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MICROPOLÍTICA E COMPORTAMENTALISMO RADICAL

Renan Kois Guimarães (PIC/UEM), Carlos Eduardo Lopes (Orientador), e-


mail: renankois@gmail.com.

Universidade Estadual de Maringá / Centro de Ciências Humanas, Letras e


Artes/Maringá, PR.

Ciências Humanas / Psicologia

Palavras-chave: micropolítica, subjugação, comportamentalismo radial

Resumo:

O ser humano tem como sua principal característica viver em sociedade,


interagindo com outras pessoas. Essas relações interpessoais são relações
de poder ou relações políticas. A partir da obra de Foucault a política tem
sido compreendida de maneira mais abrangente, não restringindo-a as
relações macropolíticas (relações entre sujeitos e instituições), mas
abarcando também as relações micropolítica (relações não-mediadas por
instituições). Um termo que normalmente está presente nos debates que
envolvem política e poder é o conceito de controle, sendo ele tratado como
subjugação. Contudo, nem todas as vertentes filosóficas tem essa mesma
concepção. O Comportamentalismo Radical nega que o controle seja
sinônimo de dominação, entendendo-o como intrínseco ao próprio
comportamento. Skinner, principal representante do Comportamentalismo
Radical, entende que a dominação está atrelada a formas específicas de
controle: o controle aversivo e “reforçadores positivos incontingentes”,
utilizados pelas agências de controle; ao mesmo tempo, Skinner propõe
ferramentas contra essa dominação imposta. Como resultado, verificam-se
que podem ser traçadas algumas aproximações entre as propostas políticas
skinneriana e a proposta micropolítica foucaultiana, surgindo a possibilidade
de se pensar uma micropolítica Comportamentalista Radical.

Introdução

As discussões sobre o conceito de política na filosofia atravessaram séculos,


sendo tradicionalmente entendida como um Estado organizado por leis e
normas sociais. Nesse contexto, ideias e ideologias, como o liberalismo, o
fascismo, o socialismo, são a base dos discursos políticos. Contudo, nem
todos os pensadores entendem a política dessa forma. Contrapondo-se à
visão tradicional, Foucault (2012a) propõe uma discussão mais abrangente
sobre o tema. Partindo do princípio que o ser humano é caracterizado por
conviver em sociedade, o filósofo francês entende que todas as relações
sociais são relações de poder ou relações políticas, dividindo então as
relações políticas em duas categorias: a macropolítica e a micropolítica. As
relações macropolíticas estão ligadas ao entendimento tradicional de
política, ou seja, identificam-se com relações estabelecidas entre sujeitos e
instituições. Esse é o campo político ao qual Foucault (2012a) dirige muitas
de suas críticas, pois as relações macropolíticas são enrijecidas e
cristalizadas, de forma a manter os sujeitos subjugados às instituições. As
diferentes estratégias macropolíticas de manutenção do controle institucional
recebem a denominação de poder disciplinar (FOUCAULT, 2012b). Esse
poder tem como objetivo docilizar os corpos, o que é fundamental para a
desigualdade intrínseca das relações macropolíticas: corpos docilizados
obedecem as ordens, respeitam a hierarquia, não impõem resistência.
Contudo, Foucault (2012a) distancia-se da visão tradicional defendendo a
legitimidade do campo micropolítico, no qual os indivíduos interagem com
outros indivíduos, sem o intermédio do Estado ou de outras instituições. A
ausência de mediação institucional significa um ponto de fuga do poder
disciplinar. Assim, na medida em que exclui o poder disciplinar, a
micropolítica aumenta a possibilidade de equidade nas relações
interpessoais. Dessa forma, a proposta política foucaultiana envolve o
fortalecimento das relações micropolíticas em detrimento de relações
macropolíticas, o que fomentaria a liberdade ao mesmo tempo em que
diminuiria a exploração.
O Comportamentalismo Radical, que tem como principal representante B. F.
Skinner, também busca, em sua proposta política, alternativas a dominação
dos sujeitos. À semelhança de Foucault, alguns textos políticos skinnerianos
defendem o enfraquecimento do poder institucional. Isso aparece na crítica
às agências controladoras, entendidas como uma parte organizada do grupo
social que opera mantendo as relações de controle o mais estáveis possível
(SKINNER, 2003). Em outras palavras, as estratégias de controle
empregadas pelas agências visam a manutenção do poder dos
controladores sobre os controlados. Partindo dessas semelhanças esta
pesquisa teve o objetivo de explorar as aproximações entre a proposta
política skinneriana e a proposta micropolítica foucaultiana.

Método

Trata-se de uma pesquisa de natureza conceitual, que buscou explorar as


semelhanças entre os textos de Skinner e Foucault, no que concerne à
política. Para tanto, a pesquisa se deu em três etapas: (i) mapeamento e
definição do conceito de política na obra de Foucault; (ii) análise da proposta
política skinneriana; (iii) construção de um intertexto buscando uma possível
aproximação entre o conceito foucaultiano de micropolítica e as ferramentas
políticas propostas por Skinner.

