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2.

1 Da punibilidade e sua extinção

O direito de punir manifesta-se com o Estado, pois anteriormente todos tinham o


direito de se defender e atacar, haja vista a inexistência de uma estrutura que
monopolizasse o poder e tivesse capacidade de julgar. Deste modo, nasce para o Estado
o poder-dever de punir, quando uma norma penal é infringida a partir da prática de
conduta por ela proibida.

Nesse sentido, pontua o doutrinador Rogério Greco (2017, p. 915) que o Estado,
como ente dotado de soberania, detém, exclusivamente, o direito de punir (jus
puniendi). Tratando-se de manifestação de poder soberano, tal direito é exclusivo e
indelegável. Mesmo na ação penal de iniciativa privada, o particular possui apenas a
prerrogativa de dar início ao processo, por meio da queixa.

No que tange à afirmação de que o direito de punir surge com a prática


delituosa, Cleber Masson esclarece o seguinte:

Praticado um crime ou uma infração penal, nasce automaticamente a


punibilidade, compreendida como a possibilidade jurídica de o estado impor
uma sanção penal ao responsável (autor, coautor, partícipe) pela infração penal.
(MASSON, 2017, p. 1.005).

Seguindo essa mesma linha de raciocínio, o professor Rogério Greco (2017, p.


865), em seu curso de direito penal, declara que a punibilidade é uma consequência
natural da prática de uma conduta típica, ilícita e culpável levada a efeito pelo agente.
Toda vez que o agente pratica uma infração penal, isto é, toda vez que infringe o nosso
direito penal objetivo, abre-se a possibilidade para o Estado de fazer valer o seu ius
puniendi.

De modo geral, o Estado como detentor exclusivo do jus puniendi, se reservou


também o direito de abrir mão desse poder-dever diante de determinadas situações
expressamente previstas em lei, as chamadas causas de extinção de punibilidade. Assim,
ocorre a renúncia, ou até mesmo a perda do exercício desse jus puniendi, sendo
hipóteses previstas em lei, no art. 107 do Código Penal. Assim, em palavras um pouco
mais minuciosas, trata-se do desaparecimento da possibilidade jurídica de punir alguém.

Nas palavras de Rogério Greco (2017) são aquelas que extinguem o direito de
punir do Estado (GRECO, 2017, p. 880). Ou ainda na ilustração de Guilherme de Souza
Nucci (2017) é o desaparecimento da pretensão punitiva ou executória do Estado, em
razão de específicos obstáculos previstos em lei, por razões de política criminal.
(NUCCI, 2017, p. 1.273).

Cumpre destacar que esse rol legal não é taxativo, podendo-se encontrar outras
causas em diversos pontos da legislação penal, ou seja, o artigo 107 do Código Penal
apenas elenca algumas das chamadas causas extintivas da punibilidade. Dentre elas,
encontra-se a prescrição.

A doutrina apresenta diversos conceitos de prescrição, sendo prevista no art.


107, IV, primeira figura do Código Penal, além de ter sido regulada pelos arts. 109 a
119 do mesmo diploma legal.

Na conceituação de Nucci (2017), cuida-se da perda do direito de punir do


Estado pelo não exercício em determinado lapso de tempo. Não há mais interesse estatal
na repressão do crime, tendo em vista o decurso do tempo e porque o infrator não
reincide, readaptando-se à vida social. (NUCCI, 2017, p. 1. 296).

Fernando Capez (2017), a define como perda do direito-poder-dever de punir


pelo Estado em face do não exercício da pretensão punitiva (interesse em aplicar a pena)
ou da pretensão executória (interesse de executá-la) durante certo tempo. (CAPEZ)

Para Rogério Greco, por sua vez, a punibilidade é a possibilidade de efetivação


concreta da pretensão punitiva. Para satisfazê-la, o Estado deve agir dentro de prazos
determinados, sob pena de perdê-la. Há um prazo para satisfazer a pretensão punitiva e
outro para executar a punição imposta. Prescrição é, justamente, a perda da pretensão
concreta de punir o criminoso ou de executar a punição, devido à inércia do Estado
durante determinado período de tempo. (GRECO, 2017, p. 915)

Ou, de forma mais pontual, Greco (2017) afirma que prescrição é o instituto
jurídico mediante o qual o Estado, por não ter tido capacidade de fazer valer o seu
direito de punir em determinado espaço de tempo previsto pela lei, faz com que ocorra a
extinção da punibilidade. (GRECO, 2017, p.887).

Ainda, ressalva-se a seguinte colocação de Cezar Roberto Bitencourt acerca da


prescrição:
Com a ocorrência do fato delituoso nasce para o Estado o ius puniende. Esse
direito, que se denomina pretensão punitiva, não pode eternizar-se como uma
espada de Dámocles pairando sobre a cabeça do indivíduo. Por isso, o Estado
estabelece critérios limitadores para o exercício do direito de punir, e, levando
em consideração a gravidade da conduta delituosa e da sanção correspondente,
fixa lapso temporal dentro do qual o Estado estará legitimado a aplicar a
sanção penal adequada. - BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito
Penal: Parte Geral.

