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Tomás de Aquino, em italiano Tommaso d'Aquino (Roccasecca, 1225 – Fossanova, 7 de março

de 1274), foi um frade católico da Ordem dos Pregadores (dominicano) italiano[2][3] cujas
obras tiveram enorme influência na teologia e na filosofia, principalmente na tradição
conhecida como Escolástica, e que, por isso, é conhecido como "Doctor Angelicus", "Doctor
Communis" e "Doctor Universalis"[4][a]. "Aquino" é uma referência ao condado de Aquino,
uma região que foi propriedade de sua família até 1137.

Ele foi o mais importante proponente clássico da teologia natural e o pai do tomismo. Sua
influência no pensamento ocidental é considerável e muito da filosofia moderna foi concebida
como desenvolvimento ou oposição de suas ideias, particularmente na ética, lei natural,
metafísica e teoria política. Ao contrário de muitas correntes da Igreja na época[5], Tomás
abraçou as ideias de Aristóteles - a quem ele se referia como "o Filósofo" - e tentou sintetizar a
filosofia aristotélica com os princípios do cristianismo. As obras mais conhecidas de Tomás são
a "Suma Teológica" (em latim: Summa Theologiae) e a "Suma contra os Gentios" (Summa
contra Gentiles). Seus comentários sobre as Escrituras e sobre Aristóteles também são parte
importante de seu corpus literário. Além disso, Tomás se distingue por seus hinos eucarísticos,
que ainda hoje fazem parte da liturgia da Igreja[6].

Tomás é venerado como santo pela Igreja Católica e é tido como o professor modelo para os
que estudam para o sacerdócio por ter atingido a expressão máxima tanto da razão natural
quanto da teologia especulativa. O estudo de suas obras há muito tempo tem sido o cerne do
programa de estudos obrigatórios para os que buscam as ordens sagradas (como padres e
diáconos) e também para os que se dedicam à formação religiosa em disciplinas como filosofia
católica, teologia, história, liturgia e direito canônico[7]. Tomás foi também proclamado
Doutor da Igreja por Pio V em 1568. Sobre ele, declarou Bento XV:

“ Esta ordem [dominicana]... ganhou novo lustre quando a Igreja declarou os


ensinamentos de Tomás como seus próprios e este Doutor, honrado por elogios especiais dos
pontífices, o mestre e patrono das escolas católicas. ”

— Fausto appetente die, Papa Bento XV[8].

Tomás nasceu em Roccasecca, no condado de Aquino do Reino da Sicília (atualmente na região


do Lácio, na Itália) por volta de 1225. De acordo com alguns autores, nasceu no castelo de seu
pai, Landulfo de Aquino, que não pertencia ao ramo mais poderoso de sua família e era apenas
um miles ("cavaleiro"). Já a mãe de Tomás, Teodora, era do ramo Rossi da família napolitana
dos Caracciolo[9]. Enquanto o resto da família dedicou-se à carreira militar[10], seus pais
pretendiam que Tomás seguisse o exemplo do irmão de Landulfo, Sinibaldo, que era abade do
mosteiro beneditino de Monte Cassino[11], uma carreira perfeitamente normal para o filho
mais jovem de uma família nobre do sul da Itália da época[12].
Aos cinco anos de idade, começou a estudar em Monte Cassino, mas, depois que o conflito
militar entre o imperador Frederico II e o papa Gregório IX chegou à abadia no início de 1239,
Landulfo e Teodora matricularam o pequeno Tomás no studium generale (a universidade em
Nápoles), recém-criada por Frederico em Nápoles[13]. Foi provavelmente lá que Tomás foi
introduzido aos estudos de Aristóteles, Averróis e Maimônides, importantes influências para
sua filosofia teológica[14]. Seu professor de aritmética, geometria, astronomia e música era
Pedro da Ibérnia[15].

Foi também durante seus estudos em Nápoles que acabou sob a influência de João de São
Juliano, um pregador dominicano que era parte do grande esforço empreendido pela Ordem
dos Pregadores para recrutar seguidores[16]. Finalmente, aos dezenove, Tomás resolveu se
juntar à ordem, o que não agradou sua família[17]. Numa tentativa de impedir que Teodora
influenciasse a escolha de Tomás, os dominicanos arranjaram para que ele se mudasse para
Roma e, de lá, para Paris[18]. Porém, durante a viagem para Roma, seguindo as instruções de
Teodora, seus irmãos o capturaram quando ele bebia num riacho e o levaram de volta para
seus pais no castelo de Monte San Giovanni Campano[18].

