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A Estratégia e a Tática da Revolução Socialista no


Brasil
Resolução do XV Congresso Nacional do PCB

(18 a 21 de abril de 2014 – São Paulo)

Introdução
1) A meta estratégica do Partido Comunista Brasileiro é a conquista do poder político pela classe
trabalhadora e seus aliados fundamentais, organizados no Bloco Revolucionário do Proletariado, cujo
objetivo central é a construção da sociedade socialista, período transitório para a emancipação do
proletariado na sociedade comunista. A conquista revolucionária do poder político envolve dois
aspectos fundamentais: a) a participação dos trabalhadores como sujeito da ação histórica contra o
capitalismo e a sociedade burguesa; b) a organização e o fortalecimento dos instrumentos políticos
revolucionários capazes de dirigir a disputa pela hegemonia do proletariado na sociedade, fazendo
uso das formulações teóricas e políticas que embasam a teoria social desenvolvida por Marx, Engels,
Lênin e outros revolucionários.
2) É no terreno concreto da luta de classes que o PCB trabalha para consolidar-se como um dos
principais instrumentos revolucionários, desenvolvendo uma plataforma política capaz de construir
uma alternativa real de poder para os trabalhadores. Neste processo histórico, o Partido objetiva se
tornar um dos aglutinadores da radicalidade da transformação socialista, contribuindo para a unidade
de ação de todas as forças do Bloco Revolucionário, como um formulador de uma política de classe,
avançada e independente, política esta que dirija as forças anticapitalistas para a revolução
socialista.
3) Desde 1992, quando demos início ao processo de reconstrução revolucionária do PCB, logo após
a ruptura com setores que queriam liquidar o partido seguindo uma linha abertamente de direita,
vimos afirmando a estratégia da Revolução Socialista como o caminho a ser trilhado pela classe
trabalhadora e seus aliados fundamentais para a tomada do poder e a superação da sociedade
burguesa, no rumo do socialismo no Brasil. A estratégia da Revolução Socialista consolidou-se
definitivamente entre nós no XIV Congresso, realizado em outubro de 2009. Nossas resoluções
políticas e de organização foram aprofundadas nas Conferências de Organização (2008) e de Tática
(2011).
4) Se no XIII Congresso (2005) já havíamos rompido com o governo Lula, no XIV Congresso
avançamos para a formulação da necessidade de construção do Bloco Revolucionário do
Proletariado, visando ao aprofundamento das lutas contra o bloco dominante, formado hoje,
fundamentalmente, pela burguesia monopolista, pelo monopólio capitalista da terra e pelo
imperialismo. A orientação central da estratégia do PCB pode ser assim resumida: “uma vez
constatado que o capitalismo no Brasil já atingiu a etapa monopolista, fica claro que o processo
revolucionário brasileiro é de caráter socialista” (Resoluções do XIII Congresso).
5) No XIV Congresso, consideramos que o Brasil se tornou um país capitalista completo, ou seja,
uma formação social capitalista na qual predominam as relações de trabalho assalariadas, a
propriedade privada burguesa dos meios de produção, as formas de produção e acumulação
ampliada de capitais que completaram seu caminho até a formação dos oligopólios, formas estas
inseparavelmente ligadas ao imperialismo, que determina as relações econômicas mundiais. O Brasil
desenvolveu um parque industrial oligopolista, setores de infraestrutura de mineração, energia,
armazenagem, transporte, portos e aeroportos, malhas urbanas, um comércio nacional e
internacional, capitalizou o campo, gerou a estrutura moderna da agricultura, um sistema financeiro
interligado ao mercado mundial e uma malha logística de serviços e ações públicas necessárias à
reprodução das relações burguesas de produção.
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6) Trata-se de uma economia capitalista que já atingiu sua completude, ou seja, já consolidou
plenamente seu parque industrial, seu mercado interno, estendeu à produção agrícola as mais
avançadas técnicas de organização e exploração capitalistas, criou e desenvolveu o capital
financeiro. Toda essa estrutura, altamente complexa e diversificada, está plenamente integrada aos
fluxos internacionais de reprodução do capital. Tal integração ao sistema capitalista mundial verifica-
se na reprodução de práticas imperialistas, que podem ser observadas através da exportação de
capitais de empresas brasileiras pelo mundo afora, tal como Vale do Rio Doce, Santista, Friboi,
Odebrecht, Gerdau, Votorantim, Petrobras, entre outras, fato que não elimina a sua subordinação
aos polos centrais do capitalismo mundial.
7) Próprio do desenvolvimento desigual e combinado desse modo de produção, a particularidade
brasileira absorve e reproduz o capitalismo em toda sua complexidade atual, mas não elimina a
posição de autonomia relativa da economia do país frente ao imperialismo mundial, pois o caráter da
integração reproduz a histórica associação subordinada da burguesia que se constituiu no país –
mesmo que com novos formatos históricos. É preciso, pois, reconhecer a existência de inúmeras
relações de interdependência entre a estrutura econômica brasileira e o sistema capitalista
internacional, como em certas áreas do comércio exterior e na constituição de diversas cadeias
produtivas. Podemos afirmar, enfim, que a formação social brasileira atual, em todas as suas
dimensões, produz e reproduz a forma própria da sociedade capitalista, na qual o eixo central da luta
de classes passa pelo confronto de interesses entre o proletariado e a burguesia.
8) A burguesia brasileira é formada por diversas frações: a industrial, a bancária/financeira, a
comercial, a agrária, o grande empresariado do setor de transportes, a oligarquia que controla as
comunicações no Brasil (toda a rede de TV, controlada por 8 famílias, e os maiores jornais e rádios
do país) e uma facção que contrata serviços diversos formados pela mercantilização crescente de
setores como os da saúde, educação e outros. Ao mesmo tempo, o capital subordina ao mercado e
ao processo ampliado de acumulação de capitais todos os setores que mantêm relações não
capitalistas. É o que ocorre no campo, onde predomina a proletarização promovida pela grande
produção agrária oligopolista (o chamado agronegócio) associada à formação de um proletariado
precarizado, combinadas ou não com a pequena propriedade dedicada à agricultura familiar ou com
formas coletivas de trabalho (cooperativas, assentamentos), as quais cada vez mais são forçadas a
se vincular ao mercado e à lógica do capital. A expansão agroindustrial promove também a expulsão
de comunidades camponesas, quilombolas e indígenas, transformando terras antes dedicadas à
produção de alimentos em áreas produtoras de “commodities”. Ao mesmo tempo, consegue
combinar um alto nível tecnológico com a precarização da força de trabalho, promovendo, em
algumas regiões do país, trabalhos análogos à escravidão.
9) Com o crescimento e a consolidação da moderna economia industrial monopolista, generalizou-se
o assalariamento e formou-se um numeroso proletariado, caracterizado como o conjunto dos
trabalhadores que só podem viver mediante a venda de sua força de trabalho. O núcleo central dos
assalariados é o setor operário, formado pelos trabalhadores produtivos, explorados diretamente pelo
capital e que passou por grandes transformações a partir dos anos 1990. Ao contrário do que se
apregoou com o suposto “fim do trabalho”, o operariado industrial brasileiro cresceu em números
absolutos e desconcentrou-se territorialmente, tendo ainda se fragmentado com a terceirização e a
descentralização das empresas. O operariado industrial é o setor da classe trabalhadora
estrategicamente posicionado no coração da economia capitalista, do ponto de vista da luta de
classes.
10) A urbanização crescente e a criação de uma infraestrutura para o desenvolvimento da
acumulação capitalista geraram camadas urbanas intermediárias que vão desde setores gerenciais,
profissionais assalariados, pequenos e médios comerciantes, técnicos especializados, professores,
pesquisadores, médicos, advogados e outros profissionais. Parte destas camadas médias passou,
nos últimos anos, por uma intensa proletarização, transformando-se em assalariados do capital. Ao
lado destes profissionais proletarizados, somam-se funcionários públicos nos diferentes setores de
ação do Estado, compondo uma numerosa camada heterogênea, com condições de trabalho e
remuneração diversas, a qual sofreu uma precarização crescente nos últimos governos neoliberais.
