Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
CONSELHO EDITORIAL
Profa. Dra. Solange Martins Oliveira Magalhães (UFG)
Profa. Dra. Rosane Castilho (UEG)
Profa. Dra. Helenides Mendonça (PUC GO)
Prof. Dr. Henryk Siewierski (UNB)
Profa. Dra. Irene Dias de Oliveira (PUC GO)
Prof. Dr. João Batista Cardoso (UFG)
Prof. Dr. Luiz Carlos Santana (UNESP)
Profa. Ms. Margareth Leber Macedo (UFT)
Profa. Dra. Marilza Vanessa Rosa Suanno (UFG)
Prof. Dr. Nivaldo dos Santos (PUC GO)
Profa. Dra. Leila Bijos (UCB DF)
Prof. Dr. Ricardo Antunes de Sá (UFPR)
Profa. Dra. Telma do Nascimento Durães (UFG)
Prof. Dr. Francisco Gilson (UFT)
FERNANDA BUSANELLO FERREIRA
FELIPE MAGALHÃES BAMBIRRA
ARNALDO BASTOS SANTOS NETO
(ORGANIZADORES)
REFLEXÕES CONTEMPORÂNEAS
SOBRE FILOSOFIA,
CONSTITUCIONALISMO E
DIREITOS HUMANOS
Goiânia-GO
Editora Espaço Acadêmico, 2017
Copyright © 2017 by Fernanda Busanello Ferreira et al
Contatos:
Prof Gil Barreto (62) 81061119 TIM / (62) 85130876 OI
Larissa Pereira (62) 82301212 TIM
(62) 3922-2276
ISBN:978-85-69818-61-8
CDU: 342.7
DIREITOS RESERVADOS
É proibida a reprodução total ou parcial da obra, de qualquer forma ou por qualquer meio, sem
a autorização prévia e por escrito da autora. A violação dos Direitos Autorais (Lei nº 9.610/98)
é crime estabelecido pelo artigo 184 do Código Penal.
Impresso no Brasil
Printed in Brazil
2017
5
AUTORES
APRESENTAÇÃO
“O SEMEADOR”
1 BRIAN, Petrie. Obras Primas de Van Gogh. Lisboa, Verbo, 1974, p. 17.
2 WALTHER, Ingo F.; METZGER, Rainer. Vincent Van Gogh: obra completa de pintura. Trad.
Sandra de Oliveira. Lisboa:Taschen, 1996, p. 360.
10
Os organizadores
11
SUMÁRIO
15 PREFÁCIO
INDICADORES DA TRAJETÓRIA DA CONSTRUÇÃO DO
BINÔMIO DIREITOS HUMANOS E CONSTITUCIONALIS-
MO: ENTRE THEMIS E ADRASTÉIA
Alexandre Walmott Borges
PREFÁCIO
INDICADORES DA TRAJETÓRIA DA
CONSTRUÇÃO DO BINÔMIO DIREITOS
HUMANOS E CONSTITUCIONALISMO:
ENTRE THEMIS E ADRASTÉIA
1. Introdução
12 Tradução livre do original francês: “Aristote manifeste la double face de la vertu, qui ne se dé-
finit pas seulement pour un certain type de disposition subjective, mais aussi par la référence à
un certain type de situation. Être vertueux, ce n’est pás seulement agir comme Il faut, mais avec
qui Il faut, quand Il faut et ou Il faut”. AUBENQUE, P. La prudence chez Aristote. Paris: Presses
Universitaires de France, 2009, p. 64.
13 AUBENQUE, P. La prudence chez Aristote. Paris: Presses Universitaires de France, 2009.
28 Angela Couto Machado Fonseca
porque são capazes de considerar (theorein) o que é bom para eles mes-
mos e para os homens” (EN VI 5 1140b8ss). Este considerar (theorein)
não é teórico, mas sim uma consideração prática sobre o contingente.
Esta passagem assinala o tom presente na EN de que a phronesis está
presente na ação que fornece sentido ao contingente das relações hu-
manas. Exatamente por que se insere e atua no campo do que pode ser
sempre inovado e alterado. O homem prudente possui a sensibilidade
de medir cada ocasião e dentro dela agir de modo a estabelecer o que
deseja.
A phronesis, que se desenha como o saber sobre a ação concreta,
não está vinculada, portanto a uma concepção teórica ou formalista. O
agir não parte de um postulado teórico fixo que justifique a ação a par-
tir de fora de seu contexto específico. Também não se pode, exatamen-
te por conta da imprevisibilidade, aproximar a ação prudente ao saber
técnico. Este último conta com táticas que de antemão prescrevem um
receituário guiando as diferentes formas possíveis de se proceder.
Na phronesis o que está em jogo é a capacidade de compreensão,
que opera de forma prática, na ação. Prudente é aquele que apreende
dentro das circunstâncias todas suas informações (elementos, tempo,
agente, pessoas envolvidas) expondo à luz a própria ação em tudo que
nela está envolvido desde sua causa até sua finalidade.
A phronesis, como este saber considerativo, não é técnica e nem
tampouco contemplação teórica, é a capacidade de, junto aos demais,
estabelecer relações pautadas pela avaliação e pela força da ação. Seu
lugar se inscreve no desenrolar da vida humana: entendendo por vida
humana a vida qualificada alcançada pelo homem que delibera e esta-
belece como viver mediante sua práxis. Seria, enfim, considerar a ins-
crição da ação do homem num plano de contingência, como ‘aquilo que
pode ser ou pode não ser’, o que indica um sentido criativo da ação, não
se trata de um horizonte de fabricação, mas de criação em meio ao jogo
das circunstâncias e seus termos. Como nos lembra Aubenque: “Num
mundo perfeitamente transparente à ciência, quer dizer onde ele seria
estabelecido sem que nada pudesse ser de outro modo do que é, não
Vita Activa, ação e sua relação com a phronesis: uma leitura de Hannah Arendt e Aristóteles 29
haveria nenhum lugar para a arte, nem, de uma maneira geral, para a
Ação humana”14.
21 Aristóteles com todas as letras expõe n’A Política (1254a): “a vida é ação, não produção”.
Vita Activa, ação e sua relação com a phronesis: uma leitura de Hannah Arendt e Aristóteles 35
Arendt houvesse designado a filosofia de Nietzsche como mera inversão do sistema platônico
(na esteira de Heidegger), este autor invalida a dualidade ser e aparecer e rejeita a imposição
totalitária e arbitrária das interpretações metafísicas. Retomando o pensamento de Heráclito,
Nietzsche aposta na radicalidade de um devir sem fundo e de pura criação.
25 GADAMER, Hans-Georg. A Idéia do Bem entre Platão e Aristóteles. São Paulo: Editora WMF
Martins Fontes, 2009, p. 156.
Vita Activa, ação e sua relação com a phronesis: uma leitura de Hannah Arendt e Aristóteles 37
4. Referências Bibliográficas.
I. Introdução
seria nem velho nem novo, mas permanente, como se deve isto destacar
destas considerações errantes sem forma – como distinguir-se e afir-
mar-se de outro modo a não ser através da ciência?14”
O problema agrava-se quando se tem em conta instituições polí-
ticas, como o direito, a eticidade e o Estado, pois “a verdade é justamen-
te tão antiga como se expõe e conhece abertamente nas leis públicas, na
moral pública e na religião”. Uma vez que o homem não se satisfaz de
conhecer essa verdade de maneira imediata, como concebê-la de forma
racional, para o seu conteúdo já em-si racional, de modo que apareça
justificado ao pensar livre, que não se contenta com o meramente dado
– “quer seja apoiado pela autoridade positiva exterior do Estado ou do
consenso dos homens, ou pela autoridade do sentimento interior do co-
ração e pelo imediato testemunho concordante do espírito”15?
Hegel identifica duas atitudes ou condutas simples do espírito.
