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No momento político atual a Igreja Católica não é produtora de discurso capaz de

orientar a ação política de parcela significativa da população. No espaço urbano ela não
conseguiu o mesmo prestígio que possuía no meio rural. Como escreveu Cândido
Procópio Ferreira de Camargo, ela possuía o monopólio no meio rural brasileiro. Era o
catolicismo tradicional. O ambiente era todo marcado pelos símbolos e ritos católicos.
Os cruzeiros no alto dos montes cristianizavam o lugar; os templos católicos nos lugares
mais visíveis, invariavelmente acima das construções do poder civil (prefeituta, câmara
municipal); ela guardava os morros, os cemitérios ficavam atrás das igrejas; ela fazia a
mediação entre a vida e a morte. O sino chama para a oração. Tempo marcado
religiosamente.

No espaço urbano ele perde o privilégio ou monopólio do lugar formulador dos sentidos
da vida e da organização e produção de significado no espaço público e da política. Ela
está ao lado de tantos os outros lugares produtores de sentidos pelos quais o ser humano
organiza o seu estar no mundo. O espaço urbano é indiferente à sua presença. Não lhe
tem como centro de sua organização.

Vai longe o prestígio que tinha com o governo Vargas que lhe concedia a mesma
importância dada ao exército. Nesse momento, ela forneceu dois símbolos de coesão
nacional: Nossa Senhora Aparecida e Cristo Redentor. Eles tiveram mais eficiência que
as tentativas anteriores da república de produzir a alma da nação (CARVALHO) pela
mediação simbólica. O símbolo nacional que rivaliza com esses dois é Tiradentes,
transformado em Cristo Cívico.

Compreendo que hoje a religião como compreendido após a revolução francesa que
estabeleceu reservas de mercado para as empresas de salvação e política não cria nova
compreensão e anima para a ação. Ela organiza e fortalece aquilo que já existe de
maneira frágil e desorganizada, preconcebida (ARENDT).

O momento político atual produziu um substituto da religião como fonte de alienação.


Para o tradicional discurso de coisa alienante da religião. Por meio dela o fiel seria
levado a produzir falsas compreensões da realidade. Seus filtros seria algo como óculos
o que fazem a mediação entre a imagem e os olhos. A pessoa religiosa faria elaborações
absurdas por causa dessa fonte de erros cognitivos por estar fundada no absurdo.
Cebs foi coisa importante mas num registro de massa de demanda diferente do que foi
hoje.

Outubro de 2016 o conselho permanente ouviu exposição sobre dívida pública. Quase
metade do orçamente é “sangrado” para a destinação do setor financeiro.

07/04/16 discutiu-se questão política brasileira. Repúdio à corrupção no país.


Compreendem que as crises não são de agora. No momento elas estão abertas mas vêm
de longe. Demorarão um tempo para serem superadas.

03/02/15

Igreja complexo de oposições. Impossível falar no singular.

Igreja não é mais relevante como formadora de opiniões políticas na ação imediata.

Mídias sociais possuem maior relevância por força da natureza de suas mensagens
serem simbólicas e imagéticas. Vão direto pro imaginário.

Olavo.

1) Governo americano está trabalhando para a ascensão islâmica mundial.


2) A casa real britânica protege invasão islâmica em seu país. O príncipe Charles é
membro do “matarica”. Obedece a um xeique islâmico.
3) Está em plena execução um processo de extinção de toda a religião
principalmente a católica.
4) Dilma Roussef, Gilberto Carvalho participam da implementação do projeto de
uma religião biônica.
5) Não existe combustível fóssil.
6) A Pepsi cola está usando células de fetos abortados como adoçante.
7) A cultura cientifica mundial está baseada em falsificações monstruosas,
históricas e científicas.
8) Heliocentrismo não tem comprovação, copernicano.
9) Sobre a origem teoria da relatividade: Einstein fez um arranjo para que não fosse
admitido que o heliocentrismo não tem prova. Relatividade nunca foi provada
mas salvava as aparências.
10) Heliocentrismo e geocentrismo: não há prova definitiva de um lado e nem de
outro.
11) Não há prova de que a consciência seja causada pelo cérebro.
12) A URSS foi quem armou os nazistas.
13) Stalin planejou toda a segunda guerra com antecedência e usou os nazistas como
instrumento.
14) Proibição de fumo destinada a coibir a manifestação de conduta do sujeito,
extinção de comportamento. Mudança de comportamento sem o pedido do
sujeito. Ministério da saúde faz pratica ilegal da medicina.
15) Barack Obama é muçulmano.