Em tese, no campo do direito, a prescrição é uma das situações em que o Estado,


em virtude do decurso de certo espaço de tempo, perde seu direito de punir. Estes
prazos variam, dependendo do crime praticado; há crimes que prescrevem em 20 anos,
há crimes que prescrevem em 16 anos, há crimes que prescrevem em 12 anos, há crimes
que prescrevem em 8 anos, há crimes que prescrevem em 4 anos e há crimes que
prescrevem em 3 anos.

Segundo Nucci (2017), o código penal apresenta dois grandes grupos de


prescrição: (1) da pretensão punitiva e (2) da pretensão executória. (NUCCI, 2017, p.
1.070).

A linha divisória entre os dois grandes grupos é o trânsito em julgado da


condenação: na prescrição da pretensaõ punitiva, não há transito em julgado para ambas
as partes (acusação e defesa), ao contrário do que se dá na prescrição da pretensão
executória, na qual a sentença penal condenatória já transitou em julgado para o
Ministério Público ou para o querelante, e também para a defesa.

A prescrição da pretensão executória ocorre quando o Estado após formar seu


título executivo judicial, isto é, a sentença penal condenatória transitada em julgado, não
pode executá-la em virtude de determinado lapso temporal estabelecido em lei.

Com a condenação, e o trânsito em julgado para a acusação, passa a se calcular a


prescrição com base na pena aplicada pelo magistrado, ou seja, a pena em concreto nos
termos do artigo 110, §1° do Código Penal. A razão para o dispositivo legal estabelecer
como requisito o trânsito em julgado somente para a acusação e não para a defesa é
simples e decorre de uma analise sistemática dos princípios do duplo grau de jurisdição
e da non reformatio in pejus.
O caput do art. 110 do Código Penal determina que: Art. 110. A prescrição
depois de transitada em julgado a sentença penal condenatória regula-se pela pena
aplicada e verifica-se nos prazos fixados no artigo anterior, os quais se aumentam de um
terço, se o condenado é reincidente.

Quando a extinção da punibilidade for decretada após o trânsito em julgado,


extinguese a pretensão executória do Estado – imposição da pena –, remanescendo, no
entanto, os efeitos secundários da sentença condenatória, tais como lançamento do
nome no rol dos culpados, reincidência, entre outros.

Segundo Nucci, (2017), a condenação somente perde o efeito para o fim de


imposição da sanção principal – a pena aplicada. Remanescem os efeitos secundários da
condenação, como o registro 18.3.1. 18.4. a) do antecedente, a viabilidade de gerar
reincidência, o dever indenizatório na área cível etc. (NUCCI , 2017, p. 1.298)

Já a prescrição da pretensão punitiva é a perda do poder-dever de punir, em face da


inércia do Estado durante determinado lapso de tempo, antes do transito em julgado.
Estabelece o artigo 109 do Código Penal que a prescrição antes de transitar em julgado
para a acusação, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao
crime, ou seja, pela pena em abstrato. Traz ainda os prazos prescricionais em seus
incisos.

O art. 109 do Código Penal determina:

Art. 109. A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o


disposto no § 1º do art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena
privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se:
I – em 20 (vinte) anos, se o máximo da pena é superior a 12 (doze) anos;
II – em 16 (dezesseis) anos, se o máximo da pena é superior a 8 (oito) e não
excede a 12 (doze);
III – em 12 (doze) anos, se o máximo da pena é superior a 4 (quatro) anos e
não excede a 8 (oito);
IV – em 8 (oito) anos, se o máximo da pena é superior a 2 (dois) anos e não
excede a 4 (quatro);
V – em 4 (quatro) anos, se o máximo da pena é igual a 1 (um) ano, ou sendo
superior não excede a 2 (dois);
VI – em 3 (três) anos, se o máximo da pena é inferior a 1 (um) ano.
Havendo extinção da punibilidade antes do trânsito em julgado da sentença, atinge-
se o jus puniendi do Estado, não persistindo qualquer efeito do processo ou da sentença
condenatória, significando que o prazo prescricional consumou-se antes da sentença
condenatória, com trânsito em julgado para as partes. Elimina-se todo rastro do direito
de punir estatal. Assim, a sentença que reconhece a prescrição terá os mesmo efeitos
que uma sentença absolutória.Não se computa para antecedentes, geração de
reincidência, dever de indenizar etc.
De seu turno, a prescrição da pretensão punitiva e subdividida em outras três
modalidades: (1) prescrição da pretensão punitiva propriamente dita ou prescrição da
ação penal, (2) prescrição intercorrente e (3) prescrição retroativa.

Faz-se uma observação, da necessidade de ressaltar que o art. 61 do Código de


Processo Penal determina que:

Art. 61. Em qualquer fase do processo, o juiz, se reconhecer extinta a


punibilidade, deverá declará-lo de ofício

Assim, levando-se em consideração o colocado acima, o autor Guilherme de


Souza Nucci (2017) sintetiza muito bem em suas lições, ao explicar que em qualquer
momento procedimental, ocorrendo a prescrição da pena em abstrato ou em concreto,
dentro das regras estabelecidas pelo Código Penal, o magistrado deve julgar extinta a
punibilidade do acusado ou condenado. (NUCCI, 2017, p. 1.299).

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