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SECRETARIA DO ESTADO DA SAÚDE

PROGRAMA DE APRIMORAMENTO PROFISSIONAL

DÉBORA OLIVEIRA CHIARARIA

INSERÇÃO DA PSICOLOGIA NO CONTEXTO HOSPITALAR SOB A ÓTICA DO


MATRICIAMENTO

Marília
2015
SECRETARIA DO ESTADO DA SAÚDE
PROGRAMA DE APRIMORAMENTO PROFISSIONAL

DÉBORA OLIVEIRA CHIARARIA

INSERÇÃO DA PSICOLOGIA NO CONTEXTO HOSPITALAR SOB A ÓTICA DO


MATRICIAMENTO

Trabalho de Conclusão de Curso


apresentado ao Programa de
Aprimoramento Profissional/SES-Fundap,
elaborado na Faculdade de Medicina de
Marília, em Psicologia Hospitalar sob
orientação da Profa. Danielle Abdel
Massih Pio.
Área: Saúde Mental

Marília
2015
C532i Chiararia, Débora de Oliveira
Inserção da Psicologia no contexto hospitalar
sob a ótica do matriciamento / Débora Oliveira Chiararia -
- Marília, 2015.
00 f.

Orientadora: Profa. Danielle Abdel Massih Pio.


Trabalho de Conclusão de Curso (Programa de
Aprimoramento Profissional) – Secretaria de Estado da
Saúde-Fundap, elaborado na Faculdade de Medicina
de Marília, em Psicologia Hospitalar.
Área: Saúde Mental.

1. Hospitais. 2. Psicologia. 3. Integralidade em saúde.


4. Administração em serviços de saúde.
Débora Oliveira Chiararia

Inserção da psicologia no contexto hospitalar sob a ótica do matriciamento

Trabalho de Conclusão de Curso


apresentado ao Programa de
Aprimoramento Profissional/SES-Fundap,
elaborado na Faculdade de Medicina de
Marília em Psicologia Hospitalar.
Área: Saúde Mental.

Comissão de Aprovação:

____________________________
Profa. Ms. Danielle Abdel Massih Pio
Supervisora/Orientadora

____________________________
Profa. Ms. Camila Mugnai Vieira
Coordenadora PAP (SES/Fundap) – FAMEMA - Área

____________________________
Profa. Dra. Roseli Vernasque Bettini
Coordenadora PAP (SES/Fundap) – FAMEMA

Data de Aprovação: ___________________


AGRADECIMENTOS

Gostaria, primeiramente, de agradecer aos meus pais, que desde meu


nascimento investiram, de uma forma saudável e genuína, no meu desenvolvimento
e crescimento, assim, hoje posso ser uma pessoa melhor. Devo a eles também a
oportunidade de ter uma profissão e de poder exercê-la tão amorosamente.
Agradeço as minhas amigas, por suportarem minha ausência durante este
ano, meus momentos de incertezas e por todo o apoio e incentivo.
Agradeço ao Tomaz, que, com todo amor e carinho, me amparou e sustentou.
Pela paciência em me escutar e acolher em todos os momentos. Meu amor, meu
amigo.
Obrigada às minhas preceptoras. Compartilhamos e renovamos o fazer „psi‟
em muitos aspectos e aprendemos com as diferenças. Pude crescer e amadurecer
graças a cada uma de vocês.
Agradeço também a minha orientadora, Danielle, que sempre foi muito
prestativa e acolhedora nos momentos desafiadores e nos de tranquilidade. Entre
risos e „biscoitinhos diets‟ desenvolvemos uma amizade e parceria que marcou esse
ano de aprendizado.
E, finalmente, às pessoas que conheci e compartilharam seus sentimentos
mais íntimos e profundos. Sem vocês nada disso seria possível ou valeria a pena.
Sem vocês não há aprendizado ou crescimento. Obrigada por me ajudar a
amadurecer como pessoa e profissional. Levo cada um em meu coração,
especialmente aqueles que não estão mais entre nós.
“Bem, conto todas essas histórias porque um cientista ou um psicólogo não nasce
do nada, não é fruto só de sua genética, de seu próprio cérebro, de sua educação
formal, ou dos livros que lê, mas sim, e principalmente, é resultado das influências
que recebeu de seus mestres. Como disse o próprio Isaac Newton (1643-1727), “se
enxerguei mais longe, foi porque estava apoiado sobre os ombros dos gigantes”;
assim, também ouso dizer que se construí algo em Psicologia da Saúde no Brasil foi
porque também estava apoiado sobre os ombros de gigantes da Psicologia
brasileira”. (Ricardo Gorayeb)
RESUMO

O presente trabalho trata-se de uma revisão bibliográfica acerca dos estudos sobre
a atuação da Psicologia Hospitalar, sob o enfoque de uma reorganização do modelo
de cuidado e de gestão dos processos em saúde. O modelo implantado baseia-se
nos referenciais de gestão colegiada, equipe multiprofissional, equipes de apoio e de
referência, que buscam fortalecer o olhar biopsicossocial, proporcionando assim
uma assistência integral. Observa-se a importância de preparar os profissionais para
atuarem nesse modelo de cogestão e de uma clínica ampliada, visto os mesmos
ainda terem resquícios do modelo biomédico/curativista de cuidado. Para isso, se
faz necessário propostas de educação permanente, reuniões de equipe semanais e
esclarecimento sobre os novos conceitos empregados pelo SUS. Tais proposições e
ações auxiliam na troca de saberes e percepções acerca do paciente, bem como na
construção de resoluções dos problemas levantados de forma eficaz e realmente
efetivas, com a elaboração de projetos terapêuticos e continuidade dos cuidados ao
paciente na Rede de Atenção à Saúde. O papel do psicólogo dentro da equipe é
contribuir para a construção e ativação de espaços para comunicação ativa e o
compartilhamento de conhecimento entre profissionais de referência e apoiadores,
buscando potencializar a prática da interdisciplinaridade, humanização e qualidade
do cuidado, auxiliando assim na melhor condução de demandas relacionadas à
saúde mental.

Palavras-chave: Hospital. Psicologia. Integralidade em saúde. Administração de


serviços de saúde.
ABSTRACT

The current paper work is about a bibliographic review of the studies of a proposal on
Psychological performance made based on a reorganization of a hospital service.
The model implemented is based on the collegiate management frameworks, multi-
professional team, support and referral teams that seek to strengthen the
biopsychosocial look, providing comprehensive care. Note the importance of
preparing professionals to work in this model of co-management and a broader clinic,
since they still have remnants of the biomedical model / curative care. For this, it is
necessary proposals for continuing education, weekly team meetings and clarification
of the new concepts employed by SUS. Such propositions and actions assist in the
exchange of knowledge and perceptions of the patient as well as the construction of
resolutions of the problems effectively and really effective, with the development of
therapeutic projects and continuity of patient care in the Health Care Network. The
psychologist's role within the team is to contribute to the construction and activation
of spaces for active communication and knowledge sharing between reference
professionals and supporters, seeking to enhance the practice of interdisciplinarity,
humanization and quality of care, thus helping to better driving demands related to
mental health.

Key-words: Hospitals. Psychology. Integrality in health. Health services


administration.
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.................................................................................................. 8
2 JUSTIFICATIVA................................................................................................ 13
3 OBJETIVOS...................................................................................................... 14
3.1 Objetivo Geral .............................................................................................. 14
3.2 Objetivos Específicos.................................................................................. 14
4 MÉTODO.......................................................................................................... 15
5 DESENVOLVIMENTO...................................................................................... 16
5.1 O pensamento biomédico e o olhar biopsicossocial: interfaces na
prática e na promoção da saúde ..................................................................... 16
5.2 A implantação do trabalho interdisciplinar no contexto hospitalar
através dos conceitos de clínica ampliada e cogestão ................................ 21
5.3 Clínica ampliada e matriciamento: propostas de atuação para a
psicologia hospitalar ...................................................................................... 30
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................ 39
REFERÊNCIAS ................................................................................................. 42
8

1 INTRODUÇÃO

O psicólogo, enquanto profissional no Brasil, tem uma história muito recente.


Apesar de o ensino da Psicologia ser feito desde os anos 30 nas escolas normais
dos Institutos de Educação do país, foi somente em 1962 - por força da Lei Federal
n° 4.119 - que a Psicologia passou a existir como profissão. No ano de 1964 foi
regulamentada a formação do psicólogo e seu exercício profissional pelo Conselho
Federal de Educação, com o Decreto n° 53.464. Com isso, o Brasil tornou-se um
dos poucos países a adotar uma legislação reguladora da profissão em todo
território nacional (DIMENSTEIN, 1998).
A partir de então, a atuação do psicólogo brasileiro consolidou-se
prioritariamente na esfera privada, tendo a prática psicoterápica como principal
instrumento de trabalho. Logo, era compreensível que a área clínica consistisse na
principal fonte de interesse profissional da grande maioria dos psicólogos
ingressantes e concluintes dos cursos de Psicologia. Porém, a partir dos anos 80, a
saúde pública passou a ser um campo de absorção para a Psicologia (MARCON;
LUNA; LISBOA, 2004).
É importante ressaltar que as políticas de saúde no Brasil são centradas no
hospital desde a década de 40, em um modelo que prioriza as ações de saúde via
atenção secundária (modelo clínico/assistencialista), e deixa em segundo plano as
ações ligadas à saúde coletiva (modelo sanitarista); sendo o hospital o símbolo
máximo de atendimento em saúde, idéia que, de alguma maneira, persiste até hoje.
Segundo Lhullier (2003), nas primeiras teses acadêmicas sobre psicossomática, a
psicologia era concebida apenas como suporte teórico à prática médica. Os médicos
não levantavam a possibilidade de um novo campo de atuação, muito menos a
criação de cursos em que se estudasse somente psicologia, sendo esta considerada
um domínio da ciência médica, contribuindo para a compreensão dos aspectos
mentais e da integração entre corpo e mente.
Assim sendo, o psicólogo na saúde pública ligou-se à área da saúde mental,
principalmente junto aos hospitais psiquiátricos, priorizando-se o modelo de atuação
clínico. Lo Bianco (1994) aponta que, nesse espaço, o psicólogo ocupava um papel
secundário diante da primazia do tratamento médico, sendo a avaliação
psicodiagnóstica sua principal forma de atuação profissional.
9

