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A Desmoralização da Disciplina Eclesiástica - Cleyton Gadelha

Muito se tem discutido sobre a necessidade de as igrejas locais


praticarem o claro ensino bíblico da disciplina de membros que se
mostrarem endurecidos e pecaminosos. Ananias e Safira (At.5), o
imoral de 1 Cor.5 os falsos ensinadores de 2 João 1:10-11, e o
faccioso de Tito 1:10, estabelecem clara convicção sobre essa
doutrina. Textos é o que não faltam para assegurar a escrituricidade
do assunto.
Entretanto, dentro da cristandade plural dos nossos dias, ações
disciplinadoras têm perdido completamente sua eficácia, em razão
de várias igrejas e pastores receberem como membros àqueles que
vêm excluídos de outras comunidades co-irmãs.
O crente excomungado (apartado da comunhão) em uma igreja
frustra o seu próprio processo disciplinar transferindo-se para outra
igreja local, que, o receberá em sua comunhão, sem nenhum
respeito pela ação disciplinar da igreja da qual o crente em estado
de excomunhão é oriundo.
O efeito de tal prática é desmoralizante para a Igreja de Cristo e
para os ministros do Evangelho. Já vi gente suspeitando que essa
prática, em alguns casos, tem em vista o aumento de receita
financeira por parte do pastor que desrespeita a decisão disciplinar
de uma igreja co-irmã.
Os prejuízos causados por essa prática são muitos.

Primeiro: Torna trivial a prática de igreja desmoralizar igreja. Para


Calvino um dos propósitos da disciplina eclesiástica é “Preservar a
honra de Deus através da Igreja”.

Segundo: Promove o descaso da membrezia para com qualquer


ação disciplinadora por parte da igreja local. Os crentes sabem que,
se forem excluídos de sua igreja, serão recebidos por alguma outra
ávida por números.
Fica perdido um dos propósitos da excomunhão, que é infundir na
congregação o temor do pecado (1Tim.5:20). O objetivo de “evitar a
corrupção dos piedosos” (Calvino), fica completamente
comprometido.

Terceiro: Promove o endurecimento do membro excomungado, que


perde uma das marcas mais importantes de um eleito que é um
profundo respeito para com as igrejas de Cristo.
A excomunhão tem dois propósitos claros:
1) “… foi instituída a fim de que sejam afastados e expulsos da
congregação dos crentes aqueles que, falsamente, simulando fé em
Cristo, pela indignidade da vida e licenciosidade desenfreada de
pecado, nada mais são do que um escândalo para a Igreja, sendo,
portanto, indignos de se gloriar no nome de Cristo”. (Calvino).

2) Mas a excomunhão é também um meio de forçar o


arrependimento “… embora a disciplina eclesiástica não nos
permita viver com familiaridade com pessoas excomungadas ou ter
íntimo contato com elas (1Cor.5:11), todavia devemos… pela
exortação, ensino… (e) orações (pedir) a Deus para que elas
possam (arrependidas) retornar a comunhão da Igreja”.

Ao desrespeitar a ação disciplinadora de uma igreja co-irmã, o


pastor e a igreja receptora estão praticando uma ofensa ao Senhor
da Igreja, pois frustram um processo recomendado por ele e pelos
seus apóstolos, que deve ser exercido sobre pessoas endurecidas
com, pelo menos, três objetivos:

1) “a fim de que eles não sejam contados entre os cristãos… como


se a Igreja fosse uma conspiração de malfeitores e homens
notoriamente ímpios. 2) A fim de que, por relacionamentos
freqüentes, eles não corrompam outros pelo exemplo de uma vida
perversa. E 3) Para que possam começar a se arrepender
consternados pela vergonha…” (Richard de Rider citado por Heber
Campos Jr./Fides Reformata Vol.X nº1/2005)