11) O exército industrial de reserva é formado por um proletariado precarizado, submetido a relações
de trabalho cada vez mais precárias e incertas. Estes trabalhadores estão inseridos nas condições
gerais da acumulação de capitais, como força de trabalho abundante e barata, de diferentes modos:
como operadores da chamada economia informal, como consumidores e agentes da economia
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política da criminalidade ou como base de massa e objeto de ação de uma rede de assistencialismo
e de “filantropia” formada pelo chamado terceiro setor. Parte desta superpopulação relativa mantém
vínculos políticos e culturais com o proletariado, uma vez que se forma constantemente de
expropriados, funcionalmente utilizados pelo capital como forma de manter o valor da força de
trabalho em níveis aceitáveis para a acumulação de capitais. Há ainda uma massa de trabalhadores
desempregados, sem perspectiva de retorno ao mercado de trabalho, que, em condições de pobreza
absoluta, sobrevive da precária proteção oferecida pela assistência estatal. Essa massa tende a ser
manipulada politicamente pelo Estado burguês.
12) Assim, a estrutura de classes no Brasil apresenta um polo burguês, hegemonizado pela grande
burguesia monopolista, e um polo proletário, composto pela imensa massa de assalariados urbanos
e rurais, constituindo, assim, as duas classes antagônicas da luta de classes no Brasil. Do lado delas
coexistem segmentos ou setores médios que tendem ao assalariamento, um campesinato
heterogeneamente formado pela agricultura familiar, cooperados, assentados e pequenos
proprietários e um proletariado precarizado imerso em uma superpopulação relativa inserida de
maneira precária e brutal nas condições do mercado capitalista.

O capitalismo contemporâneo: tendências gerais


13) Nos últimos anos, o capitalismo tem vivido processos de crise e expansão cada vez mais curtos
e constantes. Todas as crises econômicas recentes vivenciadas pelo capitalismo em nível mundial
repercutem o mesmo fenômeno analisado por Marx em O Capital: quanto mais cresce o capital, mais
ele produz a crise que é concernente a sua natureza. As crises do capitalismo contemporâneo, a
partir, principalmente de sua maturidade, com a passagem para a fase monopolista e imperialista no
século XIX, são crises de superacumulação que se combinam com manifestações de superprodução
e queda tendencial da taxa de lucro.
14) Vejamos como Marx desvendou o fenômeno: a) quanto mais cresce a concorrência entre os
capitalistas, menor é a livre concorrência e maior é a tendência ao monopólio; b) nas condições de
uma concorrência entre monopólios, os capitalistas, para aumentar a produtividade do trabalho,
tendem sempre a investir mais em capital constante (máquinas, instalações, novas matérias primas,
etc) e menos em capital variável (compra da força de trabalho), alterando drasticamente a
composição orgânica do capital em favor do trabalho morto; c) o resultado é a tendência geral à
queda na taxa de lucro, porque o trabalho vivo – única fonte de valor – é substituído por trabalho
morto, que somente transmite às mercadorias a mesma quantidade de valor já incorporada nos
meios de produção. Consequentemente, reduz-se a capacidade das empresas de reinvestirem seus
lucros na produção e explodem as crises.
15) A crise econômica atual, que culminou com a explosão do sistema financeiro centrado nos
Estados Unidos, rapidamente se alastrou pela Europa e impactou o restante do mundo. Na Europa,
os efeitos mais violentos da crise verificam-se nos países mais fragilizados economicamente: Grécia,
Espanha, Portugal, Irlanda, Itália, Chipre, em decorrência da política desenvolvida pela União
Europeia em favor do Euro, a qual contribuiu ainda mais para a concentração de capital e para o
fortalecimento das corporações monopolistas, favorecendo, acima de tudo, as empresas da
Alemanha e da França e a praça financeira da Inglaterra.
16) As respostas apresentadas pelos governos dos países centrais à bancarrota que se generalizou
após 2008 combinaram elementos de ajuda estatal ao sistema financeiro, de estatização de bancos
e socorro a empresas de grande porte com o reforço ao desmonte das políticas sociais e o ataque
redobrado aos direitos dos trabalhadores. Enormes somas de dinheiro público foram destinadas às
grandes empresas afetadas pela crise e ao sistema financeiro, ao passo que os trabalhadores
voltavam a sofrer com a retirada de direitos, desemprego em massa, redução de salários e outras
medidas que, sistematicamente, vêm sendo adotadas pelos capitalistas desde o início do desmonte
das políticas de Bem Estar Social, nos anos de 1970/80.
17) A tendência geral do capitalismo atual, em função do acirramento da concorrência internacional e
da expansão das relações capitalistas em praticamente todas as áreas físicas do planeta, é a de
reduzir os mais amplos contingentes populacionais à condição de força de trabalho plenamente
disponível e livre para servir aos interesses e às necessidades do capital. Formas renovadas de
expropriação são criadas para destruir laços sociais e ordenamentos jurídicos que, ao longo da
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história de lutas dos trabalhadores, funcionaram como freios à dominação irrestrita do trabalho pelo
capital. Ao lado de persistir a expropriação sobre pequenos agricultores, tendo em vista subsistirem
grandes massas destes passíveis de se tornarem trabalhadores assalariados (como na China, Índia,
América Latina e África, por exemplo), outras expropriações seguem conduzindo grande número de
trabalhadores à plena disponibilidade para o mercado de força de trabalho, buscando quebrar a
resistência dos trabalhadores à exploração.
18) Uma das formas de intensificar a extração do valor e que mais incide diretamente sobre a
capacidade de organização e de resistência do proletariado à exploração é a que promove a
fragmentação do espaço produtivo e a separação dos trabalhadores em inúmeras unidades fabris.
Trata-se da expropriação da resistência operária por proximidade no local de trabalho, decorrente da
introdução de novas tecnologias produtivas e de outros mecanismos que permitem aprofundar a
cooperação entre os trabalhadores dispensando sua reunião física. No interior do processo
produtivo, formas cada vez mais sofisticadas de gerenciamento da produção, associadas à utilização
de tecnologias frequentemente renovadas, impõem aos trabalhadores a submissão à lógica do
capital dentro e fora do espaço produtivo.
19) Outras formas de expropriação estão ligadas à retirada dos direitos sociais e trabalhistas
conquistados à custa de um longo processo histórico de lutas operárias. Diferentes formatos jurídicos
foram criados para disciplinar a relação de trabalho em favor de sua plena utilização pelo capital:
subcontratações, terceirizações, formação de cooperativas de fachada, trabalho “informal”,
“voluntariado”, renúncia ao contrato formal, ou, ainda, a figura do trabalhador “pessoa jurídica”, que,
mobilizado pela falácia do “empreendedorismo”, se converte individualmente numa empresa fictícia
para vender sua força de trabalho, sem os direitos associados legalmente à contratação tradicional.
20) Tais exemplos de “reestruturação produtiva” e “desregulamentação do mercado de trabalho”, com
vistas à plena “empregabilidade” ou “trabalhabilidade” (para usar termos recorrentes no jargão
burguês contemporâneo) do sujeito obrigado a vender sua força de trabalho para sobreviver, nada
mais são do que formas atualizadas de dominação, com o duplo sentido de disponibilizar grandes
contingentes de pessoas para o trabalho assalariado e de fazer valer a hegemonia do capital, por
meio de um processo alienante de difusão da ideologia burguesa. Isto porque tais mecanismos de
expropriação do trabalho vêm acompanhados de intensa campanha ideológica voltada a convencer a
todos de que se trata da conquista da liberdade individual perante a opressão do trabalho (não do
proprietário dos meios de produção). Propala-se a ideia, difundida pelo “empreendedorismo”, de que
cada um pode ser “patrão de si mesmo”.