N o sábado, véspera do primeiro turno das eleições, fui a


uma festa de família em Nova Friburgo, minha cidade natal.
Durante o dia, no inevitável passeio pela avenida principal da
cidade, deu para perceber os sinais de campanha presidencial, o
que não tinha ocorrido em nenhum momento no Rio de Janeiro:
dezenas de cabos eleitorais balançando bandeiras, muita gente
vestindo a camisa amarela com a foto de Bolsonaro estampada.
16) Em conversa com familiares, comecei a dimensionar a
força do bolsonarismo na cidade. No grupo de 25 pessoas que
jogam vôlei com a minha irmã, apenas ela e mais três disseram
que não votariam no candidato do PSL; no grupo de vinte que
jogam a tradicional pelada de fim de semana com o meu
cunhado, apenas ele e mais quatro não iam votar em Bolsonaro.
O mais inesperado foi ouvir relatos sobre antigos colegas de
colégio, figuras silenciosas e discretas, que tinham se
transformado em virulentos defensores de Bolsonaro nas redes
sociais. Adotando uma “tática de enxame”, eles se
especializaram em conjuntamente atacar páginas do Facebook
de amigos que postassem qualquer crítica ao capitão.

17) Friburgo é uma cidade conservadora, mas saí de lá com a


sensação de que Bolsonaro estava muito mais forte do que eu
imaginava. De volta ao Rio, ao votar no primeiro turno,
encontrei uma situação muito mais equilibrada. Meu
passatempo, durante a longa espera, foi tentar identificar o voto
dos eleitores das filas vizinhas. Alguns, atendendo ao pedido da
campanha de Bolsonaro, chegaram com a camisa da Seleção
brasileira. Vi muitos com adesivos de candidatos do PSOL e de
Ciro Gomes. Será que as urnas em geral estariam mais próximas
da maré bolsonarista vista em Friburgo ou do cenário mais
equilibrado das filas de uma escola de Botafogo?

18) Já faz alguns anos que não ligo a tevê para acompanhar a
apuração. Prefiro baixar o programa do TSE e abrir o site de um
grande jornal, navegando conforme as minhas escolhas. Esse
ano, porém, como os resultados demoravam a aparecer, resolvi
seguir as previsões feitas pelas pesquisas de boca de urna. À
medida que os resultados eram divulgados nos jornais
televisivos e outros eram compartilhados via WhatsApp por
amigos que estudam eleições, mais estupefato eu ficava.

19) No Rio de Janeiro, o juiz Wilson Witzel, candidato


apoiado pela família Bolsonaro, chegava em primeiro lugar,
desbancando Eduardo Paes, líder em todas as pesquisas que
foram publicadas desde o começo do ano. Imediatamente,
recebo mensagens de toda a parte. Quem é esse juiz? Em Minas
Gerais, os petistas sonharam com o crescimento do candidato do
Novo, um empresário chamado Romeu Zema. Mas não
imaginavam que ele tirasse o governador Fernando Pimentel da
disputa no segundo turno. A sensação de que essa era uma
eleição de ruptura com a velha ordem partidária ficou clara
quando apareceram os dados para o Senado de Minas, com a ex-
presidente Dilma amargando o quarto lugar. Era isso mesmo?
Sim. Uma ex-presidente vitoriosa em quatro turnos naquele
estado estava atrás de outros três concorrentes.

20) Os resultados da noite deixaram os analistas de política


sem adjetivos. O uso de analogias climáticas, embora meio
desgastado depois de anos de crise (quem não se lembra da
“tempestade perfeita”?), foi a opção. Estávamos diante de um
“tsunami” eleitoral, do “furacão” Bolsonaro, da “avalanche” de
votos do PSL. Restava falar da velha ordem política também
com imagens de destruição. O sistema partidário estaria “em
escombros”, “em ruínas”, teria vindo ao chão diante de uma
“hecatombe” de renovação.
21)

22) A final, quais eram as bases do sistema partidário


que teria sido destruído no primeiro turno do pleito de 2018?
23) Vale a pena voltar no tempo e lembrar a grande
instabilidade que marcou a primeira década da vida partidária
após a redemocratização. Cinco partidos foram fundados ainda
no regime militar: PDS, PMDB, PT, PDT e PTB. Entre 1985 e
1994, nada menos do que 68 partidos foram organizados e
disputaram pelo menos uma eleição. Dentre esses, destacam-se
o PFL, o PSDB, o PL, o PCdoB, o PSB e o PRN.