Segundo Dimenstein (2001), historicamente a psicologia sempre esteve


“míope” diante da realidade social, das necessidades e sofrimento da população,
levando os profissionais a cometer muitas distorções teóricas e realizar práticas
descontextualizadas e etnocêntricas, com uma psicologização dos problemas
sociais, na medida em que não são capacitados para perceber as especificidades
culturais dos sujeitos.
Ainda segundo a autora, a formação profissional direcionou o psicólogo para
modelos de atuação bastante limitados para o setor saúde, modelos responsáveis,
em parte, pelas dificuldades do profissional em lidar com a demanda da clientela das
instituições de saúde, e até de adaptar-se às condições do perfil profissional
exigidas pelo SUS. Tais modelos de atuação são menos flexíveis às influências do
mercado e às necessidades sociais, pois se encontram muito arraigados à
identidade e cultura profissional do psicólogo e ao processo de institucionalização
das organizações corporativas. Tanto é que a entrada do psicólogo nas instituições
públicas de saúde, apesar de ter ampliado seu campo de trabalho, parece não ter
alterado os modelos teóricos e práticos que fundamentam sua atuação. Ou seja, não
houve uma contextualização, revisão ou até mudança nas suas formas tradicionais
de atuar. Daí, sua dificuldade em construir novas práticas voltadas para a produção
social da saúde e da cidadania, práticas comprometidas com o bem-estar social
(DIMENSTEIN, 2001).
A história registrada da entrada do Psicólogo, mais especificamente no
contexto hospitalar geral, se dá em 1954 com Matilde Neder, no setor de Clínica
Ortopédica e Traumatológica da USP. O trabalho iniciou-se com o desenvolvimento
de atendimentos no pré e pós-cirúrgico infantil, a pedido da equipe médica da
instituição, com o intuito de facilitar a adesão ao tratamento, onde ocorreu uma
adaptação técnica do modelo clínico à realidade institucional, com a preconização
da Psicoterapia Breve (CAMON, 1996).
Segundo Tonetto e Gomes (2005), o termo Psicologia Hospitalar tem sido
usado no Brasil para designar o trabalho de psicólogos em hospitais, ao que se
sabe, sem precedentes em outros países. O movimento para demarcar a área como
uma especialidade surgiu a partir do final da década de oitenta (YÉPEZ, 2001). Tal
fato se concretizou em dezembro de 2000, quando o Conselho Federal de
10

Psicologia (CFP) promulgou a Resolução de nº 014, regularizando a concessão de


título de especialistas, incluindo a Psicologia Hospitalar.
Segundo o Conselho Regional de Psicologia (2003), a consolidação do
campo da Psicologia Hospitalar tem relação direta com as transformações da
instituição hospitalar em meados do século XX, com a produção industrial dos
quimioterápicos, acompanhada pela incorporação de produtos tecnológicos,
transformações na enfermagem e entrada de outros profissionais. O psicólogo
especialista em Psicologia Hospitalar tem sua função centrada nos âmbitos
secundário e terciário de atenção à saúde, atuando em instituições de saúde e
realizando atividades como: atendimento psicoterapêutico; grupos psicoterapêuticos;
grupos de psicoprofilaxia; atendimentos em ambulatório e Unidades de Terapia
Intensiva (UTI); Pronto Atendimento (PA); enfermarias em geral; psicomotricidade no
contexto hospitalar; avaliação diagnóstica; psicodiagnóstico; consultoria e
interconsultoria.
Segundo Sebastiani (2001), na década de 1970 o princípio do trabalho do
psicólogo era mais voltado à área ambulatorial, inserido aí o atendimento clínico
clássico. Com o passar dos anos, os psicólogos foram inseridos às enfermarias,
onde passaram a praticar atendimento individual e em grupos e, a participar de
modo mais efetivo das reuniões de equipe multiprofissionais, para definição de
conduta e aperfeiçoamento do atendimento e humanização dos diferentes serviços.
Romano (1999) comparou dois conjuntos de dados obtidos de profissionais
de diferentes partes do país, em 1987 e 1997. Os resultados indicaram que as
intervenções psicológicas permaneciam centradas no atendimento de pacientes
internados, orientadas por modelo de atendimento individual, tanto para pacientes
quanto para familiares. As práticas de ensino foram sistematizadas a partir de
estágios, residências, cursos de especialização, mestrado e doutorado na área de
psicologia hospitalar. As atividades em pesquisa, entre esses profissionais,
permanecia muito limitada. A exceção, neste sentido, foi para profissionais
vinculados a programas de mestrado e doutorado. Tais práticas foram adotadas
devido às dificuldades de formação acadêmica dos psicólogos para a atuação
hospitalar.
Sebastiani (2001) pontua que a partir de 1980, algumas faculdades de
psicologia inseriram em seus currículos, cadeiras ou cursos optativos na área. As
11

experiências mal sucedidas em Psicologia Hospitalar caracterizam-se pela


inadequação do psicólogo ao tentar transpor ao hospital o modelo clínico tradicional.

Mais que uma atuação determinada por uma localização, a


psicologia hospitalar é o campo de entendimento e tratamento
dos aspectos psicológicos em torno do adoecimento – aquele
que se dá quando o sujeito humano, carregado de
subjetividade, esbarra em um real, de natureza patológica,
denominado doença” (SIMONETTI, 2004)

Sebastiani (2001) coloca que o psicólogo hospitalar deve ter características


próprias, adequadas e específicas ao hospital que, por sua vez, interfere
diretamente na inserção e no desempenho técnico do profissional. Isso porque,
tecnicamente, o Psicólogo Hospitalar diferencia-se do Psicólogo Clínico em alguns
pontos fundamentais, a saber:
 Instituição permeando a atuação.
 Obrigatoriamente multiprofissional (interdisciplinar ou transdiciplinar).
 Dinâmica de trabalho com multiplicidade de solicitações.
 Ambiente de ação aberto e variável.
 Tempo impondo limites.
 Sobreposição do sofrimento organo-psíquico.
 Imposição x opção do acompanhamento psicológico.
 Iminentemente focal e emergencial.
 Predominantemente egóica.
 Morte e o morrer como parceiros constantes na rotina de trabalho.
 Abrangência maior de conhecimentos específicos.
 Possibilidades múltiplas de intervenção paciente-família-equipe-instituição.
Pode-se concluir, então, que a atuação do Psicólogo Hospitalar está
diretamente determinada por limites institucionais, onde este terá que lidar com
regras, rotinas, condutas específicas, dinâmicas que devem ser respeitadas e
seguidas, limitando ou impondo rotinas diferentes as possibilidades de atuação do
profissional. Deve, portanto, inserir-se na equipe de saúde, não num movimento de
simplesmente incluir-se, mas sim, de fixar-se, afirmar-se e interagir. Torna-se
obrigatório a interação com os demais profissionais e seus respectivos
procedimentos, exigindo-se uma flexibilidade do psicólogo (SEBASTIANI, 2001).
12

O psicólogo também deve lidar com as variadas solicitações que o hospital


requer, onde pode estar ora em um cenário, ora em outro. Isso demanda rápida e
consistente capacidade de ação, onde a técnica mais viável e utilizada, desde os
primórdios, é a norteada pela Psicoterapia Breve (PB), que, segundo Almeida
(2013), é uma intervenção terapêutica com tempo e objetivos limitados. Os objetivos
são estabelecidos a partir de uma compreensão diagnóstica do paciente e da
delimitação de um foco, considerando-se que esses objetivos são passíveis de
serem atingidos num espaço de tempo limitado (que pode ou não ser
preestabelecido), através de determinadas estratégias clínicas. Assim, as PBs estão
alicerçadas no tripé: foco, estratégias e objetivos.
Na realidade hospitalar são eleitos, junto ao paciente, focos principais a
serem trabalhados, considerando primordialmente o momento do indivíduo e todas
as características da situação especial e crítica da doença e hospitalização. A
intervenção psicológica não visa a abordagem profunda, mas foca-se no momento
vivido e nas respostas (ou ausência delas) manifestadas pelo paciente. Não se deve
esquecer o quão importante é que cada atendimento contenha um fechamento
coerente com as necessidades emergentes no „aqui e agora‟. Cada indivíduo possui
em sua história e subjetividade formas melhores ou piores de enfrentar o adverso, o
que interfere no seu estado físico e global, bem como, na forma de utilizar
mecanismos adaptativos e de enfretamento (SEBASTIANI, 2001).
Assim, é importante pensar no sentido estrito do trabalho do psicólogo junto
ao doente e sua hospitalização, porém também refletir no âmbito institucional e no
contexto ampliado em que se insere o paciente. Para isso, o psicólogo inserido em
uma equipe multiprofissional vê a importância de um espaço profissional que tenha
uma compreensão mais ampliada acerca do indivíduo-família-equipe, com
intervenções que extrapolem o campo do hospital.
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2 JUSTIFICATIVA

