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O SOPRO SUAVE

Eu ofereço o sopro macio,


brando e suave que acaricia,
como a brisa refrescante...
Doada pelos mares a fio.
Eu sou o sopro vazio,
como águas cristalinas.
Nadei no oceano, deixei fluir...
No aberto da minh'alma,
eis a leveza e suavidade.
Tornando-me capaz do DOM.
Subi nas montanhas, deixei fluir...
Sei que sou oferenda,
na hora presente do "aqui e agora".
E toda hora é hora, de nadar e subir...
Para oferendar o sopro.
O Divino sopro,
que a vida oferece.
Sem nada pedir.

Norma Villares
A estrada da vida precisa de espaço para fluir com amplidão e, para sorver o sopro Divino com a leveza de uma pluma
num trilhar sereno em direção ao DOM. Eu recebi o alento Cósmico e abri para novas capacidades e habilidades de
ser feliz. Eis que vi ante aos olhos brilhantes, o grande encontro fascinante e aterrorizante da 'luz e da sombra', que
tanto ansiava e temia. E nessa união da 'dor e da plenitude' me vi inteira no leito Cósmico onde o sopro ofereceria sem
cessar toda potência da luz, paz e harmonia, sem nada pedir... E estrada da vida pede espaço para fluir e, eu disse
"sim" a este balanceado cósmico. Eu disse "sim... e você amigo(a)?

Eis a grande aliança terapêutica que ensina ser como a luz, que necessita do sopro para respirar a vida e fluir no
espaço aberto... O sopro trás o vigor Divino é rico mananciais que precisamos para curar os males de nossas almas.
Graças ao brilho do sol, tudo é iluminado e visível, aquele que confia nos recursos Divinos e nos seus próprios sempre
é abençoado e tem sucesso. A luz clarifica a aliança com o que nunca adoece, com o sopro que nos inspira e nos
habita.
Nascemos sadios de alma, não somos doentes. Estamos temporariamente doentes. O processo da doença traz em sua
mala o fluxo Cósmico do 'vir a ser'.

"O ser humano precisa ser nomeado pela sua essência, como na trilogia
sânscrita sat-chit-ananda, que significa ser-consciência-bem-
aventurança".

Estigmatizar alguém com o rótulo é uma atitude arrogante e insultuosa. E neste barco estamos todos juntos. Os
estados vibratórios revelam o campo de autenticidade do ser, ora luz, ora sombra. E assim o balanço maravilhoso da
vida pulsa, vibra e reverbera.
O Divino Vibra e Reverbera, esperando que conscientizemos nesta vibração.
Eu sou o sopro que vida oferece sem nada pedir.
Paz e Bem!

Jean-Yves Leloup é um dos pensadores importantes do mundo contemporâneo. Nascido em 1950, na


França, ele é um cidadão do mundo. Filósofo, terapeuta transpessoal, teólogo, ele é padre da igreja
ortodoxa na França, e traduziu e interpretou textos bíblicos. Seu pensamento é poético, universalista,
multidimensional. Conferencista reconhecido internacionalmente, ele vem regularmente ao Brasil proferir
seminários organizados pela Universidade da Paz.
Para Marie de Solemne, uma estudiosa da sua obra, “a considerável força da palavra de Jean-Yves
Leloup é que ela é sistematicamente informada, ao mesmo tempo, por uma reflexão filosófica,
psicanalítica e espiritual”. Os livros de Jean-Yves estão publicados em vários idiomas e fazem sucesso no
Brasil. Entre os seus últimos lançamentos estão “Amar ... Apesar de Tudo” e “A Arte da Atenção”, ambos

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da Editora Verus. A entrevista a seguir foi concedida na sede da Unipaz, em Brasília.

Pergunta – Você é sacerdote da igreja ortodoxa...


Jean-Yves Leloup - A ortodoxia é a tradição das origens do cristianismo. Inicialmente, o cristianismo era
uma comunhão de igrejas. Havia a igreja de Jerusalém, a de Antióquia, a de Éfeso, a de Roma. Foi só no
século 12 que a igreja de Roma se separou. As diferentes igrejas ortodoxas preservaram a tradição de
comunhão e permaneceram unidas apesar das diferenças.

Pergunta - Você acredita em Astrologia?

Jean-Yves Leloup – O homem é uma parte do universo e depende dos astros. Isso faz
parte da sua unidade com o cosmo. Gosto das palavras de Santo Tomás de Aquino, que
diz que os homens dependem dos astros, mas são maiores do que eles. Não somos
completamente determinados pelos astros. O homem é uma mistura de natureza e de
aventura. Creio na Astrologia, mas não no determinismo.