24) Mais do que pelo grande número de legendas, o período


foi caracterizado pela crise que afetou os partidos tradicionais.
Nas eleições presidenciais de 1989, os candidatos do PMDB e
PFL – os dois partidos responsáveis pela vitória na eleição de
Tancredo Neves no Colégio Eleitoral – tiveram um desempenho
pífio. Ulysses Guimarães, presidente da Assembleia Constituinte
que encerrara seu trabalho um ano antes da eleição, obteve 4,7%
dos votos. Aureliano Chaves, ex-vice-presidente da República,
alcançou apenas 0,9%.

25) A vitória de Fernando Collor pelo PRN, legenda à qual se


filiou apenas para concorrer à Presidência, e o subsequente
governo de Itamar Franco, presidente que se desfiliou do PRN e
governou sem estar vinculado a nenhuma legenda, ilustram bem
o quadro de crise do sistema partidário nos primeiros anos da
década de 90.

26) Podemos definir o ano de 1994 como o início do sistema


partidário com características mais ou menos estáveis, que
perduraria por duas décadas até as eleições de 2014. Destaco
três principais características desse sistema.

27) A primeira delas é a polarização entre PT e PSDB na


disputa presidencial. Os dois partidos chegaram em primeiro ou
em segundo lugar em todos os dez turnos disputados entre 1994
e 2014. Nas duas eleições em que o PSDB venceu no primeiro
turno (1994 e 1998), o PT chegou em segundo lugar. Nos oito
turnos em que o PT venceu (2002, 2006, 2010 e 2014), o PSDB
chegou em segundo lugar.

28) A segunda característica é o papel central do PT no


sistema partidário. Será difícil para os historiadores do futuro
não chamarem esses vinte anos de “era do PT”. O partido ficou
à frente da Presidência por mais tempo do que qualquer outro na
história da República. Mesmo durante o governo Fernando
Henri que Cardoso, o PT conseguiu ser um ator relevante,
comandando uma combativa oposição.

29) Para além do sucesso eleitoral, um aspecto que sempre


chamou a atenção no PT foi a sua capacidade de organização.
Enquanto os outros partidos mantiveram uma estrutura
organizacional tênue, com baixo envolvimento dos filiados em
suas atividades, o PT inovou ao apostar em uma estrutura capaz
de mobilizar milhares de quadros para as suas fileiras.

30) Os cientistas políticos David Samuels e Cesar Zucco, no


livro Partisans, Antipartisans and Nonpartisans: Voting
Behavior in Brazil(2018), mostraram como a divisão PT/anti-PT
foi importante na escolha dos eleitores. Caso raro, o principal
concorrente do PT não foi outro partido, mas um sentimento
genérico com nome próprio: antipetismo.
31) Uma terceira característica do sistema partidário brasileiro
é a fragmentação. Contrastando com a disputa concentrada para
a Presidência, o quadro no Congresso Nacional é de alta
pulverização, tendência que vem se aprofundando desde os anos
90. Para se ter uma ideia dessa dispersão: em 1994, as quatro
legendas mais importantes (PSDB, PMDB, DEM e PT) tinham,
juntas, 308 cadeiras na Câmara dos Deputados; em 2014,
passaram a deter apenas 210. A predominância dos quatro
partidos não é por acaso. PT e PSDB controlaram a Presidência,
enquanto o PMDB (depois MDB) e o PFL (depois DEM) foram
centrais no controle do Congresso Nacional.