Ficou preso por cerca de um ano nos castelos da família em Monte San Giovanni e Roccasecca,
numa tentativa de fazê-lo mudar de ideia[14]. Preocupações políticas impediram que o papa
interviesse em defesa de Tomás, aumentando significativamente o tempo que ficou preso[19].
Durante este período de provações, Tomás ensinou suas irmãs e escreveu para seus irmãos
dominicanos[14]. Desesperados com a teimosia de Tomás, dois de seus irmãos chegaram a
ponto de contratarem uma prostituta para seduzi-lo. De acordo com a lenda, Tomás a
expulsou com um ferro em brasa e, durante a noite, dois anjos apareceram para ele enquanto
ele dormia para fortalecer sua determinação de permanecer celibatário[20].

Em 1244, percebendo que todas suas tentativas de dissuadir Tomás fracassaram, Teodora
tentou salvar a dignidade da família e arranjou para ele escapasse durante uma noite pela
janela. Ela acreditava que uma fuga secreta da prisão era menos prejudicial que uma rendição
aberta aos dominicanos. Tomás seguiu primeiro para Nápoles e, depois, para Roma, onde se
encontrou com João de Wildeshausen, o mestre-geral da Ordem dos Pregadores[21].

Paris, Colônia, Alberto Magno e a primeira regência em Paris (1245-1259)

Em 1245, Tomás foi enviado para estudar na faculdade das artes da Universidade de Paris,
onde é muito provável que ele tenha encontrado o estudioso dominicano Alberto Magno (que
seria depois proclamado Doutor da Igreja como Aquino), que era na época o catedrático da
cadeira de Teologia do Colégio de São Tiago em Paris[22]. Quando Alberto foi enviado por seus
superiores para ensinar no novo studium general em Colônia, em 1248, Tomás foi junto[23]
depois de recusar uma oferta do papa Inocêncio IV de nomeá-lo abade de Monte Cassino
mesmo sendo dominicano[11]. Em seguida, Alberto nomeou o relutante Tomás magister
studentium[12]. Por ser calado e não falar muito, alguns dos companheiros de Tomás
acreditavam que ele era "devagar", ao que Alberto rebateu, profeticamente, "Vocês o chamam
de boi mudo, mas em sua doutrina ele produzirá um dia um mugido tal que será ouvido pelo
mundo afora"[11].

Tomás lecionou em Colônia como professor aprendiz (baccalaureus biblicus), instruindo seus
alunos nos livros do Antigo Testamento e escrevendo "Comentário Literal sobre Isaías"
("Expositio super Isaiam ad litteram"), "Comentário sobre Jeremias" ("Postilla super
Ieremiam") e "Comentário sobre as Lamentações" ("Postilla super Threnos")[24]. Então, em
1252, Tomás retornou para Paris para tentar obter o mestrado em teologia e passou a ensinar
estudos bíblicos como professor aprendiz. Quando tornou-se "baccalaureus Sententiarum"
("bacharel das Sentenças")[25], dedicou seus três anos finais de estudo a comentar sobre as
"Sentenças" de Pedro Lombardo. Na primeira de suas quatro sínteses teológicas, Tomás
compôs um enorme comentário sobre elas chamado "Comentário sobre as Sentenças"
("Scriptum super libros Sententiarium"). Além destas obras de seu mestrado, Tomás escreveu
ainda "Sobre o Ser e a Essência" ("De ente et essentia") para seus companheiros dominicanos
de Paris[11].

Na primavera de 1256, Tomás foi nomeado regente principal em teologia em Paris e uma de
suas primeiras obras depois de assumir o cargo foi "Contra Aqueles que Ameaçam a Devoção a
Deus e a Religião" ("Contra impugnantes Dei cultum et religionem") defendendo as ordens
mendicantes que estavam na época sob ataque por Guilherme de Saint-Amour[26]. Durante
seu mandato, que foi de 1256 até 1259, Tomás escreveu diversas obras, incluindo: "Questões
em Disputa sobre a Verdade" ("Questiones disputatae de veritate"), uma coleção de vinte e
nove questões controversas sobre aspectos da fé e da condição humana[27] preparada para os
debates universitários públicos que ele presidia na Quaresma e no Advento[28]; "Quaestiones
quodlibetales", uma coleção de suas respostas às questões propostas pela audiência
acadêmica nos debates[27] e o par "Comentários sobre 'De trinitate' de Boécio" ("Expositio
super librum Boethii De trinitate") e "Comentário sobre 'De hebdomdibus' de Boécio"
("Expositio super librum Boethii De hebdomadibus"), comentários sobre as obras do filósofo
romano do século VI Boécio[29]. Quando terminou sua regência, Tomás estava trabalhando
numa de suas obras-primas, a "Suma contra os Gentios"[30].

