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Cristina Valente

COACHING PARA PAIS


ESTRATÉGIAS E FERRAMENTAS PRÁTICAS
PARA EDUCAR OS NOSSOS FILHOS
índice

Introdução........................................... 13

Educar crianças felizes e responsáveis ........................ 13


1 Educar: porque é que a intuição e o instinto não chegam?!...... 17
1.1 Educar é liderar .................................. 19
1.2. A melhor disciplina é a prevenção ..................... 25
1.3 A ansiedade: «Pais: relaxem!» ........................ 30
1.4 A culpa dos pais: «Onde foi que eu errei?!» .............. 32
1.5 Como posso tornar-me um pai positivo? ................ 37
1.6 Quer criar uma criança com valores? Deixe de
sobrevalorizá-la! ............................... 39
1.7 Em conclusão… Desfrute (com) a sua criança! ............ 40

2 Pais e filhos crescem juntos!............................ 43


2.1 Que planos tem para o seu filho? ..................... 45
2.2 Afinal, o que é uma «criança feliz»? ................... 61
2.3 O que queremos e podemos mudar? O comportamento
ou o temperamento? ............................. 64
2.4 O mimo certo ajuda a desenvolver o respeito mútuo ........ 67
2.5 O amor incondicional aceita imperfeições ............... 70
2.6 Ensinar a transformar sentimentos negativos em positivos .... 71
2.7 Em conclusão… Na educação, as medalhas demoram
a chegar… ................................... 75
3 Não existem erros. Apenas lições ........................ 77
3.1 «Boa! Errei!» .................................... 78
3.2 As crianças mentirão menos se nós… .................. 81
3.3 É preciso «coragem para sermos imperfeitos»............. 87
3.4 Sucesso cognitivo… e onde fica a felicidade? ............. 91
3.5 Crianças que erram = Crianças que criam ............... 95
3.6 Os 3 passos da reconstrução de um erro ................ 98
3.7 Em conclusão… Aprenderem lado a lado ................ 101

4 Ferramentas parentais positivas .......................... 103


4.1 Encorajar e elogiar: as diferenças ...................... 106
4.2 Peça-lhe ajuda!................................... 108
4.3 O poder das perguntas ............................. 110
4.4 O poder de escutar as respostas....................... 112
4.5 O «amuadouro» ................................. 116
4.6 Consequências naturais............................. 123
4.7 Poder com limites................................. 125
4.8 «Se é um problema, existe uma solução!» ............... 127
4.9 Em conclusão… O melhor da vida é grátis!.............. 128

5 O poder da criança .................................. 131


5.1 «Eu tenho o poder!» .............................. 133
5.2 Ensinar a criança a usar o seu poder de forma positiva ...... 136
5.3 O que é, afinal, uma luta de poder? .................... 140
5.4 As lutas que as crianças ganham sempre ................ 145
5.5 O poder da palavra «Não» .......................... 149
5.6 Em conclusão… Poderosas ideias ..................... 154

6 Birras e mau comportamento ........................... 155


6.1 Birras: o primeiro passo para a independência ............ 156
6.2 Estratégias positivas para gerir birras ................... 162
6.3 «Papá: já terminaste a tua birra?» ..................... 164
6.4 A diferença entre birra, mau comportamento e perturbações
do desenvolvimento............................. 167
6.5 Estratégias positiv as para transformar o ma u comportamento 170
6.6 Em conclusão… Depois da tempestade… ................ 178
7 Estratégias para criar autonomia à mesa e no sono ............ 179
7.2 Criar responsabilidade à mesa: «Quero escolher o que como» 181
7.3 «Não me obriguem a comer!» ........................ 184
7.4 Trabalho de equipa na cozinha....................... 189
7.5 Responsáveis e positivos… até a dormir!................ 191
7.6 Cada um na sua… (cama) ........................... 201
7.7 Dormir sobre o assunto, mas antes… relaxar! ............ 208
7.8 Em conclusão… Cama, mesa… e criança bem -comportada!… 212