32)
33) D epois da perplexidade com os resultados de boca
de urna do primeiro turno divulgados pela televisão, voltei ao
computador para analisar os dados oficiais da apuração. Ao abrir
os resultados de deputado federal do Rio de Janeiro me dei
conta que o sucesso de Bolsonaro tinha transbordado para os
cargos proporcionais.
34) Quem é esse Hélio Lopes que chegou em primeiro entre os
candidatos a deputado federal, elegendo-se com 345 mil votos, à
frente de Marcelo Freixo? Encontro na internet a foto de Lopes.
Lembro que recebi um santinho dele. Dias depois, me atualizo.
Chamado por Bolsonaro de “Hélio Negão”, ele é subtenente do
Exército e tentou ser vereador em Nova Iguaçu em 2016,
quando recebeu 480 votos. Nas estatísticas não será considerado
como um político que tenta um cargo pela primeira vez.

35) Numa eleição de tantas surpresas, nada foi mais espantoso


do que a votação obtida pelo Partido Social Liberal para a
Câmara dos Deputados. O partido obteve 11,3% dos votos e
10,1% das cadeiras. Havia conseguido eleger apenas um
deputado federal nas quatro das cinco eleições que disputou
antes de 2018. Era um dos partidos a serem barrados pela
cláusula de desempenho. A filiação de Bolsonaro e de seus
seguidores ao PSL, em março desse ano, mudou inteiramente a
sorte da legenda.

36) O PSL foi o partido que teve o maior crescimento desde as


eleições de 1990, quando é possível comparar com a primeira
eleição do regime democrático, em 1986. Em 1990, o PRN do
então presidente Collor obteve 8,3% dos votos, enquanto o
estreante PSDB recebeu 8,7%. Ambos já contavam com um
grande número de deputados e tinham o apoio de importantes
lideranças regionais.

37) Outra característica singular do PSL é o grande número de


eleitos que disputam um cargo pela primeira vez. Dos 52
deputados federais eleitos, trinta nunca haviam concorrido.
Nunca um partido elegeu tantos novatos como o PSL.
Guardadas as proporções, é um fenômeno semelhante ao da
ascensão do partido do presidente francês Emmanuel Macron
(La République en Marche!) e do Movimento 5 Estrelas, na
Itália; são novos partidos que levam dúzias de cidadãos sem
experiência prévia aos legislativos nacionais.

38) Os diversos perfis da bancada do PSL feitos pela imprensa


destacam a sua heterogeneidade. O que os une, além da
admiração por Bolsonaro, é o fato de se posicionarem na
extrema direita do espectro partidário. Só no fim da noite de
domingo do primeiro turno da eleição, quando já era possível
estimar o tamanho das bancadas de cada partido, me dei conta
de algo surpreendente: os eleitores haviam criado o maior
partido de extrema direita da história das eleições brasileiras.

39)

40) Q uando teria começado a ruína dos partidos e de


parte da tradicional elite política do país? Não são poucos os
analistas que atribuem a origem de tudo às manifestações que
varreram o país em 2013. O forte conteúdo antipolítica dos
protestos teria ajudado a minar a confiança da população no
sistema representativo.
41) Além de pedir aos manifestantes que não usassem camisas
com símbolos partidários e promover a queima da bandeira dos
partidos, os protestos lançaram alguns bordões que expressam
uma visão realmente negativa da política. “Partidos não” e “Não
me representa” eram palavras de ordem reiteradas inúmeras
vezes quando as pessoas se aproximavam da Câmara Municipal
ou da Assembleia Legislativa.

42) É difícil dimensionar se 2013 teve um efeito mais


duradouro sobre a avaliação dos brasileiros acerca dos seus
representantes. O fato é que nas eleições do ano seguinte o
impacto não foi perceptível. As pesquisas de opinião não
indicaram um aumento da desconfiança em relação às
instituições e aos partidos. A taxa de abstenção continuou
praticamente a mesma da eleição anterior. Fora do padrão,
apenas um aumento dos votos nulos e em branco para deputado
federal, particularmente nos estados do Rio e de São Paulo.