A primeira consiste em “ater-se à convicção plenamente confiante na
verdade publicamente bem conhecida e construir sobre esta base firme
o seu modo de agir e a posição firme na vida”. A partir dessa conduta
simples, indaga-se exatamente em como identificar, com clareza, o que
é universalmente reconhecido e válido diante de opiniões infinitamente
diversas e divergentes, e esse embaraço o filósofo o considera uma posi-
ção de seriedade justa e verdadeira diante da Coisa. Há, porém, uma se-
gunda conduta simplória que o espírito pode adotar. Trata-se daqueles
que se vangloriam diante do embaraço, “enxergam a floresta antes das
árvores”, e, a partir disso, colocam-se contra aquilo que é universalmen-
te reconhecido como válido, contra a substância do direito e do ético16.
Porém, o embaraço e a dificuldade foram criados por eles próprios, e é
reveladora de que querem aquilo que é diferente do universal.
Essa última hipótese é, ainda, uma conduta simples do espírito, se de
fato não se trata da “vaidade e da particularidade do opinar e do ser”, e, assim,
conseqüentemente, continua-se na substancialidade do direito e do ético.
Para Hegel, porém, o maior problema reside naquele homem que pensa, e
que procura no seu pensar o fundamento da sua liberdade e eticidade:
Este direito, tão alto, tão divino que é [de pensar], converte-
se, contudo, em injustiça quando só isto é considerado como
pensar, e o pensar então apenas se sabe livre na medida em
que se afasta do universal-reconhecido e válido e em que
soube inventar para si algo de particular17.
30 FERREIRA, Apresentação..., cit., in: HEGEL, Prefácios, op. cit., p. 179. As citações de Hegel
desse parágrafo referem-se à organização da Filosofia do Direito realizadas por Ilting.
Lógica, realidade e história: reflexões sobre o Direito e os Direitos Humanos a partir da Filosofia 51
do Direito de Hegel
31 HEGEL, G.W.F. Enciclopédia das Ciências Filosóficas (em compêndio: 1830). V. I. Trad. Paulo
Meneses. 2. ed. São Paulo: Loyola, 2005, V. I, p. 45 [§6].
32 HEGEL, Prefácios, cit., p. 197.
52 Felipe Magalhães Bambirra
Hegel ainda afirma que aquilo que fica entre o espírito consciente
de si e a razão como realidade efetiva presente, ou seja, aquilo que é
racionalmente necessário mas separa aquela razão desta, “é o grilhão
de um abstracto que não se libertou para o conceito”. Deve o filósofo,
porém,
Referências bibliográficas
Introdução
Se não nos falha a memória, Luis começou o curso com uma dinâ-
mica. Deveríamos desenhar uma representação sobre nós. Usamos lápis
de cor, canetinha e nos esforçamos na criatividade. Logo após, fizemos
a apresentação aos colegas e Luis foi tecendo comentários sobre cada de-
senho. Quem conheceu o mestre, sabe que ele não nos reconfortou e sim
5 Nota da autora Fernanda: “Lembro-me que me desenhei subindo numa escada feita de li-
vros, meio que prevendo que os estudos teriam um papel central em minha vida, e também
desenhei minha família, que era acessível por um barco. Expliquei a Luis que minha família
era meu porto seguro, local para o qual sempre eu poderia voltar. Para minha surpresa Luis
imediatamente me advertiu: cuidado! Um porto seguro pode te prender ao invés de te libertar.
O impacto que essas palavras gerou sobre mim foi muito forte. Reputo um pouco a esse mo-
mento a minha coragem para não ficar presa no porto, seja qual ele for”.
62 Fernanda Busanello Ferreira, Candice Nunes Bertaso
decidir nada, tem que saber trabalhar com o silêncio, com os enigmas,
com a inacessibilidade, tem que ser o “rosto de Deus”. A poesia, por
exemplo, tem um núcleo de mistério que mexe com você. O enigma, o
mistério, isso é tornar-se inacessível. O mediador tem que ajudar que
os outros decidam, tem que ser um mestre. O mediador tem que ser
inacessível, pois seu silêncio deve ajudar os outros.
O terapeuta intervém, faz pontuações e intervenções (inter-
pretações) e é um profissional que sabe fazê-lo. O mediador não
sabe. A mediação é uma estratégia de ajuda. Na mediação não há
comentários, são criadas condições para as pessoas descobrirem.
Quem descobre tudo são as pessoas, o mediador não dá palpites
como o conciliador. É recomendável ter dois mediadores, realizar
uma co-mediação.
A mediação como política cultural é uma ideia que se baseia no
conceito de contágio. Toda cultura, por mais autêntica e genuína que
pareça, é produto do contágio com outra cultura (grifo no original).
Nossa subjetividade é construída com o contágio com o outro.
Nossa identidade está nos outros. Lacan disse que a linguagem está nos
outros. O inconsciente de cada um está nos outros. O inconsciente é
tudo que não sei de mim mesmo. “O que você me espelha, eu encontro
em mim”. O sentido de minhas palavras não está em mim, está nos ou-
tros. A isso se dá o nome de semiótica da alteridade. O direito a partir
do outro é alteridade.
Já a contaminação é uma forma de ideologia, de alienação. O pro-
fessor costuma contaminar, pois quer impor ideias. Já o contágio (início
do contato com o outro) não é proposital, não se quis contagiar. Apren-
de-se por contágio, ele está na natureza do outro. Não posso obrigar e
tenho que estar disponível para o contágio. Por exemplo, um professor
de capoeira está sendo um mediador cultural, contagiando os alunos
com a cultura da Bahia.
Warat foi um mediador cultural (portador de contágio), trouxe
sem querer informações de outro lugar no seu discurso, que já estava
criado, só transformou em outra coisa.
A GROTESCA VIOLAÇÃO AOS DIREITOS HUMANOS NA MODERNIDADE E A MEDIAÇÃO 69
COMO DIREITO DO FUTURO: IN MEMORIAM A LUIS ALBERTO WARAT
flitos tenho que sentir a mim mesmo, ver até que ponto eu contribuí no
conflito. A sensibilidade e a compaixão estão relacionadas, mas não são
a mesma coisa.
A(s) criança(s) insatisfeita(s) do(s) juiz(es) é/ são a(s) princi-
pal(is) fonte(s) do direito (Luis às vezes dizia que as fontes do direito
eram as sogras dos juízes, em tom jocoso).
Em suma, as relações humanas são relações de cobrança de afeto.
São demandas de afeto. Todos devem me dar o que eu não tive. É aí que
entra a sublimação: eleição de instituições, movimentos substitutivos
para suprir as carências. Em geral, na convivência com os outros rece-
bemos nutrientes (energias) tóxicas.
Existem várias estruturas adictas de dependência. Elas são
estruturas substitutivas, por exemplo, o álcool, a dependência quí-
mica, o fumo, o trabalho, os amores cinematográficos, o abandono,
o sexo. No fundo, todas as dependências são de índole emocional.
Somos carentes emocionais. Nos falta amor. Há gente dependente
dos dependentes (co-dependência). A pessoa está predisposta a ser
dependente. A sua estrutura de personalidade está disposta a ser
dependente. Ocorre que os vínculos insatisfatórios são uma fonte
enorme de conflitos.
Luis, se nossa memória não nos trai, realizou após essa fala a “Di-
nâmica do Ursinho”. Retomaremos e detalharemos a experiência mais ao
final do texto.
Seguiu Warat dizendo que são exemplos de mediação: a) a media-
ção escolar; b) a mediação ambiental/ ecológica; c) a mediação policial,
que parte da humanização da polícia, da ideia de mediação na seguran-
ça pública.
São tipos de mediação: a mediação preventiva que trabalha os
vínculos afetivos antes que o conflito ocorra e realiza tipos de relação de
ajuda e a mediação reparadora em que o conflito existe, mas tem-se que
repará-lo (grifos no original).
A mediação familiar encontra um forte sentido na família. Atua-
se num processo pedagógico em que as pessoas aprendem a conviver.