21) As novas condições de exploração, que se impõem tanto pela violência quanto pelo
convencimento, obrigam às mais abjetas sujeições em troca da subsistência do trabalhador, a
começar pela ameaça permanente do desemprego: a requalificação dos trabalhadores, que devem
interiorizar a necessidade de uma autoempregabilidade; a instauração de formas de “parceria”
ocultando relações de exploração, por meio de cooperativas, contratos temporários, formas de
“voluntariado”, etc. Tudo isso é difundido como se fosse absolutamente novo, como se não fosse da
natureza mesma das relações sociais de produção capitalistas, desde seus primórdios, promover a
separação entre trabalhadores e condições sociais de trabalho, com vistas à permanente criação de
grandes contingentes de “pobres laboriosos” livres, “essa obra de arte da história moderna”, como
dizia Marx.
22) Longe do suposto “fim do trabalho”, tais expropriações demonstram a importância da força de
trabalho no mundo capitalista de hoje. À expropriação capitalista corresponde, no extremo oposto da
mesma relação, a gigantesca concentração de recursos em mãos dos capitalistas, recursos que
precisam ser constantemente valorizados e aplicados na própria exploração dos trabalhadores. A
profunda transformação da base tecnológica foi extremamente útil não apenas para transferir capitais
de um lado a outro, posto que, isolado, o acúmulo de dinheiro não produz mais-valor, mas para,
simultaneamente, fragmentar o conjunto da classe trabalhadora. A reestruturação produtiva do
capitalismo contemporâneo, portanto, é parte integrante do processo imperialista, resultante da ação
hoje hegemônica do capital financeiro.
23) O capital financeiro, apesar de ter-se amplamente disseminado o mito da existência de atividades
puramente monetárias e especulativas, sem envolvimento algum com a produção, está
completamente envolvido com os processos de extração de mais-valor e somente pode continuar
existindo caso impulsione sem cessar essa extração. Inicialmente meros depositários ou
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intermediários dos lucros dos grandes empresários capitalistas, no processo histórico de formação e
desenvolvimento do capital financeiro, os bancos tornaram-se também proprietários de capital
voltado ao investimento na produção, precisando fazer expandir frequentemente as relações sociais
capitalistas.
24) Ao mesmo tempo, há um intenso movimento especulativo, que passa a integrar a dinâmica da
expansão do capital, gerando um capital fictício através da multiplicação de papéis e títulos sem
correspondência real com os capitais respaldados efetivamente no processo de produção. O
descompasso entre o capital fictício e o capital lastreado na produção direta de valor vem
fomentando as recorrentes crises capitalistas da atualidade. A continuidade das atividades
especulativas na fase atual do capitalismo indica, no entanto, que a base social da acumulação
capitalista permanece fundamental, pois a concentração desses capitais só fez aprofundar a
exigência de valorização de tais massas de recursos sob todas as formas de exploração da força de
trabalho.
25) A hegemonia do capital se constrói a partir mesmo das relações de produção e busca envolver a
totalidade social. Ao mercantilizar tudo e todos à sua volta, o capital expande seus domínios para o
conjunto das relações sociais: as expropriações avançam sobre diversas formas de solidariedade
comunitária e cultural, sobre conquistas sociais tais como a saúde e a educação públicas (direitos
sociais que se transformam, cada vez mais, em produtos e serviços disponíveis no mercado, como
quaisquer mercadorias), sobre os movimentos sociais, que sofrem renovados processos de
criminalização, sobre os direitos políticos, com a redução das conquistas democráticas ao mero jogo
eleitoral. No caso brasileiro, temos ainda o avanço sobre a logística dos transportes (portos,
rodovias, aeroportos), hospitais federais universitários (com a Empresa Brasileira de Serviços
Hospitalares – EBSERH), a precarização do serviço público federal com o fim da aposentadoria
integral e a adoção da FUNPRESP, e até mesmo a privatização de estádios e arenas esportivas.
26) Todo esse quadro nos leva a reflexões fundamentais para o avanço da luta contra o capitalismo:
em primeiro lugar, reafirma-se categoricamente a contradição entre capital e trabalho como a
contradição fundamental a exigir a organização da classe trabalhadora na luta contra o sistema
capitalista. A luta central, pois, é entre classes, não entre nações. Mais do que nunca, coloca-se na
ordem do dia a estratégia revolucionária de luta pelo socialismo. Em segundo lugar, se as mutações
sofridas pela classe trabalhadora no quadro do redimensionamento global do capitalismo
contemporâneo acarretaram alterações muito expressivas no conjunto do proletariado, fazendo com
que, nos dias atuais, ela difira bastante do proletariado industrial identificado como sujeito
revolucionário do Manifesto do Partido Comunista, é ainda esse contingente humano de
trabalhadores que identificamos, por sua posição central no processo de produção de riquezas, como
capacitado a assumir o protagonismo na luta de classes, rumo à construção do socialismo e da
sociedade comunista.

A hegemonia burguesa no Brasil


27) No Brasil, a construção da sociedade burguesa e de seu Estado se insere no processo tardio de
formação do capitalismo e da própria burguesia enquanto classe dominante, como resultado da
herança histórica colonial. Daí que o Estado burguês tenha se desenvolvido não como fruto de uma
revolução burguesa clássica, mas em consequência de disputas e conflitos gestados e solucionados
entre os grupos e classes dirigentes, sem a participação dos setores proletários. Cabe ressaltar que,
ao longo da história nacional, essas classes dirigentes exerceram o controle do poder político em
decorrência do monopólio dos principais meios de produção. Nesta forma particular de constituição
da hegemonia capitalista, em que pesem as diferentes formas assumidas de poder político, a
característica central foi a predominância dos aspectos repressivos e coercitivos no exercício da
dominação. Prova disso foi o constante recurso aos golpes e às intervenções armadas da parte da
classe dominante, desde a proclamação da República até a ditadura inaugurada com o golpe militar
de 1964, apoiada e financiada pela burguesia nacional e internacional.
28) O período ditatorial marcou a consolidação do bloco dominante burguês, hegemonizado pela
burguesia monopolista, em aliança com o latifúndio tradicional e o imperialismo. Este bloco organizou
o assalto ao poder de Estado em 1964, colocando fim ao período de legalidade burguesa anterior e
interrompendo o ascenso político das massas populares verificado desde a década precedente. O
golpe explicitou o caráter marcadamente autocrático da burguesia internamente instalada, através de
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uma política própria de governos classicamente bonapartistas, que se utilizam do expediente da
força militar para impor uma ordem social que se adeque aos seus interesses de classe.
29) Consolidado este objetivo, o processo de dominação burguesa se completou com a transição da
ditadura ao Estado de Direito burguês. O período de abertura política serviu, fundamentalmente, para
promover a incorporação das massas urbanas e dos trabalhadores ao ordenamento jurídico-político
burguês, de que é expressão significativa a afirmação de um conjunto de regras democráticas, como
a ampliação do direito ao voto, e de direitos sociais e trabalhistas, sacramentados na Constituição de
1988. Formou-se, assim, uma sociedade civil-burguesa com um conjunto de instituições enraizadas
e, em parte, legitimadas no corpo da sociedade, tendo se afirmado a hegemonia liberal burguesa
através de um regime formalmente democrático, num processo que se completa com o
estabelecimento de poderoso monopólio capitalista nas telecomunicações, na informação e na
organização da cultura, responsável por aprimorar e fortalecer a dominação ideológica em favor da
burguesia.
30) É certo que este processo de consolidação da ordem burguesa no Brasil não se deu sem
conflitos. Nos estertores da ditadura, travou-se uma luta entre os grupos burgueses dominantes e o
bloco de forças políticas e sociais formado pelos trabalhadores e setores das camadas médias, à
época sob a forte influência do PT e de outros setores de esquerda, juntamente a inúmeras
entidades de massas e movimentos e organizações políticas que se destacaram na resistência ao
regime ditatorial e nas lutas democráticas do período anterior. Em que pese a eclosão de inúmeras
greves e manifestações populares durante a chamada abertura, o resultado final deste embate, em
meio a um contexto internacional de crise do movimento socialista e de ofensiva neoliberal, foi o
amoldamento à ordem liberal burguesa das instituições forjadas na luta contra a ditadura.
