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CIÊNCIAS POLÍTICAS
As relações que se estabelecem entre sociedade civil e
Estado definem o potencial democrático de cada país.
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Todavia, não são relações de fácil compreensão, pois
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traz informações para a compreensão dos fenômenos
políticos e destina-se tanto a pesquisadores e estudiosos
do tema quanto a entusiastas da política.
Alexandra Lourenço
Alexandra Lourenço
IESDE BRASIL
2020
© 2020 – IESDE BRASIL S/A.
É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito da autora e do
detentor dos direitos autorais.
Projeto de capa: IESDE BRASIL S/A. Imagem da capa: Nataliya Nazarova/Shutterstock.
Lourenço, Alexandra
Ciências políticas / Alexandra Lourenço. - 1. ed. - Curitiba : IESDE,
2020.
142 p. : il.
Inclui bibliografia
ISBN 978-85-387-6575-2
3 O Estado Moderno 49
3.1 Nascimento e extinção do Estado 49
3.2 Finalidade e funções do Estado 55
3.3 Elementos do Estado: território, povo e poder 61
4 Estado e governo 68
4.1 Regimes de governo 68
4.2 Modelos de Estado 76
4.3 Formas e sistemas de governo 83
Gabarito 136
APRESENTAÇÃO
Nossas escolhas afetam cotidianamente nossas vidas. Essa afirmação é
ampliada quando pensamos em nossas ações como profissionais, cidadãos
e eleitores. Por isso, é fundamental que tenhamos alguns instrumentos
teóricos que nos permitam fazer a leitura da realidade política e social na
qual estamos inseridos.
Vivemos em sociedades que se organizam com base na constituição de
Estados e governos. Um grupo seleto de indivíduos é escolhido para ocupar
as posições que dão vida à governança e tomar decisões que influenciam
diretamente a vida da população de cada país.
As ações dos Estados são implementadas por meio das políticas públicas
e direcionadas à educação, saúde, moradia, economia, segurança etc. Elas
são o resultado das escolhas dos indivíduos que ocupam posições de decisão
política, motivados pelos grupos de pressão e de interesse.
Dessa forma, as relações que se estabelecem entre sociedade civil e Estado
definirão o potencial democrático de cada país. Todavia, não são relações de
fácil compreensão, pois são permeadas por questões importantes e complexas,
como o acesso desigual às condições de participação na sociedade, economia
e política.
Este livro apresenta teorias e conceitos que poderão ser utilizados para
melhor compreender essa realidade. Para organizar nossa discussão a
respeito do Estado, o conteúdo está dividido em seis capítulos.
No primeiro capítulo, serão apresentados alguns conceitos básicos da
ciência política, que auxiliarão na compreensão do nascimento do Estado e de
suas formas organizacionais. No segundo capítulo, abordaremos os variados
modelos de sociedades políticas e de Estados ao longo da história.
No terceiro capítulo, compreenderemos como nascem e como são extintos
os Estados, suas funções e seus elementos característicos. Já no quarto
capítulo, trataremos dos regimes, das formas e dos sistemas de governo,
buscando refletir sobre sua aplicação nos modelos de Estados.
No quinto capítulo, será abordada a importância da moderação do poder
para o Estado de Direito e para o funcionamento dos regimes democráticos.
No sexto e último capítulo, analisaremos a pertinência dos sistemas partidários
e eleitorais, bem como a participação da sociedade civil na configuração dos
modelos democráticos.
Em suma, esta obra traz informações para a compreensão dos fenômenos
políticos e destina-se tanto a pesquisadores e estudiosos do tema quanto a
entusiastas da política.
Bons estudos e uma ótima leitura!
1
Conceitos básicos da
ciência política
Neste capítulo, apresentaremos alguns conceitos importantes
para se compreender o que é ciência política e como ela pode
nos auxiliar na compreensão da política. Discutiremos questões
como a participação da sociedade no governo, os formatos que
os governos adquirem, a organização civil para participação na
política, a busca da representatividade, a necessidade da existência
de uma ordem política.
Abordaremos também o contexto do advento dessa ciência e o
lugar que ocupa em uma reflexão mais ampla, que chamamos de
pensamento político. Finalizaremos com a apresentação do autor
Nicolau Maquiavel, considerado por muitos o primeiro cientista
político antes mesmo do surgimento da ciência política.
Essa compreensão da política, além de importante para a
cidadania, pode ser muito empolgante para o pesquisador e
estudioso do tema, por isso, convidamos você para os primeiros
passos dessa trajetória de conhecimento sobre a ciência política e
suas contribuições.
O filósofo grego, que viveu entre 384 a.C. e 322 d.C., discutia diver-
sos temas relativos à vida na cidade, dentre eles a ética e a política.
Na obra Política, Aristóteles (2009) defendeu a ideia de que o homem
é naturalmente um ser social e político. Segundo ele, os homens ne-
cessitam viver em sociedades, precisam estabelecer relações uns com
os outros para realizarem objetivos comuns. Nesse convívio, além das
relações sociais e econômicas, os homens constroem relações políticas
e organizam formas de governo.
10 Ciências Políticas
1.1.2 Filosofia política
O que é filosofia política ou filosofia da política? Responder a essa
pergunta não é uma tarefa fácil, pois existe uma grande variedade de
opiniões, mas vamos nos basear em um caminho traçado pela história
do pensamento político que observou quais são os aspectos valoriza-
dos na reflexão filosófica sobre o “mundo da política”.
12 Ciências Políticas
O quarto aspecto afirma que a filosofia política nos fornece a refle-
xão sobre a metodologia para os estudos sobre o tema. Ou seja, ela
deve ser compreendida como metodologia ou, ainda, como uma análi-
se crítica sobre os discursos dos atores políticos.
14 Ciências Políticas
Ao elaborar um dicionário de termos políticos, Bobbio, Matteucci e
Pasquino (1998) salientaram a dificuldade em estipular definições rígidas
para a linguagem política, afinal essa é uma construção histórica e os
termos vão se ressignificando com as transições de gerações e os pro-
cessos históricos vivenciados pelas sociedades humanas. Segundo eles:
A maior parte dos termos usados no discurso político tem signi-
ficados diversos. Esta variedade depende [...] de muitos termos
terem passado por longa série de mutações históricas – alguns
termos fundamentais, tais como “democracia”, “aristocracia”,
“déspota” e “política”, foram-nos legados por escritores gregos.
[...] Na linguagem da luta política quotidiana, palavras que são
técnicas desde a origem ou desde tempos imemoriais, como “oli-
garquia”, “tirania”, “ditadura” e “democracia”, são usadas como
termos da linguagem comum e por isso de modo não unívoco.
Palavras com sentido mais propriamente técnico, como são
todos os “ismos” em que é rica a linguagem política – “socialis-
mo”, “comunismo”, “fascismo”, peronismo”, “marxismo”, “leni-
nismo”, stalinismo” etc. –, indicam fenômenos históricos tão
complexos e elaborações doutrinais tão controvertidas que não
deixam de ser suscetíveis das mais diferentes interpretações.
(BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO, 1998, p. V)
Figura 1 Partidos
Inter-relações entre Estado políticos
e elementos
Poder e sua
Teorias sobre
relação com o
a política
Direito
Modelos de
Burocracia
Estado
Instituições Instituições
políticas políticas
Estado
16 Ciências Políticas
1.2.1 Partidos políticos
Os partidos podem ser definidos como formas de associação da
sociedade civil nas quais indivíduos que partilham de uma mesma
ideologia se organizam formalmente para disputar o espaço político.
Os partidos se desenvolveram na Europa e nos Estados Unidos no
século XIX. Para falarmos em partidos, no plural, é necessário que exis-
tam diferenças ideológicas entre eles. Com a Revolução Industrial, a
burguesia buscou se organizar politicamente e, posteriormente, com o
aumento da classe operária, surgiram, já ao final do século XIX, os par-
tidos de massa representando os trabalhadores. Anteriormente, havia
somente partidos de quadros ou, mais precisamente, partidos das eli-
tes (aristocratas e burgueses).