A GROTESCA VIOLAÇÃO AOS DIREITOS HUMANOS NA MODERNIDADE E A MEDIAÇÃO 71
COMO DIREITO DO FUTURO: IN MEMORIAM A LUIS ALBERTO WARAT
ROL DO MEDIADOR
- Facilitar e promover a comunicação;
- Promover a confiança no procedimento e na pessoa (tem que
ser sedutor e ter o comando);
- Estabelecer certo comando com as partes (controlar as situa-
ções);
- Dirigir o procedimento;
- Ajudar as partes a identificarem seus interesses e definirem as
questões em disputa;
A GROTESCA VIOLAÇÃO AOS DIREITOS HUMANOS NA MODERNIDADE E A MEDIAÇÃO 73
COMO DIREITO DO FUTURO: IN MEMORIAM A LUIS ALBERTO WARAT
Introdução
2 BOBBIO, Norberto. Teoria geral da política: a filosofia política e a lição dos clássicos. Rio de
Janeiro: Elsevier, 2000, p. 67-69.
3 RAWLS, John. Uma teoria da Justiça. 2ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 3
4 SANDEL, Michael. O liberalismo e os limites da justiça. Lisboa: Fundação Calouste Gulbeskian
2005, p. 245.
disputas políticas, ações judiciais e direitos humanos sob a ótica da filosofia política contemporânea: 79
a teoria e a prática da ideia de justiça no brasil
6 RAWLS, John. Justiça como equidade: uma reformulação. São Paulo: Martins Fontes, 2003, p.
60.
disputas políticas, ações judiciais e direitos humanos sob a ótica da filosofia política contemporânea: 81
a teoria e a prática da ideia de justiça no brasil
7 DE VITA, Álvaro. A justiça igualitária e seus críticos. São Paulo: Martins Fontes, 2007.
82 Igor Suzano Machado
constituir para nós obrigações que nada têm a ver com uma
escolha.18
21 EISENBERG, José. A democracia depois do liberalismo: ensaios sobre ética, direito e política.
Rio de Janeiro: Relume Darumá, 2003.p. 141-142.
disputas políticas, ações judiciais e direitos humanos sob a ótica da filosofia política contemporânea: 89
a teoria e a prática da ideia de justiça no brasil
22 HONNETH, Axel. A luta por reconhecimento: a gramática moral dos conflitos sociais. São
Paulo: Editora 34, 2003.
23 FRASER, Nancy. “Da redistribuição ao reconhecimento? Dilemas da justiça na era pós-so-
cialista”. In: SOUZA, Jessé (Org.). Democracia hoje: novos desafios para a teoria democrática
contemporânea. Brasília: UNB, 2001. Pág. 245-254..
90 Igor Suzano Machado
26 KYMLICKA, Will. Multicultural odysseys: navigating the new international politics of diversity.
Oxford ; New York: Oxford University Press, 2007.
92 Igor Suzano Machado
mília na teoria de Rawls, ora fazendo parte, ora sendo excluída a estrutura
básica da sociedade. Tal estrutura costuma estar restrita às instituições
políticas, ao mercado, às relações internacionais, etc. E só a elas devem
ser aplicados os princípios de justiça da teoria da justiça de Rawls. Como
consequência, como pensar injustiças que operam e se reproduzem não
nessa esfera pública tradicional, mas no âmbito privado, como na organi-
zação familiar em que o patriarcado realiza suas principais operações de
jugo das mulheres? Daí a importância, para as feministas, de se pensar a
justiça refletindo também sobre a distinção entre público e privado, para
que não se exclua de antemão algumas formas importantes que assume a
injustiça praticada contra as mulheres.
Deve-se ter sempre em mente, no entanto, que existem muitos
feminismos, e, consequentemente, muitas formas de se pensar a distinção
entre público e privado. Por exemplo, o feminismo liberal não estará dis-
posto a tornar indistintas as fronteiras entre público e privado. Logo, essa
distinção é mais uma questão com a qual o feminismo deve se defrontar
para pensar a emancipação das mulheres, do que uma receita pronta a
ser aplicada enquanto parâmetro universal de justiça. O mesmo pode ser
dito a respeito da distinção entre sexo – fisiologia de natureza biológica –
e gênero – comportamento condicionado socialmente a respeito do que
se espera de homens e mulheres enquanto parâmetro de masculinidade
ou feminilidade. Há teorias feministas essencialistas em que a vinculação
entre sexo e gênero é considerada importante, pondo-se em evidência a
necessidade de maior presença de características femininas numa socie-
dade pautada por características masculinas. Mas há também, por ou-
tro lado, teorias feministas anti-essencialistas que negam a existência de
qualquer essência acerca do que seja masculino e feminino, devendo tais
diferenciações entre feminino e masculino serem desconstruídas, em vez
de glorificadas. Mesmo a vinculação entre sexo e natureza é relativizada
por algumas correntes do feminismo, que destacam o quanto a própria
fisiologia já é hoje construída e reconstruída por padrões sociais.
De qualquer forma, seja para destacar a necessidade de um mun-
do mais feminino, ou para questionar o que seja feminino e masculino,
94 Igor Suzano Machado
pela qual a maioria dos ministros optou por manter o monopólio. Nas
palavras do ministro:
5. Considerações finais
Referências bibliográficas
Adriana Inomata1
1. INTRODUÇÃO
5 Conforme será demonstrado adiante com análise das normas constitucionais, infraconstitu-
cionais e da interpretação dada pelo Supremo Tribunal Federal.
NEPOTISMO: RAÍZES HITORICAS E ANÁLISE CRÍTICA DA RESOLUÇÃO Nº 7 DO CNJ E DA 107
SÚMULA VINCULANTE Nº 13
6 CARVALHO, José Murilo de. Mandonismo, Coronelismo, Clientelismo: uma discussão con-
ceitual. Dados – Revista de Ciências Sociais. Rio de Janeiro, v. 40, n. 2, 1997, p. 229 a 250, p. 229.
108 Adriana Inomata
senvolvimento da urbanização – que não resulta unicamente do crescimento das cidades, mas
também do crescimento dos meios de comunicação, atraindo vastar áreas rurais para a esfera
de influência das cidades – ia acarretar um desequilíbrio social, cujos efeitos permanecem
vivos ainda hoje. Não era fácil aos detentores das posições públicas de responsabilidade, for-
mados por tal ambiente, compreenderem a distinção fundamental entre domínios do privado
e do público. Assim eles se caracterizam justamente pelo que separa o funcionário “patrimo-
nial” do puro burocrata conforme a definição de Max Weber. Para o funcionário “patrimonial”,
a própria gestão política apresenta-se como assunto de seu interesse particular; as funções, os
empregos e os benefícios que deles aufere relacionam-se a direitos pessoais do funcionário e
não a interesses objetivos, como sucede o verdadeiro Estado burocrático, em que prevalecem
a especialização das funções e o esforço para se assegurarem garantias jurídicas aos cidadãos.
A escolha dos homens que irão exercer funções públicas faz-se de acordo com a confiança
pessoal que mereçam os candidatos, e muito menos de acordo com as suas capacidades pró-
prias. Falta a tudo a ordenação impessoal que caracteriza a vida no Estado burocrático. O fun-
cionalismo patrimonial pode, com a progressiva divisão das funções e com a racionalização,
adquirir traços burocráticos. Mas em sua essência ele é tanto mais diferente do burocrático,
quanto mais caracterizados estejam os dois tipos (HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do
Brasil. 26ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. p. 145-146)
15 Segundo Arno Wehling e Maria José Wehling, “tratando-se de uma sociedade de ordens, o
ofício era visto como uma dignidade atribuída pelo monarca a que correspondiam prestígio,
honras e privilégios, não apenas no nível mundano, mas com resultados sociais práticos. O
exercício do cargo público dava ao indivíduo uma concreta preeminência na sua comunidade
e perante os órgãos públicos. Assim, a ocupação pelo pai ou avô de um ofício real, mesmo
modesto, era considerado favor favorável ao ingresso em vários cargos. Constituía-se, dessa
forma, num elemento de ascensão social.” (WEHLING, Arno e WEHLING, Mari José. O fun-
cionário colonial entre a sociedade e o rei. In PRIORI, Mary del (org). Revisão do paraíso: os
brasileiros e o Estado em 500 anos de história. Rio de Janeiro: campus, 2000. p.143).