31) O transformismo operado no interior das principais organizações de esquerda do período – com
destaque para o PT e a CUT – conduziu-as a uma postura de abandono das propostas radicalizadas
de sua origem e de limitação da luta dos trabalhadores aos marcos impostos pela ordem hegemônica
burguesa. Isto representou, na esfera política, a sanção das principais organizações representativas
dos trabalhadores ao poder instituído, culminando, na década de 1990, com a franca afirmação de
uma democracia reduzida às estratégias ditadas pelo capital. Esta situação se explica em parte pela
burocratização e acomodação das direções partidárias e sindicais e das principais organizações
representativas dos trabalhadores e da juventude (vide CUT e UNE) e, por outra, pelo equívoco de
acreditar na viabilidade da disputa no interior do capitalismo e de seu Estado burguês, pressupondo
um aperfeiçoamento lento, gradual e progressivo desse Estado, o que levou à prática de considerar,
como um fim em si mesmo, a participação em espaços institucionais e em cargos nas esferas de
governo e do parlamento.
32) Ao longo dos últimos trinta anos, o espaço político conquistado através das lutas contra a
ditadura transformou-se em formas de apassivamento das massas trabalhadoras às regras de um
jogo eleitoral calcado nos velhos vícios fisiológicos, na corrupção, na manipulação ideológica, no
mercado de votos e no marketing elaborado por grandes empresas de publicidade, que vendem
candidatos como produtos ligados à competência administrativa e à capacidade de melhor gerenciar
a crise produzida pelo capital. Nos períodos não dedicados às campanhas eleitorais, a participação
política restringe-se ao modelo de cidadania incapaz de abalar as estruturas do sistema, pois voltado
à administração de problemas de maneira não conflituosa, por meio de mecanismos institucionais,
iniciativas legislativas e ações judiciais. O eixo das lutas de massas foi, assim, deslocado para a
representação política e institucional, buscando-se quebrar o protagonismo dos trabalhadores e
estimulando a articulação dos movimentos sociais em torno de lutas ligadas ao atendimento a
demandas específicas (como as de gênero, etnia, orientação sexual, culturais, etc.) desvinculadas
das lutas gerais contra a exploração capitalista.
33) A chegada do PT ao governo só fez avançar a proposta de realização de um “pacto nacional” de
submissão consentida do conjunto da sociedade à hegemonia burguesa, por meio de programas
como o Fome Zero e outros, que deveriam mobilizar ONGs, empresas, instituições religiosas,
sindicatos e escolas num mutirão de combate à fome, instituindo a parceria da “sociedade civil
organizada” com o Estado. O apelo ao tratamento compensatório à fome e à miséria de parte da
população integra a estratégia de construção do consenso em torno do projeto de transformação do
Brasil em um país de capitalismo avançado com “face humana”. A economia política do capital e a
filantropização da questão social encontram sua unidade na manutenção da economia de mercado
capitalista, ou seja, a economia privada deve dar lucros, o Estado arrecadar e, depois de garantir os
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prioritários interesses do grande capital, deve chegar, de maneira focalizada, até pontos da
miserabilidade, para amortecer a explosividade da miséria.
34) Esta estratégia ajuda a encobrir, de um lado, o processo avançado de privatização dos serviços
públicos e de transferência da responsabilidade do Estado para a esfera privada (através de
contratos com Organizações Sociais – OSs, por exemplo), acompanhado da retirada dos direitos
sociais. De outro, percebe-se a tentativa de evitar o acirramento da luta de classes, criando espaços
institucionais de participação dos indivíduos e entidades associativas para o encaminhamento de
reivindicações e a resolução de problemas de forma pragmática, na lógica da colaboração e sem
resvalar para o campo da contestação ao status quo. É o que acontece nos órgãos oficiais de
participação da sociedade, como Conselhos e Conferências, cujo objetivo maior é legitimar as ações
dos governos burgueses, impedindo ou dificultando ao máximo a efetiva participação popular em seu
interior.
35) A combinação eficiente de consenso e coerção garante a reprodução do domínio da ordem
monopolista burguesa. A subordinação dos trabalhadores à ordem institucional burguesa e aos
imperativos do capital e do mercado se processa por um conjunto de mecanismos de dominação:
manipulação ideológica pelos meios de comunicação, ações permanentes no interior da empresa
para a colaboração de classe, promoção da cultura do individualismo, incentivos materiais como
participação nos lucros e resultados e cooptação pura e simples das lideranças sindicais. Quando
esses métodos não funcionam, as classes dominantes lançam mão da repressão e da violência
policial sobre todos aqueles que se levantam contra essa ordem, promovendo a criminalização dos
movimentos sociais, da pobreza e da militância anticapitalista.
36) Mas é preciso reconhecer a existência de disputas políticas entre distintas frações de classe no
interior do bloco hegemônico burguês. A disputa política institucional principal no Brasil de hoje se dá
entre duas alternativas no campo do capital: uma representada, fundamentalmente, pela aliança
liderada pelo PSDB (que inclui legendas ultraconservadoras como o DEM) e outra representada pelo
bloco de partidos que sustentam o governo do PT, tendo o PMDB como principal aliado. Esta disputa
se faz dentro dos limites de um grande consenso burguês, que tem por base a manutenção da
macropolítica econômica, a manutenção e aprofundamento da lógica de mercado, o papel do Estado
como garantidor dos interesses do capital monopolista e amortizador da luta de classes e o
abandono de qualquer alternativa, mesmo reformista, que possa implicar em mudança dos marcos
do “novo pacto social”.
37) Em outras palavras, em que pesem algumas diferenças, o bloco liberal burguês encontra uma
unidade estratégica em forças políticas que divergem na tática. PT, PSDB, PMDB, DEM, PP, PSB,
PTB, entre outros partidos, disputam a confiança das classes dominantes e o controle da máquina de
governo – e, a partir daí, a ocupação de cargos e o manejo do jogo político tradicional que se
perpetua – como forças políticas distintas defensoras de um mesmo projeto de sociedade, que tem
por base a manutenção das relações capitalistas de produção, a propriedade privada, a economia de
mercado e a integração do capitalismo brasileiro ao sistema imperialista.
38) Por trás destas expressões políticas, formou-se um bloco de classe burguês que, mesmo com
disputas entre as frações que o compõem, mantém a hegemonia conservadora sobre a sociedade
brasileira: a burguesia monopolista, a nova burguesia monopolista agrária, a pequena burguesia e o
capital financeiro (nacional e internacional), este último exercendo papel preponderante na condução
da lógica de reprodução do capitalismo em sua atual fase de internacionalização. Junte-se à
composição deste bloco, uma fração oriunda do proletariado que, recrutada nas burocracias
partidárias e sindicais, passou por um processo de transformismo em seu posicionamento de classe
e age politicamente no sentido de cooptar o conjunto do proletariado, buscando garantir o apoio
desta classe ao governo e ao projeto político-econômico por este encarnado, afastando-se cada vez
mais de suas origens de classe.
39) O posicionamento do governo atual na dinâmica da luta de classes deve ser entendido pelo
caráter do programa e da ação política objetiva que reproduz, não pela origem de classe de seus
membros. Neste sentido, tal governo é o principal representante de uma política que propõe a
conciliação e a harmonização entre o capital e o trabalho, nos marcos de uma política “republicana”
que supostamente atenderia aos interesses de “toda” a sociedade, proposições próprias do ideário
liberal, portanto burguês, em sua fase histórica de explícito recuo conservador. A lógica política é a
da conciliação de classe, do interesse da “nação” acima dos interesses de classes, da harmonização
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dos conflitos e, principalmente, da crença que o desenvolvimento da economia capitalista resolve as
desigualdades sociais através do “ciclo virtuoso” da produção, emprego, consumo, e que aos mais
miseráveis, o Estado deve contemplar com políticas compensatórias. Explicitando seu conteúdo
ideológico, afirmamos: trata-se de um projeto burguês.
40) Essa fração do proletariado que aderiu ao projeto burguês se transformou em principal “gestora”
do capitalismo brasileiro na última década. Assim, ocupando cargos em todos os níveis do governo
federal – inclusive como integrantes dos conselhos de administração de grandes empresas estatais e
como representantes de fundos de pensão – os principais quadros políticos do PT e da CUT
passaram à defesa do projeto burguês, cuja lógica financeira orienta o posicionamento econômico do
governo. Só podemos concluir que o governo e seu projeto de pacto alinharam-se aos interesses do
capital monopolista, na cidade e no campo, e ajudaram a consolidar e legitimar a hegemonia
burguesa liberal, compondo assim o bloco conservador e a aliança com a burguesia monopolista
(que inclui o agronegócio e a burguesia bancária) e o imperialismo.

A Estratégia Socialista da Revolução Brasileira


41) Afirmamos que a Revolução Brasileira é uma Revolução Socialista, considerando que o Brasil é
uma formação social capitalista desenvolvida e monopolista, que a burguesia monopolista
nacional/internacional constituiu-se em classe hegemônica e dominante; que o Estado brasileiro é
um Estado burguês e que o processo político da luta de classes no ciclo recente produziu um bloco
liberal burguês hegemônico e dominante, formado pela aliança entre a grande burguesia
monopolista, o monopólio capitalista da terra, o imperialismo e um setor da pequena burguesia
política que, através de burocracias partidárias e sindicais e o controle de mecanismos de governo,
buscam cooptar o proletariado e neutralizar suas ações; considerando ainda que um bloco proletário
procura resistir na direção de uma contra-hegemonia que aponta para uma meta de superação do
capitalismo e da necessidade de uma sociedade socialista.
42) Sob todos os aspectos, a hegemonia burguesa consolidou-se plenamente no Brasil. A economia
capitalista desenvolveu-se até o estágio monopolista, tendo se constituído uma sociedade civil-
burguesa e um “Estado de Direito”. O capitalismo brasileiro é parte do processo de acumulação
mundial e parte constitutiva do sistema de poder imperialista no mundo, e as classes dominantes
brasileiras estão associadas umbilicalmente ao capital internacional. A burguesia não disputa sua
hegemonia contra nenhum setor pré-capitalista; pelo contrário, a luta burguesa se volta contra a
possibilidade de uma revolução proletária. As “tarefas clássicas em atraso”, como a reforma agrária,
não são mais tarefas em atraso, mas tarefas deixadas para trás e que não serão realizadas nos
limites de uma sociedade capitalista. As contradições objetivas que estão na base das demandas
imediatas das massas trabalhadoras não se devem ao baixo desenvolvimento de forças produtivas
capitalistas, mas exatamente pelo próprio desenvolvimento e natureza de uma sociedade
hegemonizada pelo capital.
43) Portanto, as tarefas estratégicas colocadas ao conjunto dos trabalhadores e, em especial, à
classe operária, núcleo estratégico e central do sujeito revolucionário, o proletariado, não podem se
realizar nos limites de uma sociedade capitalista. O grau de desenvolvimento das forças produtivas
materiais, no Brasil e no mundo, já se coloca em contradição com a atual forma capitalista das
relações sociais de produção, que ameaçam a produção social e a própria existência das condições
que permitem a vida humana no planeta. A transição para o socialismo e para a formação de um
Estado Proletário que garanta a existência de novas formas de propriedade e de relações sociais
representa o único meio de libertar os trabalhadores das mazelas que hoje os afligem, contribuindo
para livrar o mundo do desastre socioambiental que a ordem capitalista mundial impõe.
44) Para dar consequência à estratégia socialista – consolidada a partir da interpretação do
capitalismo como modo de produção determinante na formação social brasileira – sinalizamos para a
necessidade de o PCB, como um operador político da classe, aprofundar o debate sobre a via ao
socialismo, pautado pela imanência do acirramento da luta de classes e pelas características da
sociedade de massas que temos. O PCB não exclui a radicalização de nenhuma perspectiva
revolucionária, não descartando qualquer forma de luta no processo de ruptura com a ordem do
capital.
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45) Toda a experiência histórica dos trabalhadores demonstrou que qualquer forma de pacto com a
burguesia é uma miragem que confunde os trabalhadores, desorienta a luta de classes e apaga o
horizonte socialista. Seja a clássica socialdemocracia, que, após a Segunda Guerra Mundial,
garantiu, sob pressão da luta organizada dos trabalhadores, direitos e políticas públicas, mas que se
domesticou diante do capital; seja a atual versão do social-liberalismo ou “socialdemocracia tardia”,
adoradora do mercado, que passou a gerir o neoliberalismo adotando medidas assistencialistas, ao
mesmo tempo em que são aplicadas com mão de ferro as políticas mais regressivas do grande
capital, conforme pudemos verificar nos últimos 30 anos. Esses pactos não nos levarão a conquistas
parciais que cumulativamente poderiam desembocar em uma sociedade justa e igualitária. Pelo
contrário, fortalecerão ainda mais o capital e seu sistema de poder mundial. Toda experiência
histórica e presente nos comprova que o capital e a propriedade privada capitalista, ao se
perpetuarem, concentram riquezas, acumulam desigualdades e geram periodicamente as crises que
terão que ser pagas pelos trabalhadores para salvar o lucro dos grandes capitalistas.
46) A definição da etapa socialista da Revolução Brasileira não implica ausência de mediações
políticas na luta concreta para enfrentamento das conjunturas que se apresentam na dinâmica da
luta de classes imediata. No entanto, a estratégia socialista determina o caráter da luta imediata, ou
seja, a estratégia subordina a tática e não o inverso, como formulam equivocadamente algumas
organizações políticas e sociais. A estratégia socialista não nega as lutas imediatas, mas não aceita
a forma atual de sociabilidade como capaz de dar soluções estruturais e duradouras a estas
questões, pois os problemas vividos pelas massas são manifestações da contradição entre a forma
capitalista de organização da sociedade e as necessidades da produção e reprodução da vida em
um novo patamar.
47) Entendemos que os campos institucional e eleitoral são importantes espaços a serem ocupados
pelos comunistas na luta de classes, mas sabemos das suas crescentes limitações e precisamos
determinar com clareza como ocupá-los. Nossas ações táticas e nossa política de alianças devem
ser moldadas pela necessidade de superação revolucionária do capitalismo e pela construção da
sociedade socialista. Tal construção dependerá de uma ação permanente dos comunistas e
revolucionários para intensificar a luta política e ideológica na sociedade atual e fazer avançar o
projeto contra-hegemônico do proletariado. Este projeto será construído no calor da luta de classes,
em meio aos embates sociais e ao processo de confrontação política e ideológica frente ao
capitalismo e à sociedade burguesa.
48) Na perspectiva do socialismo, é preciso pensar a construção da hegemonia proletária como a
formação de um modo de produção alternativo sob controle dos trabalhadores, o que significa dizer
que ela se assenta no mundo da produção, não ficando restrita à sua dimensão política e cultural. O
conceito de Bloco Histórico nos remete à compreensão da sociedade como unidade orgânica entre a
estrutura econômica e a superestrutura, cimentada por uma determinada ideologia, na qual ocupam
papel fundamental os intelectuais, artistas e organizadores da cultura. Os trabalhadores, em sua luta
contra a ordem do capital, devem apresentar-se como classe capaz de contrapor à atual sociedade
desde formas de produção social da vida anticapitalistas, base para novas relações sociais de
produção, até formas políticas de participação popular que correspondam à profunda socialização da
produção e da vida social.
