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Universidade Paulista - UNIP

Disciplina: Estratégias de Intervenção Psicológica


Estágio: Intervenção Psicológica na Queixa Escolar
Professor/Supervisor: Rita
Aluna: Dayane de Morais Aveiro RA: C55278-0
Semestre: 9° Turno:manhã

Referência: TANAMACHI, Elenita; MEIRA, Marisa. A atuação do Psicólogo como expressão do


pensamento crítico em Psicologia e Educação. In: Psicologia Escolar: Práticas Críticas. MEIRA,
Marisa; ANTUNES, Mitsuko. A.A. São Paulo. Casa do Psicólogo, 2003. p. 11 a 62.

O texto tem por objetivo apresentar possibilidades de intervenção elaboradas pelas autoras
que se exprimem em expressões do pensamento crítico já elaborado em Psicologia e Educação.

A Psicologia Escolar é a área de estudo da Psicologia e de atuação/ formação profissional do


psicólogo, que tem no contexto educacionalo foco de sua atenção, e na revisão crítica dos
conhecimentos acumulados pela Psicologia como ciência, pela Pedagogia e pela Filosofia da
Educação, a possibilidade de contribuir para a superação das indefinições teórico-práticas que ainda
se colocam nas relações entre a Psicologia e a Educação. p11

O que define um psicólogo escolar não é o seu local de trabalho, mas o seu compromisso
teórico e prático com as questões da escola. p.11

O melhor lugar para o psicólogo escolar é o lugar possível, desde que ele se coloque dentro
da educação e assuma um compromisso teórico e prático com as questões da escola, já que ela deve
se constituir no foco principal de sua reflexão. É do trabalho que se desenvolve em seu interior que
emergem as grandes questões para as quais deve buscar tanto os recursos explicativos, quanto os
recursos metodológicos que possam orientar sua ação. p.11

1 . PRI NCI PAI S QUESTÕES TEÓRI CO- PRÁTI CAS DA PSI COLOGI A NA
EDUCAÇÃO.

Análise crítica das abordagens tradicionais em Psicologia Escolar

Dados obtidos por pesquisas realizadas sobre o processo de escolarização no Brasil revelam
ausência de escola para todos, evasão ou permanência sem nada aprender (expulsão/exclusão),
índices altos de analfabetismo, mostrando que a impossibilidade de constituição da condição
humana pela via da educação formal é ainda uma realidade em nosso País. p.13

Segundo Maria Helena Patto (1990), a Psicologia tem contribuído para justificar essa
realidade educacional. p.13

A autora remete-se ao século XIX para assinalar o momento no qual a contradição vivida
pela burguesia atinge o apogeu, intensificando-se o abismo entre a acumulação de riquezas e as
pequenas conquistas do proletariado que, segregado pela burguesia, já não é mais seu aliado. Buscar
justificar tal abismo é também uma tarefa das ciências humanas que nascem e se oficializam nesse
período. p.14

A burguesia traduz as reivindicações das massas em termos assimiláveis pela ordem social
existente com o auxílio das ciências. Esse é o caminho mais eficaz para permitir uma participação
política, sem que tais reivindicações se tornem ameaças incontroláveis. p.14

A Psicologia, para explicar os ajustes da ordem social capitalista em função das exigências
dos novos momentos históricos de sua recomposição, tem transitado entre teorias e abordagens que
nada mais são do que recursos da Psicologia como ciência para a reordenação do status quo da
própria sociedade, da Filosofia, da Sociologia... p.14

Concluimos que, a Psicologia tendo surgido nesse período, mantém-se até o momento
presente, hegemonicamente, reproduzindo essa condição. p.14

É possível identificar que a heterogeneidade por ele revelada é apenas aparente. p.14

Patto, quando afirma que embora por caminhos teórico-práticos diferentes, a Psicologia em
suas relações com a Educação tem sido conduzida por finalidades semelhantes. Referenda o status
quo da Educação e da própria Psicologia como ciência, por meio da ênfase em aspectos particulares
dos indivíduos, das famílias ou do meio sociocultural que caracterizam a maioria de suas
explicações. p.14

A única pergunta possível ao psicólogo refere-se a "porque os indivíduos não aprendem",


apontando para uma ausência de compromisso da Psicologia com a condição multideterminada das
circunstâncias nas quais os indivíduos se humanizam. p.15