Durante as atividades práticas do Programa de Aprimoramento Profissional


da Secretaria do Estado da Saúde na área de Psicologia Hospitalar, na Faculdade
de Medicina de Marília (FAMEMA), realizadas na Unidade Clínico Cirúrgica e na
Unidade Materno-infantil do Hospital das Clínicas, foi observada a dificuldade ainda
existente dos profissionais em entender e compreender o papel do psicólogo no
contexto hospitalar, bem como a necessidade de fortalecer a compreensão do
adoecimento para além do biológico, valorizando os aspectos subjetivos desse
fenômeno humano.
No decorrer da prática e contato com outros membros da equipe, torna-se
clara a resistência em transpor a barreira do binômio saúde-doença e voltar-se para
o olhar do cuidado integral e biopsicossocial, mesmo que seja algo muito enfatizado
na instituição. Percebe-se que com o estresse do dia-a-dia e intensa demanda, os
profissionais se limitam aos cuidados aos quais já estão „acostumados‟. Quando a
situação vai além do biológico, com ênfase na subjetividade, logo solicitam a
psicologia, pois se sentem inseguros para lidar com esta demanda que consideram
específica.
Dessa forma, a motivação desse trabalho foi compreender de que forma o
psicólogo pode auxiliar na reflexão acerca de tais demandas, permitindo assim, que
as mesmas sejam enxergadas e acolhidas por toda a equipe e não só pelo
psicólogo.
Vale ressaltar também que dentro do contexto hospitalar o psicólogo entrou
recentemente como apoiador das equipes de referência, sendo um dos seus papéis
permitir a autonomia dos outros membros da equipe.
Para tal, pretende-se realizar uma revisão bibliográfica para melhor
compreender a atuação do psicólogo no modelo de cuidado que envolve a cogestão,
equipes de referência e apoio matricial, procurando clarear suas possibilidades e
desafios junto às equipes multiprofissionais.
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3 OBJETIVOS

3.1 Objetivo geral

Este trabalho pretende apresentar, considerando o histórico da inserção do


psicólogo na saúde pública, o modelo mais recente de cuidado do psicólogo na
instituição hospitalar, sob a ótica do matriciamento em saúde.

3.2 Objetivos específicos

 Identificar o modelo de atuação estabelecido para o Psicólogo desde o início


na saúde e no contexto hospitalar.
 Compreender os modelos de formação biomédico e biopsicossocial e suas
repercussões na configuração do trabalho do psicólogo e da equipe.
 Rever as novas necessidades de formação no campo da saúde, considerando
a integralidade do cuidado e as necessidades do fazer profissional sob a ótica
do cuidado ampliado e do matriciamento em saúde.
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4 MÉTODO

Para formulação deste trabalho, a metodologia usada foi de pesquisa


bibliográfica, onde se consultou e analisou materiais existentes sobre o tema em
questão, em livros, artigos e documentos eletrônicos. Tendo como principais fontes
SCIELO, LILACS e Ministério da Saúde, com o uso dos seguintes descritores:
Hospital; Cogestão; Psicologia e Matriciamento.
A finalidade da pesquisa foi colocar o autor em contato com os materiais já
publicados sobre os assuntos levantados como fundamentais para nortear o
trabalho.
Não foi delimitado um período referente ao ano de publicação dos artigos,
sendo selecionados aqueles que mais se aproximavam do tema. Vale a pena
ressaltar que na temática do matriciamento e da psicologia, na perspectiva deste
modelo, foram encontrados mais artigos relacionados à atuação junto à atenção
primária em saúde. Neste sentido, a temática foi trabalhada procurando transpor as
idéias existentes à discussão proposta, relacionada à atenção hospitalar, mas com
significado e amplitude para o trabalho na rede de saúde.
16

5 DESENVOLVIMENTO

5.1 O pensamento biomédico e o olhar biopsicossocial: interfaces na prática e


na promoção da saúde.

"... nada mudará a menos que, ou até que, aqueles que controlam os
recursos tenham a sabedoria de se aventurar fora do caminho já batido da
exclusiva dependência da biomedicina como a única abordagem para o
cuidado em saúde" (George L. Engel, 1977).

Desde os tempos mais remotos e ao longo da história da humanidade, o


temor pela morte e pela doença e o desejo de restabelecer a saúde, sempre
estiveram presentes no ideário humano. No entanto, a concepção do que é saúde
e/ou doença, e as formas de obter a cura tem variado em função da cultura, das
formas de organização social em cada tempo na história (SILVA, 2008).
O avanço das descobertas no campo da Medicina acompanhou também o
desenvolvimento das ciências modernas, decorrentes da revolução cultural da
renascença e da revolução industrial do século XVIII tendo continuidade na era da
automação. Na metade do século XX, a área da saúde se apresenta como campo
de transformações, com impacto mundial de grandes proporções: mudanças
científico-tecnológicas em meio a contradições ideológicas, filosóficas e éticas
decorrentes (MEDEIROS, 2012).
Com base nas premissas da Medicina científica ou paradigma flexneriano,
organizou-se o modelo de saúde conhecido como biotecnológico. Esse modelo
sustentado nas descobertas do campo da biologia nos séculos XVIII e XIX considera
saúde como sendo a ausência de doenças e promoção da saúde como diagnóstico
e tratamento das doenças nos indivíduos. Pode-se compreender o sucesso da
medicina científica pelo fato da mesma ter se desenvolvido plenamente aliada ao
modo de produção capitalista (SILVA, 2008).
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Para Medeiros (2012), facilmente o homem cairia na armadilha de preparar


profissionais para o uso da tecnologia e negligenciar outros saberes milenares.
Portanto, não constitui surpresa que, no ensino médico e nas residências médicas,
prevalecesse a formação de técnicos e, de preferência, especialistas. Não somente
especialistas, mas profissionais especializados em partes do corpo humano cada
vez menores e em aparelhos mais precisos.

Aproximando-se bem mais da bomba cardíaca e seus mecanismos


dinâmicos e deixando de lado o coração humano com todos os seus
simbolismos; pondo-se mais perto da condução de
neurotransmissores e menos atento ao sentimento daquele que
sofre; tudo isso sem maldades implícitas, é bem verdade, pois a
ciência busca melhorias para a humanidade. É que, muitas vezes,
quem a pratica o faz aproximando-se tanto da máquina, que se
esquece do homem a quem está a servir (MEDEIROS, 2012).

Esta reconfiguração da medicina, traduzida pela tendência em desenvolver


perspectivas orientadas para o coletivo e alicerçadas na quantificação estatística (e
já não exclusivamente centradas no indivíduo), é indicativa de um perfil que veio
transformar profundamente os conceitos de individuação e subjetividade, centrais na
experiência clínica. Nessa medida, o foco privilegiado da medicina desloca-se para
as análises populacionais baseadas na experimentação biomédica e estatística,
permitindo mensurar e comparar os fenômenos clínicos, com vistas à determinação
de regras universais (RAPOSO, 2009).
Ainda segundo Raposo (2009), nesta acepção, não obstante a crescente
valorização do método experimental, que é fundador da ciência moderna, e a
consequente procura de leis universais, através de pesquisas quantitativas e
populacionais, é importante notar que as decisões clínicas lidam e confrontam-se
efetivamente com zonas de indeterminação e contingência próprias da singularidade
e da individualidade. Isto significa que, apesar de o enfoque da moderna
biomedicina privilegiar o geral e o universal em detrimento do particular e do
existencial, em que os indivíduos tendem a ser vistos como casos ilustrativos das
patologias, o objetivo original da medicina é o de lidar com doentes individuais
através de faculdades de julgamento prudenciais que valorizam a diferença e a
singularidade.
18

Na contemporaneidade, pode-se observar que as concepções e ações em


saúde buscam superar o modelo biomédico, mecanicista e centrado na doença,
também denominado paradigma curativista ou biomédico (PEREIRA, BARROS &
AUGUSTO, 2011).
Com as mudanças no perfil de morbi-mortalidade como a redução da
mortalidade por doenças transmissíveis e aumento das crônico-degenerativas,
resultantes do processo de industrialização e urbanização, o modelo biotecnológico
mostrou-se insuficiente e em inicia sua crise (SILVA, 2008).
Ainda segundo a autora acima, nesse ínterim o movimento da reforma
sanitária brasileira teve papel crucial na discussão tanto para o processo de
democratização do acesso a saúde, como na discussão teórica sobre o conceito
ampliado de saúde que nortearia o sistema de saúde brasileiro. Há a necessidade
da mudança do conceito negativo de saúde (saúde como ausência de doenças),
então hegemônico, para conceituar a saúde como resultado da produção social
(conceito positivo).
A compreensão sobre saúde passa de uma condição de dependência de
técnicas, especializações e visão mecanicista do corpo humano, para um estado em
constante construção, sendo produzida coletivamente, nas relações sociais e
subjetivas, afinando-se com as ideias e concepções atuais que caminham para a
interdisciplinaridade, na medida em que ampliam o olhar sobre os diversos aspectos
do processo saúde-doença. Configura-se então um novo paradigma sanitário: o da
produção social da saúde também denominado paradigma biopsicossocial
(PEREIRA; BARROS; AUGUSTO, 2011).
O modelo biopsicossocial permite que a doença seja vista como um resultado
da interação de mecanismos celulares, teciduais, organísmicos, interpessoais e
ambientais (FAVA & SONINO, 2008). Observamos neste discurso a apresentação
do ser humano, considerado de modo contextualizado em todos os aspectos
inerentes ao seu espaço vital, ou seja: orgânico, psicológico, cultural e
socioeconômico, em que cada um influencia de modo dinâmico o outro e não
apenas enfocado na doença em si e seu tratamento (SILVA et al. 2011).
Ainda segundo os autores, os fatores psicossociais podem operar para
facilitar, manter ou modificar o curso da doença, embora o seu peso relativo possa
19