Portanto “a liderança da congregação local faz bem em lembrar-se


de que o Senhor irá requerer de suas mãos uma prestação de
contas. (…) Aquilo que o membro disciplinado faz, torna-se
responsabilidade pessoal dele; aquilo que os líderes deixam de
fazer é, inevitavelmente, responsabilidade deles…” (L. de Koster).
Calvino distinguiu três marcas nos eleitos: “Confissão de fé,
exemplo de vida e participação nos sacramentos”, marcas que
ligam visivelmente o crente a igreja de Cristo. Martin Bucer, e os
calvinistas depois de Calvino, asseveravam que a disciplina
eclesiástica é uma das marcas de uma verdadeira igreja de Cristo.
Essas marcas só se tornam visíveis no contexto de uma igreja local
(visível). É no seu âmbito que o eleito faz declaração de sua fé,
participa do batismo e da ceia do Senhor, e é também ali onde ele é
submetido a disciplina, quando a marca de uma vida exemplar dá
lugar a um endurecimento pecaminoso.
“Para o protestantismo, a igreja universal torna-se visível na
congregação local, é ali que o poder das chaves é exercido e a
disciplina administrada”.(L.deKoster) (Mt.16:19).
Se “Cristo governa a Igreja por meio da Igreja” (Ernest Kevan), o
desrespeito praticado por pastores e igrejas que desconsideram as
ações disciplinadoras de outras igrejas, é desrespeito contra o
governo de Cristo.
As Igrejas e pastores que passam por cima de medidas
disciplinatórias de igrejas co-irmãs estão em completo desacordo
com o Novo testamento. Não faria sentido a Escritura ensinar a uma
igreja local “… sobre a importância de manter a integridade da
Igreja ao lidar com pecado persistente na congregação” (Franklin
Ferreira/Alan Myatt) e ao mesmo tempo não julgar a insolência de
uma outra igreja local que, abertamente, descredencia a decisão
disciplinatória de outra.
“Em Mt.18:15-20 Jesus disse que um irmão em pecado deve ser
confrontado, reprovado e excluído da igreja, caso não se mostre
arrependido” (Teol.Sistemática Franklin Ferreira/Alan Myatt). Essa
recomendação perde totalmente sua eficácia, se os pastores não
tomarem a firme resolução de respeitarem as ações disciplinares de
outras igrejas, praticando a troca de cartas de transferências, E-
Mail’s, telefonemas, enfim buscarem, junto a igreja de origem o
histórico de crentes que chegam.
Em caso de membros em situação de pendência disciplinar,
recomendar que retornem e resolvam as pendências existentes, e
só então, recebê-los como novos membros, nunca antes disso.
“Se os membros fossem aceitos nas igrejas baseadas
simplesmente nas declarações destes que desejam ser membros
haveria grande potencial para o mal. Pois então cada ‘Cristão
carnal’ que tivesse sido excluído de uma igreja por impiedade ou
heresia, poderia simplesmente ir para uma outra igreja,
proclamando-se um cristão bom e espiritual, e teria que ser
recebido como um membro”. (Davis W. Huckabee).
O episódio envolvendo Ananias e Safira em Atos 5:1-11 nos ensina
a seriedade do pecado deliberado, enquanto 1 Coríntios 5:1-5 nos
adverte para a gravidade do pecado tolerado. A atitude de
desrespeitar uma igreja de Cristo, recebendo como membro uma
pessoa excomungada pela mesma, desmoraliza a noção de
seriedade que se deve ter para com o pecado, enquanto rouba-se
de uma igreja de Cristo o respeito que lhe é devido.
“É uma triste verdade que muitas igrejas, em seu zelo por números,
põem de lado a disciplina das igrejas co-irmãs quando
propositalmente recebem membros excluídos de outras igrejas sem
requerer que o membro excluído corrija a sua situação com a igreja
anterior”. (Davis W. Huckabee).
É bom lembrar que, as verdadeiras igrejas estão diante do Senhor,
os que promovem tal prática desmoralizante, certamente receberão
severa reprovação dEle.
“… se cada igreja requeresse carta de recomendação das igrejas
co-irmãs antes de aceitar um novo membro, e somente fizesse
exceção a esta regra após uma completa verificação das
circunstâncias… então diminuiria, e muito, a destruição das igrejas
por pessoas mundanas que se mudam de igreja em igreja como
andarilhos maldosos destruindo [ou contaminando] uma igreja após
outra…” (D.W.Huckabee).
Na verdade os pastores deveriam ser exemplos para o rebanho de
Cristo no cumprimento de 2 João 10-11 e não buscarem proveito
numérico na desobediência.
“Não pode haver uma igreja sem disciplina eclesiástica” (Martin
Bucer).

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