16 Pois “a ideia básica era a de que o cargo, com poucas exceções – remunerasse seu detentor, o
que o aproximava de um objeto de propriedade, como o direito de uso ou a enfiteuse” (Ibid., p.
144)
17 O ofício era um benefício do rei. Assim, o vínculo estabelecido reforçava os laços de clientela
e tornava a função pública um objeto de fidelidade pessoal ao monarca. A fidelidade pessoal
prevalecia sobre a noção de impessoalidade da administração pública moderna. (Ibid., p. 143)
NEPOTISMO: RAÍZES HITORICAS E ANÁLISE CRÍTICA DA RESOLUÇÃO Nº 7 DO CNJ E DA 111
SÚMULA VINCULANTE Nº 13
18 Idem.
19 Ibid, p. 159
20 CARVALHO, José Murilo de. Op. cit., p.233.
21 WEBER, Max. Economia e sociedade: fundamentos da sociologia compreensiva. Tradução de
Regis Barbosa e Karen Elsabe Barbosa. Brasília. Ed. UnB, 1999.
22 “A comunidade política conduz, comanda, supervisiona os negócios, como negócios privados
seus, na origem, como negócios públicos depois, em linhas que se demarcam gradualmente. O
súdito, a sociedade, se compreendem no âmbito de um aparelhamento a explorar, a manipular,
a tosquiar nos casos extremos. Dessa realidade se projeta (...) a forma de poder, instituciona-
lizada num tipo de domínio: o patrimonialismo, cuja legitimidade assenta no tradicionalismo
– assim é porque sempre foi.” FAORO, Raymundo. Os donos do poder. Formação do patronato
político brasileiro. 3ª ed. São Paulo: Globo, 2001, p. 819 (sem grifo no original)
112 Adriana Inomata
28 Sobre a concepção de Estado Social de Direito aqui utilizada, ver: NOVAIS, Jorge Reis. Con-
tributo para uma teoria do Estado de Direito. do Estado de Direito Liberal ao Estado Social e
democrático de Direito. Coimbra: Almedina, 2006.
29 SALGADO, Eneida Desiree. Abuso de Poder Político e Moralidade Administrativa na Legis-
lação Eleitoral. In: GUIMARÃES, Edgar (coordenador). Cenários do Direito Administrativo.
Estudos em Homenagem ao Professor Romeu Felipe Bacellar Filho. Belo Horizonte: Editora
Fórum, 2004, p. 227.
30 O uso do poder político para favorecimentos pessoais corresponde ao que Enrique Dussel
denomina de “Corrupção do político”, que significa, nas palavras o autor: “A corrupção origi-
nária do político, que denominaremos o fetichismo do poder, consiste em que o ator político (os
membros da comunidade política, sejam cidadãos ou representantes) acredita poder afirmar
sua própria subjetividade para a instituição em que cumpre alguma função (...) como a sede
ou a fonte do poder político. (...) Se os membros, por exemplo, crêem que exercem o poder a
partir de sua autoridade auto-referente (ou seja, para si próprios) seu poder foi corrompido.”
(DUSSEL, Enrique. 20 teses da política. Tradução de Rodrigo Rodrigues. São Paulo: Expressão
Popular, 2007, p. 16.)
31 ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 90.
NEPOTISMO: RAÍZES HITORICAS E ANÁLISE CRÍTICA DA RESOLUÇÃO Nº 7 DO CNJ E DA 117
SÚMULA VINCULANTE Nº 13
serão tratados aqui neste trabalho como conceitos fechados, cujos limi-
tes são pré-estabelecidos. Essa concepção corresponde mais ao que é
denominado teoria interna dos direitos fundamentais, a qual parte do
pressuposto de que os limites de um direito (princípio) são internos a
ele e por isso, in abstrato, é possível definir o conceito e os contornos
de um princípio. De outro modo, a teoria externa, proposta por Alexy,
entende que, em abstrato, só é possível falar de um conceito prima facie,
quando se trata de um princípio. Deste modo, os princípios da morali-
dade e da impessoalidade em abstrato, desvinculados de qualquer ca-
sos concreto, devem ser abordados de forma prima facie, ou seja, como
conceitos abertos que terão seus contornos definidos no caso concreto,
quando colidirem com outros princípios.32
O princípio da moralidade, posto ao lado da legalidade, significa
que não basta agir de acordo com a lei, é preciso que o ato seja moral
para ser válido, isso impõe, prima facie, um comportamento, tanto da
administração pública quanto do cidadão em relação à ela, de acordo
com a moral, os bons costumes, as regras da boa administração, os prin-
cípios da justiça, da equidade e da honestidade33. Não se trata de uma
moralidade subjetiva, mas de uma prescrição de um dever ético para
a administração pública. Como esclarece Romeu Felipe Bacellar Filho,
a moral administrativa não guarda estrita compatibilidade com a mo-
ral comum, “imposta ao homem para sua conduta interna”34. A moral
administrativa é a imposição de um dever ético à conduta externa do
agente, de um agir de acordo com a finalidade do bem comum35.
O princípio da impessoalidade, que é positivado no plano constitu-
cional pela primeira vez na Constituição de 1988, impõe, prima facie, dois
deveres: primeiro exige da Administração Pública um agir de acordo com
a finalidade pública proibindo o tratamento diferenciado. Isso significa
que “a Administração não pode atuar com vistas a prejudicar ou bene-
32 Ibid., p. 276-278.
33 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 22 ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 77.
34 BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. Princípios constitucionais do processo administrative disci-
plinar. São Paulo: Max Limonad, 1998, p. 179.
35 Idem.
118 Adriana Inomata
38 “Art. 10. No âmbito da jurisdição de cada Tribunal ou Juízo é vedada a nomeação ou designa-
ção, para os Cargos em Comissão e para as Funções Comissionadas de que trata o art. 9°, de
cônjuge, companheiro ou parente até o terceiro grau, inclusive, dos respectivos membros ou
juízes vinculados, salvo a de servidor ocupante de cargo de provimento efetivo das Carreiras
Judiciárias, caso em que a vedação é restrita à nomeação ou designação para servir junto ao
Magistrado determinante da incompatibilidade.”
39 “Art. 6o No âmbito da jurisdição de cada tribunal ou juízo é vedada a nomeação ou designa-
ção, para os cargos em comissão e funções comissionadas, de cônjuge, companheiro, parente
ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive, dos respectivos membros e ju-
ízes vinculados, salvo a de ocupante de cargo de provimento efetivo das Carreiras dos Quadros
de Pessoal do Poder Judiciário, caso em que a vedação é restrita à nomeação ou designação
para servir perante o magistrado determinante da incompatibilidade.”
40 “Art. 355, § 7º Salvo se funcionário efetivo do Tribunal, não poderá ser nomeado para cargo
em Comissão, ou designado para função gratificada, cônjuge ou parente (arts. 330 a 336 do
Código Civil*), em linha reta ou colateral, até terceiro grau, inclusive, de qualquer dos Minis-
tros em atividade.”
41 “Art. 357. Comporão os Gabinetes dos Ministros: I – até dois Assessores, bacharéis em Direito,
nomeados em Comissão, nos termos da lei e dos atos regulamentares do Tribunal; II1 – até
dois Assistentes Judiciários, escolhidos dentre servidores portadores de diploma de curso de
nível superior, um dos quais recrutado no Quadro da Secretaria do Tribunal; III – até seis
Auxiliares, da confiança do Ministro, cinco dos quais, no mínimo, serão recrutados dentre os
servidores do Tribunal. Parágrafo único. Não pode ser designado Assessor, Assistente Judici-
120 Adriana Inomata
ário ou Auxiliar, na forma deste artigo, cônjuge ou parente, em linha reta ou colateral, até o
terceiro grau, inclusive, de qualquer dos Ministros em atividade.”