variar de doença para doença, de um indivíduo para outro e até mesmo entre dois
episódios diferentes da mesma doença, no mesmo indivíduo (SILVA et al., 2011).
Com estas informações, nota-se que este modelo está mais voltado à
prevenção de doenças e promoção da saúde, sendo que esses dois conceitos agem
de forma dialética, ou seja, promovendo saúde se previne doenças e vice-versa.
Para atingir tal objetivo, o modelo biopsicossocial considera um conceito de saúde
que como o conceito de doença tem um lado biológico, hereditário, quase não
manipulável, mas também existem alguns fatores psicológicos, sociais, econômicos,
culturais, étnicos/raciais e comportamentais que podem ser moldados pela pessoa,
como hábitos saudáveis, ambiente favorável ou acesso aos serviços de saúde,
conhecidos como Determinantes Sociais de Saúde (SCILIAR, 2007).
Pesquisas realizadas têm demonstrado que o comportamento e o estilo de
vida dos indivíduos podem ter um impacto significativo sobre o desenvolvimento ou
a exacerbação das doenças. Muitos comportamentos que auxiliam na promoção e
na manutenção da saúde são geralmente desenvolvidos durante a infância e a
adolescência, como hábitos alimentares saudáveis e prática de atividades físicas
(MIYAZAKI; DOMINGOS; CABALLO, 2001).
Além dos comportamentos, outro fator que pode influenciar no
desenvolvimento de doenças está relacionado à rede de conexão
psiconeuroimunoendócrina, que faz parte de um dos mecanismos básicos das
enfermidades. A partir dela podemos compreender como os fatos da vida cotidiana e
as emoções (raiva, ódio, culpa, arrependimento, insegurança, amor, tristeza,
depressão e outras) podem romper o equilíbrio frágil do processo saúde/doença
[respostas biopsicossociais] (BATEMAN et al., 1989).
Pode-se dizer que uma disfunção e/ou enfermidade é multifatorial. O médico
não pode escolher um ou outro fator ao cuidar do enfermo. A atenção deve ser
dirigida às necessidades da pessoa e não do médico. Procedendo assim, a ação do
médico se fará no eixo da integralidade. Podemos afirmar que o ser humano é a
unidade mente/corpo em interação com o meio ambiente. O ser total se realiza no
encontro das dimensões biológica [corpo], psicológica [mente] e social [meio
ambiente] (TSUJI; SILVA, 2010).
20

Para que a proposta biopsicossocial seja realmente validada nos contextos de


saúde, é preciso que haja uma mudança nas ações e formações dos profissionais ali
inseridos.
Sabe-se que há considerável alívio e melhoria das condições de trabalho
assistencial quando o profissional pode conhecer, por um lado, os motivos do
comportamento do usuário dos serviços de saúde e, por outro lado, tanto os efeitos
que esse comportamento lhe provoca (tais como angústia, raiva, impotência) como
as defesas que desencadeia. A atividade assistencial não pode ocupar-se de seres
humanos como se não o fossem. Seres humanos são tanto os usuários como os
profissionais, ou seja, ambos têm necessidades, desejos, medos, carências
(MARTINS, 2001).
Assim, o cuidado em saúde preconizado pelo paradigma biopsicossocial
envolve a contínua reconstrução de significados a respeito de si, do outro e do
mundo, incluindo também significados sobre saúde, doença, qualidade de vida,
autonomia, que torna necessária a criação de um espaço relacional que vá além do
saber-fazer científico/tecnológico. Isso permite o olhar para a pessoa além da
doença que apresenta, considerando-se o conhecimento que possui sobre si
mesma, sobre o adoecer e a saúde, como focos essenciais na reconstrução
conjunta de sentidos em direção a uma vida saudável nos seus diversos aspectos
(MANDÚ, 2004).
Para o autor, proposições em circulação abarcam ideias como vigilância à
saúde, atenção integral e equânime, atendimento personalizado, geração de vínculo
e estímulo ao autocuidado. Nesse conjunto, evidencia-se a relevância de ultrapassar
os tradicionais recortes prévios e limitados dos problemas de saúde-doença a
enfrentar (por classificações e/ou situações de risco), mediante a organização de
assistência mais aberta à percepção e absorção das diversas necessidades em
saúde (MANDÚ, 2004).
Discute-se, a seguir, alguns delineamentos teóricos em torno da construção
de uma nova visão/relação com o objeto de trabalho (sujeitos e suas necessidades),
baseado na recriação de tecnologias relacionais, destacando o tema da
interdisciplinaridade, clínica ampliada, matriciamento e cogestão. Tal construção
pode ser tomada como uma das bases para repensar/recriar o todo do trabalho,
voltado ao cuidado integrado, particularmente no contexto hospitalar.
21

5.2 A implantação do trabalho interdisciplinar no contexto hospitalar através


dos conceitos de clínica ampliada e cogestão.

Após as reflexões feitas nos capítulos anteriores, torna-se claro que o pensar
e fazer saúde não se esgota apenas com os saberes médicos de doença e de cura.
Com o passar dos anos, foi necessária uma evolução que envolvesse os aspectos
totais que compõem a vida de um ser humano.
Pensando em termos de Brasil, o caminho da saúde e doença também
percorreu o pensar e o fazer biomédicos, chegando, finalmente, ao pensar e o fazer
biopsicossocial. Um marco dessa mudança ocorreu com a Reforma Sanitária em
1986, onde sempre pretendeu ser mais do que apenas uma reforma setorial.
Almejava-se, desde seus primórdios, que pudesse servir à democracia e à
consolidação da cidadania no País (BRASIL, 2006).
Ainda segundo o Ministério da Saúde (MS), na esteira deste processo
democrático constituinte, o chamado movimento sanitário tinha proposições
concretas. A primeira delas, a saúde como direito de todo o cidadão, independente
de ter contribuído, ser trabalhador rural ou não trabalhador. Não se poderia excluir
ou discriminar qualquer cidadão brasileiro do acesso à assistência pública de saúde.
A segunda delas é a de que as ações de saúde deveriam garantir o acesso da
população às ações de cunho preventivo e/ou curativo e, para tal, deveriam estar
integradas em um único sistema. A terceira, a descentralização da gestão, tanto
administrativa, como financeira, de forma que se estivesse mais próximo da quarta
proposição, que era a do controle social das ações de saúde (BRASIL, 2006).
O MS, também postula que a consolidação da reforma sanitária veio através
da criação do Sistema Único de Saúde (SUS), fundamentado na Constituição
Federal de 1988, regulamentado na Lei Federal n.º 8.080, de 19 de setembro de
1990, que dispõe sobre a organização e regulação das ações de saúde, e na Lei
Federal n.º 8.142, de 28 de dezembro de 1990, que trata do financiamento da saúde
e da participação popular. A promulgação da Lei Orgânica da Saúde - Lei Federal nº
8.080, de 19 de setembro de 1990, dispõe sobre as condições para a promoção,
proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços
correspondentes e dá outras providências. Em seu artigo 2º garante que a saúde é
22

um direito fundamental do ser humano e que o Estado deve prover as condições


indispensáveis ao seu pleno exercício (BRASIL, 2006).
Para falarmos de interdisciplinaridade, precisamos relembrar sobre o princípio
da integralidade, uma das diretrizes básicas do SUS, que atualmente é foco de
debates e têm sido atribuídos a ela alguns sentidos, como: o da atenção integral, ou
seja, o acesso deve ser garantido desde as ações de promoção até as de
recuperação da saúde, das ações coletivas às individuais; o que incorpora o
conceito ampliado de saúde, envolvendo o sujeito e suas relações com o ambiente e
a sociedade e na formulação de políticas compreendendo a atenção a grupos
específicos (BRASIL, 2006).
A integralidade não é apenas uma diretriz do SUS definida
constitucionalmente. Ela é uma “bandeira de luta”, parte de uma “imagem objetivo”,
um enunciado de certas características do sistema de saúde, de suas instituições e
de suas práticas que são consideradas por alguns, desejáveis. Ela tenta falar de um
conjunto de valores pelos quais vale lutar, pois se relacionam a um ideal de uma
sociedade mais justa e solidária (MATTOS, 2001).
Pensar a integralidade da atenção nos obriga a enxergar como o “micro” está
no “macro” e o “macro” no “micro” e que esta recursividade, mais do que uma
formulação teórica, tem importantes implicações na organização de nossas práticas.
A luta pela integralidade implica, necessariamente, em repensarmos aspectos
importantes da organização do processo de trabalho, da gestão e planejamento e da
construção de novos saberes e práticas em saúde (CECÍLIO, 2001).
A influência do modelo fragmentado de organização do processo de trabalho,
em que cada profissional realiza parcelas do trabalho sem uma integração com as
demais áreas envolvidas, tem sido apontada como uma das razões que dificultam a
realização de um cuidado em saúde mais integrador e de melhor qualidade, tanto na
perspectiva daqueles que o realizam, como para aqueles que dele usufruem.
Considerando-se a realidade e as especificidades do trabalho em saúde, que é
desenvolvido por seres humanos para outros seres humanos, cuja complexidade
ultrapassa os saberes de uma única profissão, é que se tem defendido que o
trabalho em saúde deve envolver práticas que se identificam com o que tem sido
classificado como multi, pluri, inter e transdisciplinares, por uma necessidade própria
23

da evolução do conhecimento e da complexidade que vão assumindo os problemas


de saúde na realidade atual (MORIN & PIRES, 2000).
A integralidade deve ser fruto do esforço e confluência dos vários saberes de
uma equipe multiprofissional, no espaço concreto e singular dos serviços de saúde,
sejam eles um centro de saúde, uma equipe de Estratégia Saúde da Família (ESF)
ou um hospital. Poderíamos denominá-la de “integralidade focalizada” na medida em
que seria trabalhada no espaço bem delimitado (focalizado) de um serviço de saúde.