Em 1259, Tomás completou sua primeira regência no studium generale e deixou Paris para que
outros pudessem obter a mesma experiência. Retornando para Nápoles, foi nomeado
pregador geral pelo capítulo provincial da ordem em 29 de setembro de 1260. Em setembro
do ano seguinte, foi enviado a Orvietto como leitor conventual responsável pela formação dos
frades que não podiam frequentar um studium generale. Lá, completou a "Suma contra os
Gentios", escreveu "A Corrente de Ouro" (Catena aurea)[31] e escreveu obras para o papa
Urbano IV, como a liturgia para a recém-criada festa de Corpus Christi e "Contra os Erros dos
Gregos" ("Contra Errores Graecorum")[30].
Em fevereiro de 1265, o recém-eleito papa Clemente IV convocou Tomás de Aquino a Roma
para servir como teólogo papal. No mesmo ano, foi ordenado pelo capítulo dominicano de
Agnani[32] para ensinar no studium conventuale do Convento de Santa Sabina, fundado alguns
anos antes, em 1222[33]. O studium em Santa Sabina rapidamente tornou-se um experimento
para os dominicanos, o primeiro studium provinciale, uma escola intermediária entre o
studium conventiale (restrito aos residentes das casas monásticas - mosteiros e conventos) e o
studium generale (as universidades nas grandes cidades). Antes disso, não havia na província
de Roma nenhuma forma de educação especializada, apenas as escolas conventuais, com
cursos básicos de teologia para os frades residentes, e ainda assim apenas na Toscana[34].
Tolomeo da Lucca, um parceiro e um dos primeiros biógrafos de Aquino, conta que, no
studium de Santa Sabina, Aquino ensinou uma ampla de temas filosóficos, morais e
naturais[35].

Foi em Santa Sabina que Tomás começou a escrever sua obra mais famosa, a "Suma
Teológica"[31], que ele concebeu como sendo mais adequada especificamente aos estudantes
em seus primeiros anos: "Pois um doutor da verdade católica deveria ensinar não apenas os
proficientes, mas a ele cabe também instruir os iniciantes. Como diz o apóstolo em I Coríntios
3:2 'Leite vos dei a beber, não vos dei comida; porque ainda não podíeis', nossa intenção com
esta obra é apresentar tudo sobre a religião cristã de uma forma pertinente à instrução de
iniciantes"[36]. Ele escreve em Orvietto também uma variedade de outras obras, como o
incompleto "Compêndio Teológico" ("Compendium Theologiae") e "Resposta ao Irmão João de
Vercelli sobre os 108 Artigos Retirados da Obra de Pedro de Tarentaise" ("Responsio ad fr.
Ioannem Vercellensem de articulis 108 sumptis ex opere Petri de Tarentasia")[29]. Em sua
posição de superior do studium, Aquino conduziu uma série de importantes debates sobre o
poder de Deus que compilou depois em sua "Do Poder" ("De potentia")[37]. Nicholas Brunacci
(1240-1322) estava entre os alunos de Aquino em Santa Sabina e, depois, em Paris. Em
novembro de 1268, ele estava com Aquino e seu parceiro e secretário, Reginaldo de Piperno,
quando deixaram Viterbo a caminho de Paris para o início do ano acadêmico[38]. Outro aluno
em Santa Sabina foi o beato Tommasello de Perúgia[39].

Aquino permaneceu no studium de Santa Sabina de 1265 até ser chamado de volta a Paris em
1268 para uma segunda regência[37]. Com o tempo, principalmente depois de sua partida, as
atividades pedagógicas no studium provinciale de Santa Sabina foram divididos em dois campi.
Um novo convento da ordem na Igreja de Santa Maria sopra Minerva começou de forma
modesta em 1255 como uma comunidade de mulheres recém-convertidas, mas cresceu
rapidamente em tamanho e em importância de ser entregue aos cuidados dos frades
dominicanos em 1275[33]. Em 1288, o componente teológico do currículo provincial para a
educação dos frades foi realocado do studium provinciale de Santa Sabina para o studium
conventuale de Santa Maria sopra Minerva, que foi então rebatizado como um studium
particularis theologiae[40]. No século XVI, este studium foi transformado no Colégio de São
Tomás (em latim: Collegium Divi Thomæ) e, no século XX, o colégio foi transferido para o
Convento de Santi Domenico e Sisto e transformado na Pontifícia Universidade São Tomás de
Aquino (o famoso "Angelicum").
Em 1268, a Ordem dos Pregadores nomeou Tomás para ser o regente mestre da Universidade
de Paris pela segunda vez, uma posição que ele manteve até a primavera de 1272. Parte da
razão para esta súbita transferência parece ter sido a ascensão do "averroísmo", conhecido
também como "aristotelismo radical", nas universidades. Como resposta a estes aparentes
malefícios, Tomás escreveu duas obras. Na primeira, "Sobre a Unidade do Intelecto, Contra os
Averroístas" ("De unitate intellectus, contra Averroistas"), ele ataca o averroísmo como sendo
incompatível com a doutrina cristã[41]. Foi durante a segunda regência que Aquino terminou a
segunda parte da "Suma" e escreveu "Dos Virtuosos" ("De virtutibus") e "Da Eternidade do
Mundo" ("De aeternitate mundi")[37], esta tratando do controverso conceito aristotélico e
averroísta sobre a "falta de começo" do mundo[42].