Pergunta – Quando você diz que aceita postulados da Astrologia, essa é uma opinião pessoal ou é
um consenso em sua igreja?
Jean-Yves Leloup – Na igreja ortodoxa há diferentes teólogos, com pontos de vista diversos. A linha de
pensamento em que estou engajado respeita a Astrologia. A consciência da relação do homem com o
universo, a consciência da sua liberdade e a consciência daquilo que o ser humano faz em relação ao
universo – essas são questões muito tradicionais.

Pergunta – No seu livro A Arte da Atenção, você define o oceano como “um deserto em
movimento”. O deserto parece ser um dos seus temas constantes. Se para você o deserto é uma
metáfora, ele simboliza o quê?

Jean-Yves Leloup – Simboliza o silêncio – o silêncio de onde vem a palavra e para onde a palavra volta.
O deserto é também uma metáfora da vacuidade – a vacuidade de onde vem o mundo e para onde esse
mundo volta. Quando estamos no deserto, nesse espaço de silêncio, nós nos aproximamos dessa
vacuidade essencial e não somos distraídos pelas formas. Entramos em contato com o que não tem forma
— a origem de todas as formas.

Pergunta – Você acredita em reencarnação?


Jean-Yves Leloup – A reencarnação é uma explicação possível. Ela é importante para dar-nos um
sentido de responsabilidade e para colocar-nos em contato com as conseqüências dos nossos atos. A
idéia de reencarnação está ligada à idéia de justiça e à lei do Carma. O Evangelho diz que o que você
planta, você colhe. Nesse sentido, a idéia da reencarnação pode ser útil. Mas os grandes sábios da Índia
dizem que a reencarnação é uma crença popular e uma forma de interpretar o que está além do espaço e
do tempo. Crer na reencarnação é acreditar na continuidade do espaço-tempo. Por isso, há uma diferença
entre reencarnação e ressurreição. O objetivo humano é sair do ciclo da reencarnação e atingir um estado
de ressurreição que está além da necessidade de reencarnar e constitui uma libertação. Quando
perguntaram ao indiano Ramana Maharshi para onde ele iria depois da sua morte, ele respondeu: “irei
para onde sempre estive”. Ele não fala de reencarnação, nem do encadeamento de causas e efeitos. Ele
destaca que há dentro de nós algo que está livre da roda de causas e efeitos, livre do samsara. É esse
estado de despertar que devemos descobrir.

Pergunta – O que é Deus? É uma entidade antropomórfica que toma decisões como se fosse um
ser humano, com seu hemisfério cerebral esquerdo, que gosta ou não gosta, que se apega ou
rejeita algo? Ou Deus é apenas uma Lei Universal?

Jean-Yves Leloup – Cada um tem sua religião conforme o seu nível de consciência. Nossa imagem de
Deus é feita de acordo com o que a nossa consciência pode conter. É por isso que existem imagens de
Deus muito infantis – Deus como uma grande mãe ou um grande pai, como uma fonte de segurança.
Meister Eckhart escreveu que, para alguns, Deus é como uma vaca leiteira, algo que tem que suprir as
nossas necessidades. Para outros, Deus é aquilo que coloca em ordem a sociedade humana e o universo,
é a lei natural. Para outros, ainda, Deus é apenas uma palavra, e tudo o que podemos pensar de Deus
não é Deus, mas apenas a nossa representação dele. Assim, também, o que conhecemos da matéria não
é a matéria, mas apenas o que os nossos instrumentos de compreensão nos permitem perceber. Por isso,
quando usamos a palavra Deus, é bom saber do que estamos falando. Ao longo da nossa vida pessoal,

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nossa imagem de Deus pode mudar. Aquilo que a gente aprendeu no catecismo, em outro momento
ganha outro significado. O que aprendemos sobre Química no primeiro grau não é o que aprendemos na
universidade. Às vezes, no entanto, ficamos fixados nas imagens da escola de primeiro grau. O mais
importante, claro, é a nossa experiência. O que quero dizer quando falo de Deus? Que experiências estão
por trás dessa palavra? Para mim, essa é uma experiência de serenidade, de silêncio, de amor, e de luz.

Pergunta – Em seus livros, você aborda “a memória do corpo”.