Neste encontro do usuário com a equipe, deveria prevalecer


sempre o compromisso e a preocupação de se fazer a melhor
escuta possível das necessidades de saúde trazidas por
aquela pessoa que busca o serviço, apresentadas ou
“travestidas” em alguma(s) demanda(s) específica(s).
Poderíamos trabalhar com a imagem de que, quando alguém
procura um serviço de saúde, está trazendo uma “cesta de
necessidades de saúde”, que caberia à equipe ter a
sensibilidade e preparo para decodificar e saber atender da
melhor forma possível (CECÍLIO, 2001).

Toda a ênfase dada à gestão, da organização da atenção e da capacitação


dos trabalhadores deveria ser no sentido de uma maior capacidade de escuta e
atendimento das necessidades de saúde, mais do que a adesão pura e simples a
qualquer modelo de atenção dado aprioristicamente (CECÍLIO, 2001).
Como uma maneira de intervenção, discutir-se-á sobre a proposta de trabalho
interdisciplinar que se baseia em alguns princípios e diretrizes do SUS, promulgados
no Art 7º da Lei Federal n.º 8.080, sendo eles:
I - universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de
assistência;
II - integralidade de assistência, entendida como conjunto articulado e
contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos,
exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do sistema;
III - preservação da autonomia das pessoas na defesa de sua integridade
física e moral;
IV - igualdade da assistência à saúde, sem preconceitos ou privilégios de
qualquer espécie;
V - direito à informação, às pessoas assistidas, sobre sua saúde;
24

VI - divulgação de informações quanto ao potencial dos serviços de saúde e a


sua utilização pelo usuário;
VII - utilização da epidemiologia para o estabelecimento de prioridades, a
alocação de recursos e a orientação programática;
VIII - participação da comunidade.

Na perspectiva contemporânea, a interdisciplinaridade contempla: o


reconhecimento da complexidade crescente do objeto das ciências da saúde e a
consequente exigência interna de um olhar plural; a possibilidade de trabalho
conjunto, que respeita as bases disciplinares específicas, mas busca soluções
compartilhadas para os problemas das pessoas e das instituições; o investimento
como estratégia para a concretização da integralidade das ações de saúde (SAUPE,
2005).
Este trabalho também pressupõe novas formas de relacionamento, tanto no
que diz respeito à hierarquia institucional, à gestão, à divisão e à organização do
trabalho, quanto no que diz respeito às relações que os/as trabalhadores/as
estabelecem entre si e com os usuários do serviço. Essas mudanças se distanciam
da fragmentação e hierarquização taylorista-fordista e se aproximam das chamadas
Novas Formas de Organização do Trabalho - NFOT (MATOS; PIRES; CAMPOS,
2009).
Tais formas de relacionamento vão de encontro com a Política Nacional de
Humanização (PNH), lançada pelo Ministério da Saúde em 2003, que busca pôr em
prática os princípios do SUS no cotidiano dos serviços de saúde, produzindo
mudanças nos modos de gerir e cuidar. A PNH estimula a comunicação entre
gestores, trabalhadores e usuários para construir processos coletivos de
enfrentamento de relações de poder, trabalho e afeto que muitas vezes produzem
atitudes e práticas desumanizadoras que inibem a autonomia e a
corresponsabilidade dos profissionais de saúde em seu trabalho e dos usuários no
cuidado de si.
Para Capella e Mattos (2002), a perspectiva interdisciplinar pode possibilitar o
exercício de um trabalho mais integrador e articulado, tanto no que diz respeito à
compreensão dos/as trabalhadores/as sobre o seu próprio trabalho, como no que diz
respeito à qualidade do resultado do trabalho. Segundo a PNH (2003), incluir os
25

trabalhadores na gestão é fundamental para que eles, no dia a dia, reinventem seus
processos de trabalho e sejam agentes ativos das mudanças no serviço de saúde.
Incluir usuários e suas redes sociofamiliares nos processos de cuidado é um
poderoso recurso para a ampliação da corresponsabilização no cuidado de si.
Dentre os arranjos e materiais de trabalhos interdisciplinares propostos
também pela PNH, tem-se a Clínica Ampliada, como sendo um instrumento para que
os trabalhadores e gestores de saúde possam enxergar e atuar na clínica para além
dos pedaços fragmentados, sem deixar de reconhecer e utilizar o potencial desses
saberes. Este desafio de lidar com os usuários enquanto sujeitos buscando sua
participação e autonomia no projeto terapêutico é tanto mais importante quanto mais
longo for o seguimento do tratamento e maior for a necessidade de participação e
adesão do sujeito no seu projeto terapêutico. Ou seja, exceto as situações de
atenção à emergência e os momentos de procedimentos em que os sujeitos estão
sedados, é cada vez mais vital para qualificar os serviços dialogar com os sujeitos. O
que é um desafio também em vários sistemas públicos de saúde no mundo. É na
interação entre os diferentes sujeitos da equipe (justamente valorizando essas
diferenças) que se poderá mais facilmente fazer uma clínica ampliada (BRASIL,
2003).
Assim, para que se realize uma clínica adequada é preciso saber, além do
que o sujeito apresenta de igual, o que ele apresenta de diferente, de singular,
inclusive, um conjunto de sinais e sintomas que somente nele se expressam de
determinado modo. Com isso, abrem-se inúmeras possibilidades de intervenção, e é
possível propor tratamentos muito melhores com a participação das pessoas
envolvidas (BRASIL, 2008).
Além disso, considera-se essencial a ampliação também do objetivo ou da
finalidade do trabalho clínico: além de buscar a produção de saúde, por distintos
meios – curativos, preventivos, de reabilitação ou com cuidados paliativos –, a
clínica poderá também contribuir para a ampliação do grau de autonomia dos
usuários. Autonomia entendida aqui como um conceito relativo, não como a
ausência de qualquer tipo de dependência, mas como uma ampliação da
capacidade do usuário de lidar com sua própria rede ou sistema de dependências. A
idade, a condição debilitante, o contexto social e cultural, e, até mesmo, a própria
26

subjetividade e a relação de afetos de cada pessoa, inevitavelmente, estará


envolvida (CAMPOS; AMARAL, 2007).
Podemos dizer então que a clínica ampliada é:
• um compromisso radical com o sujeito doente visto de modo singular;
• assumir a responsabilidade sobre os usuários dos serviços de saúde;
• buscar ajuda em outros setores, ao que se dá nome de intersetorialidade;
• reconhecer os limites dos conhecimentos dos profissionais de saúde e das
tecnologias por eles empregadas e buscar outros conhecimentos em diferentes
setores;
• assumir um compromisso ético profundo (BRASIL, 2008).
Ainda segundo o MS, podemos citar também, como ferramentas que surgiram
a partir da Clínica Ampliada, as Equipes de Referência e de Apoio Matricial.
Os conceitos de apoio matricial e equipe de referência foram propostos em
1989 dentro da linha de pesquisa voltada para a reforma das organizações e do
trabalho em saúde. Posteriormente, essa metodologia de gestão do cuidado foi
adotada em serviços de saúde mental, de atenção básica e da área hospitalar do
SUS. Algum tempo depois, alguns programas do MS – Humaniza-SUS, Saúde
Mental e Atenção Básica/Saúde da Família – também incorporaram essa
perspectiva (CAMPOS; DOMITTI, 2007).
Uma atenção integral, como a pretendida pelo SUS, só poderá ser alcançada
através da troca de saberes e práticas e de profundas alterações nas estruturas de
poder estabelecidas, instituindo uma lógica do trabalho interdisciplinar, por meio de
numa rede interligada de serviços de saúde (FIGUEIREDO, 2006).
A reforma e ampliação da clínica e das práticas de atenção integral à saúde
dependem centralmente da instituição de novos padrões de relacionamento entre o
sujeito/clínico e o sujeito/enfermo. Sugere-se a adoção de um arranjo no processo
de trabalho que estimule maiores coeficientes de vínculo entre equipe de saúde e
usuário concreto (CAMPOS, 1999).
O conceito de equipe de referência pode ser explicado por uma equipe que é
referência para uma determinada população. No plano da gestão esta referência
facilita um vínculo específico entre um grupo de profissional e certo número de
usuários (BRASIL, 2008).
27