Na Inglaterra, o país de mais antigas tradições parlamentares, os
2 2
partidos aparecem com o Reform Act de 1832 , o qual, amplian-
do o sufrágio, permitiu que as camadas industriais e comerciais Lei de Reforma de 1832, que
modificou o sistema eleitoral na
do país participassem, juntamente com a aristocracia, na gestão
Inglaterra.
dos negócios públicos. Antes dessa data, não se pode falar pro-
priamente de Partidos políticos na Inglaterra. Os dois grandes
partidos da aristocracia, surgidos no século XVIII e desde então
presentes no Parlamento, não tinham, fora disso, nenhuma rele-
vância nem algum tipo de organização. Tratava-se de simples eti-
quetas atrás das quais estavam os representantes de um grupo
homogêneo, não dividido por conflitos de interesses ou por di-
ferenças ideológicas substanciais, que aderiam a um ou a outro
grupo, sobretudo por tradições locais ou familiares. (BOBBIO;
MATTEUCCI; PASQUINO, 1998, p. 899, grifo do original)
1.2.2 Burocracia
Como outros conceitos da ciência política, o termo burocracia tam-
bém não tem uma única definição, pois passou por transformações ao
longo de décadas de teorização. De modo amplo, podemos dizer que o
termo assinala a existência de um corpo de funcionários da administra-
ção pública que têm suas funções e territórios de competência regidos
formalmente, são treinados e selecionados pelo critério de especializa-
ção e se encontram em relações hierárquicas.
18 Ciências Políticas
Sendo assim, o espaço político será o local em que ocorre o mo-
vimento dos partidos políticos na busca por conquistar os votos dos
eleitores nas democracias contemporâneas.
20 Ciências Políticas
métodos científicos. Nesse mesmo século, a Revolução Industrial es-
tava em processo e o culminar da Revolução Francesa, que buscava
encerrar o Antigo Regime, criaram em conjunto um novo modelo de
organização política, jurídica, econômica, social e cultural que conhece-
mos como modernidade.
22 Ciências Políticas
menos em parte, e na sua inspiração fundamental, também no
sentido limitado e técnico da palavra, algumas obras clássicas,
como as de Aristóteles, Maquiavel, Montesquieu, Tocqueville,
enquanto elas tendem à formulação de tipologias, de gene-
ralizações, de teorias gerais, de leis, relativas aos fenômenos
políticos, fundamentadas, porém, no estudo da história, ou seja,
apoiando-se na análise dos fatos.
24 Ciências Políticas
1.3.1 Conquistar e manter o poder de governar
Por que era importante manter o poder? Qual era o contexto no
qual Maquiavel vivia? Nascido no dia 3 de maio de 1469, em uma Itá-
lia formada por vários pequenos Estados, com regimes políticos, de-
senvolvimento econômico e cultura variados, a disputa pelo poder era
constante. Para Sadek (2002, p. 14), “tratava-se, a rigor, de um verdadei-
ro mosaico, sujeito a conflitos contínuos e alvos de constantes invasões
por parte de estrangeiros”. A partir do final do século XV, a Península
Ibérica passou a vivenciar mais incisivamente as invasões e disputas
pelo poder em curto espaço de tempo.
Até 1494, graças aos esforços de Lourenço, o Magnífico, a penínsu-
la experimentou uma certa tranquilidade. Cinco grandes Estados
dominavam o mapa político: ao sul, o reino de Nápolis, nas mãos
dos Aragão; no centro, os Estados papais controlados pela Igreja e
a república de Florença, presidida pelos Médici; ao norte, o ducado
de Milão e a república de Veneza. (SADEK, 2002, p. 14-15)
26 Ciências Políticas
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste capítulo, buscamos apresentar a ciência política e alguns con-
ceitos relacionados a ela. Considerando que em toda sociedade existe
uma organização política, é fundamental que possamos compreender o
funcionamento do espaço político.
O estudo da ciência política nos fornecerá as ferramentas para essa
compreensão e nos permitirá uma leitura crítica das relações de poder
que se estabelecem entre sociedade e Estado. Por isso, continuaremos
nossa discussão sobre o surgimento e a consolidação do Estado Moderno
no próximo capítulo.
REFERÊNCIAS
ARISTÓTELES. Política. Trad. de António de Castro Caeiro. São Paulo: Atlas, 2009.
BOBBIO, N.; MATTEUCCI, N.; PASQUINO, G. Dicionário de política. 11. ed. Brasília: Editora
UnB, 1998.
KONDER, L. Ideologia e política. Revista USP, São Paulo, n. 49, p. 24-29, mar./maio 2001.
Disponível em: http://www.revistas.usp.br/revusp/article/view/32905/35475. Acesso em:
21 out. 2019.
LOURENÇO, A. O recrutamento das elites políticas no Brasil: o caso de Mato Grosso, 1945-
2007. Lisboa, 2011. Tese (Doutorado em Ciência Política) – Setor de Ciências Sociais,
Universidade Nova de Lisboa.
MAQUIAVEL, N. O príncipe. São Paulo: Martins Fontes, 1990.
PLATÃO. A República. Trad. de Carlos Alberto Nunes. 2. ed. Belém: Edufpa, 1988.
SADEK, M. T. Nicolau Maquiavel: o cidadão sem fortuna, o intelectual de virtú. In: WEFFORT,
F. C. Os clássicos da política. São Paulo: Ática, 2002. v. 1.
WEBER, M. Economia e sociedade. Brasília: Editora UnB, 1999. v. 2.
WEFFORT, F. C. Os clássicos da política. São Paulo: Ática, 2002. v. 1.
28 Ciências Políticas
2
O Estado e o pensamento
político
Este capítulo tem por objetivo identificar os tipos de
sociedade política e de Estado ao longo da história, bem como os
pensamentos políticos em épocas passadas a fim de compreender
os Estados existentes na atualidade. Vivemos sob a organização
política de um Estado, e as ações colocadas em prática por aqueles
que governam afetam cotidianamente nossas vidas. Por isso, é
fundamental compreender como e por que aceitamos viver sob
esse modelo.
30 Ciências Políticas
Aristóteles, São Tomás de Aquino alertava para o fato de que a vida
solitária é exceção (MALUF, 2011).
Essas sociedades são definidas pelo seu território, pois elas pos-
suem direito para agir somente dentro do território que reconhece a
sua autoridade. Segundo a maior parte dos manuais que buscam sim-
plificar a evolução das sociedades políticas, encontramos a seguinte
classificação: primeiro as tribos, depois as cidades-Estados gregas e o
Império Romano, em seguida os principados e reinos medievais e, fi-
nalmente, o Estado.
32 Ciências Políticas
Na introdução da obra A ética protestante e o espírito do capitalismo,
o sociólogo Max Weber (1976) indicou que tanto o Estado como o ca-
pitalismo não podem ser considerados como uma criação exclusiva da
civilização ocidental. Todavia, o autor alertou para o fato de que:
somente na Civilização Ocidental teve lugar o desenvolvimento
de um capitalismo racional, de fenômenos culturais dotados de
“universal[idade] em seu valor e significado”, e o desenvolvimento
de um Estado como uma “entidade política, com uma ‘Constitui-
ção’ racionalmente redigida, um Direito racionalmente ordena-
do, e uma administração orientada por regras racionais, as leis,
e administrado por funcionários especializados”. (FLORENZANO,
2007, p. 11, grifo do original)
34 Ciências Políticas
O Estado é a mais completa das organizações criadas pelo
homem. Pode-se até dizer que ele é sinal de um alto estágio de
civilização. Nesse sentido o Estado aparece num momento his-
tórico bem preciso (século XVI). Não se nega que a Antiguidade
Clássica (as cidades gregas e o Império Romano) já apresentasse
sinais precursores dessa realidade. Todavia, preferem os auto-
res localizar o seu aparecimento no início dos tempos moder-
nos, uma vez que só então, em última análise, se reúnem, nas
entidades políticas assim denominadas, todas as características
próprias do Estado. (BASTOS, 1999, p. 29)
Como indica Bastos (1999), o poder do Estado não pode ser supe-
rado por nenhum outro poder dentro do território que ele administra.
