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ILMO. SR.

PRESIDENTE DA COMISSÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO


DISCIPLINAR, PREFEITURA MUNICIPAL DE CASCAVEL/PR.PROCESSO
N°: 67.677/2019

Paulo Sérgio de Oliveira Pinto, servidor público municipal,


devidamente registrado sob a matrícula n° 19.256, ocupante do cargo de
Guarda Patrimonial, através de seu defensor dativo que subscreve, vem à
presença de vossa senhoria, apresentar DEFESA FINAL, com fulcro no artigo
231 da Lei Municipal n° 2.215/1991.

1 - DOS FATOS

Mediante a Portaria n° 1.433/2019 – GAB, o servidor foi indiciado tendo


em vista:

 Conforme documentos acostados o servidor em sua vida particular


teria feito algo que desabonasse sua imagem como servidor público, conforme
o item A e o item B desta Portaria.

2 - DO DIREITO

Uma questão que perpassa pela vida dos agentes públicos, sejam
funcionários, servidores ou ainda agentes políticos é se os atos por ele
praticados na vida privada podem ensejar a aplicação de sanções
administrativas. Para responder isso, deve-se examinar a finalidade de um
processo disciplinar.

A professora ODETE MEDAUAR ensina que: "O regime disciplinar visa a


assegurar a responsabilização dos agentes públicos por faltas funcionais, isto
é, infrações que resultam de inobservância de deveres vinculados às
atribuições do cargo, função ou emprego. (...). O vínculo ao exercício do cargo,
função ou emprego norteia, por conseguinte, a caracterização das infrações
passíveis de sanções disciplinares".1

E, de acordo com o STF, "na aferição da responsabilidade administrativa


é de se levar em consideração os fatos vinculados à atividade funcional do
servidor público".2 Isso porque a finalidade do processo disciplinar não é

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castigar o infrator, ou realizar a justiça, mas sim examinar a existência de um
ilícito administrativo3 diante de uma infração funcional.

Logo, pode-se concluir que a instauração de processo administrativo


disciplinar ocorre em duas hipóteses: i) quando há vinculação entre o fato e a
função pública; ii) quando o fato foi praticado no exercício da função.

Por sua vez, quando o fato não foi praticado no exercício da função e
não há vinculação com a função, a responsabilização disciplinar se torna
exceção. É o que diz o Manual de Processo Administrativo da Controladoria-
Geral da União "a repercussão disciplinar dos atos cometidos pelo servidor em
sua vida privada é uma exceção".4

Assim, por ser uma exceção, a investigação de um fato da vida privada


de um agente público tem certas exigências. Nesses casos, deve haver "um
comportamento privado, desconectado do exercício das funções públicas,
representativo de grave impossibilidade de o agente exercer essas mesmas
funções".5 Logo, para o processamento de um processo disciplinar nessas
situações é imprescindível que tal fato afete de modo significativo a vida
pública. É o entendimento dos Tribunais.6

E no caso de magistrados e promotores, que possuem prerrogativas e


sujeições especiais, essa situação se modifica? Sobre o tema, FÁBIO MEDINA
OSÓRIO ensina:

"É certo que mesmo membros do Ministério Público e da


Magistratura, para ficarmos com as categorias mais exigidas
historicamente, podem cometer ilicitudes, no campo de suas vidas
particulares, que não mereçam sanções administrativas, mas sim, no
máximo, sancionamentos de outros ramos jurídicos e de outras
espécie (...) "Uma determinada função pública pode exigir requisitos
de ilibada conduta privada, desde que as exigências guardem
vinculação racional, razoável e proporcional com a dignidade das
funções."7

Ou seja, nessas carreiras, que exigem conduta pública e privada


irrepreensível, deve-se observar se exigência guarda vinculação racional,
razoável e proporcional com a dignidade das funções. Caso contrário, estar-se-
á desvirtuando da finalidade de um processo disciplinar.