A equipe de referência é composta por um conjunto de profissionais


considerados essenciais para a condução de problemas de saúde dentro de certo
campo de conhecimento. Dentro dessa lógica, a equipe de referência é composta
por distintos especialistas e profissionais encarregados de intervir sobre um mesmo
objeto – problema de saúde –, buscando atingir objetivos comuns e sendo
responsáveis pela realização de um conjunto de tarefas, ainda que operando com
diversos modos de intervenção (CAMPOS; DOMITTI, 2007).
Num serviço hospitalar pode-se definir a equipe de referência como o
conjunto de profissionais que se responsabiliza pelos mesmos usuários
cotidianamente. Por exemplo, certo número de leitos em uma enfermaria, a cargo de
uma equipe (BRASIL, 2008).
Como a proposta de equipes de referência é extensiva aos hospitais, centros
de referência, enfermarias, unidades de urgência ou de terapia intensiva, fica
evidente que a adstrição de clientela em cada um desses casos terá uma
temporalidade distinta daquela das equipes de saúde da família, em geral, mais
longa. Um paciente em tratamento de AIDS deveria permanecer adscrito a uma
equipe de referência de um centro especializado enquanto persistir seu problema;
um outro em uma enfermaria permanecerá referido a determinada equipe enquanto
durar seu tratamento no hospital. O funcionamento dialógico e integrado da equipe
de referência pressupõe tomá-la como um espaço coletivo, que discute casos
clínicos, sanitários ou de gestão, e participa da vida da organização (CAMPOS;
DOMITTI, 2007).
Segundo o MS (2008), esta mesma equipe pode ter profissionais que
trabalhem como apoiadores, quando fazem uma “interconsulta” ou um procedimento
em usuários que estão sob a responsabilidade de outra equipe. A diferença do apoio
e da interconsulta tradicional é que o apoiador faz mais do que a interconsulta, ele
deve negociar sua proposta com a equipe responsável.
O apoio matricial em saúde objetiva assegurar retaguarda especializada a
equipes e profissionais encarregados da atenção a problemas de saúde. Trata-se de
uma metodologia de trabalho complementar àquela prevista em sistemas
hierarquizados, a saber: mecanismos de referência e contra-referência, protocolos e
centros de regulação. O apoio matricial pretende oferecer tanto retaguarda
assistencial quanto suporte técnico pedagógico às equipes de referência. Depende
28

da construção compartilhada de diretrizes clínicas e sanitárias entre os componentes


de uma equipe de referência e os especialistas que oferecem apoio matricial. Essas
diretrizes devem prever critérios para acionar o apoio e definir o espectro de
responsabilidade tanto dos diferentes integrantes da equipe de referência quanto
dos apoiadores matriciais (CAMPOS; DOMITTI, 2007).
Os autores pontuam também que o apoiador matricial é um especialista que
tem um núcleo de conhecimento e um perfil distinto daquele dos profissionais de
referência, mas que pode agregar recursos de saber e mesmo contribuir com
intervenções que aumentem a capacidade de resolver problemas de saúde da
equipe primariamente responsável pelo caso. O apoio matricial procura construir e
ativar espaço para comunicação ativa e para o compartilhamento de conhecimento
entre profissionais de referência e apoiadores. O apoiador busca personalizar os
sistemas de referência e contra-referência, ao estimular e facilitar o contato direto
entre referência encarregada do caso e especialista de apoio.
O emprego do nome matricial indica essa possibilidade, a de sugerir que
profissionais de referência e especialistas mantenham uma relação horizontal, e não
apenas vertical como visto na tradição dos serviços de saúde. Trata-se de uma
tentativa de atenuar a rigidez dos sistemas de saúde quando planejados de maneira
muito estrita segundo as diretrizes clássicas de hierarquização e regionalização. O
primeiro termo – apoio – sugere uma maneira para operar-se essa relação horizontal
mediante a construção de várias linhas de transversalidade, ou seja, sugere uma
metodologia para ordenar essa relação entre referência e especialista não mais com
base na autoridade, mas com base em procedimentos dialógicos (CAMPOS, 1996).
A responsabilização compartilhada dos casos exclui a lógica do
encaminhamento, pois visa aumentar a capacidade resolutiva de problemas de
saúde pela equipe local. Assim, ao longo do tempo e gradativamente, também
estimula a interdisciplinaridade e a ampliação da clínica na equipe. A ampliação da
clínica significa o resgate e a valorização de outras dimensões, que não somente a
biológica e a dos sintomas, na análise singular de cada caso. Assim, riscos como os
sociais e outros se incorporam à avaliação clínica (BRASIL, 2003).
Para que a clínica ampliada possa ser também praticada no hospital, é
importante rever a lógica organizacional. Por um lado, aumentar o poder do usuário
na gestão e no cotidiano do hospital. Há uma série de dispositivos que ampliam a
29

possibilidade do usuário e de seus familiares participarem do processo de gestão e


dos projetos terapêuticos. Um deles se refere à presença de acompanhantes; somar
ao paciente alguém de sua confiança, tanto para companhia e apoio quanto para
participar de momentos do projeto terapêutico em que o paciente e clínico julgarem
convenientes. A ampliação do horário de visitas em hospitais é fundamental para
lograr esse objetivo. Em várias cidades brasileiras, os hospitais e centros
especializados ligados ao SUS iniciaram a construção de Conselhos de Gestão
tripartite (representação da direção, dos usuários e de profissionais) ou, até mesmo,
de assembleias com usuários em que se discutem problemas do serviço, elaboram-
se projetos e realiza-se a avaliação do trabalho. As presenças de ouvidores e de
espaços de diálogo complementam essas medidas (CAMPOS; AMARAL, 2007).
Proposta em 2007, a concepção Paidéia sugere tomar-se como unidade
nuclear de poder gerencial a Equipe Interdisciplinar. Equipes interprofissões e
interespecialidades organizadas em função de grandes áreas voltadas para uma
mesma finalidade e para um mesmo objeto (encargo). Essas equipes têm sido
denominadas de Equipe de Referência. Segundo essa concepção, um conjunto de
equipes de referência constituiria o novo "departamento" desse hospital reformulado.
Esse novo tipo de "departamento" tem sido denominado de Unidade de Produção.
São departamentos recortados segundo o objetivo e o encargo (objeto de trabalho)
de um conjunto de trabalhadores, independentemente de sua especialidade. As
Unidades de Produção recortam o hospital segundo uma nova lógica, uma
racionalidade centrada na integração do processo de trabalho. Assim, alguns
hospitais que adotaram essa estratégia criaram novos departamentos como os de
Clínica Médica, Pediatria, Urgência, Terapia Intensiva, Traumatologia e Reabilitação,
que aglutinam distintos profissionais sobre um mesmo comando e coordenação.
Cria-se um gestor único e apoiadores especializados em enfermagem, clínica,
planejamento e avaliação, etc. (CAMPOS; AMARAL, 2007).
Para assegurar a gestão democrática dessas Unidades de Produção,
agregou-se a esse desenho a proposta de criação de Colegiados de Gestão, em que
o gestor da Unidade de Produção se reúne periodicamente com as Equipes de
Referência para avaliação, elaboração de projetos e decisões estratégicas.
Recomenda-se a constituição de um sistema de cogestão: a base seria composta
pela unidade gerencial básica do hospital, a Equipe de Referência; haveria
30

Colegiados em cada Unidade de Produção e ainda um Colegiado de Gestão Central,


composto pela superintendência e gestores das Unidades de Produção. Os usuários
ingressariam nesse sistema por meio do Conselho de Gestão do hospital ou da
realização de assembléias e de reuniões com objetivos e temas específicos.
(CAMPOS; AMARAL, 2007).
A estruturação de colegiados de cogestão visa à construção de espaço onde
ocorra a contratação dos objetivos institucionais, elaboração dos planos operativos,
acompanhamento e avaliação de processos e resultados, mediante o uso de
indicadores (CAMPOS; AMARAL, 2007).
Os autores também colocam o quanto a noção de “apoio matricial” facilita
bastante à comunicação horizontal, em que um especialista de determinada Unidade
de Produção apoia equipe de referência de outra unidade em casos de maior
complexidade ou na elaboração de diretrizes clínicas, protocolos e projetos. Um
especialista em clínica médica, vinculado à Unidade de Produção Clínica Médica,
poderá fazer visitas conjuntas com a Equipe de Referência ou com cirurgiões da
Unidade de Produção de Trauma, por exemplo. O "apoio matricial" destina-se
também a dar suporte especializado ao gestor e às equipes de uma Unidade de
Produção: assim, por exemplo, uma apoiadora de enfermagem poderá apoiar o
trabalho em todas as Unidades onde houver trabalho de enfermagem, sem que
necessariamente integre essas Unidades de Produção (CAMPOS; AMARAL, 2007).
Para a concepção Paidéia, é tão importante e estratégico proceder-se à
reorganização estrutural do hospital quanto instituírem-se novos padrões de
microgestão do trabalho clínico (CAMPOS; AMARAL, 2007).

5.3 Clínica Ampliada e Matriciamento: Propostas de atuação para a Psicologia


Hospitalar.
Com a perspectiva da mudança dos modelos de atenção e de gestão do
sistema e das práticas de saúde, visando a superação do modelo de atenção
hegemônico da tecnificação, a dinâmica hospitalar foi tomando novos rumos e
arranjos, como a gestão do cuidado, a ampliação da clínica, a autonomia dos
sujeitos, o trabalho em equipe interdisciplinar, a democratização do processo de
gestão e a responsabilização e produção de vínculo terapêutico (BRASIL, 2004).
31