Resultados e Discussão

Quando o Comportamentalismo Radical discute as relações humanas, um


dos principais conceitos que surge é o controle (CARRARA, 2005). Embora
controle seja tradicionalmente entendido como abuso de poder ou
subjugação, o Comportamentalismo Radical entende-o de forma diferente.
Para Skinner (2003) todo comportamento é controlado pelas consequências
que produz. Dessa forma, o controle do comportamento não deve ser
entendido como essencialmente ruim, uma vez que o controle é intrínseco
ao próprio comportamento, ocorrendo mesmo em um nível não-social das
relações entre o organismo e o mundo físico-natural. Partindo desse
concepção ampla de controle, a dominação é considerada como um tipo de
controle, geralmente atrelada ao conceito de controle aversivo ou coercitivo.
Esse tipo de controle tem como um de seus principais efeitos o
fortalecimento de comportamentos de fuga e de esquiva (SKINNER, 2003).
Além disso, principalmente quando a fuga e a esquiva não são possíveis, o
controle aversivo é responsável pela ocorrência de comportamentos de
ataque ou enfrentamento do controlador, o que é denominado
contracontrole. No contexto social, o uso do controle aversivo é amplamente
empregado por instituições ou agências controladoras, que organizam
práticas para a manutenção de seu poder de controle sobre o
comportamento individual (SKINNER, 2003). Além disso, as agências
controladores fomentam a burocratização das relações sociais, o que diminui
as chances de que os controlados identifiquem o controlador, inviabilizando,
assim, o contracontrole.
Dessa forma, as análises políticas skinnerianas envolvem críticas às
agências controladoras e suas estratégias de subjugação. Essas mesmas
críticas parecem ser compartilhadas por Foucault (2012b). As duas
propostas têm como base o fato das relações macropolíticas serem sempre
desvantajosa para os indivíduos controlados. Indo além, Skinner (2003)
busca alternativas às relações macropolíticas, como por exemplo, o
contracontrole. Entretanto, para que o contracontrole seja uma ferramenta
útil contra as agências, é necessário que o controlador seja localizado, o
contracontrole deve ser direcionado a um controlador. Além disso, as
agências controladoras nem sempre utilizam apenas o controle aversivo
como estratégia de dominação. Muitas vezes as agências valem-se de
“reforçadores positivos não contingentes” para mascarar a dominação.
Nesse caso, fuga, esquiva e contracontrole, são substituídos por
sentimentos de felicidade, alegria e gratidão, tornando os sujeitos dóceis à
dominação da agência. Sendo assim, o contracontrole só pode ser
considerado uma ferramenta contra a subjugação quando as contingências
são claramente aversivas. Em contingências de reforçamento positivo, o
contracontrole parece perder sua efetividade.
Skinner (1978) propõe, ainda, outra ferramenta contra a dominação: controle
face-a-face. Segundo o autor, essas relações são necessariamente
apartadas das agências controladoras. A relação face-a-face fundamenta-se
na aproximação dos indivíduos das consequências do comportamento
social, visto que não há mediação de burocracia ou leis. O indivíduo está
mais próximo das consequências e, por isso, fica mais sensível às reações
que produz nos outros, além de estar mais sensível ao seu próprio
comportamento. Sendo assim, Foucault e Skinner parecem acreditar que o
campo político mais promissor é o das micro-relações, aquelas inter-
relações que excluem as agências controladoras ou instituições em favor do
contato face-a-face.

Conclusões

É possível identificar duas propostas políticas skinnerianas: o contracontrole,


com um papel importante em contingências aversivas conspícuas; e o
controle face-a-face, com uma maior importância, visto que é a alternativa
principal para as relações macropolíticas, e sua efetividade não depende da
presença de controle aversivo evidente. Assim, parece plausível defender
que o comportamentalismo radical aproxima-se da concepção foucaultiana
de micropolítica, opondo-se ao poder disciplinar com a noção de
contracontrole e com a defesa das relações face-a-face. Isso abre caminho
para investigações futuras sobre outras possibilidades de diálogo entre
Skinner e Foucault.

Referências

CARRARA, K. Behaviorismo radical: crítica e metacrítica. São Paulo:


Editora da UNESP, 2005.

FOUCAULT, M. Microfísica do poder. São Paulo, SP: Graal, 2012a.

FOUCAULT, M. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Petrópolis, RJ:


Editora Vozes, 2012b.

SKINNER, B. F. Ciência e comportamento humano. São Paulo, SP:


Martins Fontes, 2003.

SKINNER, B. F. Human behavior and democracy. In: _______. Reflections


on behaviorism and society. Englewood Cliffs: Prentice-Hall, 1978, p. 3-15.

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