43) Somente uma força externa muito poderosa poderia abalar


um sistema de partidos estruturado em duas décadas de
competição política, com diversos mecanismos de autoproteção.
A Operação Lava Jato cumpriu esse papel. As investigações
afetaram diversas legendas, mas sobretudo as três mais
importantes: PT, PSDB e MDB. O PT teve vários de seus
dirigentes presos e investigados, entre eles o ex-presidente Lula.
Os principais dirigentes investigados do MDB tinham foro
privilegiado (eram senadores e deputados), mas o que se viu na
maior seção do partido, a do Rio de Janeiro, com a prisão de
Sérgio Cabral, Eduardo Cunha e Jorge Picciani, foi suficiente
para fazer um estrago sem precedentes na legenda. Vários
dirigentes do PSDB investigados também se beneficiaram do
foro privilegiado, mas a revelação das conversas de Aécio
Neves com o empresário Joesley Batista também amplificou
muito a rejeição ao partido.

44) Olhando para trás e relembrando a maré de denúncias


contra a elite política que circulou entre 2015 e 2018, percebo
como os analistas subestimaram os efeitos da Lava Jato. A
operação mudou o patamar de rejeição em relação aos principais
partidos. Todos foram igualados por participarem sem pudor de
gigantescos esquemas de corrupção.

45)

46) A té o começo do horário eleitoral, a visão


dominante dos cientistas políticos sobre as eleições de 2018 era
a de que repetiria os padrões dos pleitos anteriores. Eles
acreditavam que: a disputa pela Presidência se daria novamente
entre PT e PSDB; a renovação parlamentar seria baixa; e o trio
PSDB/PT/MDB continuaria dominando a política brasileira.
47) O argumento dos que defendiam a tese de que “essa
eleição é igual às últimas” baseava-se em duas premissas.
Primeiro, a importância que a estrutura partidária e a montagem
das coalizões de apoio nos estados havia tido em pleitos
anteriores. Segundo, a nova legislação eleitoral, que concentrou
o tempo de propaganda eleitoral e o dinheiro do fundo eleitoral
nos grandes partidos; juntos, MDB, PSDB, PT e PP ficaram
com 44% do dinheiro.

48) A mesma visão parece ter orientado as ações dos


dirigentes partidários. O PSDB optou por lançar Geraldo
Alckmin, uma liderança tradicional, que já havia sido candidato
à Presidência. O ex-governador de São Paulo, mais do que
qualquer um dos nomes ventilados pelo partido, tinha a cara da
velha política. O PSDB teve como prioridade a montagem de
palanques estaduais e o apoio dos partidos para conquistar o que
havia sido o melhor ativo de outras eleições: o tempo de
propaganda na tevê.

49) A estratégia do PT também mirou o passado. A ideia


parecia simples. Lula liderava as pesquisas com enorme
vantagem. O que, por si só, seria uma evidência de que o
eleitorado queria uma nova edição da época de ouro dos
governos petistas. Como as pesquisas mostravam que um
número expressivo de eleitores estaria disposto a votar em um
nome indicado por Lula, a equação estava fechada. Confiando
na força do ex-presidente e na teoria de transferência de votos, o
PT se deu ao luxo de fazer a mais estreita coalizão eleitoral
desde 1989. Só conseguiu o apoio do PCdoB – que retirou a
candidatura de Manuela D’Ávila à Presidência – e do PROS.

50) Nada, porém, supera a crença dos partidos na manutenção


da velha ordem do que o comportamento dos partidos do centrão
(DEM, PP, PR, PRB e Solidariedade). É interessante lembrar
que alguns deles haviam sido sondados pelo PT e outros pela
candidatura de Ciro Gomes. Bolsonaro gostaria de ter o senador
Magno Malta como seu vice, mas o PR não aceitou. Depois de
semanas de negociação, os partidos resolveram apoiar qual
candidato? Geraldo Alckmin.

51) PT e PSDB se prepararam para enfrentar um ao outro.


Nenhum dos dois acreditava no fenômeno Bolsonaro. No último
debate do primeiro turno na Rede Globo, a certa altura Alckmin
escolheu Haddad para responder uma de suas perguntas.
Durante minutos os dois falaram como se estivessem em 2014.
Enquanto isso, Bolsonaro concedia uma entrevista nos seus
termos à Rede Record do bispo Edir Macedo.

