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COORDENAÇÃO E SUBORDINAÇÃO
Maria Eugenia Lamoglia Duarte
(1a) [[As duas turistas de Lisboa] e [os dois rapazes brasileiros]] visitaram o centro da
cidade.
(1b) A televisão mostrou [[as duas turistas de Lisboa] e [os dois rapazes brasileiros]]
durante o Jornal Nacional.
(1c) O repórter falou [[sobre as duas turistas de Lisboa] e [(sobre) os dois rapazes
brasileiros]].
(2) [As duas turistas de Lisboa chegaram] e [os dois rapazes brasileiros partiram].
sejam elas coordenadas entre si (isto é, não dependem sintaticamente uma da outra), mas são
subordinadas a um outro constituinte (em relação ao qual desempenham a mesma função):
(3) As duas turistas [que chegaram de Lisboa] e [(que) ficaram em minha casa]
saíram com dois rapazes brasileiros.
Em (2), as duas orações são “sintaticamente independentes”, isto é, uma não exerce função
sintática na outra. Em (3), ao contrário, temos duas orações que fazem parte da estrutura interna
do sujeito selecionado por “saíram”: elas modificam o núcleo do sujeito “turistas”, sendo, pois,
“subordinadas” a ele. Por outro lado, estão “coordenadas entre si” (isto é, uma não desempenha
função sintática na outra).
(4) “O brasileiro está com medo de tudo! Não sabe exatamente por quê, mas teme [o
impeachment de Bill Clinton], [as reações de Bóris Yeltsin], [o acordo com o FMI],
[um ataque especulativo], [a fuga de dólares], [o ajuste fiscal] e [o sobe-desce das bolsas
de valores]. Receia [perder o emprego], [votar errado], [ir ao Maracanã], [ver o Jornal
Nacional], [voar de helicóptero], [comprar à prestação] e [usar o cheque especial]"
(Extraído de Veríssimo, JB,21.09.98)
Um exame das estruturas destacadas entre colchetes nos mostra que o argumento interno (objeto
direto) do predicador verbal “temer” (alguém teme alguma coisa) veio representado por sete
SDs, coordenados entre si. Há entre eles um nexo semântico de “adição”, expresso pela
sequência e pela conjunção “e”, com valor aditivo, mas não há dependência sintática entre eles.
Outra sequência entre colchetes nos mostra novamente sete estruturas oracionais (todas têm um
verbo) coordenadas entre si, exercendo a função de argumento interno (objeto direto) do
predicador vernal “receia” (alguém receia alguma coisa). Novamente, há entre essas orações
coordenadas um nexo semântico de de adição, mas uma não é subordinada à outra. Os dois
conjuntos de estruturas coordenadas, entretanto, são subordinados ao predicador que as
selecionou, exercendo em relação a ele a função de objeto direto.
Em resumo, quando falamos/escrevemos utilizamos dois processos fundamentais de
organização sintática: a coordenação e a subordinação. No primeiro caso, colocamos no mesmo
nível hierárquico estruturas (simples ou oracionais) independentes uma da outra sintaticamente:
uma não exerce função na outra; no segundo, subordinamos termos (simples ou oracionais),
isto é, construímos estruturas em que um termo se subordina a outro, isto é, exerce função no
outro. E assim vamos “tecendo” o nosso texto. (Falaremos ainda de um número mais reduzido
de estruturas subordinadas em que os dois membros são interdependentes, o que as torna mais
fixas e as diferencia do par – Principal + Subordinada, de um lado, e do par Coordenada +
Coordenada, de outro. No caso de orações interdependentes, não há como apontar qual é a
principal e qual é a subordinada.)
Os exemplos em (1) mostram as relações de coordenação e subordinação dentro do
período simples (um só predicador verbal). Neste capítulo abordaremos as relações de
coordenação e subordinação no período composto, isto é, em construções em que esses termos
que vimos no período simples aparecem em forma de oração. Comecemos pela subordinação.