42 “Art. 110. (...) IV - provimento dos cargos em comissão e funções de confiança por servidores
do quadro de pessoal, exceto quanto aos Gabinetes de Ministro, do Procurador-Geral e de
Auditor em relação a um Oficial de Gabinete e a um Assistente, que serão de livre escolha da
autoridade, obedecidos os requisitos legais e regimentais; (Redação dada pela Lei nº 9.165, de
1995)”
NEPOTISMO: RAÍZES HITORICAS E ANÁLISE CRÍTICA DA RESOLUÇÃO Nº 7 DO CNJ E DA 121
SÚMULA VINCULANTE Nº 13
A decisão aqui não se justifica, pois não é imposta por lei – re-
serva legal imposta pelo art. 37, I –, e não respeita a máxima da propor-
cionalidade. No entanto, foi anunciada como solução definitiva para o
problema do nepotismo.
Note-se ainda que a o Supremo Tribunal Federal, ao rechaçar a
presença de parentes nos cargos de direção, demonstra uma atuação
legislativa ainda mais enfática, ao fazer uma interpretação diversa do
Código Civil Brasileiro sobre o que seja parentesco, mantendo o enten-
dimento da Resolução nº 7 do CNJ.
O Código Civil nos artigos 1591 a 1595 trata das relações de
parentesco. 62 Parentesco é o vínculo que une uma pessoa a outras da
mesma família. Será considerado consanguíneo quando as pessoas são
unidas em razão de vínculo biológico, ou seja, laços de sangue, assim
também como os filhos por vínculo de adoção que, em virtude da Cons-
tituição de 1988, adquiriram mesmo patamar de filhos biológicos para
todos os efeitos legais. Será consanguíneo em linha reta quando se esta-
belecer uma linha de descendência entre as partes (avô, pai, filho, neto).
Não há limitação de grau neste tipo de parentesco. O parentesco será
consanguíneo em linha colateral quando as partes tiverem um mesmo
ancestral comum (irmãos, tio e sobrinho, primos). O Código civil con-
sidera parentes os colaterais até o quarto grau (primos).
O parentesco por afinidade é o que une os parentes de um cônju-
fundamentais não pode ser diminuída em nome de uma prevenção preconceituosa contra
indivíduos de conduta duvidosa , como sugeriu o deputado relator do projeto ficha limpa , ou
para salvar a políticados politicos…” (MEZZAROBA, Orides; STRAPAZZON, Carlos Luiz.
Moralismo político e restrições a direitos fundamentais. Revista Direitos Fundamentais & Jus-
tiça, PUC-RS, nº14 – jan./mar. 2011)
62 “Art. 1.591. São parentes em linha reta as pessoas que estão umas para com as outras na rela-
ção de ascendentes e descendentes.
Art. 1.592. São parentes em linha colateral ou transversal, até o quarto grau, as pessoas provenien-
tes de um só tronco, sem descenderem uma da outra.
Art. 1.593. O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consangüinidade ou outra origem.
Art. 1.594. Contam-se, na linha reta, os graus de parentesco pelo número de gerações, e, na cola-
teral, também pelo número delas, subindo de um dos parentes até ao ascendente comum, e
descendo até encontrar o outro parente.
Art. 1.595. Cada cônjuge ou companheiro é aliado aos parentes do outro pelo vínculo da afinidade.
§ 1o O parentesco por afinidade limita-se aos ascendentes, aos descendentes e aos irmãos do côn-
juge ou companheiro.
§ 2o Na linha reta, a afinidade não se extingue com a dissolução do casamento ou da união estável.”
NEPOTISMO: RAÍZES HITORICAS E ANÁLISE CRÍTICA DA RESOLUÇÃO Nº 7 DO CNJ E DA 129
SÚMULA VINCULANTE Nº 13
5. CONCLUSÕES
REFERÊNCIAS BIBLIGRÁFICAS
INTRODUÇÃO
10 Vale a referência de que para Gargarella, um modelo constitucional é um tipo ideal acerca
do modo de organizar a estrutura básica da sociedade. Assim, a constituição para o autor,
desempenha um papel fundamental, uma vez que é nela em que se escrevem os princípios
orientadores da sociedade (Ibidem, p.306).
11 GARGARELLA, 2003, p.305.
140 José Ribas Vieira, Fabiana de Almeida Maia Santos, Gabriel Lima Marques, Rafael Bezerra de
Souza, Sérgio Bocayuva Tavares de Oliveira Dias
12 Um exemplo que pode ser citado é o constante da constituição do Equador de 1843, onde o
legislativo era convocado somente uma vez a cada 4 anos, e onde se permitia ao executivo,
dentre outras coisas, suspender procedimentos judiciais. No mesmo sentido, pode-se aludir,
de igual modo, a lei fundamental do Peru de 1826, em que se consagrou Símon Bolívar tanto
como presidente vitalício quanto como irresponsável politicamente.
13 A ideia era a construção de uma cidadania que compartilhasse dos mesmos valores morais,
sobretudo religiosos. Um exemplo disso pode ser tomado da carta política do Equador de 1869
que condicionava direitos civis à adoção da fé católica.
14 Ibidem, 2003, pp.308-310.
15 Et seq. p.321.
16 O autor chama a atenção para o exemplo do General Artigas, que segundo ele, foi um dos
poucos que defendeu na América Latina, o modelo constitucional coletivo.
17 Ibidem. p.325.
IMPASSES E ALTERNATIVAS EM 200 ANOS DE CONSTITUCIONALISMO LATINO- 141
AMERICANO
18 Ibidem. p.326.
19 Ibidem. p.328.
20 GARGARELLA. R. 2011. Fragmento del Borrador del Libro “200 años de Constitucionalismo
en América Latina”. Caps. 5 e 6. Disponível em <http://seminariogargarella.blogspot.com.br/>.
Acesso em: 06/07/2013. pp. 1-32.
21 O discurso da desconfiança foi de suma importância no momento fundacional latino-ameri-
cano. Sustentado pelas elites, possuía os seguintes traços comuns: preocupação com a ordem
e a estabilidade política; temor frente à anarquia; prevenção à participação das maiorias na
política e crítica as abstrações das teorias estrangeiras, distantes da realidade (Ibidem. p.03).
142 José Ribas Vieira, Fabiana de Almeida Maia Santos, Gabriel Lima Marques, Rafael Bezerra de
Souza, Sérgio Bocayuva Tavares de Oliveira Dias
pela ONU, considerando que o reconhecimento da justiça indígena pode agregar valor à jus-
tiça ordinária na Bolívia, recuperando a sua credibilidade. Confira notícia em: <http://www2.
stf.jus.br/portalStfInternacional/cms/destaquesNewsletter.php?sigla=newsletterPortalInter-
nacionalNoticias&idConteudo=241480>.
51 VICIANO E DALMAU, 2011, pp. 319- 320.
52 VICIANO E DALMAU, 2011, pp. 318-319.
53 VICIANO E DALMAU, 2010b, pp. 11-12.
IMPASSES E ALTERNATIVAS EM 200 ANOS DE CONSTITUCIONALISMO LATINO- 149
AMERICANO
NOVO CONSTITUCIONALISMO
NEOCONSTITUCIONALIS-
LATINO-AMERICANO
MO
PONTOS DE APROXIMAÇÃO
- A constitucionalização do ordenamento jurídico;
- A rigidez constitucional;
- A força normativa dos princípios e a sua presença abundante nas consti-
tuições;
- Constituições analíticas/prolixas (busca da permanência da vontade do
constituinte, em face da necessidade de estabilidade institucional).
PONTOS DE TENSÃO
61 Idem, p. 08.
62 Ibidem, 2010, p. 09.
IMPASSES E ALTERNATIVAS EM 200 ANOS DE CONSTITUCIONALISMO LATINO- 153
AMERICANO
63 Sem embargo da discussão doutrinária sobre a imediata aplicação interna de Tratados de Di-
reitos Humanos após a ratificação, independentemente de qualquer decreto, com fundamento
no parágrafo 1º do art. 5° da Constituição.
64 YRIGOYEN, 2010, p. 17.
65 Ibidem, 2010, pp.18-19.
154 José Ribas Vieira, Fabiana de Almeida Maia Santos, Gabriel Lima Marques, Rafael Bezerra de
Souza, Sérgio Bocayuva Tavares de Oliveira Dias
CONCLUSÃO
BIBLIOGRAFIA
_________. 2011. Fragmento del Borrador del Libro “200 años de Consti-
tucionalismo en América Latina”. Caps. 5 e 6. Disponível em <http://se-
minariogargarella.blogspot.com.br/>. Acesso em: 06/07/2013. pp. 1-32.
O SIMBOLISMO NO JULGAMENTO
CONSTITUCIONAL: UMA ANÁLISE DO CASO
ELLWANGER
1. INTRODUÇÃO
5 C.f. crítica de Umberto Eco às inúmeras classificações à respeito do símbolo e do signo utili-
zadas pelas mais diversas ciências em ECO, Umberto. Semiótica e filosofia da linguagem. Trad.
Mariarosaria Fabris e José Luiz Fiorin. São Paulo: Ática, 1991.
6 Geertz apud FERNANDES, Gabriela da Silva Ramos. A relação entre poder político e sím-
bolos: uma questão de estratégia. Anais do XV encontro regional de história da Associação
Nacional de História. ANPUH: Rio de Janeiro, 2012, p. 3. Disponível em: <http://www.en-
contro2012.rj.anpuh.org/resources/anais/15/1338410115_ARQUIVO_TextoAnpuhparapu-
blicacao.pdf>. Acesso em 09 de junho de 2016.
7 Cf. sentido de latência nas obras de Psicanálise e Psicologia, para melhores aprofundamentos.
BOCK, Ana Maria Mercês Bahia. FURTADO, Odair. TEIXEIRA, Maria de Lourdes Trassi.
Psicologias: uma introdução ao estudo da psicologia. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 1999.
O SIMBOLISMO NO JULGAMENTO CONSTITUCIONAL: UMA ANÁLISE DO CASO 165
ELLWANGER
nos Estados Unidos, de 1920-1933. Ele demonstrou que a lei seca não
surge para garantir eficácia normativamente, nem para regular condutas
– efetivamente proibir a vende e uso de álcool – mas como proposta de
glorificação de um grupo em detrimento de outro. Ou seja, a afirmação
do valor do nativo protestante, contra o valor do grupo do imigrante
católico, que tinha o habito de beber álcool. O resultado foi o rótulo e a
separação dos dois grupos, acentuando suas diferenças, elemento forte
que permeou a visão que os nacionais americanos tinham do imigrante
até algumas décadas atrás.
Geralmente, tais casos podem ser observados em assuntos de
complexidade temática legislativa. No Brasil, percebemos tal fato, de
forma análoga, nas hermenêuticas das esferas religiosas e em seus corre-
lativos contrários nos temas das pautas complexas como: células tronco,
aborto, união homoafetiva, dentre outras16. É perceptível que o valor de
uma escolha como essa altera não só a conduta social, mas afeta direta-
mente o modo como os dogmas e a percepção identitária de grupos no
contexto coletivo: como glória ou padecimento valorativo perante a lei
e a sociedade.
A escolha, obviamente, gera efeitos no mundo jurídico, porém, a
discussão que o tema gera, e que a lei revela, está para além da legítima
regulação de expectativas.
16 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Distrito Federal. Procurador Geral da República e Pre-
sidente da República, Congresso Nacional. Acórdão n. ADI 3510. Relator: Min. Ayres Britto.
Tribunal Pleno. Data da decisão: 29/05/2008. Disponível em: < http://redir.stf.jus.br/pagina-
dorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=611723> Acesso em 26 de junho de 2016; BRA-
SIL. Supremo Tribunal Federal. Distrito Federal. Confederação Nacional dos Trabalhadores na
saúde- CNTS e Presidente da República. Acórdão n. ADPF 54. Relator: Min. Marco Aurélio.
Tribunal Pleno. Data da decisão: 12/04/2012. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/pagina-
dorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=3707334> Acesso em 26 de junho de 2016. BRA-
SIL; Supremo Tribunal Federal. Estado do Rio de Janeiro. Governador do Estado do Rio de
Janeiro. Acórdão n. ADPF 132. Relator: Min. Ayres Britto. Tribunal Pleno. Data da decisão:
05/05/2011. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=A-
C&docID=628633> Acesso em 26 de junho de 2016.
O SIMBOLISMO NO JULGAMENTO CONSTITUCIONAL: UMA ANÁLISE DO CASO 169
ELLWANGER
19 Cf. verbete Repercussão Geral in BRASIL. Glossário Jurídico do Supremo Tribunal Federal.
Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/glossario/verVerbete.asp?letra=R&id=451>.
Acesso em: 06 de julho de 2016.
20 Optamos, em todas as citações relativas ao HC 82.242/RS, em referenciar o número de página
como a página do arquivo eletrônico (PDF) disponível no sítio do STF, conforme link infor-
mado. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Rio Grande do Sul. Habeas Corpus n.82.424/RS.
Relator: Min. Maurício Correa. Tribunal Pleno. Data da decisão: 17/09/2003. Disponível em:
<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=79052>. Acesso em
27 de maio de 2016.
21 PINHEIRO, Douglas Antonio Rocha.As margens do caso Ellwanger: visão conspiracionista da
História, ecos tardios do integralismo e judicialização do passado.2013. 281 fl.Tese (Doutorado
em Direito) - Faculdade de Direito, Universidade de Brasilia, Brasília. Disponível em: <repo-
sitorio.unb.br/bitstream/10482/13810/1/2013_DouglasAnt%C3%B4nioRochaPinheiro.pdf>
Acesso em 26 de fevereiro de 2017.
172 Felipe Magalhães Bambirra, Carolina Meire de Faria
22 BRASIL. Estado do Rio Grande do Sul. Oitava Vara Criminal de Porto Alegre. Autos do pro-
cesso crime comum n. 01391013255/5947. Autor: Ministério Público Estadual. Réu: Siegfried
Ellwanger. Porto Alegre, 1991, in: PINHEIRO, Às margens do caso Ellwanger... cit., p. 2-3.
23 BRASIL. Lei n. 7.716 de 05 de janeiro de 1989. Define os crimes resultantes de preconceito
de raça ou cor. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7716.htm>. Acesso
em: 27 de junho de 2016.
O SIMBOLISMO NO JULGAMENTO CONSTITUCIONAL: UMA ANÁLISE DO CASO 173
ELLWANGER
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
simbólico, vivo, que norteia as relações sociais. Isto não significa, por
outro lado, que o Direito possa prescindir de seu código próprio, de
seus procedimentos, do conteúdo fático levado à análise, sob pena de
infringência a este mesmo Código e seu enfraquecimento, levando, em
casos extremos, até mesmo a sua corrupção, invadido pela moral, pela
economia, enfim, por discursos de outros sistemas sociais, sem que se-
jam adequadamente recepcionados, integrados pelo Direito.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
n. ADI 3510. Relator: Min. Ayres Britto. Tribunal Pleno. Data da deci-
são: 29/05/2008. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/
paginador.jsp?docTP=AC&docID=611723> Acesso em 26 de junho de
2016.
ponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pi-
d=S1414-98932001000300008>. Acesso em 09 de abril de 2016.
JUNG, Carl G. O homem e seus símbolos. Trad. Maria Lúcia Pinho. 4. ed.
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1964
LIMA VAZ, Henrique Cláudio de. Ética & Direito. São Paulo: Loyola,
2002.
1. Nota de abertura
2. Introdução
11 FUNARI, Pedro Paulo. A cidadania entre os romanos. In.: PINSKY, Jaime; PINSKY, Carla
Bassanezi (Orgs.). História da cidadania. São Paulo: Contexto, 2003, p 76.
12 BERTASO, Op. Cit., p. 24-25.
13 Conforme Guarinello “o fechamento da cidade-estado implicava, necessariamente, a defini-
ção do outro e sua exclusão. E o outro não era apenas o estrangeiro, mas muitos dos habitantes
do próprio território das cidades-estado. Eles participavam da sociedade com seu trabalho
e recursos, mas não se integravam ao conjunto de cidadãos. Este é um ponto crucial, cuja
importância aumentou com o crescimento de várias cidades-estado, por expansão econômica
ou militar. Muitas delas, sobretudo as maiores e mais poderosas, como Atenas, Esparta ou
Roma, abrigavam vasta população não-cidadã, completamente excluída do corpo de cidadãos”.