52)

53) F ui mais cético que meus colegas de ofício sobre a


possibilidade de que a eleição de 2018 repetisse o padrão das
eleições anteriores. Minha desconfiança se devia a duas razões.
A primeira, mais genérica, pode ser resumida no sentimento de
que, depois de três anos de crise política, dificilmente as
estruturas do sistema partidário não sairiam abaladas. Lembro-
me de uma conversa com a cientista política Maria Hermínia
Tavares de Almeida, que também compartilhava do meu
ceticismo, em que ela fez a pergunta definitiva: “Depois de tudo
que aconteceu nesses anos, as eleições não vão mudar nada?”
54) A segunda razão é que venho há anos acompanhando a
movimentação do candidato Bolsonaro. Por intermédio de um
amigo que compartilha o material do candidato, assisti aos seus
vídeos postados nas redes sociais, e os mais impressionantes
deles mostravam o acolhimento efusivo que recebia de seus
seguidores pelos aeroportos do país. Mas, apesar de não
desprezar a força de Bolsonaro, minha expectativa sobre o que
seria a eleição presidencial se revelaria totalmente equivocada.
Consulto os slides de uma apresentação que fiz em março deste
ano sobre o tema. Estimava que Bolsonaro teria algo em torno
de 15% a 20% dos votos.
55) Minha aposta era que cinco candidatos (Marina, Alckmin,
Ciro, Bolsonaro e o candidato do PT) disputariam entre si as
duas vagas para o segundo turno; todos eles com potencial de
votação semelhante, entre 10% e 20% dos votos. Uma pessoa
cujo nome não lembro e que compartilhava de avaliação
semelhante chegou a propor um número mágico: nesse cenário,
o candidato que tivesse 17% dos votos passaria para o segundo
turno.

56) Meu equívoco maior se deu quando projetava os


resultados do segundo turno. Mais de uma vez, fui perguntado
em debates e aulas sobre as chances de Bolsonaro vencer as
eleições. Na resposta, sempre me lembrava do caso francês.
Bolsonaro é candidato de um segmento específico do eleitorado,
é um candidato de nicho, que lembra o desempenho do partido
de extrema direita da França. Lá, a Frente Nacional consegue até
chegar ao segundo turno, mas todas as forças do espectro
político (da direita republicana à esquerda comunista) se juntam
contra o partido, que é sempre derrotado. Não me lembro, mas
provavelmente devo ter dito uma frase que muitos falavam em
meados do ano: “O candidato do PSL será derrotado por
qualquer um no segundo turno.”

57)

58) B olsonaro saiu do nicho. Esse é o fenômeno mais


impressionante da campanha presidencial de 2018 e será o tema
incontornável dos estudos sobre o comportamento político no
Brasil nos próximos anos.
59) Como um candidato com uma história tão à direita no
espectro político, com dezenas de vídeos em que revela seu
racismo, sua homofobia e seu menosprezo pelas mulheres, foi
capaz de conquistar uma parcela tão expressiva de eleitores de
alta renda e alta escolaridade? Fui a São Paulo em junho e
percebi que Bolsonaro já era o preferido dos motoristas de Uber
e dos trabalhadores do hotel onde me hospedei. Em setembro,
em nova viagem, soube que a comunidade judaica o apoiava em
peso. O mesmo acontecia com a elite da cidade, outrora eleitora
do PSDB.

60) O mais impressionante é que uma grande parte do


eleitorado passou a apoiar Bolsonaro sem conhecer
minimamente suas ideias. Recolhido no hospital ou em casa
desde o atentado que sofreu em 6 de setembro, Bolsonaro
compareceu somente aos dois primeiros debates da campanha.
Sem dispor de tempo no horário eleitoral gratuito, também não
detalhou nenhum dos seus projetos para o país. Minha
impressão é que seus eleitores, ao votarem nele, imaginam
escolher uma espécie de João Doria nacional.

61) Outra hipótese, mais óbvia mas não menos intrigante, é a


que vê no antipetismo uma razão forte para Bolsonaro ter saído
de seu nicho. A maré bolsonarista deveria menos aos méritos do
candidato do que a uma força inercial da opinião pública. Dito
de outro modo, qualquer candidato que disputasse contra o PT
acabaria vencendo.

62) Usei o adjetivo “intrigante” no parágrafo acima por uma


razão muito simples. Onde estava o antipetismo tão visceral que
ninguém foi capaz de dimensioná-lo? Aos olhos de agora,
parece que todo mundo já sabia da força do antipetismo, mas
nenhuma pesquisa de opinião feita antes de a campanha
começar foi capaz de capturá-lo. Ao contrário, as pesquisas
mostravam que Lula reerguia o petismo e que o partido já
recuperava seu tamanho como legenda preferida do país. Havia
inclusive uma hipótese para explicar a força do petismo: “O
governo Temer e a prisão do Lula teriam ressuscitado o PT.”