49) Contra o bloco histórico capitalista, portanto, devemos atuar visando à construção do Bloco
Revolucionário do Proletariado, ou seja: o conjunto de ações e transformações econômicas,
políticas, jurídicas e formas de consciência que apontem para a superação do capitalismo e para a
construção da sociedade socialista no rumo do comunismo. Isto exige a formação de um bloco de
classes e setores sociais e suas representações político-organizativas, que, nas lutas concretas –
específicas ou gerais – contra a ordem do capital, vá se constituindo como um poderoso instrumento
de luta e de organização dos trabalhadores, com uma ação que extrapole o campo dos interesses
econômicos para se apresentar como o contraponto unitário de forças à hegemonia burguesa. A
construção do bloco contra-hegemônico, portanto, pressupõe a articulação das dimensões
econômicas e políticas na conformação da proposta emancipadora, capacitando o proletariado ao
exercício do poder político e da direção cultural de toda a sociedade.
50) O PCB reafirma que esta transformação histórica não se dará através de um projeto reformista,
mas por uma ruptura radical, na qual desempenha papel central a questão do poder, ou seja, a
destruição do poder e da dominação política burguesa e a construção de um novo Estado do
proletariado da cidade e do campo, comprometido com a construção histórica da capacidade dos
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trabalhadores em chegar ao autogoverno e, portanto, à superação do Estado. Isto implica que nossa
política de alianças deve se materializar no campo proletário e popular. A aliança de classes capaz
de formar o Bloco Revolucionário do Proletariado deve ser fundamentalmente estruturada entre os
trabalhadores urbanos e rurais, os setores médios proletarizados e as massas de proletários
precarizados que compõem a superpopulação relativa.
51) A força deste bloco está diretamente ligada à capacidade de a classe trabalhadora entrar em
cena com independência e autonomia histórica, mas depende, da mesma forma, da iniciativa de
vanguardas que resistam à acomodação e mantenham-se em luta contra a ofensiva crescente e
criminalizadora do capital monopolista e seus aliados da pequena burguesia. A fragmentação atual
do bloco popular expressa a fragmentação da própria classe trabalhadora, em virtude centralmente
das determinações atuais da dominação capitalista, mas também como resultado da inflexão política
das vanguardas que a hegemonizaram neste ciclo que se encerra. A unidade do bloco proletário
deve ser buscada fundamentalmente na capacidade de organização e luta dos trabalhadores contra
a hegemonia liberal burguesa.
52) Este bloco é, portanto, um projeto político a ser construído. Os elementos dispersos e
fragmentados não se constituem enquanto classe, nem econômica nem politicamente. Apresentam-
se como indivíduos em disputa no mercado de trabalho, espaço no qual seu adversário imediato às
vezes é outro proletário e não a burguesia. A fusão de classe exige que estes setores sociais se
coloquem em luta e sejam capazes de ver, para além das expressões fenomênicas, as causas
comuns de seus problemas e a solução, como consequência direta de sua ação independente e
constituição, enquanto classe portadora de um projeto histórico próprio: o socialismo. Nossa política
de alianças deve ser firme e ampla: ao mesmo tempo em que não há alianças estratégicas com a
burguesia e seus aliados, todo aquele que na luta concreta se colocar em movimento contra a ordem
do capital, se contrapondo aos interesses do bloco liberal burguês, é um aliado em nossa luta.
53) Mas é preciso não confundir a necessidade de unidade dos trabalhadores e sua fusão em classe
social com a unidade das forças políticas que representam ou dizem representar os trabalhadores.
Enquanto militantes da classe trabalhadora em suas lutas imediatas e concretas, devemos
apresentar o ponto de vista do proletariado, apontando as causas dos problemas imediatos e
relacionando-as com a lógica do capital, defendendo uma alternativa socialista. É de se esperar que,
no acirrar das lutas sociais – sobretudo com o agravamento da crise do capitalismo e a rendição do
governo de plantão às receitas do capital para combater seus efeitos – setores hoje hegemonizados
pelas organizações reformistas e burocráticas possam vir a se deslocar para o bloco proletário,
passando à condição de aliados quando se contrapuserem, na prática, às iniciativas e políticas
antipopulares do bloco burguês liberal e de seu governo.
54) O PCB precisa aprofundar a sua organização interna e dar um enorme salto qualitativo no seu
trabalho de inserção no interior dos movimentos dos trabalhadores, da juventude e das lutas
populares, para poder assumir como perspectiva futura um importante protagonismo na direção do
bloco contra-hegemônico. Não se trata de fazermos a autoproclamação do Partido como organização
revolucionária da classe, mas de nos apresentarmos como uma vanguarda que, no interior de um
bloco amplo de forças políticas e sociais, seja capaz de jogar todas as energias na direção da
construção do projeto revolucionário e na contraposição às saídas reformistas, “nacional
desenvolvimentistas”, “democrático-populares” ou outras, que não levem às últimas consequências a
ruptura com a ordem capitalista. Todavia, tal objetivo somente será alcançado se, na condição de
parte integrante do proletariado e respaldado pelas condições objetivas, soubermos agir no sentido
de conquistar o reconhecimento e o apoio das massas ao nosso Partido e ao projeto revolucionário.
55) O Partido será capaz de participar da direção da classe trabalhadora se penetrar nas
organizações nas quais a massa trabalhadora se agrupa, realizando nelas e através delas uma
sistemática mobilização de energias segundo um programa de lutas anticapitalistas e anti-
imperialistas. Lênin deixava claro não existir uma única forma de luta capaz de conduzir à vitória do
socialismo, que pudesse ser copiada pelos movimentos revolucionários em todo o mundo, “na base
de regras táticas de luta estereotipadas, mecanicamente niveladas e idênticas”. Tampouco basta a
ação isolada da vanguarda ou um trabalho voltado apenas à agitação e à propaganda, pois somente
através da própria experiência política das massas será possível desenvolver formas de abordagem
da revolução proletária, ou seja, formas de luta eficazes na mobilização popular e no enfrentamento
às classes dominantes.
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As Mediações Táticas da Revolução Socialista


56) Assim como expresso no Manifesto do Partido Comunista de Marx e Engels, devemos reafirmar
que os comunistas do PCB não lutam para criar um partido à parte do proletariado, mas devem
apresentar, no conjunto da luta dos trabalhadores, ali onde ela se expressar, os interesses gerais da
classe. Esta representação se associa à necessária compreensão da sociedade capitalista e suas
determinações mais profundas, assim como se articula à dimensão internacional da luta e do
horizonte socialista e comunista de nossa proposta. A tarefa central dos militantes do PCB é a
construção do nosso Partido em bases de fato revolucionárias, sem o que não será possível agir no
interior da luta de classes com uma perspectiva política que vá além das reivindicações e
necessidades imediatas. Da mesma forma, a organização do PCB só tem sentido se for ao mesmo
tempo organização de um setor da classe trabalhadora profunda e organicamente ligado às lutas
reais do proletariado.
57) Uma vez que o domínio do bloco conservador construiu uma hegemonia que se expressa em
todos os níveis da sociedade (na aceitação da economia capitalista de mercado; no limite das
políticas sociais não mais percebidas como direitos conquistados; na privatização dos serviços e
desmonte das políticas públicas, etc.) torna-se necessário um intenso trabalho de informação, de
formação política e de ação cultural, no sentido de desvelar os reais fundamentos da ordem do
capital, apostando no desenvolvimento de valores calcados na solidariedade de classe, que
resgatem a história das lutas e da resistência dos trabalhadores e das massas por seus objetivos,
com autonomia e independência. De igual modo, o caráter integrado do capitalismo brasileiro à
ordem internacional do capital imperialista implica numa interdependência da luta contra-
hegemônica. Este aspecto leva à tática de aprofundar os laços de solidariedade internacional
diferenciando aquelas forças que atuam na perspectiva anticapitalista e anti-imperialista e, ainda
mais sólida e profundamente, àquelas forças socialistas e comunistas.