Diversas controvérsias com alguns importantes franciscanos, como Boaventura e João


Peckham, ajudaram a tornar a segunda regência muito mais difícil e conturbada que a
primeira. Um ano antes de tomar posse novamente, nos debates de 1266-67 em Paris, o
mestre franciscano Guilherme de Baglione acusou Tomás de encorajar os averroístas,
chamando-o de "líder cego dos cegos". Tomás chamou-os de "murmurantes"
("resmungões")[42]. Na realidade, ele ficou profundamente perturbado pela disseminação do
averroísmo e se enfureceu quando soube que Siger de Brabante estava ensinando
interpretações averroístas de Aristóteles aos seus alunos em Paris[43].

Em 10 de dezembro de 1270 o bispo de Paris, Etienne Tempier, publicou um édito condenando


treze proposições aristotélicas e averroístas como sendo heréticas e excomungou os que
continuavam a defendê-las[44]. Muitos na comunidade eclesiástica, os chamados
"agostinianos", temiam que a introdução do aristotelismo e sua versão mais extrema, o
averroísmo, pudesse de alguma forma contaminar a pureza da fé cristã. No que parece ter sido
uma tentativa de conter o temor contra o pensamento aristotélico, Tomás conduziu uma série
de debates entre 1270 e 1272, reunidos em "Sobre as Virtudes em Geral" ("De virtutibus in
communi", "Sobre as Virtudes Cardinais" ("De virtutibus cardinalibus") e "Sobre a Esperança"
("De spe").

Últimos anos (1272-1274)

Em 1272, Tomás pediu licença da Universidade de Paris quando os dominicanos de sua


província natal o convocaram para fundar um studium general onde quisesse, com liberdade
para empregar nele quem desejasse. Aquino escolheu Nápoles e se mudou para lá para
assumir o posto de regente mestre[37]. Ele aproveitou esta temporada ali para trabalhar na
terceira parte da "Suma" enquanto dava aulas sobre vários tópicos religiosos. Em 6 de
dezembro de 1273, Tomás se demorou um pouco mais na Capela de São Nicolau do convento
dominicano de Nápoles e foi visto pelo sacristão Domenic de Caserta levitando aos prantos em
oração diante de um ícone de Cristo crucificado. Segundo o relato, Cristo perguntou:
"Escrevestes bem sobre mim, Tomás. Que recompensa esperas pelo teu trabalho?" A resposta
foi: "Nada além de ti, Senhor" [45][46]. Depois desta conversa, algo mudou, mas Aquino jamais
falou ou escreveu sobre o tema. Depois de ver o que viu, ele abandonou sua rotina e parou de
ditar para seu secretário, Reginaldo de Piperno. Quando este implorou-lhe que voltasse ao
trabalho, Tomás lhe disse: "Reginaldo, não posso, pois tudo o que escrevi não passa de uma
palha para mim"[47] ("mihi videtur ut palea")[48]. Seja o que for que tenha despertado a
mudança no comportamento de Tomás de Aquino, os católicos acreditam que foi alguma
espécie de experiência sobrenatural de Deus[49].

Anos antes, em 1054, o Grande Cisma dividiu a Igreja entre a Igreja Latina, sob a liderança do
papa (posteriormente conhecida como Igreja Católica Romana), no ocidente e os quatro
patriarcados do oriente (conhecidos coletivamente como Igreja Ortodoxa). Numa tentativa de
reunir as duas partes, o papa Gregório X convocou o Segundo Concílio de Lyon em 1 de maio
de 1274 e ordenou que Tomás comparecesse[50] para apresentar sua obra "Contra os Erros
dos Gregos" ("Contra Errores Graecorum")[51]. A caminho do concílio, montado num burro
enquanto viajava pela Via Ápia[50], bateu a cabeça num galho de uma árvore tombada, ficou
seriamente ferido e foi levado às pressas para Monte Cassino para se recuperar[52]. Depois de
descansar por um tempo, tentou novamente seguir viagem, mas teve que parar, doente
novamente, na abadia cisterciense de Fossanova[53]. Os monges tentaram ajudá-lo por
diversos dias, mas ele não resistiu. Quando recebeu sua extrema unção, as últimas palavras de
Aquino foram:

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