Partindo desse pressuposto, entende-se que novos profissionais são


incorporados às equipes, não mais constituídas por médicos e enfermeiros, mas,
agora também por farmacêuticos, fisioterapeutas, nutricionistas, psicólogos,
assistentes sociais e terapeutas ocupacionais, com o intuito de atingir o indivíduo
adoecido como um todo. As atuais diretrizes da política de atendimento exigem a
construção de práticas integradas a partir de áreas diversas do conhecimento. O
trabalho em equipe baseado na comunicação entre os profissionais das instituições
é frequentemente apontado como alternativa para a integração. Quando a instituição
em cena é o hospital, as melhorias nos níveis de comunicação entre os profissionais
tornam-se ainda mais valiosas, pois repercutem diretamente na qualidade do
atendimento ao paciente (CACHAPUZ, 2006).
Em termos históricos, a prática do psicólogo em instituições hospitalares
recebeu a influência decisiva do modelo de pensamento biológico (CHIATTONE,
2002), o qual se ancora nos parâmetros epistemológicos que sustentam a ciência
tradicional e consequentemente a postura do profissional ante o processo saúde-
doença. A este respeito Calatayud (1991) ressalta também que a vinculação
histórica da Psicologia com a Medicina, na busca de explicações para as doenças
mentais e psicossomáticas, implicou numa prática muito mais centrada na
doença/patologia do que na saúde. A influência desse modelo biomédico, em que
está presente a visão cindida do processo corpo-mente, reforçou as práticas
voltadas ao indivíduo psicológico ou biológico (SEBASTIANI; MAIA, 2005). Por sua
vez, a transposição para o espaço público de um modelo clínico psicológico, cuja
prática se dava em âmbito privado, afetou diretamente a sua eficiência no que se
refere à intervenção (MORE, 2001; CHIATTONE, 2002).
Assim, no hospital o psicólogo deparou-se com a necessidade de desenvolver
habilidades que permitissem o trabalho em equipe, visto que sua prática ocorria de
forma individualizada. Nessa nova realidade de trabalho, o psicólogo e os demais
componentes da equipe experimentaram no seu cotidiano limitações profissionais e
entenderam que os colegas de outras formações poderiam fornecer respaldo
fundamental para a melhor compreensão do processo de intervenção neste contexto
(TONETTO; GOMES, 2007). Nessa mesma direção, Crepaldi (1999) aponta que os
profissionais, à medida que se tornaram conscientes de que possuíam limites
técnicos ou pessoais para enfrentar certos obstáculos, passaram a solicitar a ajuda
32

da equipe de trabalho, o que transformou a resolução do problema e o


enfrentamento da imprevisibilidade do processo saúde-doença em uma tarefa de
equipe. Isto gerou as bases para a construção da tarefa multidisciplinar, que, para
Giannotti (1995), consiste na ação de profissionais de diversas áreas, agregados em
equipes de saúde, objetivando de forma comum o estudo das interações
“somatopsicossociais” e de métodos que possibilitem uma prática integradora focada
na totalidade dos aspectos relacionados à saúde e à doença. Essa tarefa passou a
ser um desafio concreto para a formação e para a intervenção do psicólogo na área
hospitalar, pois ele teve que desenvolver uma compreensão do seu papel no campo
multidisciplinar para assim adotar uma postura interdisciplinar. Esta, por sua vez,
implicava no desenvolvimento de uma postura de aceitação e incorporação da
diversidade presente nos diferentes saberes, em benefício do melhor acolhimento do
processo de saúde-doença dos envolvidos.
O psicólogo hospitalar foi então sendo influenciado pelas novas realidades
que a prática profissional lhe impôs, ou seja, a necessidade de reconhecer a
importância da revitalização e ressignificação de parâmetros teóricos e técnicos que
permitam uma melhor articulação do seu fazer e eficiência nas intervenções (MORE
et al, 2009). Esse cenário atual de desenvolvimento da Psicologia Hospitalar condiz
com o que aponta Silva (1992), sobre a necessidade constante do exercício do
psicólogo de reaprender com suas experiências profissionais, reintegrando seus
saberes através da permanente investigação sobre eles.
Segundo Vasconcelos (2002, p.151), “ampliando o foco de atenção (...) o
observador pode perceber em que circunstâncias o fenômeno acontece, verá
relações intrassistêmicas e intersistêmicas, verá não mais um fenômeno, mas uma
teia de fenômenos recursivamente interligados (...)”. Assim, contextualizar o objeto
em estudo significa tirar o foco de um único elemento e colocá-lo nas interações de
todos os elementos envolvidos.
Especificamente no campo da Psicologia Hospitalar, esta postura de ampliar
o foco da atenção quando se planeja e se reflete sobre uma ação de intervenção,
implica sustentar a postura do olhar da clínica ampliada, incluindo dados contextuais
que vão além do paciente e de sua doença ou sua queixa. Quando se concorda com
este olhar se está concomitantemente aceitando a realidade hospitalar como
multifacetada e complexa (MORE et al., 2009).
33

Nesse sentido, ressalta-se que proceder à revisão e compreensão de


parâmetros de atuação sob o olhar da complexidade implica necessariamente, para
o profissional, significar e adaptar sua prática a fim de propiciar uma escuta
contextualizada, cujo pressuposto, segundo More (2006), respalda-se na
necessidade de compreender o contexto como um campo de possibilidades de
sentido e significação das nossas práticas, e escuta como a capacidade de
considerar o outro (...) na sua alteridade, independente do lugar (...)”.
Assim, desenvolver a posição de escuta contextualizada, que considera e
pensa os seres humanos em contextos (MORE et al., 2004), permite o
desenvolvimento da postura da clínica ampliada, entendida como uma leitura da
realidade que implica, necessariamente, a presença de saberes que vão além
daqueles que guiam tradicionalmente a formação do psicólogo e a busca constante
do protagonismo de todos os envolvidos numa situação de intervenção (MORE et al,
2009).
O pensamento sistêmico, segundo Grandesso (2000) e Vasconcelos (1995),
dentro do campo das psicoterapias, propõe uma mudança de foco das teorias que
sustentam a clínica enquanto prática: do indivíduo para os sistemas humanos,
portanto, do intrapsíquico para o inter relacional.
Com relação a isto, Grandesso (2000) afirma que a grande virada, ao se
enfatizar os problemas como sistêmicos, foi o destaque dado aos contextos e na
postulação de uma causalidade circular para os fenômenos, favorecendo uma
abertura do campo da psicoterapia para uma espécie de interdisciplinaridade,
ampliando as fronteiras para a compreensão da pessoa humana para além do
psicológico.
Assim, a intervenção sistêmica entende o sujeito dentro de um contexto
interacional ou interpessoal, de modo que os sintomas que este possa desenvolver
sejam vistos como os resultados de suas inter-relações dentro dos sistemas dos
quais ele faz parte. Este olhar difere do modelo médico e até dos modelos
psicodinâmicos tradicionais, nos quais o locus do sintoma é o indivíduo, seja pela
sua biologia, bioquímica ou genética, em um primeiro modelo, seja pelo seu
desenvolvimento intrapsíquico, no segundo (MORE et al, 2009).
O Psicólogo inserido no ambiente hospitalar depare-se com o desafio
cotidiano de ser muitas vezes requisitado para cobrir emergências ou demandas de
34

conteúdos mais deprimidos/ansiogênicos, em que o restante da equipe não se sente


preparada para acolher. O contato inicial do paciente com a equipe se dá por meio
do acolhimento, sendo o mesmo feito por todos os profissionais de forma coerente
com suas respectivas práticas, neste momento o psicólogo atua de forma
agregadora, por vezes estabelecendo o vínculo entre o paciente e outros
profissionais, vínculo este que se faz essencial, pois corresponde a uma
possibilidade de cuidado que facilitará a melhora do paciente, sendo esta de
interesse de todos os envolvidos (ANGERAMI-CAMON, 2003).
Geralmente, após tal acolhimento da equipe, caso seja „detectada‟ uma
demanda para Psicologia ou outro profissional, optam-se por duas maneiras de
encaminhamentos:
O atendimento indireto, que se dá por meio da interconsulta, onde se
detectam os fatores iatrogênicos no funcionamento dos serviços hospitalares.
Utiliza-se tal prática em situação de conflito não explicitada, envolvendo tanto a
equipe quanto a instituição. Recolhem-se informações com todos os envolvidos:
paciente, família e equipe. Realiza-se um diagnóstico da situação através de trocas
com a equipe, alivia-se a crise, restabelece-se a relação equipe/paciente (Romano,
1999).
Ou a consultoria, para o diagnóstico e aconselhamento no manejo da conduta
de um paciente, a pedido de um médico, faz-se a mediação para manter a
comunicação entre o paciente e os que estão encarregados de assisti-lo. A
assistência pode ser direta, ou seja, com o paciente e sua família. Os recursos
técnicos para tal consultoria seriam: entrevista, observação, psicodiagnóstico,
psicoterapia individual e grupal, testes psicológicos, psicoterapias breves, focais,
observação lúdica, dinâmica de grupos, grupos operativos, técnicas corporais,
dentre outros (ROMANO, 1999).
Resumindo, o papel do psicólogo hospitalar seria o de ser um agente de
mudanças, um especialista em relações, com a atuação voltada parta o social, para
a comunidade, numa atividade curativa e preventiva, trabalhando com os conteúdos
manifestos e latentes, tendo a função de diagnosticar e compreender o que está
envolvido na queixa, no sintoma, na patologia, contribuindo também para a
humanização do hospital numa função educativa, profilática e psicoterapêutica
(GIOIA-MARTINS; JUNIOR, 2001).
35

Embora a atuação do Psicólogo Hospitalar atualmente seja estruturada, em


alguns momentos pode ser muito solitária, visto ser uma profissão que não segue a
tradição do trabalho em saúde, particularmente da Clínica Médica, Fisioterapia,
Enfermagem, Nutrição. As práticas costumam pensar o sujeito reduzindo-o a uma
condição de objeto, algo que vai se diagnosticar. Enfim, trata-se de uma tradição de
relações hierarquizadas (CAMPOS, 2012) e, se não estiver atento a isso, o
psicólogo corre o risco de se tornar mero executante da queixa e das ordens
implícitas dos encaminhadores, sustentando assim ações fragmentadas e
preconceitos relacionados ao paciente, à equipe de saúde e ao contexto (MORE et
al, 2009).
Dentro de uma inovação do trabalho junto à equipe de referência, o psicólogo
é considerado apoiador matricial, desenvolvendo suas atividades com o intuito de
fortalecer o desenvolvimento do trabalho em equipe e a troca de saberes. No
panorama atual da saúde pública, o compromisso profissional é o desenvolvimento
de ações/reflexões cuja intencionalidade prática e política produzem cidadania ativa,
sociabilidade e novas subjetividades (DIMENSTEIN, 2001).
Com isso, é possível que a Psicologia ganhe espaço, e propicie com a
proposta, a maior capacitação da equipe interdisciplinar de saúde para compreender
e atender às demandas em saúde mental, melhor delimitando seu trabalho,
otimizando o tempo e espaço e fortalecendo o papel do Psicólogo Hospitalar. A
inserção dos serviços de psicologia é privilegiada em instituições onde há espaço
para reuniões entre os diversos profissionais da equipe multidisciplinar, pois nestas
ocasiões, o psicólogo evidenciará a importância da valorização dos aspectos
emocionais do indivíduo. A equipe médica de saúde, então, busca humanizar as
condições do indivíduo no seu período de hospitalização (ANGERAMI-CAMON,
1987).
O vínculo entre o indivíduo e a equipe multidisciplinar tem de ser considerado
no manejo psicológico. É indispensável que o psicólogo saiba detalhadamente das
atividades desenvolvidas pelos demais profissionais, bem como os limites de cada
um, possibilitando uma atuação integrada, com manejo único. A
multidisciplinariedade corre o risco de fragmentação entre os setores, e
consequentemente, a fragmentação do paciente. O relacionamento precário entre o
indivíduo e a equipe de saúde pode acarretar mais sofrimento do que o esperado
36