63) Estudos sobre o desenrolar da campanha eleitoral de 2018,


particularmente sobre o papel das redes sociais, devem mostrar a
evolução do antipetismo. Meu palpite é que tanto a ampliação
do antipetismo, como a mudança de patamar desse sentimento
(de um estágio relativamente leve para um visceral) deve-se à
eficácia do que chamarei, na falta de expressão melhor, de
máquina de propaganda da campanha de Bolsonaro.
64) As eleições para prefeito do Rio de Janeiro em outubro de
2016 e a greve dos caminhoneiros, em maio de 2018, mostraram
a força de uma nova forma de comunicação e mobilização
social: o WhatsApp. Falo especificamente desse instrumento
porque ele é realmente uma inflexão na forma de os brasileiros
se comunicarem. De novo, não tenho estudos, mas posso
observar na minha rotina que o WhatsApp é o grande
responsável pela inclusão de milhões de cidadãos de baixa renda
e baixa escolaridade na era digital.

65) Somente a comunicação via redes sociais, cultivada nos


últimos anos no país, poderia explicar a força e a rapidez com
que as ondas de opinião se propagaram nessas eleições. Antes,
velhas ondas de campanha demoravam dias para se formar e
precisavam do “boca a boca” para se propagar. Agora, a
propagação da informação faz-se de maneira veloz, em escala
geométrica – como provavelmente ocorreu na impressionante
campanha que levou o juiz Witzel a saltar de um dígito nas
pesquisas feitas na quarta-feira antes da eleição para 41% dos
votos válidos no primeiro turno.

66) A campanha também foi invadida por uma onda de fake


news. Assisti a dezenas de vídeos, quase todos pró-Bolsonaro,
com montagens toscas, adulterações de fatos e estatísticas
inventadas. A Justiça Eleitoral não se preparou para lidar com o
fenômeno. Diferentemente do que tinha feito em outras eleições,
quando controlava os desvios e agressões da propaganda de
rádio e televisão, nesse ano o silêncio foi a sua tônica.
67) Mas nem tudo foi fake news. Depoimentos e trechos de
eventos foram difundidos com eficácia pela campanha do PSL.
Ouvi pastores e lideranças empresariais pedirem voto para o
Bolsonaro. Vi compararem algumas propostas do candidato com
as do PT. Acabo de assistir a um vídeo em que um bispo finaliza
a sua homilia repetindo, e sendo efusivamente aplaudido pelos
fiéis, o principal bordão da campanha bolsonarista: “Brasil
acima de tudo, Deus acima de todos.”
68) Bolsonaro é, a meu juízo, o maior fenômeno da história
das eleições no Brasil. Muitos o comparam com Collor em
1989, mas sua força e abrangência são bem maiores. Uma coisa
parece certa. Com Collor, vimos a emergência de um fenômeno
propagado pelas redes de televisão. Bolsonaro não só nos
mostrou que a era da televisão está se encerrando, como uma
nova era começa: a das campanhas feitas nos subterrâneos da
sociedade, por meio das redes sociais.

69)

70) E mbora essa seja uma análise ainda inicial, minha


sugestão é que o pleito desse ano é um exemplo do que os
cientistas políticos chamam de “eleição crítica”: uma disputa
que desestrutura o padrão de competição partidária vigente.
71) Enumero quatro elementos que demonstram que as
eleições deste ano marcam o encerramento do sistema partidário
que vigorou por duas décadas: o fim da polarização entre PT e
PSDB nas eleições presidenciais; o fim da centralidade do
primeiro como força organizadora do sistema partidário; o
declínio dos dois maiores partidos de centro (PMDB e PSDB); e
a emergência de um novo e expressivo partido de direita (PSL).