8 Famílias positivas .................................... 215


8.1 Todos diferentes, mas todos responsáveis e positivos ........ 216
8.2 O amor dos pais nunca acaba… dá para todos!........... 220
8.3 Famílias competitivas ou famílias cooperativas?........... 221
8.4 As lutas servem para des envolvermos competências positi vas 224
8.5 Reuniões de família para irmãos positivos! ............... 225
8.6 Em conclusão… Final feliz.......................... 231

9 Pré-adolescentes e adolescentes .......................... 233


9.1 Como saber que a adolescência chegou cá a casa:
os principais sinais .............................. 234
9.2 Adolescentes positivos? Isso existe?! ................... 238
9.3 Ajude a criar um adolescente poderoso ................. 242
9.5 Sexo, drogas e rock’n’roll ........................... 245
9.5 «Alô, alô, Terra chamando…»: como comunicar com
um adolescente ................................ 252
9.7 Em conclusão… nunca é tarde! ....................... 256

10 Estratégias positivas para crianças responsáveis.............. 259


10.1 As boas notas são a medida do nosso amor? ............ 260
10.2 A criança pode escolher a sua própria roupa? ............ 262
10.3 O valor que as crianças dão ao dinheiro................ 265
10.4 Preparar o melhor ano letivo de sempre!............... 267
10.5 A criança e o livro............................... 269
10.6 A semana ideal para pais positivos.................... 272
10.7 Temos mesmo de ajudá-los nos TPC?.................. 274
10.8 Educar para a solidariedade ........................ 277
10.9 Em conclusão… Os 12 passos dos pais positivos.......... 279
11 Pais e mães single ................................... 283
11.1 Nunca imaginei… tornar-me um pai single!............. 284
11.2 Ter fé nos filhos de famílias single .................... 290
11.3 Criar harmonia na vida da família single............... 294
11.4 O relacionamento com o/a «ex»: o seu filho merece! ....... 301
11.5 Ser single também é tomar conta de si! ................ 305
11.6 Em conclusão… Singles: os mais fortes do planeta! ........ 308
INTRODUÇÃO

EDUCAR CRIANÇAS FELIZES E RESPONSÁVEIS

screver este livro foi um ato de amor. Amor por mim própria,
E como mulher e mãe (porque aprendi muito ao escrevê-lo), amor
pelos meus filhos e por todos os outros pais e crianças. É a minha
contribuição como cidadã que espera, sempre, um mundo melhor. E o
mundo só se torna melhor quando em cada casa onde houver crianças
e pais… todos sintam paz e alegria.
É fundamental que as crianças sejam tratadas com respeito e educa-
das para serem independentes, boas, generosas, criativas e ousadas. E a
olharem para os erros como oportunidades valiosas de aprendizagem,
lutando contra a culpa, o medo e a insegurança. Só assim poderão
tornar-se cidadãos verdadeiramente livres, felizes e responsáveis. Cida-
dãos que saibam como mudar o mundo, vivendo com um propósito
e deixando um legado.
Mas igualmente importante é que nós, pais, tenhamos mais pra-
zer no desempenho do nosso papel de educadores. Temos de ser
– e somos! – os primeiros líderes e heróis dos nossos filhos. Os líderes
apoiam, compreendem, mas sobretudo… desafiam. Os heróis inspiram
e dão o exemplo. É bem verdade que nenhum de nós nasceu com a
«competência» para ser pai ou mãe. E a intuição não basta. Educar é
decidir entre vários caminhos e isso implica reflexão, escolha. Refletir
sobre o que queremos realmente para os nossos filhos mas também
sobre os tantos obstáculos emocionais que nós próprios temos de ultra-
passar, o que nos obriga a um crescimento pessoal que nem sempre
encaramos com coragem e esperança.

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É certo que ser pai ou mãe nunca foi fácil. E os desafios específicos
que os pais atualmente encaram nem sequer existiam no passado, em
que as orientações sobre como se educa um filho eram bem mais claras.
Hoje, na maior parte dos casos, os pais alternam constantemente
entre a abordagem autoritária e a permissiva. Sabem que se exercerem
demasiado poder e se usarem castigos, isso não resulta. E que o oposto
também não (deixar cair o poder e educar sem regras). Sabem isso
muito bem. O seu problema é não conhecerem alternativas eficazes
para poderem ultrapassar as dificuldades sentidas pelos filhos (desig-
nadamente aquelas associadas à alimentação e ao sono, ao insucesso
escolar, à adolescência, à separação dos pais, etc.).
Precisamos portanto de muito apoio, de todo o tipo de apoio. Até
porque sentimo-nos, muitas vezes, demasiado preocupados, sozinhos
e stressados. E como sabem, o stresse é o espaço entre o que a vida é
e o que pensamos que deveria ser.
E é tão reconfortante sabermos que, afinal, estamos todos no mesmo
barco: temos todos os mesmos problemas, as mesmas dúvidas, come-
temos quase sempre os mesmos erros. E que sim, existem alternativas
eficazes! Por isso devemos partilhá-las.
E é esse o objetivo deste livro: partilhar ideias e soluções práticas.
Tenho aprendido ao longo da vida que se algo resulta comigo, então
vale a pena partilhá-lo com os outros. Conheço famílias que parecem
estar quase a desmoronar-se e que apenas precisam de um conselho,
de uma atitude compreensiva da nossa parte, de um pequeno nada que
faça a diferença! Esperamos poder ajudar com este livro.
A psicologia moderna, as neurociências e tantas outras áreas
trazem-nos boas notícias e importantes conhecimentos que nos ajudam
a todos a compreendermos melhor esse maravilhoso mundo dos mais
pequeninos: o que pensam, o que sentem e porque fazem o que fazem.
Todo esse capital de conhecimento acumulado dá-nos, portanto,
alternativas à educação que nos foi transmitida pelos nossos pais e
avós. Hoje em dia, todos nós podemos aprender uma educação paren-
tal mais democrática, adaptada ao mundo atual que é também mais
democrático e onde os modelos de submissão já não funcionam. E as
crianças sabem disso! Por isso tornam-se tão exigentes!
Bem sei que a palavra «democrática» assusta um pouco alguns
pais. Não existe razão para tal. Numa família democrática, embora
a opinião de todos seja tomada em conta, quando chega a altura de

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ser tomada uma decisão, a última palavra cabe sempre aos adultos.
A educação democrática é bastante mais eficaz porque orienta, reforça
regras, exercita autoridade (e não autoritarismo) quando necessário,
mas também partilha responsabilidades, sempre numa relação baseada
nos princípios da colaboração, da firmeza, da dignidade e do respeito
entre pais e filhos.
Todos os casos relatados nesta obra são baseados em situações reais
mas os nomes dos adultos e das crianças foram omitidos ou substituí-
dos, para total proteção da privacidade de todos os envolvidos.
Para finalizar, gostaria de agradecer a cada um dos leitores que
escolheu ler este livro. Porque cometeu (tal como eu ao escrevê-lo)
um ato de amor pelos seus filhos. É que não foi a intuição que vos
trouxe até aqui. Cada um de vós escolheu e decidiu lê-lo. E amor é
isso mesmo. Amor é ação.
O meu mais profundo desejo, pois, é que encontrem aqui alguma
informação útil, um conselho que resulte convosco ou uma ideia esti-
mulante que vos faça refletir e, sobretudo, agir. Acreditem: existe
sempre uma solução!
… E o mundo precisa de pais heróis que saibam mostrar aos seus
filhos que ser feliz é o estado natural do ser humano.

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1

EDUCAR: PORQUE É QUE A INTUIÇÃO


E O INSTINTO NÃO CHEGAM?!

educação das crianças, principalmente nos dias de hoje, é uma


A tarefa verdadeiramente dura. Já pensaram bem nos desafios que,
como pais, todos temos de enfrentar? Como poderemos alguma vez
ter sucesso se contarmos apenas e só com a nossa intuição e com o
nosso instinto? Não podemos! Do que precisamos mesmo é de ter
ideias muito claras sobre as várias fases do desenvolvimento infantil,
sobre o que deveremos esperar da criança em cada idade, sobre como
se constroem (boas) relações humanas e, não menos importante, sobre
nós próprios. Precisamos de ter ao nosso dispor soluções muito prá-
ticas: ferramentas, estratégias, planos de ação. Precisamos de destruir
muitos mitos sobre as crianças e sobre a forma ideal de educá -las.
O que aprendemos dos nossos pais e avós (que nos educaram, sem
dúvida, com todo o seu amor) terá de ser repensado. Hoje sabemos
mais. Precisamos de quebrar o ciclo da vergonha, do castigo, da culpa
e da crítica que caracterizava os métodos mais autoritários! Os pais
atuais precisam de encontrar alternativas a estes métodos e é isso que
vão encontrar nas páginas deste livro.
Qualquer mãe sabe, intuitivamente, como são vitais os afetos no
desenvolvimento saudável do seu filho. Mas, afinal, o que é a intuição?
A intuição é o conhecimento direto da verdade. Não envolve nenhum
raciocínio consciente nem um conhecimento analítico.
E o instinto? O instinto é um movimento inato de sobrevivência e
conservação da espécie. Pensemos, por exemplo, na amamentação: o
que acontece quando amamentamos o nosso bebé está diretamente

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ligado, em parte, ao nosso instinto, à nossa intuição (e também,claro,
a um certo conhecimento inconsciente coletivo) que nos orienta no
momento de alimentarmos o bebé. Também é verdade que a sociedade
atual, por muitas razões, retirou-nos a todos a capacidade de seguirmos
e confiarmos na nossa intuição, no nosso instinto e nesse conhecimento
tão importante que passoude gerações em gerações. Vejamos, por exem-
plo, o que aconteceu comigo, com os meus filhos e com a amamentação.

Enquanto esperava o meu primeiro bebé, li e reli tudo o que havia


para ler sobre «como ser uma boa mãe». Pensava eu. Considero-
-me uma mulher moderna, instruída, curiosa. No entanto, foi apenas
durante os últimos meses de gravidez que tive um contacto mais pro-
fundo com o tema «amamentação» – de uma forma prática, objetiva,
esclarecedora. No curso de preparação para o parto, quase faltei a
uma sessão sobre o tema, por não entender na altura a importância
do conteúdo. Foi nesse dia que despertei. De outra forma, teria pro-
vavelmente desistido de amamentar assim que tivesse surgido a pri-
meira adversidade (mamilos gretados, mastite, receio de não ter um
leite «bom», etc.). Quando o bebé finalmente nasceu, percebi que a
amamentação era uma experiência verdadeiramente poderosa. Ama-
mentei o meu primeiro filho até aos 19 meses e a minha filha até aos
20. Foi a experiência mais simples deste mundo e, no entanto, das mais

maravilhosas. Segui
aceder a ela, tive e confieio na
de aceitar intuição? Claro
conhecimento quefoisim.
que me Mas para
transmitido
para que pudesse retirar da experiência o que havia de melhor. Foi o
conhecimento que me despertou para a intuição.

Mas apesar da importância indiscutível da amamentação, educar


uma criança é muito mais do que alimentá-la. É até mais do que tratar
(instintivamente) da sua saúde. Já lhe aconteceu, por exemplo, sen-
tir o hálito «quente» do seu filho, colocar-lhe imediatamente (quase
sem pensar) a mão na testa e pressentir que a febre vai chegar, mais
cedo ou mais tarde? E descobrir, horas depois e sem surpresa, que o
termómetro acabou por dar-lhe toda a razão? O instinto é algo mara-
vilhoso! Mas como eu dizia, educar uma criança é muito mais do que
alimentá-la, cuidar da sua saúde e protegê-la.

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Educar um filho envolve uma série de reflexões, decisões, compara-
ções sobre o que faço, o que já fiz, o que deveria fazer e o que deveria
ter feito. Educar é ser consistente, responsável, tentar fazer escolhas
sensatas, pensar sobre as ações e as suas consequências, criar limites.
É também saber gerir frustrações (quando decido não dar à criança
tudo o que pede), motivá-la (quando quer desistir depois da primeira
aula de natação), dar o exemplo (através da nossa ação… muito mais
do que da nossa palavra!). É tudo isto… e muito mais! Então?! Como
poderemos alguma vez pensar que «já se nasce pai», «já se nasce mãe»,
e que «ninguém precisa de me vir dizer o que devo fazer!»?! Educar
é liderar, como veremos no ponto seguinte, mas o verdadeiro líder é
humilde, curioso e tem sede de aprender.

1.1 Educar é liderar


Será que um líder é-o instintivamente? Um líder nasceu líder? Pelas
mesmas razões apontadas atrás, penso que não! O que faz de alguém
– seja homem ou mulher – um verdadeiro líder? Antes de mais, um líder
tem a capacidade de fazer com que outros o sigam. E alguém só segue
alguém pelo seu exemplo (reparem nas semelhanças com «ser-se pai»
ou «ser-se mãe»!). Um líder tem uma visão muito clara do que quer
alcançar e do que precisa de fazer para lá chegar, inspirando os outros
e transmitindo-lhes essa visão – com disciplina e paixão! Paixão é algo
que pais e mães já possuem. E a disciplina? Afinal, o que éa disciplina?
«Disciplina» é uma palavra ambígua. Muitos de nós pensamos
que, em educação, «disciplina» e «castigo» são sinónimos (nesta obra,
designaremos por castigo todos os métodos que provocam à criança
humilhação, dor, culpa e vergonha e que tem como único objetivo a
obediência). Mas essa interpretação não é a mais correta. A palavra
«disciplina» deriva do latim « discipulus » («aquele que aprende»,
«aquele que segue», «seguidor da verdade»). Significa que disciplinar é
o mesmo que ensinar, instruir, orientar, educar, treinar. Gradualmente,
foram sendo adicionados outros significados, como «estabelecimento
da ordem» ou «castigo». Mas para o conceito de educação preconi-
zado neste livro, a disciplina está diretamente ligada à formação do
caráter de uma pessoa (neste caso em concreto, da criança, nosso filho
ou nosso aluno).

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Os pais devem ser os primeiros e os mais influentes «disciplina-
dores», ou seja, os melhores «mestres» ou «líderes» da criança. Sim,
queridos pais, muito antes dos nossos dedicados professores! A criança
precisa de explorar e de descobrir o mundo, pois foi para isso que
nasceu! Precisa de satisfazer a sua sede insaciável de curiosidade e de
independência (aquilo a que neste livro chamaremos «poder»). Essa
curiosidade e essa necessidade de independência parecem aos olhos dos
adultos, muitas das vezes, um mau comportamento, uma provocação.
A curiosidade é, por exemplo, uma das causas de «mau comporta-
mento» dos mais pequenos. Mas imaginem só o que pensará e sentirá
uma criança quando é castigada por algo que… veio programada para
fazer?! Claro, existem muitas outras causas para o mau comporta-
mento, mas falaremos disso mais à frente. Quanto mais soubermos
sobre estas causas e sobre as possíveis soluções, mais preparados esta-
remos para gerir a maior parte das situações que enfrentamos em casa
e na escola. Desta forma, todos ganham. Não é fantástico?
Disciplinar uma criança, por isso, não é castigá-la quando se porta
mal. O castigo é uma reação negativa a um comportamento da criança
e o seu único objetivo é levar a criança a obedecer. A boa notícia sobre
o castigo é que pode funcionar no momento. As más notícias é que o
castigo não tem valor a longo prazo nem ensina qualquer competên-
cia à criança (responsabilidade, interajuda, resolução de problemas,
etc.). Muitos estudos mostram que as crianças respondem melhor aos
métodos e estratégias de que falaremos nesta obra do que ao castigo.
Mas não precisamos de recorrer aos estudos, pois não? Qualquer um
de nós responde melhor ao encorajamento do que à punição – seja
no trabalho, no casamento, na amizade. Imagine que alguém queria
que se empenhasse numa determinada tarefa e que esperava de si o
melhor. Iria primeiro castigá-lo e humilhá-lo? Enchê-lo-ia de culpa e
vergonha? Como se sentiria? Uma criança, do ponto de vista emocio-
nal, não é diferente de um adulto. Ou seja, responde muito melhor
a uma orientação positiva do que a uma punição. Portanto, em vez
de castigá-la, oriente-a e explique-lhe pacientemente o que ela pode
e deve fazer em vez do mau comportamento. Neste livro encontrará
muitas alternativas.
Disciplinar é também estabelecer limites, mas nunca nos devemos
esquecer que esses limites devem ser adequados à idade da criança, ou
melhor, à fase de desenvolvimento em que ela se encontra. No entanto,

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à medida que ela cresce, esses limites devem ser alargados. Portanto,
vá ajustando-os periodicamente, para se assegurar de que ainda são
adequados e eficazes. Disciplinar é ensinar a criança a seguir regras, a
distinguir o certo do errado e a portar-se bem mesmo quando o papá
e a mamã (ou outro adulto qualquer) não estão por perto, para dizer-
-lhe o que deve ou não fazer. Disciplinar crianças pode ser feito com
amor (carinho e firmeza), pois isso fá-las sentirem-se seguras, amadas e
respeitadas; promove o seu crescimento emocional e a sua autoestima;
e fá-las sentirem-se felizes!
Esta será, sem dúvida, a única forma de estabelecermos uma relação
de confiança e de respeito com o nosso filho! Passarmos tempo de qua-
lidade com ele, lermos juntos, brincarmos juntos, sermos consistentes
com as regras e connosco próprios e darmos o exemplo (modelar o
bom comportamento) vai, sem dúvida, fortalecer a relação de uma
forma incrível! Lembre-se: está a educar um adulto!
A sua criança procura, a todo o momento, a sua atenção e a sua
aprovação. Passe tempo com ela só a divertir-se. Preocupe-se apenas
em estar. Ser pai não implica passar toda a sua vida apenas a disci-
plinar, a ensinar. Estar com ela provoca um impacto maior do que
castigá-la pelo mau comportamento. Fale com ela sobre emoções.
Dê-lhe palavras para explicar os seus sentimentos. Isso vai ajudá-la a
exprimi-los mais adequadamente.
E o que é que isto tudo tem que ver com… liderança? Liderar significa
orientar alguém ou mostrar-lhe o caminho para atingir determinado
objetivo. Liderar significa ter um propósito, uma causa muito grande.
Educar é, pois, liderar. Ser o modelo, dar o exemplo! Deveríamos
todos saber que não «estragaremos» os nossos filhos se estes ganharem
de vez em quando ou se desistirmos de lutar contra eles.
Falamos, portanto, de uma liderança democrática: visão clara,
respeito mútuo, regras bem estabelecidas, liberdade com responsabi-
lidade, espaço para todos exercerem os seus poderes e os seus talen-
tos! Hoje exigimos democracia. E todos os pais já perceberam que
os métodos autoritários deixaram de funcionar com estas crianças
do século xxi que, tal como nós, reclamam democracia. Já ninguém
acredita em ditaduras, já ninguém as aceita sequer. Muito menos os
mais novos!
No método autoritário , portanto, os pais ou outros adultos
impõem, sem apelo nem agravo, os seus valores e as suas regras.