58) A construção do poder proletário/popular não se resume à mera negação institucional ou
qualquer tipo de paralelismo autonomista, mas ocupa ativamente todos os poros da institucionalidade
atual, guiada por um projeto histórico de negação da ordem capitalista, portanto, partindo da
afirmação revolucionária segundo a qual os meios necessários à vida não podem ser apropriados
privadamente, que nenhum ser humano pode se apropriar de outro para transformá-lo em
mercadoria, que os bens de primeira necessidade e os serviços necessários à produção e
reprodução social da vida são patrimônio de toda a humanidade e não podem ser apropriados
privadamente. É necessário ir construindo, a partir de agora, a partir da velha ordem, um duplo
poder, uma ordem institucional e política própria dos trabalhadores, fundada e fundante de uma nova
cultura proletária e popular, capaz de dar unidade ao bloco proletário e colocá-lo em movimento na
luta contra a ordem burguesa.
59) O tema do Poder Popular apontado pelas resoluções do XIV Congresso do PCB ganhou, na
conjuntura atual, uma nova dimensão, uma vez que se tornou uma palavra de ordem que encontrou
grande repercussão no movimento de massas e entre várias organizações de nosso campo de ação
política. Ao afirmar a necessidade de construir um Poder Popular, o PCB chama a atenção para um
processo político que não pode ser confundido com instâncias e organizações de massa ou
articulações políticas entre os partidos de esquerda, isto é, não é um mero elemento de ação tática.
Este processo se desdobra em pelo menos quatro momentos fundamentais, que articulam o plano
tático e o estratégico:

a) A luta pelo Poder Popular se expressa nas ações independentes da classe trabalhadora em
seus embates contra as manifestações mais evidentes da ordem do capital, os quais ganham
a forma mais expressa de mobilizações, greves e movimentos que colocam em marcha os
diferentes segmentos do proletariado e da classe trabalhadora em geral. Neste aspecto
afirmamos que o Poder Popular existe já em germe na construção da autonomia e da
independência de classe destes movimentos que se chocam com o bloco conservador e sua
política em defesa da ordem burguesa, através das organizações próprias da vida cotidiana,
da organização e da resistência da classe trabalhadora (movimentos sociais, sindicatos,
organizações e partidos de esquerda, fóruns de luta pela saúde, educação, moradia,
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transporte, etc.), ainda que, neste momento, atuem de forma fragmentada e sem a unidade
política necessária.
b) Essas lutas e os enfrentamentos tendem a se intensificar e, diante da reação esperada do
poder burguês, caminhar no sentido da necessária unidade programática em torno de eixos
comuns de luta que unifiquem as demandas setoriais apresentadas de forma fragmentada em
uma pauta cada vez mais precisa de bandeiras e reivindicações, sob as quais o movimento
de massas define sua independência em relação aos governos da ordem e ao bloco
dominante, dando forma ao campo popular e de esquerda.
c) A culminância das lutas de massas e das resistências desenvolvidas aponta para o
aprofundamento da autonomia do campo popular expressa nas bandeiras de luta, na pauta
das demandas apresentadas e em formas organizativas capazes de se configurar como força
política contraposta ao bloco dominante e como alternativa de poder, formulando um
programa político de transformações necessárias de caráter anticapitalista. Neste momento, o
Poder Popular encontrará as formas organizativas necessárias que não podem ser
antecipadas (Conselhos, Assembleias Populares, Comitês, etc.).
d) No quadro de uma situação revolucionária ou pré-revolucionária, esta construção política
pode e deve assumir a forma de uma dualidade de poderes que prepare as condições para
os enfrentamentos decisivos contra as classes dominantes e seu Estado – a ditadura da
burguesia –, combinando formas diretas de luta que possibilitem a constituição de uma real
alternativa de poder dos trabalhadores. Neste momento, o Poder Popular assume toda sua
potencialidade como germe de um novo Estado sustentado pelas massas populares e pela
classe trabalhadora, na perspectiva da transformação radical da sociedade. Plenamente
desenvolvido em seu potencial, o Poder Popular se converte em germe de um Estado
Proletário – a Ditadura do Proletariado – que conduzirá a transição socialista visando
erradicar a propriedade privada, as classes e, portanto, o próprio Estado através da livre
associação dos produtores.

60) Distanciamo-nos de algumas concepções de poder popular: 1) da micropolítica ou da pequena


política dos conselhos, dos fóruns e de todos aqueles espaços onde se procura envolver a população
com a política ilusória da “cidadania participativa”, não permitindo a tomada de decisões relevantes,
nem incidindo na correlação de forças entre as classes, ao ocultar as contradições fundamentais; 2)
as institucionalizantes e eleitoreiras, que organizam grupos e coletivos apenas na época das
campanhas ou pretendem canalizar as lutas e a revolta da classe trabalhadora meramente no campo
institucional, formulando projetos de lei, planos diretores, etc.; 3) a dos “novos socialistas utópicos”,
que apostam todas suas fichas no poder local, nas pequenas experiências cooperativas, nos projetos
de economia solidária ou de autogestão, pois acham que a proliferação dessas experiências e de
novos espaços de sociabilidade porá em xeque o sistema capitalista e o Estado burguês.
61) No campo contrário a essas formulações, entendemos Poder Popular como a superação da
fragmentação das lutas, imprimindo a elas um projeto de classe em torno do qual elas se articulam,
cuidando sempre de fortalecer a autonomia e independência de classe dessas lutas frente ao Estado
e ao capital, na experiência concreta do enfrentamento permanente ao inimigo de classe, buscando
sempre impulsionar as contradições e contribuindo, desta forma, para o amadurecimento da ruptura
socialista.
62) A construção do Poder Popular, portanto, pressupõe a criação de novas formas de associação e
sociabilidade proletária através das manifestações de resistência da classe trabalhadora, dotando-as
de dimensão política, pela compreensão das raízes e determinações de cada problema particular e
ao relacioná-los com a totalidade da ordem capitalista a ser negada. É preciso dotar as ações
políticas de uma dimensão organizativa e disciplinada, culturalmente solidificada, e somar na
construção de um grande movimento político de massas que tenha por objetivo a implantação do
socialismo no Brasil. Por tudo isso, torna-se prioritária a ação da militância comunista nos espaços
onde seja possível fazer avançar a organização dos trabalhadores e da juventude na luta por seus
interesses e necessidades, contribuindo efetivamente para a formação e aprofundamento da
consciência de classe contra a dominação imposta pelo capital. Para isto, é preciso estar colado com
as massas, participando ativamente dos embates diários da classe trabalhadora, seja por dentro dos
sindicatos, no interior das empresas e das escolas, nos bairros, por meio dos movimentos sociais e
comunitários, nas lutas políticas gerais, etc.
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63) Cabe aos militantes comunistas a intervenção organizada nestes espaços, promovendo sempre
a denúncia da ação do capital em todas as esferas da sociedade e da vida e apontando para a
solução radical dos problemas vividos pelos trabalhadores. Será preciso desenvolver uma
solidariedade ativa entre as categorias e setores sociais, fomentar interesses comuns e a
necessidade de uma nova forma de organização da produção social da vida para além do mercado e
da lógica do capital. Onde os limites da institucionalidade liberal burguesa impedirem a plena
realização da humanidade, é necessário criar experiências inovadoras de ação. Trata-se de tomar
uma atitude ativa diante dos diversos problemas concretos que surgirem e radicalizar soluções,
tomando para o poder proletário e popular a tarefa de enfrentar estes problemas, não no sentido de
substituir as políticas públicas e o dever do Estado, mas de denunciar sua omissão criminosa e
construir outra institucionalidade.
64) As classes sociais que hoje disputam a política brasileira excluíram a questão proletária da pauta,
maquiando uma posição pequeno-burguesa rebaixada como sendo a representante dos
trabalhadores. Nossa tarefa é garantir que o projeto proletário e socialista entre novamente no
debate, como expressão dos interesses reais, imediatos e históricos das classes trabalhadoras sob
seu protagonismo direto. O desfecho da estratégia da Revolução Socialista, na qual se insere a
proposta de construção do Poder Popular, não pode ser definido de antemão, mas é nosso dever e
responsabilidade nos preparar para os diversos cenários que podem se apresentar. Assim, devemos
estar preparados para defender a alternativa socialista contra a violência da reação burguesa e seus
aliados, desenvolvendo a autodefesa e o direito de rebelião.