Os agentes públicos submetem-se a um regime jurídico mais severo do


que trabalhadores de empresas particulares, mas não parece viável pautar

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completamente sua conduta privada em função de sua atividade pública. Por
essa razão, na esteira do pensamento de Fábio Medina Osório (Teoria da
improbidade administrativa, 2007, p. 87), a ilicitude produzida pelo agente
público em atos da vida privada deve ser daquelas qualificadas pelo direito
público e relacionadas, ainda que indiretamente, às suas funções. Caso
contrário não há porque estender a investigação e eventual punição criminal à
esfera administrativa, sob pena de se produzir um constrangimento ilícito ao
servidor por falta de justa causa para instauração de procedimento disciplinar.

Por isso, pode-se concluir que a instauração de processo


administrativo contra agentes públicos acerca de atos de sua vida privada que
careçam de vinculação razoável com a função pública é causa de nulidade.

Averigua-se que conforme o item A, o servidor indiciado foi relatado


como teria cometido um furto, seu próprio veiculo do Pátio da CETTRANS, as
imagens demonstram tal ato, mas de acordo com o código Penal o proprietário
da coisa também não pode ser autor do crime de furto, ainda que ela esteja
sob a posse legítima de terceiro, situação que caracterizar o crime do Art. 346.
Tirar, suprimir, destruir ou danificar coisa própria, que se acha em poder de
terceiro por determinação judicial ou convenção - Exercício arbitrário das
próprias razões.

A conduta típica se apresenta pela expressão “fazer justiça pelas


próprias mãos", que equivale a exercer arbitrariamente sua pretensão, sem
buscar a via judicial adequada. Ou seja, o agente, ao invés de buscar a tutela
jurisdicional, emprega a autotutela, fazendo por conta própria aquilo que
entende por justiça.

Trata-se de crime formal, sendo a ação penal, em regra, privada,


podendo ser pública apenas se houver emprego de violência contra a pessoa.
A pena é de detenção, de quinze dias a um mês, ou multa, além da
pena correspondente à violência. É um crime acessório, pois o texto legal
expressamente prevê a possibilidade de constituir-se fato mais grave. Se a lei
permitir a satisfação da pretensão pelas próprias mãos do agente, não existirá
o crime como, por exemplo, na hipótese do art. 1.210 do Código Civil:

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Art. 1.210. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de
turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência iminente, se tiver
justo receio de ser molestado.

§ 1o O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou restituir-se por


sua própria força, contanto que o faça logo; os atos de defesa, ou de
desforço, não podem ir além do indispensável à manutenção, ou restituição
da posse.

Compreendendo o furto: o crime do at. 155 do CP consiste em subtrair


coisa alheia móvel. A subtração é o ato de tomar para si aquilo que não está
sob a sua legítima posse ou de que não seja de sua propriedade.

Conforme documentos acostados na defesa Prévia o mesmo se


arrependeu de seu ato impensado, devolvendo o veículo em frente ao local de
acordo com o relato dos servidores envolvidos. Também mandou arrumar o
portão de entrada, de acordo com os servidores e o recibo de prestação de
serviço da Empresa Especializada. Conforme o CP o Arrependimento posterior:
é causa obrigatória de diminuição de pena aplicado, de acordo com o art. 16,
do CP, nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa,
quando o agente, por ato voluntário, repara o dano ou restitui a coisa até o
recebimento da denúncia ou da queixa, havendo a redução de uma dois
terços. Ou seja, como dito, é causa obrigatória e redução de pena, constituindo
providencia de politica criminal e tendo como principal finalidade o incentivo à
reparação do dano, sendo direito subjetivo do agente. A reparação do dano
também pode ser circunstancia atenuante.

STF - HC/98658 - HABEAS CORPUS - HC –Paraná – Relator: Min. Cármen


Lúcia – Pacte(s) – José Antonio Rodrigues - Impte. (s) René Dotti -
COATOR (A/S) (ES) – Superior Tribunal de Justica - Direito Penal – Parte
Geral Aplicação da Pena

Decisão: Por empate na votação, a Turma deferiu o pedido de habeas


corpus, nos termos do voto do Ministro Marco Aurélio, Redator para o

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acórdão; votaram pelo indeferimento a Ministra Cármen Lúcia, Relatora, e
o Ministro Dias Toffoli. Falou o Dr. René Dotti, pelo paciente. Presidência
do Ministro Ricardo Lewandowski. 1ª Turma, 09.11.2010. PENA – CAUSA
DE DIMINUIÇÃO – ARREPENDIMENTO POSTERIOR – ARTIGO 16 DO
CÓDIGO PENAL – ALCANCE. A norma do artigo 16 do Código Penal
direciona à gradação da diminuição da pena de um a dois terços presente
a extensão do ato reparador do agente.