Jean-Yves Leloup – O corpo é a nossa memória mais arcaica. Tudo aquilo que uma criança viveu fica
guardado na forma de impressões em seu corpo. Quando tocamos um corpo, tocamos toda essa
memória. Assim, você não pode tocar determinadas pessoas em determinadas áreas, porque ali há
registros de memórias antigas. Karl Graf Dürkheim dizia que quando fazemos massagem em alguém, não
estamos tocando um corpo, estamos tocando uma pessoa. O corpo é animado, pleno de memórias.

Pergunta – Como você vê a relação entre o individual e o social? Penso que ficamos capengas se
nos engajamos na transformação social sem fazer uma autotransformação, mas também ficamos
incompletos se tentamos uma autotransformação sem levar em conta a sociedade ao nosso redor.

Jean-Yves Leloup – É importante observar as duas coisas. Isso me faz lembrar do que me disse um
rabino em Jerusalém: que nunca haverá paz, em Jerusalém, enquanto o ser humano não fizer a paz
dentro de si mesmo. E fazer a paz em Jerusalém significa fazer a paz nos diferentes bairros. O bairro
judeu, o bairro árabe, o bairro cristão, etc. Nós também temos que construir essa paz nos nossos
diferentes bairros, o bairro do coração, o bairro da mente, o bairro do corpo. Se fizermos paz em nosso
próprio interior, poderemos fazer a paz no mundo. Há uma interpenetração do individual e do social.
Quando eu me preocupo com a sociedade, eu me transformo. Cuidar do outro me revela a mim mesmo.
Quando conheço o outro, conheço a mim mesmo. O Evangelho de São Tomé diz que o Reino está no
interior e no exterior. Se o Reino estivesse somente no interior, poderíamos abandonar o mundo e viver
apenas em meditação. Se o Reino estivesse só no exterior, não teríamos que meditar, e poderíamos
ocupar-nos o tempo todo da sociedade. Mas o que Jesus fala é que o Reino está dentro e fora, e eu acho
que esse é o segredo do amor. Porque o amor é aquilo que o ser humano tem de mais interior e, ao
mesmo tempo, ele tem conseqüências no mundo exterior.

Pergunta – Qual é o impacto que a busca espiritual dos indivíduos tem, ou que deveria ter, sobre
as estruturas sociais? A nossa cultura espiritual, hoje, não deveria incluir uma preocupação
explícita com mudanças sociais?

Jean-Yves Leloup – Não há oposição entre o que é interior e o que é exterior. Cada um deve seguir
aquilo que o espírito lhe inspira. Para alguns, é através da ação que se ama. Para outros, é através da
meditação ou da oração. A ação e a contemplação são como os dois olhos em um mesmo olhar. Às vezes
o amor nos convida à interiorização. Em outros momentos o amor nos leva a agir, a produzir. A única
condição necessária é que façamos todas as coisas a partir do melhor de nós mesmos. Não se deve
comparar a ação de Madre Teresa com a ação de um eremita dentro de sua gruta. Cada um age da sua
maneira pelo bem-estar da humanidade.

Pergunta – Como você vê, hoje, a marcha da evolução humana?


Jean-Yves Leloup – Vejo a humanidade em uma situação de apocalipse, entendendo a palavra
apocalipse como revelação. Há algo desmoronando, e há também algo que está nascendo. Nós
escutamos o barulho do carvalho que cai, mas não escutamos o barulho da floresta que brota. Ouvimos o
ruído das torres desmoronando, mas não escutamos a consciência que desperta. No mundo de hoje há
muitas coisas que desmoronam, e em geral falamos das coisas que fazem ruído, mas não falamos das
sementes de consciência e de luz que estão germinando.

Pergunta – Qual o significado do ascetismo no caminho espiritual?


Jean-Yves Leloup – O ascetismo é um caminho para prazeres mais sutis.

Pergunta – O que separa uma religião da outra?


Jean-Yves Leloup – Creio que é a ignorância, junto com a vaidade e o desejo de poder. Quando você
conhece o outro, você o respeita. Se não há desejo de poder, há lugar para todos. Em um canteiro de
flores há lugar para as flores azuis, para as brancas, e cada uma delas cresce em direção à luz.

Pergunta – O que as religiões têm a ensinar umas às outras?


Jean-Yves Leloup – Cada uma pode ensinar às outras a sua diferença, o que a distingue. Não podemos
fazer um buquê, se todas as flores tiverem a mesma cor. Se todas as pessoas pensam igual, então elas

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não pensam mais. O pensamento dos outros estimula o nosso pensamento. A maneira como os outros
consideram o absoluto me permite relativizar minha própria maneira de considerar o absoluto. Isso me
impede de construir um dogma e me leva a um conhecimento mais profundo.

