eu não tinha este coração
que nem se mostra.

Eu não dei por esta mudança,


tão simples, tão certa, tão fácil:
- Em que espelho ficou perdida
a minha face?

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