Naturalmente, esse poder resulta da própria autorização da sociedade
que atribuiu ao Estado esse papel e deverá, na atualidade, garantir que
ele (o Estado) tenha limites com base nos regulamentos impostos por
uma Constituição. Para Bastos (1999, p. 26), existe uma relação entre
poder político, ordem social e bem comum quando:
o poder político é o ponto para o qual convergem os demais
poderes na medida em que pretendam influir nos destinos da
sociedade. É ainda esse poder, por encerrar em si as funções de
editar as normas gerais a que a sociedade deverá obediência
(leis) e também a de aplicar essas mesmas normas através da
administração e da jurisdição, que se traduz na via por excelên-
cia da conformação, no sentido de dar forma à sociedade.
Para autores como Marx (1977), é uma ilusão acreditar que o Estado
irá buscar o bem comum, pois ele seria uma organização política que
age em favor dos dominantes. Ao analisar a sociedade capitalista, o
autor afirmou que o Estado era o Estado capitalista, pois havia sido
criado pelo próprio sistema e funcionava segundo a lógica do modo de
produção capitalista. Nesse modo de produção, as relações sociais de
dominação se estruturam com base na propriedade privada dos meios
(recursos como máquinas, matérias‑primas etc.) para produzir. O resul-
tado seria a acumulação de riqueza dos que detêm a propriedade e a
exploração do trabalho dos que não a detêm. Então, em uma sociedade
de desiguais não haveria possibilidade de o Estado trabalhar em bene-
fício de todos igualmente, já que seu principal objetivo seria manter a
propriedade privada e o sistema capitalista (de desiguais) funcionando.
As teorias que resultaram das análises das obras de Marx (1977) têm
sido fundamentais para analisar os Estados democráticos concretos,
para compreender por que somente após o surgimento dos partidos
de massa (dos trabalhadores) podemos falar em democracia e, ainda,
para compreender criticamente a importância dos sistemas partidários
36 Ciências Políticas
e processos eleitorais. Também é importante considerar que o Estado
democrático é animado pelos representantes que ocupam os cargos
públicos. Nesse sentido, a disputa política entre desiguais aparece tan-
to na escolha dos partidos quanto na dos eleitores. A complexidade do
funcionamento dos Estados contemporâneos tem gerado um processo
de profissionalização da política. Assim, muitas vezes, o bem comum
tem ficado à mercê de burocratas que pouco conhecem a realidade de
uma sociedade composta de desiguais.
38 Ciências Políticas
suficiente; precisa também ter interesses em comum (o que gera
uma motivação para agir coletivamente e impor o seu domínio
sobre outros grupos).
40 Ciências Políticas
2.3.2 Concepção teológica
Outra concepção sobre a origem e justificativa da existência do Es-
tado é a teológica, segundo a qual as normas surgem para controlar
os ímpetos humanos e para servirem de veículos para a realização do
bem comum e a proteção individual de cada um. Uma parcela dos de-
fensores dessa concepção afirmava que:
o Estado era obra imediata de Deus, e que ele próprio designaria
o homem ou a família que deveria exercer autoridade estatal.
Essa ideia contribuiu de maneira significativa para aumentar a
tendência absolutista existente nas monarquias da Idade Média.
Essa corrente denominava-se “teoria pura do direito divino so-
brenatural”, tendo muitos adeptos na França. Vale dizer que
nessa época os reis participavam de uma cerimônia religiosa
para serem investidos, onde eram ungidos por Deus. (BASTOS,
1999, p. 37)
42 Ciências Políticas
discórdia. Primeiro, a competição; segundo, a desconfiança; e
terceiro, a glória. A primeira leva os homens a atacar os outros
tendo em vista o lucro; a segunda, a segurança; e a terceira, a
reputação.
Foi para garantir a vida que os indivíduos abriram mão da sua liber-
dade e aderiram ao contrato de subordinação ao Estado Absolutista. 4
Assim, o único dever do Estado seria garantir a vida. A teoria hobbesia- Locke nasceu em 1632 em uma
família burguesa da cidade
na situa o nascimento do Estado no início do século XVI, quando alguns
de Bristol, na Inglaterra. Em
monarcas conseguiram unificar seu território e centralizar o poder, su- 1652 foi estudar em Oxford,
perando o poder dos nobres em seu território, como foi o caso de Por- formando-se em Medicina e
tornando-se posteriormente
tugal. O Estado Absolutista foi a primeira forma de Estado Moderno.
professor daquela universidade.
Outro importante contratualista, que discutiu o nascimento do Esta- Em 1666 foi requisitado como
4 médico e conselheiro do lorde
do Moderno, foi John Locke , que viveu entre 1632 e 1704. Em 1689-90, Shaftesbury, destacado político
ele publicou suas principais obras: Carta sobre a tolerância, Ensaio sobre liberal, que foi o mentor político
o entendimento humano e Dois tratados do governo civil. Para ele, o esta- de Locke, exercendo grande
influência em sua formação
do de natureza é um estado pré-social e pré-político. Diferentemente liberal. Além de defensor da
de Hobbes, ele defende que o período anterior ao contrato não era liberdade e da tolerância
religiosas, Locke é considerado
de guerra de todos contra todos, mas era regido pela liberdade e pela
o fundador do empirismo,
igualdade. Então, os homens não teriam aderido a um contrato de sub- doutrina segundo a qual
missão, mas de consentimento, pois eles já teriam uma forma inicial de todo conhecimento deriva da
experiência (MELLO, 2002).
organização.
44 Ciências Políticas
5 5
Na continuidade do debate, Jean-Jacques Rousseau , importante
Rousseau tinha origem humilde;
filósofo, teórico político e escritor do Iluminismo, e que viveu entre
por ser filho de relojoeiro, en-
1712 e 1778, afirma na obra Do contrato social que no estado de na- controu dificuldades para entrar
tureza o homem é essencialmente bom. Em sua obra, ele procurou no mundo das letras. Foi um
filósofo à margem dos grandes
discutir os nomes de seu século, mas nem
temas mais candentes da filosofia política clássica, tais como a por isso se afastou das principais
passagem do estado de natureza ao estado civil, o contrato so- polêmicas de sua época.
cial, a liberdade civil, o exercício da soberania, a distinção entre o
governo e o soberano, o problema da escravidão, o surgimento + Saiba mais
da propriedade, serão tratados por Rousseau de maneira exaus-
O Iluminismo foi um movimen-
tiva, de um lado, retomando as reflexões dos autores da tradi-
to cultural que se desenvolveu
cional escola do direito natural [...] e Hobbes e, de outro, não na Inglaterra, Holanda e França,
poupando críticas pontuais a nenhum deles, o que o colocará, nos séculos XVII e XVIII, período
no século XVIII, em lugar de destaque entre os que inovaram a que ficou conhecido como
forma de se pensar a política, principalmente ao propor o exer- século das luzes devido aos
cício da soberania pelo povo, como condição primeira para a sua novos saberes científicos que
surgiram.
libertação. E, certamente, por isso mesmo, os protagonistas da
revolução de 1789 o elegerão como patrono da Revolução ou
como o primeiro revolucionário. (NASCIMENTO, 2002, p. 194)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nos dias atuais, a defesa de um poder autoritário e excessivamente
centralizado ainda aparece como solução para a segurança. É justamente
a ideia de que os indivíduos são incapazes de se autogovernar ou tomar
decisões importantes e corretas que sustenta o discurso de defesa de um
Estado sem a participação da sociedade civil.
Também podemos ouvir as defesas do Estado Liberal, que, preocu-
pado com as propriedades da sociedade civil, deve somente funcionar
como um árbitro imparcial, sem interferir demasiadamente nas questões
econômicas e sociais.
Por fim, assim como ocorreu nos séculos XVII e XVIII, o Estado Demo-
crático de Direito, que resultou da teoria defendida por Rousseau, tem
sido questionado na atualidade em alguns países nos quais se desenvol-
veu o discurso autoritário. Podemos perceber que a sobrevivência ou não
desse modelo voltou ao debate. Contrária aos que defendem o modelo
autoritário com o objetivo de garantir a segurança, a crença rousseau-
niana no potencial do modelo democrático e na garantia dos direitos
individuais e coletivos se mostra a melhor forma de alcançarmos uma so-
ciedade melhor, mais equitativa, na qual o povo possa ser representado e
as liberdades sejam garantidas.
46 Ciências Políticas
AMPLIANDO SEUS CONHECIMENTOS
•• WEBER, M. Os três tipos puros de dominação legítima. Rio de Janei-
ro: VGuedes Multimídia, 2008.
ATIVIDADES
1. Com base na discussão deste capítulo, explique o que é poder.
REFERÊNCIAS
BASTOS, C. R. Curso de teoria do Estado e ciência política. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1999.
DAHL, R. Democracia. Lisboa: Temas e Debates, 2000.
DURKHEIM, E. Da divisão do trabalho social. São Paulo: Martins Fontes, 2010.
FLORENZANO, M. Sobre as origens e o desenvolvimento do Estado moderno no Ocidente. São
Paulo: Lua Nova, 2007.
HOBBES, T. Leviatã ou a matéria, forma e poder de um Estado eclesiástico e civil. Trad. de
Rosina D’Angina. São Paulo: Martin Claret, 2014.
LEBRUN, G. O que é poder. São Paulo: Brasiliense, 1981.
LOURENÇO, A. O gênero do candidato na composição da elite política no Poder Legislativo
do estado de Mato Grosso no período de 1945 a 2007. In: CONGRESSO INTERNACIONAL
DE HISTÓRIA, 8., out. 2017, Maringá. Anais [...]. Maringá: UEM, 2017. Disponível em: http://
www.cih.uem.br/anais/2017/trabalhos/3786.pdf. Acesso em: 28 out. 2019.
48 Ciências Políticas
3
O Estado Moderno
Neste capítulo, buscaremos compreender como nascem e como
são extintos os Estados. Iremos também analisar as discussões
sobre as funções do Estado e a possibilidade de sua eficácia e, por
fim, buscaremos delimitar quais são os elementos que formam o
Estado Moderno e suas configurações na contemporaneidade.
O Estado Moderno 49
tema feudal predominou a descentralização administrativa e bélica.
Cada feudo deveria se autogerir. A economia era predominantemente
agrícola e os julgamentos e os exércitos eram privados e estavam sob a
tutela dos senhores feudais.
Por isso, autores como Weber (1999) e Elias (1993) afirmam que a
burocratização e centralização do poder de administrar concentrado
no Estado foi a consequência do desenvolvimento do capitalismo, da
racionalização que esse sistema exigia, da centralização da cobrança
de tributos e da perda de poder dos senhores feudais para o monarca.
Não obstante, é evidente que alguma coisa mais acontece nesse
contexto, além da emergência fortuita de uma série de grandes
príncipes e da ocasional vitória de numerosos senhores territo-
riais ou de reis sobre estados, mais ou menos pela mesma época.
Não é sem motivo que falamos em uma era de absolutismo. O
que encontra expressão nessa mudança na forma da dominação
política é uma mudança estrutural, como um todo, na sociedade
ocidental. Não apenas reis isolados expandem seu poder, mas,
claramente, as instituições sociais da monarquia ou do principa-
do adquirem nova importância no curso de uma transformação
gradual de toda a sociedade, uma importância que simultanea-
mente confere novas oportunidades de poder aos maiores prín-
cipes. (ELIAS, 1993, p. 13)
50 Ciências Políticas
As cidades eram conhecidas como burgos e, por isso, os que mora-
vam nelas ficaram conhecidos como burgueses. Foi nesse novo contex-
to que surgiram as oportunidades para fortalecer o poder dos reis com
o apoio da burguesia. Essa nova classe buscava, na figura do monarca,
a proteção contra a nobreza feudal e seus valores ligados à vida rural
e à tradição.
O Estado Moderno 51
Formalmente, podemos dividir as modalidades do nascimento dos
Estados em originário, secundário e derivado. O modelo originário foi
o que apresentamos até aqui. Ele resulta do processo histórico viven-
ciado pela própria sociedade. Podemos afirmar que “o Estado nasce
no próprio meio onde se estabelece a sociedade, nasce diretamente
do povo, sem influência de fatores externos” (BASTOS, 1999, p. 52), ou
seja, nasce da evolução e desenvolvimento natural da sociedade.
52 Ciências Políticas
e de constituições estaduais. Naturalmente, as leis federais prevalecem
sobre as estaduais, contudo, elas existem paralelamente dentro do ter-
ritório e regulamentam a vida do povo.
A união real seria uma união entre países para defender seus inte-
resses frente a outros países no cenário internacional. Existiria, portan-
to, uma única representação na política internacional. Todavia, dentro
de cada território continuaria a vigorar o Direito, as regras e os cos-
tumes de cada país singularmente. Na união pessoal, os Estados se
uniriam quando passassem a ser governados por um único monarca.
Em ambos os casos, os Estados que compusessem o novo Estado que
nasceu da união não perderiam a sua autonomia.
O Estado Moderno 53
Kosovo, que declarou independência da Sérvia em 2008, e do Timor-
-Leste, que se separou da Indonésia em 2002. Para que esses novos
Estados se consolidem é necessário o reconhecimento internacional,
ou seja, os outros Estados devem reconhecer sua independência.
54 Ciências Políticas
Texas, que se uniu aos Estados Unidos da América. Nesse caso
o Estado entende que lhe é oportuno perder sua soberania para
entrar em uma composição estatal.
O Estado Moderno 55
Quadro 1
Funções do Estado
Função Características
Editar normas, pois somente ao Estado compete essa
função com base na ação do Poder Legislativo. No caso
brasileiro, o Legislativo está divido em federal, estadual
Legislar e municipal. No nível federal, ele é representado pela Câ-
mara dos Deputados e pelo Senado e, no caso da junção
dos dois, pelo Parlamento; no nível estadual, pelas Assem-
bleias Legislativas e, no municipal, pela Câmara Municipal.
Fazer com que as normas sejam cumpridas. Para a rea-
lização dessa função, temos o Poder Executivo. No caso
brasileiro, por ser uma federação, há a divisão em níveis
Executar
federal, estadual e municipal, representados pelo pre-
sidente da República, pelos governos estaduais e pelas
prefeituras municipais.
Cabe ao Estado julgar as infrações às leis que ele próprio
aplica. Nesse sentido, para o Estado manter a ordem pú-
Julgar
Glossário blica, ele necessita do Poder Judiciário. Portanto, o Judiciá-
rio exerce um poder coercitivo sobre a sociedade.
coercitivo: poder que força ou
Gerir a comunicação, o transporte, a saúde, a educação, a
obriga a sociedade a fazer algo.
Administrar cultura, a economia, o comércio, a habitação, a previdên-
cia social etc.
Assegurar a Proteger seu território de ataques externos, assegurar a
segurança soberania e a ordem interna.
56 Ciências Políticas
desenvolvida, que é o Estado Democrático contemporâneo, esse
modelo ainda encontra dificuldades no seu funcionamento. Nas
democracias representativas nos deparamos com a complexidade de
um sistema que busca representar todos igualmente. Por isso, autores
como Schumpeter (1961) realizam análises críticas nas quais apontam
os limites da teoria política clássica do Estado Democrático do século
XVIII. Segundo esse autor,
sustenta-se, pois, que existe um bem comum, o farol orientador
da política, sempre fácil de definir e de entender por todas as
pessoas normais, mediante uma explicação racional. Não há, por
conseguinte, razão para não entendê-lo e, de fato, nenhuma ex-
plicação para a existência dos que não o compreendem, salvo a
ignorância (que pode ser remediada), a estupidez e o interesse
antissocial. Ademais, esse bem comum implica soluções definiti-
vas de todas as questões, de maneira que todo fenômeno social
e toda medida tomada ou a ser tomada podem inequivocamente
ser tachados de bons ou maus. O povo deve admitir também,
em princípio pelo menos, que há também uma vontade comum
(a vontade de todas as pessoas sensatas) que corresponde exa-
tamente ao interesse, bem-estar ou felicidade comuns. O único
fato, exceto a estupidez ou interesses sinistros, que pode causar
divergência e explicar a existência de uma oposição é a diferen-
ça de opiniões quanto à rapidez com a qual deve ser procurada
a concretização da meta comum a quase todos. Consequente-
mente, todos os membros da comunidade, conscientes da meta,
sabendo o que querem, discernindo o que é bom do que é mau,
tomam parte, ativa e honestamente, no fomento do bom e no
combate ao mau. Todos os membros, em conjunto, controlam os
negócios públicos. (SCHUMPETER, 1961, p. 300)
O Estado Moderno 57
mocratização quer-se dizer que o número dos indivíduos com direito
ao voto sofreu um progressivo alargamento”.