72) A onda bolsonarista foi tão forte que, nos dias que se
seguiram ao primeiro turno, os prognósticos sobre o resultado
do segundo turno podiam ser resumidos em duas perguntas:
Qual será a diferença a favor do candidato do PSL? Será que ele
superará o desempenho de Lula em 2002? (Nesse ano, o
candidato do PT recebeu 61,3% dos votos válidos, a maior
votação já obtida por um candidato a presidente.) As pesquisas
publicadas na primeira semana após o segundo turno reforçaram
a ideia de vitória por grande margem. Na pesquisa do Datafolha,
o deputado do PSL vencia com 58% dos votos válidos; na
pesquisa Ibope vencia com 59%.

73) Em razão da grande vantagem confirmada nas primeiras


pesquisas, Bolsonaro manteve a mesma estratégia adotada no
último mês de campanha do primeiro turno: priorizou a difusão
de mensagens por intermédio das redes sociais, não participou
de eventos públicos e nem compareceu aos tradicionais debates
promovidos pelos principais meios de comunicação do país. A
diferença é que sua campanha chegou ao rádio e à televisão.

74) Com apenas oitos segundos, o ex-capitão havia sido quase


invisível nos meios tradicionais de comunicação no primeiro
turno. No segundo, com os dez minutos do programa eleitoral e
centenas de inserções, ele teve que dar uma atenção especial ao
velho (e para ele novo) formato de comunicação.

75) Se pudermos recorrer a uma metáfora esportiva, a


estratégia de Bolsonaro lembrou a dos times de futebol que,
vencendo por larga vantagem, “jogam contra o relógio”. Deixam
o tempo passar, trocam passes para o lado até que o juiz aponte
para o centro do gramado.

76) Na campanha de Haddad, em contrapartida, inicialmente


nada parecia funcionar. A tentativa de organizar uma frente
democrática foi um fiasco. O petista recebeu apoio crítico do
PDT e Ciro Gomes preferiu não declarar seu voto; Fernando
Henrique Cardoso e outras lideranças nacionais do PSDB
também preferiram não se manifestar; Marina Silva deu seu
apoio quinze dias depois do domingo do primeiro turno.
Chegavam notícias de que até mesmo os dirigentes do PT não
acreditavam na sorte de seu candidato e temiam uma derrota
humilhante. Em mais de uma conversa com amigos chamei a
atenção para a “solidão de Haddad”. A sensação era outra: a do
time que está sendo derrotado por uma grande diferença e conta
os segundos para que o jogo acabe.

77) A incapacidade de Haddad e do PT para ampliar o seu


arco de alianças foi relativamente compensada por um
movimento de apoio, também cultivado nas redes sociais, que
contou com grandes atividades de rua na última semana antes do
pleito. Foi provavelmente por causa desse movimento que o
candidato do PT não sofreu a derrota que se desenhava no
começo do segundo turno. A comparação dos votos dos dois
turnos, incluindo os votos nulos e em branco no cálculo, mostra
que Haddad acabou crescendo mais (passou de 27% para 40%
dos votos totais), do que Bolsonaro (passou de 42% para 50%).
78)

79) E screvo as linhas finais desse texto poucos minutos


após a confirmação de que Bolsonaro é o novo presidente do
Brasil. Escuto muitos gritos, panelas batidas e fogos para
celebrar a vitória. O volume se assemelha ao das manifestações
contra a ex-presidente Dilma Rousseff. Numa eleição de tantas
novidades cabe registrar mais essa. Pelo menos no Rio de
Janeiro, nunca tinha visto uma vitória eleitoral ser tão celebrada.
80) Ainda vou passar muitas semanas analisando os dados das
eleições de 2018. Mas como não podia deixar de ser, começo
observando o que ocorreu em Nova Friburgo: no primeiro turno,
Bolsonaro obteve 63% dos votos válidos, Ciro Gomes, 16% e
Haddad, 10%. No segundo turno, Bolsonaro obteve 73%. Já na
minha zona eleitoral, no Rio, o quadro foi bem mais equilibrado
no primeiro turno: Bolsonaro obteve 44% dos votos, Ciro, 30%
e Haddad, 13%; no segundo turno Bolsonaro chegou aos 54%.

81) Olho os números e me dou conta de como Bolsonaro foi


bem votado em outras áreas da cidade do Rio de Janeiro.
Enquanto isso, os gritos pró-Bolsonaro e contra o PT continuam
a ecoar lá fora. Realmente, estamos diante de um fenômeno
eleitoral diferente de tudo que eu já tinha visto.

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