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Eis como os historiadores deturparam a doutrina católica acerca do poder soberano

dos principais da terra. Vai em vernáculo trechos do grande doutor Belarmino em


sua Controvérsia:

Não padece dúvida que o poder divino vem de Deus: porém várias coisas há nisto
que observar.

Em primeiro lugar, se considerarmos o poder político em geral, sem


especificarmos forma alguma particular, quer monárquica, quer aristocrática, quer
democrática, devemos reconhecer que tal poder imediatamente procede só de
Deus: porque é o resultado necessário da natureza humana, e por conseguinte
provém daquele que fez a natureza do homem.

Além disto, esse poder é de direito natural e não depende do consenso dos homens;
porquanto, ou por vontade ou contra a vontade deles, é preciso que sejam
governados, sob pena de perecer o gênero humano, o que fora contrário à
inclinação da natureza. Mas o direito natural é um direito divino; logo, o governo
civil foi estabelecido por direito divino; nem outra coisa quis significar o Apóstolo
quando disse: - O que resiste ao poder, resiste à ordem estabelecida por Deus.
(Rom. XII,2.)

Notai, porém, que tal poder é conferido imediatamente a toda a sociedade. Porque,
como fica dito, ele é de direito divino. Ora, de direito divino não pertence a nenhum
homem em particular; logo pertence à sociedade. Independentemente, aliás, de
qualquer direito convencional, razão não há para que entre muitos homens, iguais
por natureza, um predomine mais do que outro; o poder pertence, pois, a todos
igualmente. Enfim, a sociedade humana deve ser perfeita; e, portanto, em si mesma
deve ter o poder de conservar-se, e por conseguinte o de punir àqueles que lhe
perturbarem a paz.
Acresce que este poder é transferido da sociedade a um ou a vários indivíduos, em
virtude do direito natural; porque a sociedade não pode por si mesma exercer tal
poder; e, portanto, lhe é forçoso despojar-se dele em favor de um só ou de poucos
indivíduos. E, desta maneira, o poder dos príncipes, considerado em geral, é
também de direito natural e direito divino: e a autoridade de todo o gênero humano
não poderia fazer com que deixasse de haver príncipes ou magistrados.

Mas no que se refere a cada forma particular de governo, cumpre notar que é de
direito humano, e não divino: pois, evidentemente, depende do consenso da
sociedade o estabelecer para seu governo, ou um rei, ou cônsules, ou outros
magistrados; e, quando ocorra motivo legítimo, poderá mudar a monarquia em
aristocracia ou democracia, ou então fazer o contrário.

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