Então, para esse autor, apenas haver uma extensão do voto para a
maior parcela dos cidadãos e definir as regras do jogo que garantam
que a vontade da maioria irá prevalecer não basta, é necessário que
a liberdade dos indivíduos seja garantida pelo Estado. Ou seja, é uma
função do Estado Liberal, ou Estado Democrático, que a liberdade dos
Glossário indivíduos seja garantida com base em leis e tribunais.
sub lege: sob a lei. No sentido Para que se realize esta condição é necessário que aos chama-
da citação, significa um poder dos a decidir sejam garantidos os assim denominados direitos
exercido não apenas com base de liberdade, de opinião, de expressão das próprias opiniões, de
na lei (qualquer lei, por reunião, de associação, etc. – os direitos à base dos quais nas-
exemplo, uma lei autoritária que
ceu o Estado Liberal e foi construída a doutrina do Estado de
proíbe a formação de partidos
políticos ou sindicatos e orga- Direito em sentido forte, isto é, do Estado que não apenas exerce
nizações civis), mas na lei que o poder sub lege, mas o exerce dentro de limites derivados do
respeita os direitos invioláveis reconhecimento constitucional dos direitos “invioláveis” do indi-
do indivíduo. víduo. (BOBBIO, 1986, p. 20, grifo do original)
58 Ciências Políticas
contrário de indicar a necessidade de o Estado garantir essas condições
igualitárias, Marx indicou que o melhor seria a eliminação do próprio
Estado. De acordo com Weffort (2011, p. 50, grifos do original),
nada é mais enganoso, porém, do que imaginar que Marx, ape-
gado à “questão social”, tenha chegado a considerar a “questão
política” como um simples reflexo [...]. “Não há dúvida”, diz em
A questão judaica, “que a emancipação política representa um
grande progresso. [...] ela se caracteriza como a derradeira etapa
da emancipação humana dentro do contexto do mundo atual”.
“Dentro do contexto do mundo atual”, isto é, nos limites das atu-
ais condições de desigualdade social e de exploração econômica.
“Os chamados direitos humanos em sua forma autêntica, sob
a forma que lhe deram seus descobridores norte-americanos
e franceses, [são] direitos políticos, direitos que só podem ser
exercidos em comunidade com outros homens. Seu conteúdo é
a participação na comunidade e, concretamente, na comunidade
política, no Estado.” Marx chama também a esta “emancipação
política” de “democracia política”.
O Estado Moderno 59
Sob essa perspectiva, a finalidade do Estado se amplia e ele pode
ser pensado também como reprodutor do sistema. Essa observa-
ção é pertinente, pois, sendo o Estado um filho do sistema, ele não
poderá agir contra o seu funcionamento sob o risco de afetar sua
própria existência. Ao analisar o Estado na obra A questão judaica, o
autor afirma que:
a democracia política é cristã no sentido de que o homem, não
só um homem, mas todo o homem, é nela considerado como ser
soberano e ser supremo; mas é o homem ignorante, insociável,
o homem tal como é na sua existência fortuita, o homem como
foi corrompido, perdido para si mesmo, alienado, sujeito ao do-
mínio das condições e elementos inumanos, por toda a organi-
zação da nossa sociedade – numa palavra, o homem que ainda
não surge como real ser genérico. A criação da fantasia, o sonho,
o postulado do cristianismo, a soberania do homem – mas do
homem como ser alienado distinto do homem real – é, na de-
mocracia, realidade tangível e presente, máxima secular. (MARX,
1969, p. 20)
60 Ciências Políticas
3.3 Elementos do Estado:
Vídeo território, povo e poder
Podemos afirmar que o Estado é formado por três elementos inter-
-relacionados: povo, território e poder/governo. Com a unificação do
território, o Estado Moderno passa a ser nomeado também como Es-
tado Nacional. Mesmo que existam grupos com diferentes culturas no
território, o Estado irá buscar formar uma única nação. Dessa forma,
nação e Estado se apresentarão como algo indissociável.
Assim, Nação é uma entidade de direito natural e histórico. Con-
ceitua-se como um conjunto homogêneo de pessoas ligadas
entre si por vínculos permanentes de sangue, idioma, religião,
cultura e ideais. A Nação é anterior ao Estado. Aliás, pode ser
definida como a substância humana do Estado. [...] Pode-se dizer,
como Miguel Reale, que a nação “é um Estado em potência”. A
Nação pode perfeitamente existir sem Estado. A distinção entre
as duas realidades mais se evidencia quando se tem em vista
que várias nações podem reunir-se em um só Estado, assim
como também uma só Nação pode dividir-se em vários Estados.
(MALUF, 2007, p. 37, grifos do original)
O Estado Moderno 61
povo é o conjunto de pessoas que fazem parte de um Estado. Se
território é o elemento material do Estado, o povo é o seu subs-
trato humano. Não pode, obviamente, haver Estado sem povo. O
que determina se alguém faz ou não parte do povo de um Estado
é o direito. Daí por que ser a nacionalidade um vínculo jurídico. É
por ela que o Estado considera alguém como seu membro.
62 Ciências Políticas
será considerado cidadão. Predominantemente, a teoria aponta como
definição para o conceito de cidadão aquele que desfruta dos direitos
políticos.
A cidadania consiste na manifestação das prerrogativas políticas
que um indivíduo tem dentro de um Estado democrático. Em ou-
tras palavras, a cidadania é um estatuto jurídico que contém os
direitos e as obrigações da pessoa em relação ao Estado. Já a pa-
lavra cidadão é voltada a designar o indivíduo na posse dos seus
direitos políticos. (BASTOS, 1999, p. 71, grifo nosso)
O Estado Moderno 63
fortemente inseridos nesse Direito. Os estrangeiros quando estão no
Brasil também precisam respeitar as leis brasileiras, todavia o Estado
brasileiro, na medida do possível, deve buscar respeitar a cultura des-
ses estrangeiros, que estão amparados em outro Direito nacional. O
mesmo se aplica a brasileiros que estão em outros países e, portanto,
sob as regras de outros Estados.
64 Ciências Políticas
e onde outro termina. Por isso, alguns autores afirmam que o poder
jurídico nunca deixa de ser político.
Para o Direito poder ser aplicado, ele precisa que as leis sejam po-
sitivadas, ou seja, votadas, aprovadas e implementadas pelo Estado.
Além disso, necessita de todo o aparato jurídico – tribunais e sistema
prisional – para que elas sejam aplicadas. Em retorno, o poder jurídico
legitima o poder político dentro da noção racional de legalidade.
O Estado Moderno 65
Outra questão que precisamos considerar, quando pensamos em
soberania, é o avanço das forças das comunidades internacionais que
pressionam os limites do poder dos Estados. Por exemplo, na União Eu-
ropeia, os Estados-membros precisam cumprir regulamentos que são
internacionais. Eles não podem quebrar os acordos com a União sob o
risco de serem penalizados.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nisto reside o desafio do Estado Democrático de Direito: somente ele
edita as leis que dão legitimidade ao próprio poder e nós, na condição de
cidadãos, necessitamos que essas leis realmente representem o nosso
desejo de administração pública. A sociedade e os indivíduos organizados
em grupos de pressão necessitam vigiar e pressionar o Estado para que
sua gestão inclua a diversidade e promova a igualdade, respeitando as
liberdades individuais.
A sociedade não pode fazer leis, julgar ou executá-las, mas cabe a ela
participar, acompanhando os processos decisórios e propondo suas de-
mandas por meio dos mecanismos de consulta, como abaixo-assinados,
plebiscitos, entre outros.
66 Ciências Políticas
AMPLIANDO SEUS CONHECIMENTOS
•• LEBRUN, G. O que é poder. São Paulo: Brasiliense, 1981.
Essa obra, apesar de publicada como coleção de bolso, tem uma
qualidade impressionante. A leitura ajudará a compreender me-
lhor o fenômeno do poder.
ATIVIDADES
1. Para alguns autores, o bem comum é considerado a finalidade do
Estado, enquanto para outros é irrealizável. Explique essa divergência
resgatando os argumentos abordados neste capítulo.
REFERÊNCIAS
BASTOS, C. R. Curso de teoria do Estado e ciência política. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1999.