CONFRONTO ENTRE ABORDAGEM TRADICIONAL E OUTRAS PERSPECTIVAS
Relações de subordinação
As orações substantivas ou completivas
O ponto de partida para analisar um período composto, isto é, aquele que tem mais de
uma oração (mais de um verbo principal), é o verbo flexionado (conjugado) que se encontrar
numa oração sem elementos subordinantes em posição inicial (conjunções, pronomes
interrogativos e relativos, por exemplo). Assim, a oração iniciada pela conjunção subordinativa
integrante “que” (que trataremos como “complementizador”) em (5a) não nos serve de ponto
de partida. Comecemos então pela oração “decepcionou os familiares”. Esta á a oração principal
e nosso trabalho de análise deve se iniciar por ela. O verbo “decepcionar” seleciona dois
argumentos ( “alguém/alguma coisa decepciona alguém”): um tema, que terá a função de
sujeito, e um experienciador, com a função de objeto direto. O argumento externo com a função
de sujeito (“o que decepcionou os familiares?”) aparece em forma de oração “que o João não
tenha conseguido o emprego”. Trata-se, pois, de uma oração subordinada, completiva de verbo
(introduzida pelo complementizador “que”, com a função de sujeito da sua principal (que a
gramática tradicional chama de substantiva subjetiva). Observe-se que, em (5a), a oração pode
vir anteposta à sua principal, ocupando a posição estrutural do sujeito da sua principal. Esta,
entretanto, não é a posição preferencial do sujeito que aparece em forma de oração (sujeito
oracional). Observe-se em (5b) que é mais natural a ocorrência da subordinada com essa função
após a principal.
Em (6a), temos mais uma oração selecionada por um predicador verbal, classificada
pelas gramáticas tradicionais como oração subjetiva tal como a que ocorre em (5). Entretanto,
o argumento selecionado pelo verbo “parecer” (“o que parece?”) não pode ocupar a posição
anteposta ao seu predicador (a estrutura em (6b) soa agramatical). Essa oração é sem dúvida
um argumento de “parecer”, mas sua posição fixa pós-verbal mais se assemelha à das orações
em (7), em que temos duas completivas de verbo, uma em função de objeto direto e uma em
função de complemento oblíquo (ou complemento relativo na tradição gramatical), esta última,
frequentemente falada/escrita sem a preposição “de”. Assim, a subordinada selecionada por
“parecer” se comporta como esses argumentos internos em (7). A classificação das orações de
(5) a (7) como completivas de verbo, seja na função de sujeito seja na função de objeto (direto
ou oblíquo), é coerente com a seleção feita pelo predicador verbal.
Passemos às orações completivas selecionadas por um predicador nominal. Vimos, no
capítulo anterior, que um nome (adjetivo ou substantivo) pode selecionar argumentos. Tais
argumentos podem igualmente aparecer em forma de oração:
(8a) [Que o João não tenha conseguido o emprego] foi uma decepção.
(8b) [__] Foi uma decepção [que o João não tenha conseguido o emprego].
As orações selecionadas por um predicador nominal podem ainda aparecer como um argumento
interno, assim como os selecionados pelos verbos transitivos. Vejamos, então, os exemplos em
(12):
Em (13a), o argumento interno de “destacaram” aparece sob a forma de SD (ou SN) simples,
modificado por um outro SD (ou SN), que faz parte da estrutura interna do complemento, a que
chamamos “aposto” e, como insistimos no capítulo anterior, faz parte dele. Esse termo pode
aparecer, tal como os demais, em forma de oração, como vemos em (13a’) e deve ser
classificado como um elemento “modificador”, que faz parte da estrutura interna do objeto
direto. Assim, teremos uma completiva (não argumental) apositiva. Vejamos agora os dois
exemplos em (13b)
Uma comparação entre as funções apontadas pela NGB, por Rocha Lima e por Raposo
et alii pode ser vista no quadro a seguir: