Você está na página 1de 6

1

MITO E RITO.
Prof. Dr. Salustiano Alvarez Gómez

Introdução: a busca da verdade


O ser humano surge na realidade planetária tentando dominar-la e entender-la. As
primeiras tentativas do homem visam entender a realidade na qual vive e estabelecer
formas de convivência. O esforço por descobrir as causas e as finalidades de tudo aquilo
que faz parte da mesma realidade vai se expressando dentro das possibilidades concretas e
circunstanciais: linguagem, compreensão, conhecimento, dificuldade,... Trata-se de
encontrar-se a si mesmo dentro de uma realidade externa à qual pertence e da qual não pode
nem omitir-se nem excluir-se.
Pensar: Imaginar promovendo o conhecimento
Conhecimento: 1.- Calcula: CIÊNCIA. 2.- Imagina: ARTE. 3.- Confia: RELIGIÃO
Processo de elaboração do conhecimento:
1º.- VERDADE

surgimento da vivência da
intuição realidade

2º.- INTERPRETAÇÃO 4º.INTERPRETAÇÃO


MÍTICA surgimento da expressão SIMBÓLICA

surgimento da surgimento da
razão expressão

3º.- INTERPRETAÇÃO
CIÊNTÍFICA
2

1.- ETIMOLOGIA E SIGNIFICADO DE MITO


Mito vem do Grego MYTHÓS, que tinha um grande número de significados dentro
de uma idéia básica: “discurso, mensagem palavra, assunto, invenção, lenda, relato
imaginário”. Modernamente está fixada nestes últimos sentidos.
“Mistério” vem do Grego MÝEIN, “fechar”, especialmente os olhos. Quando uma
pessoa era iniciada em algum ritual que exigisse segredo, ela devia se comportar como se
estivesse com os olhos fechados quando lhe foram apresentadas aquelas informações. Seu
significado gira em torno de “desconhecido, intrigante, não esclarecido”. De MÝEIN se
deriva para MÝSTES, “iniciado nos mistérios”, de onde derivou MYSTÉRION, “doutrina
secreta, arcano, culto secreto”.
“Místico” deriva daí e tem o sentido de “obscuro, secreto, possuidor de
propriedades mágicas, ligado a ritos esotéricos”.
A importância do Mito é tentar descobrir a resposta humana existencial das questões
tão ocultas como De onde vim? Para onde vou? São as perguntas mais significativas e
principais que moveram os homens diante do aparentemente absurdo do cosmo, assim
como as questões relativas a O quê é? Como é? Porque é?. A busca de respostas a estas
questões permite ao homem a busca do saber. Sua primeira expressão ou tentativa de
resposta será o MITO, como tentativa de explicação do mundo (ordem) cosmológica é em
primeira instância como algo antropológico. O homem quer explicar ou melhor quer
entender e viver o grande mundo manifestado no fenômenos da natureza o cosmo
(universo) externo e ao mesmo tempo quer dar sentido ao mundo intelectivo de um
universo interno uma referência do eu e do seu grupo social.

2.- FUNÇÕES DO MITO


Joseph Campbell, um dos principais estudiosos nos campos de religião e mitologia
comparada, explica que o mito tem quatro funções básicas: a metafísica ou mística, a
cosmológica, a sociológica e a pedagógica.
Sua função metafísica serve para nos despertar para o mistério e o assombro da
criação, para abrir nossas mentes e nossos sentidos para uma consciência da mística do
“fundamento do ser”, a fonte de todos os fenômenos. Sua função cosmológica serve para
3

descrever a “forma” do cosmos, o universo, o nosso mundo como um todo, de modo que o
cosmo e tudo nele contido se tornem vívido e vivo para nós, infundido com sentido e
significado; cada lugar, cada pedra, colina, flor, planta,... têm seu lugar e seu significado no
esquema cosmológico que o mito fornece. Sua função sociológica serve para estabelecer “a
lei”, os códigos morais e éticos para as pessoas daquela cultura seguirem, os quais vão
ajudar a definir aquela cultura assim como sua estrutura social prevalecente. Sua função
pedagógica serve para nos conduzir através de ritos de passagem específicos que definem
os vários estágios significativos de nossas vidas, da dependência à maturidade e à velhice, e
finalmente, a nossa morte, a passagem final. Os ritos de passagem levam a entrar em
harmonia com o “fundamento do ser” e permitir fazer a viagem de um estágio para o outro
com uma sensação de conforto e propósito.
A experiência mística, o âmago da viagem espiritual que prevê o sobrenatural,
sempre foi uma experiência difícil de expressar. Alguns diriam que é impossível expressá-
la. Outros diriam que esta é a função primária do mito – de encontrar uma maneira para
comunicar qualquer visão mística adquirida na viagem: um entendimento dos mistérios que
fundamentam o universo, uma valorização de suas maravilhas, o sentimento de temor ou
arrebatamento sentido. Uma vez que tais coisas não podem ser transmitidas por meios
diretos, o mito fala através de uma linguagem de metáforas, de símbolos e narrativas
simbólicas que não estão vinculadas a uma realidade objetiva. Alguns acreditam que a
experiência mística é o que dá à luz a linguagem metafórica, o pensamento metafórico.
Campbell explica que a função sociológica do mito serve para apoiar e validar uma
determinada ordem social. O mito vai deixar claro quem está no comando, qual o código de
ética adequado, quais serão os rituais institucionais. Estes códigos são fixos, como a ordem
natural, são eternos, não estão sujeitos a alterações.

Para resumir: o Mito é a tentativa da humanidade de compreender a razão e o


propósito da existência. Falando numa linguagem de metáforas e símbolos, ele recria
mundos e seres vivos que, embora não se refiram diretamente ao mundo comum ao nosso
redor, fornecem respostas para as nossas questões fundamentais sobre a verdadeira natureza
do mundo que nos rodeia. Eles criam a sua linguagem inesquecível de imagens poderosas e
evocativas e acende o Imaginário coletivo. Como Campbell explica, o mito é a “pátria das
4

Musas.” “Ele inspira as artes, a música, a poesia. Ver a vida como um poema, ver-se
participando nesse poema é o que mito faz por nós”.

3.- ETIMOLOGIA E SIGNIFICADO DE RITO


1.- No Brasil e nas línguas românicas a utilizamos como derivado do latim RITUS,
que se refere a ordem estabelecida ou prescrita. No grego, a palavra é ARTUS (=
ARARISKO) que tinha o sentido de harmonizar ou adaptar e ARTMOS que faz relação a elo
ou junção entre coisas.
A origem é do sânscrito, com varias acepções,
1.- No sânscrito védico, AR, que indica disposição organizada das partes de um
todo. Este conceito se refere à ordem do cosmos, à ordem das relações divinas entre os
mesmos deuses, entre os deuses e seres humanos e entre os seres humanos consigo mesmo.
2.- No sânscrito indo-europeu, a palavra utilizada é RI e faz relação ao ritmo, rima,
rio, água que flui e se espalha pela terra gerando vida.
3.- No indo-iraniano, expressa-se com o termo ARTA indicando uma harmonia
restauradora.
O significado que oferece o termo rito faz relação à ordem prescrita, tanto do
cosmos como das relações, ao ritmo e a rima da vida, a união e o fluir dos movimentos e da
vida.
O rito é uma ação conjunta do ser humano no qual expressa todo o seu ser (=
registro simbólico).
O rito acontece num tempo e lugar determinado estabelecendo papeis e funções.
O rito manifesta a experiência da realidade marcada pela destruição/criação. O rito
vai tentar harmonizar estes contrários, especialmente entre o natural-sobrenatural.
Elementos que provocam o rito: clima/flora/fauna/trabalho/distribuição território/
historia/tradições/lutas/resistência/situações/duvidas/mistérios...
Rito aparece como expressão e síntese do ethos cultural, portanto, expressão de sua
vida, ou seja, ordenação de sua vida social. Favorece a criação da vida por seu caráter
organizativo.
5

O rito é uma atividade de significação, o que conduz a uma interpretação. É a


organização e o ordenamento que se localiza na mente humana.
Rito é apresentação significada do mundo à consciência, envolvendo abstração,
projeção, intelecção, criatividade, imaginação, representação.
Como representação, FORMA+INFORMA+CONFORMA o imaginário individual
e coletivo.
IMAGINARIO = articulação do passado-presente-futuro, atualizando o que está
distante no tempo e no espaço, criando aquilo que ainda não existe (complexo conjunto de
imagens que construímos mentalmente). Trata-se de uma ação seletiva e intencional que se
transforma em via de acesso a realidades invisíveis (até sobrenaturais).
Os indivíduos, como os povos, pensam-se, e pensam os outros, imaginam-se e
imaginam os outros.
Ritual é o conjunto ordenado de ritos menores, cada um com suas estruturas e
formas prontas.
O rito aproxima as dimensões e as expressa: visível-invisível, imanente-
transcendente, futuro-passado, material-espiritual,... atividades que somente podem efetuar-
se a partir da linguagem simbólica.
A linguagem simbólica é aproximativa e não redutiva, é remetente, aproximando
realidades, daí seu caráter unitivo e organizativo.

4.- FUNÇÕES DO RITO


1.- Ato simbólico e institucionalizado cuja eficácia é de ordem extra-empírica, pelo
menos parcialmente
2.- O rito é uma ação realizada por meio de gestos, palavras, objetos em que os
homens personificam ou atualizam os gestos vivenciados pelos mitos e dessa forma
organizam e dão forma lógica à realidade (microcosmo ao macrocosmo) RESUMINDO, O
RITO É UMA SEQUÊNCIA TEMPORAL DE AÇÕES, COMPOSTAS POR DIVERSAS
PARTES
- Na estrutura teológica O rito comporta os valores, comportamentos e hábitos
éticos para sua eficácia e realização.
6

- Na estrutura simbólica, o rito comporta a transformação de locais e objetos em


imagens, que darão sentido aos atos que, com a sensibilidade, transformar-se-ão nos objetos
da realidade sagrada ao qual se referem.
- Como sistema de comunicação o rito comporta as mensagens e sinais transmitidos
através de códigos estabelecidos, sobre o significado de cada um dos objetos presentes.

MITO: NARRAÇÃO EXTRAORDINÁRIA RITO: MANIFESTAÇÃO CONCRETA


Apresentação de uma teoria Formulação de uma prática
Interpretação do sentido de vida Definição de comportamentos
Compreensão da realidade Realização de objetivos
Explicação teórica da realidade Ação pedagógica nas relações
Palavra convincente Atuação consequente
Rememoração dos fatos Comemoração dos fatos
Orientação para a vida Projeto de vida

Você também pode gostar