para determinados quadros. Entretanto, é a trajetória hospitalar do indivíduo que


definirá o enfoque de seu atendimento psicológico, que poderá ser pré ou pós-
operatório, ambulatorial, ou de enfermaria. É através desta consideração que o
trabalho do psicólogo será delineado e implementado, considerando as
necessidades individuais da pessoa (ANGERAMI-CAMON, 1987).
Por sua vez, o subsistema constituído pelos integrantes da equipe de saúde
se caracteriza pela progressiva inclusão de novos profissionais, decorrente do
avanço do conhecimento científico em todas as áreas do saber que foram se
somando para melhor acolher o paciente e sua família. Assim as equipes hoje se
caracterizam por serem polifônicas, ou seja, múltiplas vozes somam-se para pensar
saúde em seu sentido mais amplo. Os desafios para que uma equipe de saúde
abrace esta lógica de trabalho são inúmeros, podendo se destacar, à luz do
pensamento sistêmico, três que são fundamentais: 1. o conhecimento e
desenvolvimento do processo de trabalho na perspectiva da integralidade das ações
de saúde; 2. gerar condições para ações de saúde que impliquem a humanização,
para dar protagonismo a todos os envolvidos, com efetivo reconhecimento do outro
como um coconstructor do que é realizado no hospital; e 3. a adoção da postura
interdisciplinar, promovendo ações que se ancorem na condição de aceitação das
diferenças dos saberes que se conjugam numa equipe (MORE et al, 2009).
Assim, o objetivo das considerações sobre a prática do psicólogo no hospital
à luz do pensamento sistêmico apresentadas é auxiliar no campo da intervenção
psicológica no contexto hospitalar através da possibilidade concreta de gerar
condições para todos os envolvidos no problema/queixa ou situação de atendimento
de serem coconstrutores ou copartícipes das ações que contemplem: a) os
princípios da humanização, integralidade e interdisciplinaridade; b) a necessária
aceitação da polifonia de saberes que se conjugam numa equipe; c) a superação do
olhar centrado no indivíduo e na doença, através do desenvolvimento da postura da
clínica ampliada, d) a busca do empoderamento dos envolvidos para melhor
enfrentar as situações implicadas no hospital, através de uma escuta psicológica
estratégica e contextualizada, e) a busca da promoção da saúde tanto na instituição
hospitalar como fora e além dela (MORE et al, 2009).
Benevides (2005) discute a relação da Psicologia com o Sistema Único de
Saúde (SUS) no Brasil tomando-se como ponto de partida uma crítica à separação
37

entre clínica e política fortemente presente na formação e na prática profissional dos


Psicólogos e indica três princípios para a construção de políticas públicas em saúde:
o da inseparabilidade, o da autonomia e corresponsabilidade e o da
transversalidade, estando a contribuição da Psicologia no entrecruzamento do
exercício destes três princípios.

O que queremos ressaltar é que os eixos da universalidade,


equidade e integralidade, constitutivos do SUS só se efetivam
quando conseguimos inventar modos de fazer acontecer tais eixos.
Interessa perguntar o como fazer e, aqui, nossa experiência indica
que a construção das redes, das grupalidades, de dispositivos de
cogestão, de aumento do índice de transversalidade, de investimento
em projetos que aumentem o grau de democracia e participação
institucional, são alguns dos caminhos a serem percorridos
(BENEVIDES, 2005).

Da surpresa inicial, de questionamentos-chave e da incerteza do como fazer


foram surgindo aos poucos algumas certezas: é preciso posicionar-se politicamente
para lidar com as populações vulneráveis que estão submetidas às violências
cotidianas e que arrebatam a porta da emergência dos hospitais públicos. Adotar
uma dada concepção do social, por exemplo, pode ser um exercício político que nos
faz tomar posições, no cotidiano, acerca dos modos de fazer psicologia (GELMAN et
al., 2009).
Segundo as autoras acima, os compromissos ético-políticos dos psicólogos
que atuam na rede SUS podem ser formulados, em certa medida, no experimento
de autoanálise do processo de trabalho. O experimento de autoanálise do cotidiano
foi gradualmente constituindo a compreensão de que o objeto de intervenção dos
psicólogos, mesmo num hospital geral, são as subjetividades (GELMAN et al.,
2009).
Então, uma atitude política no contexto de um hospital geral seria a de
repensar cotidianamente o que se faz, como se faz e quais dispositivos podem guiar
as ações, uma vez que a cada dia novas formas de subjetividade se apresentam.
Um primeiro movimento foi implicar-se num incessante ir e vir entre concepções que
estruturam e orientam nossa relação com as práticas: o individual e o coletivo, o
subjetivo e as condições objetivas, o prescrito e o transformável no ambiente
hospitalar, o profissional e o multiprofissional (GELMAN et al., 2009).
38

Para as autoras, noutra perspectiva, uma aproximação possível para esta


questão da criação e transformação das práticas, fazendo-as deslizar sempre mais
para o campo da experimentação, pode ser localizada na implementação da política
de humanização do cuidado à saúde. A Educação Permanente em Saúde (EPS) é
identificada como um dispositivo que traz consigo muitas potencialidades para fazer
disparar movimentos de desinstitucionalização das práticas, das clausuras
subjetivadas em formas, pensamento, crenças, ações, comportamentos (GELMAN
et al., 2009).
Repensar o cotidiano de trabalho, assumir a necessidade da criatividade, a
importância do posicionamento político, da circulação dos diversos discursos entre
os diferentes atores sociais que convivem na realidade hospitalar vão conduzindo o
grupo a uma conformação própria, singular e capaz de ultrapassar os protocolos e
prescrições do discurso biomédico, problematizando-o no cotidiano do trabalho das
equipes (GELMAN et al., 2009).
39

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao longo do desenvolvimento do trabalho, foi possível perceber que mudar


um modelo de gestão, para melhor se adaptar aos programas e políticas do SUS, no
contexto da saúde e hospitalar é uma tarefa desafiadora e gradual, embora ela
represente um marco de muitas lutas para uma saúde como direito de todos.
Fato é que o modelo biomédico ainda tem grande força nos hospitais e
instituições de ensino, o que dificulta que os profissionais adotem uma postura
biopsicossocial de assistência e ensino.
Muito há que se fazer, ensinar e aprender. Propor a reforma e ampliação da
clínica e das práticas de atenção integral à saúde é uma tentativa de vencer a
barreira curativista. Os resultados são singelos, porém possíveis de serem
alcançados. Pode-se observar um avanço, mesmo que discreto, nas unidades de
atenção básica, onde as propostas de clínica ampliada, equipe de referência e apoio
matricial tem funcionado. Sendo assim, o trabalho visa discutir a possibilidade de
fortalecer tal método de cogestão no contexto hospitalar.
Constata-se que organizar as profissões em “equipes de referência” e
“apoiadores matriciais” auxilia no dia-a-dia e na compreensão do papel que cada um
exerce dentro de uma equipe multi ou interdisciplinar. As demandas do paciente
ficam mais claras, assim como a percepção dos profissionais para
detectar/decodificar as reais necessidades de saúde do paciente. É durante as
reuniões de equipe que cada um tem seu espaço para falar o que percebeu, trocar
informações e buscar soluções mais efetivas para suas condutas, proporcionando
assim um cuidado integral e ampliado.
Toma-se como foco a atuação do Psicólogo no setor hospitalar e a
necessidade de estudar seu papel profissional nessa proposta de cogestão. Com a
participação deste profissional na equipe, consegue-se olhar para a subjetividade do
paciente por trás do adoecimento e não só enxergá-lo pelas necessidades
biológicas. Tem-se uma melhora na percepção sobre as demandas psíquicas,
solidificando o trabalho do psicólogo hospitalar.
40

Proporciona também que cada profissional veja a si mesmo dentro do


contexto diário em que está inserido e repense os sentimentos e emoções
vivenciados em determinadas situações.
O profissional de saúde que desenvolve atividade assistencial, além das
ações e procedimentos técnicos ligados á área específica, estabelece sempre, com
as pessoas que atende, relações interpessoais. Seu trabalho depende, portanto, da
qualidade técnica e da qualidade interacional. O contato direto com seres humanos
coloca o profissional diante de sua própria vida, sua própria saúde ou doença, seus
próprios conflitos e frustrações. Se ele não toma contato com esses fenômenos,
corre o risco de desenvolver mecanismos rígidos de defesa, que podem prejudica-lo
tanto no âmbito profissional como no pessoal (MARTINS, 2001).
Verifica-se, portanto, a necessidade de melhor preparar os profissionais, por
exemplo, através da educação permanente, para lidarem melhor com suas próprias
angústias e as do paciente, visando assim, a melhora na qualidade de vida e uma
assistência mais humanizada.
41

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