Averígua-se que conforme o item B, que o reclamante não compareceu


em duas ocasiões a audiência de instrução, pela qual deve ser decretada sua
extinção, pois o mesmo não provou de forma hábil, alguma acusação concreta
se quer ao indiciado. As testemunhas arroladas pela Comissão também
corroboraram em favor de indiciado, sendo considerado um simples desacordo
comercial entre ambos.

DOS PEDIDOS

1- Pela ratificação de todos os argumentos presente em defesa prévia


considerando que a instrução não trouxe elementos que desabonem as
questões de direito já manifestadas pela defesa naquela oportunidade;

2 - Pugna-se pela absolvição do Indiciado quanto ao item “B” da Portaria


Exordial, por restar evidente a falta de provas da existência do fato. Sendo que
em momento nenhum as testemunhas de acusação descreveram algo que
desabonasse a sua imagem. Eventualmente, caso não seja este entendimento,
resta ao menos dúvida quanto à ocorrência, pugnando-se pela absolvição
pautando-se no in dúbio pro reo.

3 - Pugna-se pela absolvição do indiciado quanto ao item “A” da Portaria


Inaugural, estando claramente ausente elemento subjetivo essencial para
configurar a conduta descrita no art. 17, § X da Lei Municipal n° 6.532/2015 e a
Lei n° 2.215/1991, que no caso teria que ser algo recorrente.

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4. Pede-se pelas atenuantes, quanto ao item A conforme art. 216 da lei
n º 2215/1991:
 Sua confissão;
 Arrependimento posterior;
 Serviços prestados;
 Boas Avaliações (Anexo);
 Ficha Funcional (Anexo);

Acreditando-se que esta Comissão, com a função de opinar e trazer


clareza aos fatos reservar-se-á em manter-se nos princípios do bom direito,
pautando-se na imparcialidade, legalidade, razoabilidade e proporcionalidade
opinará pelo pleito pretendido.

Cascavel, 16 de Outubro de 2019.

________________________________________________________
Osvaldo Cezar Gonçalves de Andrade
Defensor Dativo

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REFERÊNCIAS

1. MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 19ª ed. São Paulo:


Revista dos Tribunais, 2015, p. 36.

2. STF, RE 458555, Rel. Min. Cezar Peluso, julgado em 09/07/2009, publicado


em DJe-151 DIVULG 12/08/20 09 PUBLIC 13/08/2009.

3. STOCO, Rui. Processo Administrativo Disciplinar. Processo Disciplinar na


Administração Pública, no Conselho Nacional de Justiça e nos Tribunais. São
Paulo, Revistas dos Tribunais, 2015, p.57.

4. CONTROLADORIA-GERAL DA UNIÃO. Manual de Processo Administrativo


Disciplinar. Disponível em: <clique aqui> . Acesso em: 17/09/19.

5. OSÓRIO, Fábio Medina. Direito Administrativo Sancionador. 3ª Ed. São


Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 255. Destaques nossos.

6. TJ-SC - MS: 445366 SC 2009.044536-6, Relator: Newton Trisotto, Data de


Julgamento: 08/10/2010, Primeira Câmara de Direito Público, Data de
Publicação: Apelação Cível em Mandado de Segurança n., de Capinzal).

7. OSÓRIO, Fábio Medina. Direito Administrativo Sancionador. 3ª Ed. São


Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 251/253. Destaques nossos.

8. SITE STF:
http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarTesauro.asp?txtPesquisaLivre=E
XERC%C3%8DCIO%20ARBITR%C3%81RIO%20DAS%20PR%C3%93PRIAS
%20RAZ%C3%95ES Acesso em: 10/10/2019.

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