GUARINELLO, Norberto Luiz. Cidades-Estado na Antigüidade Clássica. In. PINSKY, Jaime;
PINSKY, Carla Bassanezi (Orgs.). História da cidadania. São Paulo: Contexto, 2003, p. 35.
14 BERTASO, Op. cit., p. 32.
Concepções de Cidadania e tensões contemporâneas entre o público e o privado: uma introdução à 193
temática
15 Ibid., p. 33.
194 Fernanda Busanello Ferreira
16 BERTASO, João Martins. A cidadania moderna: a leitura de uma transformação. In. Arno Dal
Ri Junior; Odete Maria de Oliveira (org.). Cidadania e nacionalidade: efeitos e perspectives:
nacionais regionais-globais. Ijuí: UNIJUÍ, 2002, p. 406.
17 Ibid., p. 420.
Concepções de Cidadania e tensões contemporâneas entre o público e o privado: uma introdução à 195
temática
23 Ibid., p. 423.
Concepções de Cidadania e tensões contemporâneas entre o público e o privado: uma introdução à 197
temática
24 PINSKY, Jaime; PINSKY, Carla Bassanezi (Orgs.). História da cidadania. São Paulo: Contexto,
2003, p. 10.
25 GUARINELLO, Op. Cit., p. 29. Complementa Guarinello que “a cidadania nos Estados-nacio-
nais contemporâneos é um fenômeno único na História. Não podemos falar de continuidade
do mundo antigo, de repetição de uma experiência passada enem mesmo de um desenvol-
vimento progressivo que unisse o mundo contemporâneo ao antigo. São mundos diferentes,
sociedades distintas, nas quais pertencimento, participação e direitos têm sentidos diversos”.
Id.
26 ANDRADE, Vera Regina Pereira de. Cidadania: do direito aos direitos humanos. São Paulo:
Ed. Acadêmica, 1993, p. 18.
27 Ibid., p. 28.
28 VIEIRA, Op. Cit., p. 221.
198 Fernanda Busanello Ferreira
32 BAMBIRRA, Felipe Magalhães. O Sistema Universal de Proteção dos Direitos Humanos e Fun-
damentais. Belo Horizonte: Faculdade de Direito da UFMG, 2014, Tese (Doutorado em Direi-
to).
33 VIEIRA, Liszt. Op. Cit., p. 236.
34 Ibid., p. 240.
35 Id.
200 Fernanda Busanello Ferreira
38 Ibid., p. 37
39 Id.
40 ANDRADE, Vera Regina Pereira de. Op. Cit., p. 95.
41 Ibid., p. 111.
Concepções de Cidadania e tensões contemporâneas entre o público e o privado: uma introdução à 203
temática
45 SARMENTO, Daniel; NETO, Cláudio Pereira de Souza. Direito Constitucional: teoria, história
e métodos de trabalho. Belo Horizonte: Fórum, 2012, p. 248.
46 Id.
Concepções de Cidadania e tensões contemporâneas entre o público e o privado: uma introdução à 205
temática
49 Id.
50 Ibid., p. 257.
Concepções de Cidadania e tensões contemporâneas entre o público e o privado: uma introdução à 207
temática
57 BERTASO, João Martins. Os direitos humanos como política da cidadania. In. Direitos Cultu-
rais: revista do programa de pós-graduação em Direito. EDIURI: Santo Ângelo, v. 1, n. 1. (dez
2006), 2007, p. 11-26, p. 12.
58 VIEIRA, Liszt. Op. Cit., p. 222.
59 Id.
60 Id.
61 Ibid., p. 253.
210 Fernanda Busanello Ferreira
62 Ibid., p. 260.
63 GUARINELLO, p. 46.
Concepções de Cidadania e tensões contemporâneas entre o público e o privado: uma introdução à 211
temática
64 HABERMAS, Jürgen. Mudança estrutural da esfera pública: investigações quanto a uma cate-
goria da sociedade burguesa. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 15.
212 Fernanda Busanello Ferreira
existência, pois a polis dá a cada indivíduo, além de sua vida privada, uma
espécie de segunda vida, sua bios-politicós. Era a distinção entre a esfera
privada e a esfera pública” 65. Contudo, apenas alguns cidadãos eram tam-
bém cidadão políticos, a grande maioria era destituída de qualquer direito
de participação na vida pública, política. Trata-se, contudo, do nascimen-
to da distinção público e privada. A dimensão da casa era de índole pri-
vada, já a vida política era exercida no âmbito da Ágora, espaço público
por excelência. Foi nesse cenário que emergiu o também cidadão da an-
tiguidade grega em oposição aos não-cidadãos, os quais não possuíam o
direito de participar no espaço público, do qual foram alijados.
Convém frisar que a esfera política, pública, era considerada a
única esfera em que a liberdade se realizava de fato no mundo antigo
grego e segundo Hannah Arendt:
65 FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão e domi-
nação. São Paulo: Atlas, 2003, p. 23.
66 ARENDT, Hannah. A condição humana. Trad. Roberto Raposo. 10 ed. Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 2007, p. 43.
Concepções de Cidadania e tensões contemporâneas entre o público e o privado: uma introdução à 213
temática
80 SANTOS, Boaventura de Sousa. Para um novo senso comum: a ciência, o direito e a política na
transição paradigmática. São Paulo: Cortez, 2002, p. 299.
81 SANTOS, Boaventura de Sousa. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade.
São Paulo: Cortez, 1997, p. 271.
82 TEIXEIRA, Elenaldo. O local e o global: limites e desafios da participação cidadã. São Paulo:
Cortez, 2001, p. 52.
218 Fernanda Busanello Ferreira
Por fim, o que está dito nas entrelinhas deste texto: o desafio ao
direito é enorme diante da nova sociedade e do devir-cidadania global,
sobretudo porque o direito contemporâneo ainda patina sob os pressu-
postos do Estado-Nacional. Ainda se estuda e aplica a extradição, ainda
se vota apenas nas fronteiras políticas, ainda depende-se das decisões
tomadas pelos governantes e as Constituições seguem legitimando a ex-
clusão “dos estranhos”.
Embora, de uma forma geral, os governados não têm vez nem voz
nos processos decisórios, diante da ameaça global devem dar as mãos
e reivindicar a abertura de espaços para que participem das decisões,
atuando assim na construção do futuro, escolhendo conjuntamente os
valores que desejam preservar e os riscos que querem correr. Estes são
os prováveis encaminhamentos das tensões entre o público e privado
na sociedade contemporânea, em que o cidadão deverá cada vez mais
participar das microquestões e ao Estado caberá deslocar sua soberania
para dialogar numa lógica transnacional.
6. Considerações Finais
7. Referências
INTRODUÇÃO
vida política. Já os que não eram cidadãos faziam parte de uma maioria,
composta por estrangeiros, escravos e povos submetidos. Iremos neste
artigo dar a devida atenção para o conceito moderno de cidadania. Ao
pretendermos conceituar a cidadania, devemos destacar uma particula-
ridade que o termo possui. Por ser ligado aos direitos que foram alcan-
çados pela luta da classe burguesa, que será tratado a seguir, o termo se
encontra em conjunto com os direitos humanos, políticos e civis.
A cidadania moderna nasce com a burguesia, que como a nova
classe emergente da época, composta por comerciantes, não se viam fa-
vorecidos com o sistema feudal e tinham em mente um novo projeto so-
cial a favor de acabar com um sistema servil e desigual que o feudalismo
exercia. Conforme Darcísio Côrrea5, “o Projeto de cidadania burguesa
do século XVIII surge sob a forma de direitos civis”, portanto, esse pro-
jeto acaba se vinculando à noção dos direitos humanos, principalmente
à questão da liberdade do comércio e do trabalho e também de uma
“igualdade humana básica da participação na sociedade, concretizada
através da aquisição de direitos”6. Assim começa a se notar a incompati-
bilidade do sistema feudal com a nova proposta burguesa no momento
em que os direitos do cidadão começam a ser expostos e assim rejeitan-
do a situação do sistema feudal existente.
Com o fim do sistema feudal, e assim, com a aquisição da cidada-
nia e dos direitos civis por toda a parte integrante de uma comunidade,
podia perceber uma nova desigualdade nascendo, a desigualdade do
sistema capitalista, que agora causava uma disparidade econômica entre
os homens. Marshall esclarece que apesar do sistema capitalista causar
uma disparidade econômica entre os membros de uma sociedade, a ci-
dadania e seu conjunto de direitos que carregava foi capaz de manter o
sistema capitalista, de uma forma que:
20 Ibid., p. 96.
A Cidadania na América Latina: um olhar para as novas práticas emancipatórias 237
26 Ibid., p. 10.
27 Wolkmer, p. 209.
A Cidadania na América Latina: um olhar para as novas práticas emancipatórias 239
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
1. INTRODUÇÃO.
2 A edição utilizada para redação deste ensaio foi a da L&P Editores S/A, 6ª edição, 1996.
A TOMADA DE CONSCIÊNCIA DAS VÍTIMAS NA AMÉRICA LATINA: DO DESCOBRIMENTO 247
AO NEOLIBERALISMO
3 Teólogo tomista e professor de Direito da Universidade de Salamanca e que foi um dos juízes
escolhidos para julgar a questão proposta por Lãs Casas.
248 Safira Orçatto Merelles do Prado
4 Op. cit., p. 22
A TOMADA DE CONSCIÊNCIA DAS VÍTIMAS NA AMÉRICA LATINA: DO DESCOBRIMENTO 249
AO NEOLIBERALISMO
11 Em que pese muitos fatos de sua biografia serem contestados pelo escritor norte- americano
David Stoll em seu livro “Rigoberta Menchú e a história de todos os pobres da Guatemala”.
12 Ibidem, p. 421.
13 Idem.
252 Safira Orçatto Merelles do Prado
14 Entretanto, nesta época o capitalismo intervencionista estava no auge (ao menos nos países
de primeiro mundo, em que efetivamente foi implementado o Estado de Bem-Estar Social.
Por isso é que as idéias de Hayek não pareciam muito verossímeis. Ele defendia que o novo
igualitarismo deste período, promovido pelo Estado de Bem-Estar destruía a liberdade dos
cidadãos e a vitalidade da concorrência, da qual dependia a prosperidade de todos. Enfim, a
desigualdade era necessária. ANDERSON, Perry. Balanço do Neoliberalismo. In: _______, et
al. Pós-neoliberalismo: as políticas sociais e o Estado democrático. São Paulo: Paz e Terra, 1998.
p.10.
15 HAYEK, Friederich A. Direito, Legislação e Liberdade: uma nova formulação dos princípios
liberais de justiça e economia política. A miragem da justiça social. São Paulo: Visãok, 1985.
v.2, p.3.
16 FUKUYAMA, Francis. O fim da história e o último homem. Lisboa: Gradiva, 1992. p.15
A TOMADA DE CONSCIÊNCIA DAS VÍTIMAS NA AMÉRICA LATINA: DO DESCOBRIMENTO 253
AO NEOLIBERALISMO
19 Microfísica do poder. Organização e tradução de Roberto Machado. 11ª ed. Rio de Janeiro:
Edições Graal. 1993, p.149-150.
20 Ibidem, p. 179-180.
21 Ao mesmo tempo que somos obrigados pelo poder a produzir a verdade, “estamos submeti-
dos à verdade também no sentido de que ela é lei e produz o discurso verdadeiro que decide,
transmite e reproduz (...) efeitos de poder. Afinal, somos julgados, condenados, classificados,
obrigados a desempenhar tarefas e destinados a um certo modo de viver ou morrer em função
dos discursos verdadeiros que trazem consigo efeitos específicos de poder. FOUCAULT, op.
cit.. p. 180.
22 Op. cit., p. 504.
A TOMADA DE CONSCIÊNCIA DAS VÍTIMAS NA AMÉRICA LATINA: DO DESCOBRIMENTO 255
AO NEOLIBERALISMO
3. CONCLUSÕES.
23 MURARO, Mariel; SANTOS, Luasses Gonçalves dos. Uma visão de Marx a partir da filosofia
da Libertação de Enrique Dussel. In : http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=204da-
255aea2cd4a [acesso em 03/11/2016], p. 15
256 Safira Orçatto Merelles do Prado
4. BIBLIOGRAFIA.
SOUZA FILHO, Carlos Frederico Marés de. O Renascer dos Povos Indí-
genas para o Direito. Curitiba: Juruá, 1998.
259
Marilson Santana1
7 DWORKIN, R. O império do Direito. Trad. Jeferson Luiz Camarco. São Paulo: Martins Fontes,
1999.
264 Marilson Santana
13 Não houve tempo de inserir aqui a discussão em torno dos votos do Ministro do Relator Celso
Peluso e do voto divergente da Ministra Rosa Weber.
14 WERNECK VIANNA. Op. Cit., p.23.
15 HONNETH, A. Luta por reconhecimento: a gramática moral dos conflitos sociais. Editora 34:
São Paulo, 2003.
O direito dos quilombolas, etnicidade e o constitucionalismo em um estado democrático de direito 267
19 Idem, p.196.
20 KYMLICKA, W. Multicultural Citzenship. New York: Oxford Univerity Press, 1995.
21 Idem, p.121.
O direito dos quilombolas, etnicidade e o constitucionalismo em um estado democrático de direito 269
22 HABERMAS, J. A inclusão do outro – estudos de teoria política. São Paulo: Edições Loyola,
2002. p. 249.
23 CARDOSO DE OLIVEIRA, L.R. Direito Legal e insulto moral: dilemas da cidadania no Brasil,
Quebec e EUA. Rio de Janeiro: Relume Dumará/ Núcleo de Antropologia Política, 2002.
270 Marilson Santana
24 Idem, p.67.
25 ROSENFELD, M. A identidade do sujeito constitucional. Trad. Menelick de Carvalho Netto.
Belo Horizonte. Mandamentos, 2003.
26 HABERMAS. A inclusão Op. Cit., p. 326-336.
27 Idem.
28 Ibidem, p. 229.
29 Ibidem, p. 234.
O direito dos quilombolas, etnicidade e o constitucionalismo em um estado democrático de direito 271
peito aos “contextos de vida” dos quais se originam, sem perder de vista
a possibilidade de universalização de direitos individuais30. Assim, esse
autor, assim como Kymlycka31 (1995), diferencia as lutas de movimentos
sociais, como o feminismo, da luta de minorias. E distingue entre essas
minorias, as nacionais das minorias étnicas (e aqui se pode situar os
quilombos distantes das populações indígenas), mas dispõe todas no
universo da luta política por reconhecimento32. Para ele, torna-se pro-
blemático, contudo, a adequação dessa demanda de identidades cole-
tivas com direitos coletivos, pois a estrutura do direito, na perspectiva
democrática é individualista.
Com referência aos grupos étnicos que se formam a partir de
uma eticidade coletiva, tal estrutura não pode ser garantida com a
existência de direitos coletivos no sentido do Estado-Social, nem pode
se fechar na redoma individualista do liberalismo, mas deve se conver-
ter em uma estrutura de direito individual que paradoxalmente garan-
ta a possibilidade de exercício de um modo de viver e fazer coletivo.
Habermas reconstrói a possibilidade de exercício de direitos coletivos
ainda que de maneira temporária33 e é neste sentido que se pretende
verificar a dimensão do direito dos quilombos enquanto grupos étni-
cos não só nessa perspectiva de horizonte teórico, mas no âmbito da
análise de processos administrativos e judiciais que dizem respeito a
titulação das terras.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
30 Ibidem, p. 238.
31 KYMLICKA, W. Op. Cit.
32 HABERMAS, A inclusão Op. Cit., p. 38.
33 Idem, p. 250.
272 Marilson Santana
REIS, J.J e GOMES, F.S. Liberdade por um fio. História dos quilombos
no Brasil. São Paulo: Cia das Letras, 1996.