Pergunta – Como você vê o Brasil?


Jean-Yves Leloup – Tenho a impressão de que o Brasil não tem uma coisa ou outra, ele tem todas as
coisas. E há a riqueza da natureza, a riqueza das culturas mescladas. Mas sinto que no mundo político há
alguma coisa artificial. Sinto que há uma esquizofrenia. O Brasil tem uma coisa muito forte, espontânea,
próxima do paraíso, talvez, mas há também algo que impede o surgimento desse paraíso.

Pergunta – Existe uma relação entre a atenção e o desapego...


Jean-Yves Leloup – Se estivermos realmente atentos, estaremos dentro de um instante. Só podemos
estar atentos instante a instante. Mas se estivermos atentos a esse instante estaremos desapegados em
relação ao instante anterior. A atenção é a arte de viver no momento presente, e para isso é preciso estar
livre do passado e do futuro. A arte da atenção é a arte de estar no presente. O presente está ligado ao
passado e ao futuro, mas ao mesmo tempo ele está desapegado em relação a eles. Isso me faz pensar
em umas palavras de Buda que têm relação com uma das perguntas feitas há pouco. “Se você quiser
conhecer sua vida anterior”, disse o Buda, “esteja atento para o que você é e faz hoje”. Aquilo que você é
hoje é o resultado do que você foi. Se você quiser conhecer a sua vida futura, esteja atento para o que
você é e faz hoje. Porque o que você é hoje constitui a origem do que virá mais tarde. Há também as
palavras de Cristo, “não olhe para trás e não se preocupe com o futuro, mas faça bem aquilo que você tem
de fazer no momento presente”.
Entrevista com Jean-Yves Leloup - O Barulho da Floresta que Brota
Fonte:
Revista Planeta (Brasil)

DESERTO... DESERTO... Jean Yves Leloup


"As crises que atravessamos, quer seja em um nível pessoal, coletivo ou cósmico, podem ser ocasiões (kairós) de
voltar ao 'essencial' de escolher 'o único e necessário' que tornará a nossa vida e a da Humanidade não apenas
possível, mas justa e feliz.

Na procura dessa essência e do único necessário, precisamos enfrentar encruzilhadas da vida, trilhar desertos que as
difuldades inóspitas forjaram para o amadurecimento do ser.

Cada Ser Humano tem seu deserto para atravessar.

Essa trilha é de inteira responsabilidade pessoal, são inúmeras tradições espirituais da humanidade que
apresentam o deserto como local para construção de um novo ser. Na verdade o deserto pode até ser um
local... e também não ser local nenhum. Paradoxos, meu caro(a)!
Mas evoca um 'estado' da alma de silêncio, e de partida e de encontro consigo mesmo, permitindo-nos
verificar os elementos dos quais o ícone é composto, as cores e as formas que o estruturam, e as razões
que explicam seu poder inspirador.

Eis o convite
Partir para o deserto
Ir-se embora
Caminhar ... ir mais além
Ilimitado

Para o além do além


Mais longe ainda
De si mesmo

Transpirar e voltar
E diante de tudo resgatar
O grande encontro consigo mesmo

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Para ficar bem perto de si mesmo
Bem mais perto
Pertinho

"Ir para o deserto é, em primeiro lugar, "partir em direção a si mesmo" e é a isto que
somos convidados. Para realmente conhecer a si mesmo é preciso "deixar" para trás
várias memórias que confundimos com nossa identidade. Deixar o conhecido, o
reconhecido que cremos ser, pelo desconhecido, o não-conhecido que somos. Quando a
consciência se cala, quando ela não tem mais palavras, imagens, ou conceitos a dizer,
entramos em um espaço infinito que é simbolizado pelo espaço sem limites do deserto."

O que evoca para nós a palavra deserto?

Areias quentes, silêncio, imensidão, vento abrasador? Não apenas. Evoca também sede, miragens,
escorpiões... e o encontro do mais simples de si mesmo no olhar assombrado e surpreso do homem ou da
criança que brota não se sabe de onde – entre as dunas?

Existem os desertos de pedras e de areias, o deserto do Hoggar, de Assekrem, de Ténéré e do Sinai e de


outros lugares ainda... o deserto é sempre o alhures, o outro lugar, um alhures que nos conduz para o
mais próximo de nós mesmos.