65) O principal desafio do PCB é construir as pontes táticas que nos permitam criar as condições de
desenvolver nosso projeto estratégico pelo socialismo no Brasil. Enquanto parte das forças políticas
que atuam no cenário brasileiro, inclusive do campo de esquerda, cada vez mais jogam suas fichas
na pauta do processo eleitoral, o PCB afirma ser essencial que os próximos períodos sejam
marcados por intensas mobilizações, resistências, lutas e árduas tarefas de organização e formação
política, capazes de lançar as bases de um projeto de Poder Popular para o Brasil.
66) O PCB deve incentivar a elaboração de um calendário nacional de lutas centrado na resistência
dos trabalhadores à ofensiva do capital em função da crise, tendo como lema nenhum direito a
menos, avançar nas conquistas, a defesa do emprego e do poder de compra dos salários, a luta pela
redução da jornada de trabalho sem redução salarial, pela ampliação das verbas para educação,
garantindo o caráter público, gratuito, universal e de qualidade, pela universalização do acesso à
saúde pública, pela garantia da moradia e contra a especulação imobiliária, pela melhoria e
expansão dos transportes de massa em contraponto aos benefícios dados ao uso do automóvel
individual, visando atrair para a luta os trabalhadores e os setores mais necessitados da população,
além de combater qualquer forma de subsídio para o capital, o uso do FGTS em benefício das
empresas e a manutenção de cerca de metade do Orçamento para pagamento dos serviços da
dívida pública.
67) Apontamos ainda para a necessidade de constituição de uma frente política de caráter
permanente, organizada em torno de um programa capaz de dar unidade às lutas anticapitalistas e
de oposição às manifestações do imperialismo no Brasil e no mundo. Tal articulação, a que
denominamos Frente Anticapitalista e Anti-imperialista, não pode ser confundida com uma frente
eleitoral. A vitória eleitoral e as possibilidades de governabilidade de forças de esquerda somente
ocorrerão se estiver fincada sobre um forte movimento de massas. Portanto, o projeto de constituição
da Frente Anticapitalista e Anti-imperialista depende da formação de um amplo movimento de caráter
permanente, estruturado por partidos políticos, organizações de massa e movimentos populares
reunidos em torno do programa contra-hegemônico, no qual esteja prevista a ruptura com o
capitalismo.
68) Para a conformação desta Frente, devemos priorizar o diálogo com as forças políticas e sociais
que têm se posicionado, nas inúmeras frentes de luta, em franca oposição ao Estado burguês e sua
opressão de classe, mesmo aquelas que hoje ainda se mantêm reticentes a abraçar a ideia de um
movimento com caráter anticapitalista. Algumas dessas forças se opõem à ideia pelo entendimento
de que ainda há “tarefas nacionais” a cumprir no Brasil, e que estaríamos (nós, do PCB) nos
adiantando ao processo histórico, propondo a luta anticapitalista como central. Estes grupos partem
do princípio de que é preciso, primeiro, desenvolver a luta antilatifúndio e antimonopólio e que,
portanto, o atual estágio da luta de classes no Brasil demandaria um movimento primordialmente
anti-imperialista. Trata-se, de fato, de uma concepção “etapista” disfarçada.
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69) Entendemos que as lutas populares no Brasil contra a exploração, contra o poder do latifúndio ou
contra os monopólios são, no essencial, lutas anticapitalistas, pois o capital exerce seu domínio em
todas as esferas da vida social. Qualquer “tarefa nacional” ou “popular-democrática” a ser cumprida
tende a ser uma tarefa anticapitalista. Todo e qualquer movimento popular encontra do outro lado da
trincheira a organização do capital, tentando obstaculizar as conquistas por parte dos trabalhadores.
As lutas sociais e a resistência dos trabalhadores na defesa de seus direitos mais imediatos, como o
salário, as condições de trabalho, a aposentadoria, a assistência, os direitos previdenciários, assim
como a luta pela qualidade de vida e pelo direito a uma educação pública de qualidade, ao
atendimento de saúde, à moradia digna, à mobilidade urbana e/ou deslocamento nas zonas rurais,
ao acesso à informação, aos bens culturais e ao lazer se chocam hoje com a lógica privatista e de
mercado, que vê todos estes bens e serviços como mercadorias a ser adquiridas prioritariamente no
mercado privado, gerando lucros enormes para as grandes corporações e, secundária e
supletivamente, pelo Estado, na forma de políticas públicas.
70) Não contrapomos a luta anticapitalista à luta contra o imperialismo. No caso do Brasil, as duas
lutas se unem no mesmo processo de enfrentamento à ordem imposta pelo grande capital e pela
burguesia. Pois sabemos que o desenvolvimento do capitalismo brasileiro está, de forma profunda e
incontornável, associado ao capitalismo internacional, sendo impossível separar onde começa e
onde acaba o capital “nacional” e aquele ligado à internacionalização das grandes empresas
transnacionais. O desenvolvimento dos monopólios e oligopólios, das fusões, da concentração e
centralização dos principais meios de produção nas mãos de grandes corporações monopolistas, nos
setores industrial, bancário e comercial, torna impossível separar o capital de origem brasileira ou
estrangeira, assim como o chamado capital produtivo do especulativo, já que, nesta fase, o capital
financeiro funde seus investimentos tanto na produção direta como no chamado capital portador de
juros e flui de um campo para outro de acordo com as necessidades e interesses da acumulação
privada, sendo avesso a qualquer tipo de planejamento e controle. Por isso a luta anticapitalista hoje
é, necessariamente, uma luta anti-imperialista.
71) A afirmação do caráter anti-imperialista não advém de nenhuma afirmação de um capitalismo
nacional em contraposição à dominação estrangeira de potências desenvolvidas, o que poderia nos
levar a reapresentar um elemento essencial da estratégia das etapas ou do desenho mais geral de
uma estratégia nacional-democrática ou democrático-popular. O caráter anti-imperialista da frente
proposta, pelo contrário, parte da constatação do caráter internacional do capitalismo monopolista e
daí seu caráter imperialista, de forma que as lutas anticapitalistas que se desenvolvem no Brasil, na
América Latina e no mundo se chocam necessariamente com a ordem capitalista/imperialista
mundial, o que aumenta a necessidade de articulação política ativa e da solidariedade
internacionalista.
72) Devemos buscar o trabalho político conjunto com grupamentos políticos que, mesmo não se
situando no campo socialista, somam forças na denúncia e no enfrentamento às ações do
imperialismo, como nos casos das agressões militares diretas ou do suporte a grupos mercenários
por parte dos EUA e da OTAN à Líbia, Iraque, Síria e outros países, assim como, por outro lado, no
apoio a governos como os da Venezuela e da Bolívia, por seu caráter anti-imperialista. Devemos,
enfim, atuar, junto a todas as forças políticas e organizações sociais que de alguma forma se
contraponham ao poder do capital, com vistas à formação da Frente Anticapitalista e Anti-
imperialista, que não necessariamente terá este nome, mas que tenha, em essência, o caráter de um
amplo movimento político permanente de lutas, voltado a enfrentar os ditames do capital e da ordem
burguesa em nosso país, preparando o caminho para a disputa pelo poder e a construção da
sociedade socialista.
73) A hegemonia burguesa só pode se impor e se prolongar no Brasil pela divisão das forças
anticapitalistas e anti-imperialistas. Urge um salto de qualidade na busca pela unidade de ação dos
movimentos populares, das forças de esquerda e entidades representativas dos trabalhadores, no
interior e para além do mundo sindical corporativo, sem hegemonismos ou práticas excludentes, com
a promoção de iniciativas conjuntas de resistência e de confrontação que sejam os passos
necessários para a constituição de um bloco proletário capaz de contrapor à hegemonia
conservadora uma real alternativa de poder popular e socialista em nosso país.

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