BOBBIO, N. O futuro da democracia: uma defesa das regras do Jogo. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1986.
BOBBIO, N. Estado, governo, sociedade: para uma teoria geral da política. Rio de Janeiro:
Paz e Terra, 1987.
BRASIL. Constituição Federal (1988). Diário Oficial da União, Poder Legislativo, Brasília, DF, 5
out. 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.
htm. Acesso em: 29 nov. 2019.
ELIAS, N. O processo civilizador 2: formação do Estado e civilização. Rio de Janeiro: Zahar, 1993.
GIDDENS, A. Sociologia. 6. ed. Lisboa: Fundação Calouste, 2008.
MALUF, S. Teoria Geral do Estado. São Paulo: Saraiva, 2007.
MARX, K. A questão judaica. Rio de Janeiro: Laemmert, 1969.
SCHUMPETER, J. A. Capitalismo, socialismo e democracia. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura,
1961.
WEBER, M. Economia e sociedade. Brasília: UnB, 1999. v. 2.
WEFFORT, F. C. Os clássicos da política. São Paulo: Ática, 2011. v. 2.
O Estado Moderno 67
4
Estado e governo
No mundo contemporâneo temos discutido a importância dos
conceitos de democracia e Estado Democrático como proposta de
organização da vida pública e da sociedade. Todavia, alguns autores
têm questionado o sucesso desse modelo e, por vezes, sugerido
alternativas que nem sempre compreendemos perfeitamente.
A leitura deste capítulo é importante, pois nele procuramos
apresentar sinteticamente os modelos de regime político, formas
e sistemas de governo e, por fim, indicar como esses modelos
moldaram os Estados atuais.
68 Ciências Políticas
exemplo. Para Aristóteles, a democracia era exercida de modo direto.
O povo tomava decisões sobre o governo em discussões públicas. Na-
turalmente, a democracia aristotélica, na Grécia Antiga, era formada
por uma população menor e nem todos faziam parte da vida pública.
Estado e governo 69
ciocínio se aplicaria para um regime monárquico ou aristocrático, que
necessitaria de instituições compatíveis com sua proposta de regime.
70 Ciências Políticas
e instituições; na república, governa o povo no todo ou em parte (re-
públicas aristocráticas); no despotismo, governa a vontade de um só”
(ALBUQUERQUE, 2002, p. 116).
Estado e governo 71
Não iremos nos aprofundar na discussão sobre a proposta de Mon-
tesquieu, pois trabalharemos de maneira detalhada a contribuição do
autor no próximo capítulo. Por ora, é importante somente frisar sua
contribuição para a classificação dos regimes de governo em repúbli-
ca, monarquia e despotismo.
72 Ciências Políticas
narquias absolutistas que foram constituídas e mantidas para superar
os poderes dos nobres feudais e, assim, gerar um poder centralizado
sobre um território unificado e sobre o povo desse território. Mas, com
o passar das décadas e de alguns movimentos políticos, econômicos e
culturais, o modelo absolutista foi desafiado e passou-se a defender a
ideia de que um regime de governo deveria garantir direitos e não os
retirar, por isso as monarquias foram paulatinamente se adaptando
aos novos contextos. Segundo Bastos (1999, p. 112),
o último estágio da evolução monárquica reside na monarquia
constitucional ou parlamentar, em que existe uma autolimitação
dos poderes consagrados numa Carta Constitucional ou Consti-
tuição. Já aqui o monarca compartilha o exercício do poder com
órgãos representativos da vontade popular (os Parlamentos, aos
quais os seus ministros estão sujeitos). Em assim sendo, essa es-
pécie de monarquia deixa de enquadrar-se nas formas monocrá-
ticas de governo.
Estado e governo 73
poder ditatorial que concentra em si todas as decisões e não aceita
posturas contrárias.
74 Ciências Políticas
cidadãos (povo), eles se reuniam em assembleias públicas para decidi-
rem as questões relativas à vida coletiva ou, mais precisamente, à vida
na cidade.
Estado e governo 75
4.2 Modelos de Estado
Vídeo Assim como os Estados foram se modificando ao longo da histó-
ria, as teorias e o sistema de classificação destes sofreram alterações,
gerando uma razoável variedade de interpretações sobre esses mode-
los. Além do desenvolvimento histórico, é preciso compreender que os
critérios adotados pelos autores podem ser diferentes e isso resulta
em uma tipologia de Estados também diferente. Mas, apesar dessas
variações, podemos traçar alguns padrões principais e buscaremos
apresentar aqui alguns desses modelos.
Sendo muitos os elementos que se deve levar em conta para dis-
tinguir as formas de Estado, especialmente com referência ou às
relações entre a organização política e a sociedade ou às diver-
sas finalidades que o poder político organizado persegue nas di-
versas épocas históricas e nas diversas sociedades, as tipologias
das formas de Estado são tão variadas e mutáveis que podem
tornar incômoda, e talvez inútil, uma completa exposição delas.
Para pôr um pouco de ordem numa matéria tão rica e controver-
sa, podem-se distinguir as diversas formas de Estado à base de
dois critérios principais, o histórico e o relativo à maior ou menor
expansão do Estado em detrimento da sociedade (um critério
que inclui também aquele fundado sobre as diversas ideologias).
(BOBBIO, 1987, p. 123)
76 Ciências Políticas
O Estado Absolutista, também já abordado nos capítulos anterio-
res, modificou o modelo descentralizado de poder característico do
Estado Feudal e, em alguns países europeus, concentrou na figura do
monarca todo o poder do Estado. Dessa forma, o monarca passou a
governar, em muitos locais, sem limitações ao seu poder. Naturalmen-
te, sempre existiram limitações derivadas da própria cultura e história
dos países, como a obrigatoriedade da hereditariedade do poder. Ou
seja, o monarca não poderia passar o poder para quem desejasse, mas
para o seu sucessor de direito, seu herdeiro. Mas o que caracteriza o
absolutismo é o fato de não existir uma lei maior, como uma Constitui-
ção, que pudesse limitar o poder do monarca ou obrigá-lo a partilhar o
poder com um conselho de ministros.
Estado e governo 77
Seguindo essa abordagem histórica, Bobbio (1987) afirma que a
próxima fase do desenvolvimento do Estado é a representativa, que
dura até os dias atuais. O Estado Representativo surgiu como monar-
quia constitucional e, posteriormente, se desenvolveu para monarquia
parlamentar na Inglaterra (após a Revolução Gloriosa de 1688) e em
outros países na Europa, após a Revolução Francesa. Também houve o
desenvolvimento do modelo representativo na forma de república pre-
sidencial no Estados Unidos após o seu movimento de Independência
liderado pelas Treze Colônias Americanas.
Enquanto na Inglaterra o Estado representativo nasce quase sem
solução de continuidade do Estado feudal e do Estado estamen-
tal através da guerra civil e da “gloriosa revolução” de 1688, na
Europa continental nasce sobre as ruínas do absolutismo mo-
nárquico. Tal como o Estado de estamentos, também o Estado
representativo se afirma, ao menos num primeiro tempo, como
o resultado de um compromisso entre o poder do príncipe (cujo
princípio de legitimidade é a tradição) e o poder dos represen-
tantes do povo (por “povo” entendendo-se, ao menos num pri-
meiro tempo, a classe burguesa), cujo princípio de legitimidade é
o consenso. (BOBBIO, 1987, p. 115)
78 Ciências Políticas
Como forma de assegurar essa participação surgiu também, en-
quanto parte do Estado Representativo, o Estado de Direito. Nesse
modelo, o Estado se submete às leis e é controlado por elas, e tem suas
tarefas limitadas à manutenção da ordem, à proteção da liberdade e
da propriedade individual, evitando a possibilidade do absolutismo
desenfreado.
Estado e governo 79
Seu pressuposto fundamental é que o máximo de bem‑estar
comum é atingido em todos os campos com a menor presen-
ça possível do Estado. Trata-se de uma concepção basicamen-
te otimista. Não repudia a natureza humana no que ela tem de
egoísta e ambiciosa. Pelo contrário, parte dessa constatação
para afirmar que o livre jogo dos diversos egoísmos produzirá
o bem-estar coletivo. Sua máxima principal está insculpida na
expressão francesa Laissez faire, laissez passer, le monde va de lui
même (Deixai fazer, deixai passar, o mundo caminha por si só).