Existem os desertos na moda, onde a multidão se vai encontrar como um pode tagarela, em espaços
escolhidos, onde nos serão poupadas as queimaduras do vento e as sedes radicais; deles se volta
bronzeado como de uma temporada na praia, mas ainda por cima, com pretensões à “grande
experiência”, que nos transformaria para sempre em “grandes nômades”...

Existem, enfim, os desertos interiores. Temos que falar deles, saber reconhecer o que apresentam de
doloroso e tórrido, mas tentando também descobrir, aí, a fonte escondida, o oásis, a presença inesperada
que nos recebe, debaixo de uma palmeira sorridente, em redor de uma fogueira onde a dança dos
“passantes” se junta à das estrelas. Pois o deserto não constitui uma meta; é, antes, um lugar de
passagem, uma travessia. Cada um, então, tem a sua própria terra prometida, sua expectativa que deverá
ser frustrada, sua esperança a esclarecer.

Algumas pessoas vivem esta experiência do deserto no próprio corpo; quer isto se chame envelhecer,
adoecer ou sofrer as conseqüências de um acidente. Esse deserto às vezes demora muito a ser
atravessado.

Outras pessoas vivem o deserto no coração das suas relações, deserto do desejo ou do amor, das secas
ou dos aborrecimentos que não aprendemos a compartilhar.

Há também os desertos da inteligência, onde o mais sábio vai esbarrar no incompreensível e o mas
consciente no impensável. Só conseguimos conhecer o mundo e as suas matérias, a nós mesmos e às
nossas memórias quando atravessamos os desertos.

Temos, finalmente, o deserto da fé, o crepúsculo das idéias e dos ídolos, que havíamos transformado em
deuses ou em um Deus, para dar segurança às nossas impotências e abafar as nossas mais vivas
perguntas.

Cada pessoa tem seu próprio deserto a atravessar. E a cada vez será necessário desmascarar as
miragens e também contemplar os milagres: o instante, a aliança, a douta ignorância e a fecunda
vacuidade.

"Sem a página em branco onde ficariam as palavras?

Não foi no deserto que o homem inventou Deus?

Na ausência das coisas ou no seu silêncio descobrimos a Presença que para sempre as
conterá: Evidente, mortal e viva vacuidade...

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No deserto não há nada a ser visto e é isto que precisamos ver ao menos uma vez na
vida: nada ver com os olhos bem abertos.

E a morte não terá, então, nada mais a nos ensinar."

No deserto
Descobre-se
A pátria

E então vem a partida


Da grande miragem comum

No deserto
Duas certezas:
A sede - a poeira.
Entre estas duas
Certezas:
Uma dúvida
Um desejo:
Água!...

Roberto Crema também fala sobre as inúmeras questões a cerca do Deserto!


A tradição dos Terapeutas do Deserto, e oferece um olhar sobre o ser humano que respeita suas diversas
dimensões: o corpo, a psique, a consciência e a essência, em busca da Inteireza Humana. O quanto de
deserto existe na escuta e na visão?

Que terrenos inóspitos!


A tarefa do terapeuta é mostrar que, a iniciação na prática visionária que os inspirou é possível para todos,
basta ensinar e permitir caminhar além de roteiros... as vozes clamam.

Vozes do deserto se levantam,


para os preparados para escutar
a mensagem dos camelos
em lenta e precisa Caravana.

Vestes ao vento, véu no rosto,


que protege e realça o mistério do olhar.

Espada na mão,
para cortar o fio da ilusão.

Amor no peito, qual chama a brilhar


e a transmutar a dor em flor.

Abismos, abismos e abismos


onde me lanço qual pedra no poço,
alma.

Mensagens vastas, de travessia da imensidão desértica, vacuidade fecunda, rumo ao Oásis de uma
plenitude possível, de um sorriso apaziguado.

O deserto é o que nos murmura, docemente:

Tudo é miragem, tudo passa.


Exceto o Ser, exceto o Amor.

A ARTE DE VIVER A PASSAGEM

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Inspirado no livro da vida e da morte dos Tibetanos, Pierre Weil facilitava esse seminário apontando para as
oportunidade que representam os intervalos existentes antes, durante e depois da passagem, para realizar a verdadeira
natureza do espírito e representa uma grande aventura, tal qual a vida...

Aprendendo a vivenciar e reflexionar sobre a intencionalidade no processo evolutivo e a aprendizagem do


viver e do morrer como estados diferenciados provisórios e impermanentes. Apoiando-se nas descobertas
mais recentes da Psicologia Transpessoal e da Parapsicologia dá uma demonstração insofismável de que a morte é
não somente uma ilusão, mas também uma grande oportunidade para a transcendência.

Aprendendo a viver a morte aprendemos a viver a vida.

E todos um dia terá exaurido seu tempo na terra, e aprenderá


compreender com arte a fórmula serena de dizer adeus. Aos que ficam,
apenas saudades... Aos que partem alegrias do retorno a pátria espiritual.
E A VIDA CONTINUA...
Eu dormia e sonhava que a vida era alegria
Despertei e vi que a vida era serviço
Servi e vi que a vida era alegria.
Rabindranath Tagora

Finalmente, o quinto metaprincípio é o do serviço, o viço do Ser, que expressa a suprema Lei do Amor,
esse amor de onde viemos e para onde retornaremos, já que estamos condenados a amar.

A existência é uma escola para onde viemos aprender a amar e a servir a partir de uma
vocação particular. Não há forma de servir mais excelente do que você se tornar quem
você realmente é.

Eis um outro poema altaneiro do grande Tagore:

Oh amigo meu, amiga minha,

meu coração está angustiado

pelo peso de todos os tesouros,

que não entreguei a ti.

O que nos pesa é o que retemos, o que não ofertamos. Na realidade, apenas temos o
que oferecemos, o que servimos, que nenhum ladrão e nem mesmo a morte poderá nos
roubar.

Para que demolir os muros da prisão do apego?

Para que forjar o aço do Ser através da plena atenção?

Para que cruzar o vale de lágrimas no veículo da aceitação, transmutando a dor em flor?

Para que desvelar a vocação e esculpir a existência como uma obra-prima?

Para que realizar-se plenamente, se não for para servir!

O quinto metaprincípio focaliza a lei do amor, a terapia essencial. Cuidar da


dor, não da minha dor, mas da dor do outro.

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Velar pelo outro autenticamente, não visando retribuição, implica auto-transcendência: quando
me esqueço e, pelo outro, me esvazio de mim mesmo, abre-se um espaço intensamente vital
por onde atuam as forças curativas da Natureza.
Servir é o princípio que desvela a verdadeira compaixão, e com ela que se caminha para
auto-transcendência.
Eis o epitáfio que gostaria, quem sabe um dia, de merecer:
Confesso que servi.
Crema Roberto. Saúde e plenitude. Um caminho para o Ser. Editora Summus, 1995, 1ª edição, São Paulo-
SP.

Somos todos filhos e filhas de uma Promessa que fizemos a nós mesmos. Há uma semente inerente ao
nosso Ser; recebemos talentos na medida de nossas possibilidades e, fazer com que rendam em
abundância é a tarefa básica da existência.

A vocação é a voz de nosso mais íntimo desejo, a nos convocar para uma tarefa
pessoal intransferível que representa a nossa contribuição singular ao universo.

Não foi especulando e lendo livros de filosofia que desvelei este tema tão essencial para
cada ser humano. Foi no meu consultório, ao longo de mais de duas décadas sendo
terapeuta, escutando a dor e o encantamento de pessoas a quem acompanhei no
processo de cura e de individuação. Constatei, seguidamente, que a saúde plena não se
reduz a um estado de ausência de doenças: é uma decorrência natural de um fluxo livre
de individuação, de realização do nosso potencial inato, de alinhamento e transparência
com aquilo que somos É o que traduzo afirmando que as enfermidades são
advertências oriundas da inteligência profunda do organismo, anunciando que nos
desviamos de nossos caminhos. Todo sintoma é denúncia de desvio, de contradição;
cartas que recebemos com importantes mensagens existenciais. Nascemos para evoluir
e adoecemos quando nos deixamos estrangular no curso singular de realização
vocacional. Neste sentido, o sintoma psicossomático é um sonho orgânico que precisa
ser decifrado, como se fora um texto sagrado, na sua dimensão significativa. A autêntica
cura jamais pode ser reduzida à pura e mecânica eliminação do sintoma, decorrendo,
isto sim, de uma escuta atenta e delicada de sua mensagem vital.

Há uma dimensão educacional na abordagem holística em terapia. No seu sentido


original, educação provém do latim educare, significando trazer para fora a sabedoria
inerente ao indivíduo: atualizar o seu potencial vocacional. Aprender a fazer plena e
inclusiva escuta e leitura da sintomatologia como denúncia de descaminho, é uma
importante etapa no caminho do autoconhecimento e individuação.

No Antigo Egito, o abutre era considerado um pássaro sagrado que constava do


Panteão de Rá. Se você está fazendo uma travessia pelas areias abrasantes de um
deserto, e avista um abutre voando no céu acima de sua cabeça, saiba que você se
desviou do seu caminho e o agourento pássaro aguarda a sua refeição!... É hora, sem
demora, de voltar-se para a bússola e o mapa para um processo de correção de rota. Da
mesma forma, quando as asas negras da doença, do infortúnio e depressão circulam o
céu da sua existência, a atitude sábia é a urgente e reflexiva busca de retomada do seu
eixo original, do seu norte existencial, ou seja, da sua vocação.

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Por outro lado, também necessitei de muitos anos na escuta terapêutica para constatar
o lado luminoso desta mesma questão. Assim como o sofrimento pode nos indicar
acerca de nosso desvio, é o deslumbramento que sinaliza o nosso acerto, quando
estamos nos alinhando com o nosso propósito essencial. Escutar os momentos
estrelados de bem-aventurança é um complemento indispensável à escuta da dor.
Quando badalam todos os sinos da Catedral do Ser, quando tudo vibra em harmoniosa
melodia, quando somos abençoados por uma imensa paz, é quando estamos sendo
tocados pelas asas brancas do anjo do deslumbramento, a sussurrar em nosso íntimo:

Este é o teu caminho com coração! Não temas; vá por aí!

Eis a pergunta fundamental, que todo educador, orientador e terapeuta deve fazer ao
seu acompanhante:

O que te faz arrepiar?

É assim que, pouco a pouco, farejamos e desvelamos a promessa inerente ao ser de


cada pessoa. Pesquisar o fio de continuidade que conecta todos os nossos
deslumbramentos, da infância ao momento atual, é o mais eficaz método da tarefa
pedagógica prioritária do desvelar vocacional.

É muito triste ouvir um pai ou professor dizer a um jovem: “Faça tal curso ou siga tal
carreira pois é o que há de melhor no mercado atual”. Esta é uma ação corruptora e
desviante. Até onde posso compreender, há duas atitudes básicas frente ao trabalho.

A primeira é a de quem trabalha para ganhar dinheiro. Esta é a atitude miserável e


normótica, de quem dispersará o precioso dom da existência vendendo-se por
algo sem sentido; é vida perdida.

A segunda é a atitude nobre e saudável: a de quem ganha dinheiro realizando uma


missão, uma vocação.

Quando percorremos um Caminho com Coração, então o Mistério há de conspirar


por nós, pois estamos fazendo a nossa parte.

“Você tem medo?

Olha esta grama, olha aquele pardal; o Pai cuida deles. Você vale mais do que um
pardal. Por que o Universo não cuidaria de você?”, indaga a sabedoria Crística. Uma
das artes da individuação consiste em evoluir de uma existência perdida e alienada para
uma existência escolhida e ofertada.

É através da vocação que está ao nosso alcance superar o modelo da especialização.


Esta última limita e minimiza o raio de visão e ação. No modelo vocacional, o aprendiz é
convidado a fincar as suas raízes no solo fecundo de seus talentos particulares, a fim de
reunir a seiva para remeter o seu caule rumo ao céu. Assim, o desenvolvimento de uma
competência específica, o aprofundamento numa determinada área do saber e fazer

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humano, não castrará a visão de altitude, que desvela um horizonte amplo de sentido e
de orientação.

Como diz o antigo preceito taoísta, o alto descansa no profundo. Não será o dharma
ou vocação do ser humano, à moda do arco-íris de Noé, fazer a ponte de Aliança entre a
terra e o céu?

Vá em rumo de sua vocação, menos que isso é trair sua existência.

Siga...

Crema Roberto. Saúde e plenitude. Um caminho para o Ser. Editora Summus, 1995, 1ª edição, São Paulo-
SP.

Ao terceiro metaprincípio de um desenvolvimento integral, denomino de círculo da


aceitação. O movimento de aceitação, de modo algum implica em passividade ou
acomodação.

Pelo contrário; aceitar é uma qualidade dinâmica, quando nos fazemos não duais com a
realidade e, nesta inteireza, somos plenificados de energias, o que possibilita a
transformação ou superação do obstáculo em questão.