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A criança aceita sem discussões. Este modelo colapsou, assim como
colapsou o modelo de submissão na nossa sociedade. Todos sabe-
mos que somos iguais e que temos o mesmo direito à dignidade e ao
respeito. Assim é também nas famílias: as crianças nasceram numa
sociedade democrática e não aceitam métodos usados no passado.
Em boa verdade, esses métodos, baseados na privação ou castigo e na
recompensa ou elogio, partem do pressuposto de que a criança não
aprende a não ser pela gestão (parental) da dor e do prazer. Pressupõe
uma criança sem inteligência que não consegue pensar sobre as con-
sequências das suas próprias escolhas (como, por exemplo, aprender
por si mesma que, se não quiser jantar, vai ter fome mais tarde). Pais
autoritários muitas vezes impõem, humilham, exigem submissão –
o que faz desenvolver na sua amada criança um terrível sentimento
de inferioridade. Estes pais, lamento dizer, estão simplesmente conde-
nados ao fracasso – e fracasso significa filhos que crescerão inseguros,
dependentes, irresponsáveis.
Muitos pais e professores, sobrecarregados e desorientados sobre
a forma de educar os seus filhos e alunos, decidem (muitas vezes
porque é mais cómodo e lhes dá uma falsa sensação de segurança)
cair no extremo oposto do autoritarismo, tornando -se altamente per-
missivos ou superprotetores . Numa sociedade que preza a liberdade
individual, este modelo pode dar-nos a ilusão de que estamos a fazer
o melhor pelas crianças. Não é verdade. Esta forma de educar carece
de valores e é pouco crítica, sem regras, sem consequências para ela.
Uma criança que nunca aprendeu a superar obstáculos, que nunca
teve de lutar por nada, cresce a achar que todos lhe devem tudo!
Dificilmente conhecerá a sensação de satisfação de uma conquista,
pois atribui tudo o que lhe acontece a outros ou a circunstâncias
externas a ela (aquilo a que chamamos, em psicologia, locus de
controlo externo).
Tanto o estilo autoritário como o permissivo têm objetivos de curto
prazo, ou seja, não levam em conta a importância da aquisição de
importantes competências vitais (visão de longo prazo), que todas as
crianças deverão desenvolver – o respeito, a preocupação e o interesse
pelos outros, a resolução de problemas, a autonomia, a responsabili-
dade, etc. Filhos de pais «mandões» ou de pais «porreiros» tornar-se-
-ão crianças desanimadas, com sentimentos de inferioridade e baixa
autoestima, com locus de controlo externo.

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O estilo democrático, por outro lado, pressupõe amor e disciplina,
carinho e firmeza, espaço para a criança exercer o seu poder, mas
também limites com regras. O método democrático, em oposição ao
método autoritário ou autocrático – que supõe a aplicação de prémios
e castigos –, usa, em alternativa, o encorajamento, a busca de soluções,
a escuta, a negociação positiva. A democracia promove a coopera-
ção, o diálogo, a responsabilidade partilhada de todos os elementos
da equipa (família, escola, nação). Embora nem todos tenham (nem
tenham de ter!) os mesmos conhecimentos, as mesmas responsabilida-
des e os mesmos direitos, existe algo que tem de ser igual para todos:
a dignidade e o respeito.

PRINCIPAIS DIFERENÇAS ENTRE OS TRÊS ESTILOS PARENTAIS MAIS COMUNS

Estilo Estilo Estilo


Autoritário Permissivo Democrático
Princípio Controlo excessivo Ausência de limites Firmeza com dignidade
e respeito
Regras Aceites pela criança Ausência de regras Regras razoáveis, de
sem discussão acordo com a fase
de desenvolvimento
da criança e em que
adulto e criança
ganham (win/win)
Liberdade da criança Nenhuma Total Alguma(dentro
de limites)
Opções da criança Nenhumas Todas Algumas
Frase preferida do «Fazes porque eu «Podes fazer tudo o «Podes escolher, dentro
adulto quero! Sou eu quem que tu quiseres!» de certos limites»
manda!»
Erros/Problemas A criança não aprende A criança tem ideias Aprender com os erros
de outra forma a não pouco claras sobre é saudável e ajuda
ser se sofrer com os o que é certo e errado a crescer
seus erros
Ferramentas principais Castigos e Recompensas Encorajamento
recompensas, críticas
e elogios

Decisões sobre regras


e sanções A envolvida
criança não
noé A ocriança pode decidir
que quiser/não Adulto e criança
decidir podem
em conjunto,
processo precisa de tomar sempre que possível
decisões e de acordo com
a capacidade da
criança

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