Sua maior aplicação se deu no campo econômico, em que se pro-
curou suprimir toda a interferência do Estado na regulação da
economia. (BASTOS, 1999, p. 139, grifos nossos)
80 Ciências Políticas
Nesse sentido, o Estado Social surgiu para apaziguar ou salvaguar-
dar o funcionamento do sistema capitalista, na medida em que ameni-
za os conflitos provocados pelas relações de exploração e mantém o
sistema funcionando. Por isso esse Estado também é conhecido como
Estado do bem-estar social (Welfare State) ou Estado Assistencial, não por
fazer caridade, mas por buscar garantir o mínimo de renda, alimenta-
ção, saúde, habitação e educação como direito político.
Estado e governo 81
Mais do que controlar as leis, a economia e a cultura, ele almeja o
controle das mentes de modo a gerar uma massa de seguidores que
buscará oprimir qualquer pensamento ou ação destoante, logo, ele é a
própria antítese dos direitos e liberdades individuais.
82 Ciências Políticas
4.3 Formas e sistemas de governo
Vídeo As formas e sistemas de governo resultam da variedade de relações
que se estabelecem entre os poderes. Compreendemos como formas
de governo precisamente duas possibilidades, que já abordamos no
início deste capítulo, ou seja, a monarquia – que pode ser absolutista
ou constitucional/parlamentarista – e a república – que pode ser par-
lamentarista, presidencialista ou mista. Observe que essas formas de
governo irão variar segundo as relações que se estabelecem entre o
Poder Executivo e o Legislativo.
Estado e governo 83
O parlamentarismo tem como principal característica o controle
ou a subordinação do governo pelo Legislativo. Quando comparamos
os sistemas presidencialistas e parlamentaristas,
se estivermos falando sobre características que são necessárias
e suficientes, ambos os sistemas têm apenas duas características
primárias. O sistema parlamentarista é um sistema de dependên-
cia mútua. Quer dizer: nele, o Poder Legislativo tem a capacidade
de dar um voto de não confiança ao governo e, ainda, o Poder
Executivo tem a capacidade de dissolver o Congresso e convocar
eleições. O sistema presidencialista é um sistema de independên-
cia mútua. Quer dizer: nele, o Poder Legislativo tem um mandato
fixo e próprio, e o Poder Executivo tem seu mandato fixo e pró-
prio. Isso implica que ambos os poderes têm sua própria fonte de
legitimidade e independência. (STEFAN, 1990, p. 96)
84 Ciências Políticas
regimes parlamentares puros. Mas é importante frisar que esse siste- Curiosidade
ma se apresenta mais diversificado atualmente. A França pode ser citada como
exemplo dessa complexidade
Já o presidencialismo parte, teoricamente, de uma rígida sepa-
atual. Nesse país o sistema
ração entre Legislativo e Executivo e da não relação de dependência adotado está entre o presiden-
entre os poderes para governar. Em uma república presidencialista cialismo e o parlamentarismo.
Nesse sistema é eleito um
o presidente pode ter seu mandato independente da maioria no Con- presidente, como nos sistemas
gresso. Mesmo que seu partido tenha poucas cadeiras no Congresso, presidencialistas, mas existe
ele poderá exercer seu mandato, pois não existe regra que o obrigue também um primeiro-ministro
como nos sistemas parlamen-
a abdicar, por isso alguns autores afirmam que no sistema presiden- taristas. Devido à forma como
cialista o Poder Executivo adquiriu mais poder. Todavia, a ausência da o poder está organizado, esse
maioria do Parlamento, ainda que não impeça o governo, pode difi- sistema recebe o nome de
semipresidencialismo.
cultar imensamente e gerar um sistema de barganhas que poderá se
tornar antidemocrático.
Estado e governo 85
criasse um poder central com forças e autoridade para tanto. De
outra parte, havia o risco de se incorrer em demasias e criar-se
um poder tão forte que pudesse resvalar para o despotismo e
para a tirania. (BASTOS, 1999, p. 170)
86 Ciências Políticas
anarquismo propõe um não poder estatal e acredita que as sociedades
viveriam melhor na ausência deste.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Após revisarmos as formas de Estado, os regimes de governo e os sis-
temas de governo, podemos tecer algumas considerações.
Primeiro, todo esse esforço teórico para definir os modelos políticos
criados na história ocidental encontra imensas limitações, pois a realidade
é sempre mais complexa do que a teoria é capaz de captar.
Segundo, o desenvolvimento histórico desses modelos, por ser contí-
nuo e dinâmico, está sempre em mutação. Então, buscamos apresentar
as características gerais, que servem para realizar uma leitura da realida-
de atual e observar suas transformações.
Por fim, dentre todos os modelos de Estado, regimes e sistemas de
governo existentes ao longo da história, nenhum atingiu a perfeição. Nem
mesmo o Estado de Direito, que adotou a democracia, conseguiu repre-
sentar a todos igualmente. Isso não significa que esse é um modelo me-
lhor, mas, ainda que imperfeito, ele representa a antítese da ditadura.
Essa última implica a ausência de liberdade, inclusive, para questionar o
regime que se considere falho.
Estado e governo 87
AMPLIANDO SEUS CONHECIMENTOS
•• SARTORI, G. A teoria da democracia revisitada: as questões clássi-
cas. São Paulo: Editora Ática, 1994. v. 2.
ATIVIDADES
1. Em que medida podemos considerar o sistema parlamentarista mais
democrático do que o sistema presidencialista?
REFERÊNCIAS
ALBUQUERQUE, J. A. G. Montesquieu: sociedade e poder. In: WEFFORT, F. C. Os clássicos da
política. São Paulo: Ática, 2002. v. 1.
ARISTÓTELES. Política. Trad. de António de Castro Caeiro. São Paulo: Atlas, 2009.
BASTOS, C. R. Curso de teoria do Estado e ciência política. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1999.
BOBBIO, N. Estado, governo, sociedade: por uma teoria geral da política. Rio de Janeiro: Paz
e Terra, 1987.
BOBBIO, N.; MATTEUCCI, N.; PASQUINO, G. Dicionário de política. 11. ed. Brasília: Editora
UnB, 1998.
STEFAN, A. Parlamentarismo x presidencialismo no mundo moderno: revisão de um
debate atual. Estudos Avançados, São Paulo, v. 4, n. 8, jan./abr. 1990.
88 Ciências Políticas
5
A separação dos poderes
como princípio da moderação
Neste capítulo, discutiremos a importância da moderação do
poder do Estado com base nas teorias sobre a separação dos
poderes. Observaremos também como o princípio da moderação
do poder é a base para a formação dos Estados de Direito e das
democracias contemporâneas, que buscam garantir, ainda que
existam limitações, os direitos fundamentais e sociais.
90 Ciências Políticas
os cargos no governo não abusem ou acabem por impor uma ditadura
ou tirania insensível às necessidades da sociedade.
Para evitar essas ditaduras antiliberais vindas de cima ou de
baixo, Aristóteles propunha uma constituição mista ou timocra-
cia, combinação de aristocracia e democracia, na qual o sufrágio
se restringiria aos proprietários de terras e uma poderosa classe
média seria reguladora do equilíbrio e o eixo do poder. A terra
deveria ser dividida em duas partes, uma pertencendo à comu-
nidade em geral e a outra entregue aos indivíduos. Os cidadãos
possuiriam terras, comeriam em mesas públicas e só eles deve-
riam votar ou empunhar armas. Constituiriam uma pequena mi-
noria, dez mil no máximo, em relação à população. Nenhum teria
licença para exercer qualquer trabalho mecânico ou fazer do co-
mércio meio de vida, pois eram essas ocupações que destruíam
a superioridade. Os agricultores deveriam formar uma ordem
separada, talvez escravos. (COSTA, 2006, p. 52, grifo do original)
92 Ciências Políticas
povo, se comporá de homens com propriedade, que escolherão
representantes. (RAMOS; MELO; FRATESCHI, 2012, p. 125)
94 Ciências Políticas
Ao definir lei como relações necessárias que derivam da natureza
das coisas, “Montesquieu estabelece uma ponte com as ciências empí-
ricas, e particularmente com a física newtoniana, que ele parafraseia.