Nós apenas mudamos aquilo que aceitamos, num primeiro momento. Quando não
aceitamos algum aspecto da realidade, seja interna ou externa, nós nos dividimos –
entre o ideal e o real – o que nos leva a uma dispersão energética. Sem energia não é
possível a transformação.

Assim, a não aceitação nos leva a um esgotamento energético, que nos encerra no
círculo vicioso da estagnação. O alinhamento lúcido com a realidade é o que nos
possibilita sua transcendência.

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Eis a força do que Mahatma Gandhi afirmava ser o resumo de todas as orações: Seja
feita a vossa vontade. Este processo virtuoso pode ser assim resumido: eu me alinho
com a realidade para estar inteiro e com a energia advinda desta integridade, posso
atirar-me no processo de transmutação da própria realidade.

Falando de um outro modo, há três tipos de pessoas que querem transformar o mundo:
o rebelde, o revolucionário e o conspirador. O rebelde é alguém imaturo, que tem
problemas não resolvidos com as autoridades, com o papai e mamãe no interior de si
mesmo, projetando-os no exterior, sendo sempre do contra; em suma, é uma pessoa
que necessita de psicoterapia.

O revolucionário já é uma pessoa com maturidade, que faz a crítica das contradições
sistêmicas e postula uma ideologia que considera mais justa. Entretanto, há sempre uma
arrogância nesta atitude de querer mudar o mundo, sem antes ter se transformado. Em
função disto é que presenciamos praticamente a derrocada de todas as revoluções.

Finalmente, o conspirador é a pessoa que fez a revolução no interior de si mesmo,


trabalhando com o ditador no seu próprio coração, dando um testemunho de
autotransformação, naturalmente tornando-se um facilitador da transformação social e
ambiental.

O conspirador é aquele conhecedor de si, que se deu conta que é um pedacinho de


praça pública e caso queira ser agente de qualidade, de desenvolvimento no mundo, ele
tem que começar por este pedacinho de universo que lhe foi confiado.

Este é o líder capaz de aceitação de si, do outro e da realidade, assumindo um autêntico


papel de agente de transformação.

O autoconhecimento para o qual nos convocavam Sócrates, e todos os grandes


mestres, é a única forma de prevenir a humanidade das guerras, dos genocídios e das
grandes tragédias.

Porque somente mata o outro, somente viola e exclui aquele que não se conhece,
porque se conhecer é se conhecer na relação, na vinculação com o outro e com o
Totalmente Outro, o Mistério que, reconhecido ou não, sempre está presente.

Eis as palavras mágicas:

Sim, eu reconheço e aceito!

Paz Profunda!

Referência bibliográfica:

Encontramos a saída para desapegar através do SEGUNDO METAPRINCÍPIO, que aponta para
uma meta-terapia, um princípio terapêutico inerente a todo processo terapêutico: a PLENA
ATENÇÃO , que se traduz por Presença, estar conectado ao instante.

Existe uma pequena atenção, quando há uma concentração em algum aspecto da realidade, o que
implica em resistir a todas as demais estimulações.

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A plena atenção é derivada da qualidade noética, consciência da consciência.

O que Krishnamurti denominava de atenção sem escolha, um estado aberto e inclusivo de vigília.
Toda transformação expressa esta conexão com o aqui-e-agora, o que caracteriza a saúde plena.

Uma pessoa saudável não é uma pessoa que não tem problemas; é uma pessoa que está atenta, a
cada instante, aos problemas e às maravilhas do existir.

É uma atenção sem foco específico, um estado meditativo, sem tensão, sem concentração.

A patologia emana da desatenção. A plena atenção é uma função natural do despertar da kundalini,
de acordo com psicologia hindu.

A palavra Buda deriva do sânscrito bodh, que significa desperto. Buda, portanto, é aquele que
despertou plenamente para o real, que é o agora, o instante que nos nutre de tudo o que
necessitamos.

É através da plena atenção aos apegos que se torna possível transcendê-los. Neste estado de
atenção pura, deixamos de ser possuídos pela ilusão do passado e ficção do futuro, aptos a uma
responsabilidade, uma habilidade de responder ao agora.

Eis um sermão de sabedoria crística:

Vigiai e orai!

Ontem, ouvindo a palestra de Jordan Campos, ele perguntou:


- Qual o dia inútil?

E ele conta, que alguém da platéia respondeu:


- O meu aniversário e Ano Novo.
Todos riram.

Ele respondeu: - O dia mais importante é o presente.

E eu completo, é o "aqui e agora". É estar conectado no instante, com o rico manancial da


PLENA ATENÇÃO.

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