Com isso ele rompe com a tradicional submissão da política à teologia”
(ALBUQUERQUE, 2002, p. 115).
96 Ciências Políticas
Ele vai considerar duas dimensões do funcionamento político
das instituições: a natureza e o princípio de governo. A natureza
do governo diz respeito a quem detém o poder: na monarquia,
um só governa, através de leis fixas e instituições; na república,
governa o povo no todo ou em parte (repúblicas aristocráticas);
no despotismo, governa a vontade de um só. (ALBUQUERQUE,
2002, p. 116)
Ele estudou esses três modelos para observar o que funcionou me-
lhor para a manutenção do poder. Ainda, sobre os regimes políticos, o
autor afirma que o despotismo “é um regime que se situa no limiar da
política: o despotismo seria menos do que um regime político, quase
uma extensão do estado de natureza, onde os homens atuam movi-
dos pelos instintos e orientados para a sobrevivência” (ALBUQUERQUE,
2002, p. 116). Então, podemos observar que o autor buscava não só a
mera classificação dos regimes, mas também observar como o poder
era exercido pelas instituições nas relações entre grupos e classes.
Não se trata de uma noção puramente descritiva, como poderia
parecer à primeira vista. As análises minuciosas de Montesquieu
sobre as “leis relativas à natureza do governo” deixam claro que
se trata de relações entre as instâncias de poder e a forma como
o poder se distribui na sociedade, entre os diferentes grupos e
classes da população. (ALBUQUERQUE, 2002, p. 116)
98 Ciências Políticas
Diferentemente da monarquia, que se baseia na honra, na repúbli-
ca o princípio é a virtude. Mas como os homens não são tão virtuosos
quando estão em posse do poder, é necessário haver mecanismos de
controle para que o próprio poder possa se autofiscalizar. Então, é ne-
cessário separar o poder em três grupos diferentes e garantir que o
controle mútuo gere a moderação e a estabilidade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Estado de Direito é uma modalidade que busca garantir as liberda-
des individuais e os direitos fundamentais. Sua existência é uma forma de
resistência contra o absolutismo, as ditaduras e medidas de elites políticas
que agem de modo arbitrário. Sua forma organizacional se pauta na exis-
tência de uma separação dos poderes Legislativo, Executivo e Judiciário,
de modo que possam fiscalizar uns aos outros e agir com medidas de
sanção nos casos de irregularidades. Seu funcionamento tem como base
a racionalidade legal; por isso funde-se com o modelo constitucional, no
qual é necessário existir uma Constituição para prescrever como o poder
deve se organizar e qual é o limite de sua ação.
Por fim, cabe ressaltar que as democracias contemporâneas são for-
mas de Estados de Direito, pois a democracia necessita desse controle
que a racionalidade jurídica impõe ao poder do Estado para evitar a sua
forma distorcida, a ditadura. Quando um governo não respeita a Consti-
tuição, não podemos falar que existe democracia, muito menos um Esta-
do de Direito.
ATIVIDADES
1. Explique o que significa o sistema de freios e contrapesos.
REFERÊNCIAS
ALBUQUERQUE, J. A. G. Montesquieu: sociedade e poder. In: WEFFORT, F. C. Os clássicos da
política. São Paulo: Ática, 2002. v. 1.
BASTOS, C. R. Curso de Teoria do Estado e Ciência Política. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1999.
BOBBIO, N.; MATTEUCCI, N.; PASQUINO, G. Dicionário de Política. 11. ed. Brasília: Editora
UnB, 1998.
COSTA, N. N. Ciência Política. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2006.
MIRANDA, J. Teoria do Estado e da Constituição. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2002.
RAMOS, F. C.; MELO, R.; FRATESCHI, Y. Manual de Filosofia Política Para os cursos de Teoria do
Estado & Ciência Política, Filosofia e Ciências Sociais. São Paulo: Editora Saraiva, 2012.
ATIVIDADES
1. Mesmo com as imperfeições dos sistemas eleitorais e partidários, por
que poderíamos considerar o regime democrático mais adequado aos
Estados contemporâneos?
REFERÊNCIAS
ACQUAVIVA, M. C. Instituições políticas. São Paulo: Atlas, 1982.
BASTOS, C. R. Curso de teoria do Estado e ciência política. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1999.
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DAHL, R. Democracia. Lisboa: Temas e Debates, 2000.
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Brasil. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 30, n. 89, out. 2015.
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n. 2, p. 11-21, abr. 2003.
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2007. Lisboa, 2011.Tese (Doutorado em Ciência Política) – Setor de Ciências Sociais,
Universidade Nova de Lisboa.
LOURENÇO, A. As eleições para a Câmara de vereadores de Irati em 2004, 2008 e 2012:
uma análise sociológica das relações de gênero. In: BEGA, M. T. C.; PESSOA, K. (org.)
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Editorial, 2019.
MIGUEL, L. F. Mecanismos de exclusão política e os limites da democracia liberal: uma
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Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/nec/n98/08.pdf. Acesso em: 20 dez. 2019.
NORRIS, P. Recrutamento Político. Revista de Sociologia e Política, Curitiba, v. 21, n.
46, p. 11-32, jun. 2013. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_
arttext&pid=S0104-44782013000200002#top2. Acesso em: 20 dez. 2019.
SANTOS, W. G. As razões da desordem. Rio de Janeiro: Rocco, 1993.
SARTORI, G. Partidos e sistemas partidários. Trad. de Waltensir Dutra. ed. rev. ampl. Rio de
Janeiro; Brasília: Zahar; UnB, 1982.
SCHUMPETER, J. Capitalismo, socialismo e democracia. Rio de Janeiro: Zahar, 1984.
3 O Estado Moderno
1. Para autores mais formalistas, o bem comum é apontado como a
principal finalidade do Estado à medida que busca gerir a vida em
sociedade na busca da realização dos objetos dessa e com base
na aplicação do Direito. Para os críticos da ideia de bem comum, o
Estado não poderá o realizar, pois não existe somente uma vontade
geral. Eles afirmam que o que um grupo considera bem comum
pode não ser o mesmo para outros grupos, assim como indivíduos
poderão discordar do que o seu grupo considera bem comum.
Então, considerando a desigualdade e diversidade que existem nas
sociedades, resumir a finalidade do Estado à realização do bem
comum pode ser uma abstração que pouco explica a realidade.
2. O poder político (do Estado) não pode se manter somente com base
na força das armas, ele precisa se legitimar por meio do poder jurídico,
assim como o poder jurídico não pode ser positivado (na forma de
leis) e aplicado sem o aparato institucional do Estado, ou seja, sem
tribunais e sistema prisional.
Gabarito 137
4 Estado e governo
1. O sistema parlamentarista pode ser considerado mais democrático
porque nele um governo somente pode ocupar o posto e se manter
no poder se possuir a maioria das cadeiras do Parlamento. Como a
eleição do Legislativo representa os escolhidos pelo povo, o partido
do líder do governo não conquistar a maioria das cadeiras significa
que esse governo não tem o apoio da maioria dos representantes
do povo e, por isso, não deve permanecer no cargo. Nesse sistema,
o líder do partido que tiver o maior número de cadeiras deverá
assumir como primeiro-ministro. Assim, o Poder Executivo, que
está nas mãos do chefe do governo, deve representar a vontade
do povo.
Gabarito 139
do Estado sobre o próprio Estado, pois, caso contrário, a sociedade
não poderia mais legislar, julgar ou executar e deveria permitir que
homens (comuns ou nobres) governassem e exercessem todas essas
funções no lugar da própria sociedade. Então, se somente o Estado
pode legislar, julgar, executar e exercer violência legítima, é preciso
encontrar mecanismos de proteção para a sociedade contra a ação
do Estado. A medida encontrada foi a moderação desse poder, para
cada uma das funções (poderes) do Estado estar nas mãos de grupos
diferentes, de maneira que um fiscalize o outro e possa, também, agir
punitivamente sobre o outro em caso de abusos e/ou ilegalidades.
Gabarito 141
Alexandra Lourenço
CIÊNCIAS POLÍTICAS
As relações que se estabelecem entre sociedade civil e
Estado definem o potencial democrático de cada país.
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Todavia, não são relações de fácil compreensão, pois
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Alexandra Lourenço