Tendências atuais do pensamento crítico em Psicologia Escolar

A visão tradicional e hegemônica da Psicologia na Educação passou a ser sistematicamente


denunciada no Brasil, a partir da década de 1980, momento no qual se consolida uma postura crítica
em relação à identidade e à função social do psicólogo escolar. p.15

O movimento de crítica pautase, nesse momento, pela constatação e denúncia dos


pressupostos teóricopráticos da Psicologia e da Educação e pelo diagnóstico e análise crítica da
história da Psicologia na Educação, enfatizando concepções progressistas e o trabalho coletivo,
entre outros. p. 15

A década de 1990 assinala um período privilegiado desse movimento, marcado pela


tentativa de descrever, explicitar, construir/ propor respostas que traduzem em ações as tendências
apontadas na década anterior. p.15

Na atualidade, apesar de persistirem as tendências já assinaladas, têm ocorrido várias


tentativas de retorno às concepções tradicionais, que acabam sendo incorporadas ao discurso das
concepções defendidas pelo movimento de crítica, como seria o caso por exemplo das
aproximações entre as teorias de Piaget e Vigotski. p.15

Deixando de se posicionar diante das dimensões ontológica, epistemológica e lógica do


conhecimento, o retorno às explicações tradicionais, prepara o cenário ideológico propício às
mudanças para adaptar o já existente ao novo momento histórico social, sem que seja necessário
questionar as finalidades da organização social, da produção do conhecimento e dos próprios
indivíduos. p16

Uma concepção crítica de Psicologia Escolar

Toma-se como referência teórico-filosófica e metodológica, o conjunto de elaborações da


Psicologia, efetivados a partir do Materialismo Histórico Dialético, enfocando as categorias que têm
implicações imediatas para a compreensão do processo de humanização dos indivíduos no contexto
sociohistórico atual. p.18

No nível da análise sobre o homem, desenvolvida por Marx, destacamos o trabalho como
atividade vital por meio do qual o homem se relaciona com a natureza e com os outros homens,
criando as condições para a produção e reprodução da humanidade; o caráter material e histórico do
desenvolvimento humano que permite compreender as relações de produção como determinantes da
forma e do conteúdo das relações entre os homens e, a lógica dialética, cujas categorias centrais
viabilizam o conhecimento e a interpretação da realidade, considerando a origem multideterminada
e contraditória dos fenômenos, apreendendo-os em sua história de desenvolvimento e (articulação
entre aparência e essência. p.19

Como a concepção Materialista Histórico Dialética foi gestada visando à análise crítica da
sociedade capitalista, ela veicula, uma concepção ética. Implica a responsabilidade de se construir
uma nova ordem social, capaz de assegurar a todos os homens um presente e um futuro dignos.
Exige compromisso pessoal e com a construção de um conhecimento científico capaz de contribuir
para que o homem se objetive, de forma social e consciente, tornando-se, cada vez mais, livre e
universal. p.19

Nesse sentido, a concepção científica sobre o homem em geral, na visão de Marx, pode dar
sustentação aos estudos sobre a individualidade / subjetividade, uma tarefa para a Psicologia,
assumida por Sève (1979), Vigotski (1996), Leontiev (1978), entre outros. p.19

No nível da formação da individualidade, enfocamos os fundamentos da concepção


histórico-social do ser humano. Ao explicitar o momento de constituição da natureza social do
homem, o autor explica como se dá o processo de apropriação das objetivações humano-genéricas
que permite a objetivação do indivíduo, o lugar da comunicação e da educação, sem deixar de
considerar que tudo isso ocorre em uma determinada circunstância, no caso, a sociedade capitalista
que tem a alienação como uma de suas marcas. Como não há unidade no referido processo de
apropriação, porque esta forma de organização social é caracterizada por diferenças nas condições
de vida (fruto da desigualdade econômica, de classe e de relação com as aquisições sociohistóricas),
a constituição da individualidade está condicionada à superação do processo de alienação. p.20

Discutindo a alienação econômica e cultural, o autor aponta elementos progressistas e


reacionários da cultura intelectual. Explicita a ruptura entre as gigantescas possibilidades
desenvolvidas pelo gênero humano e a pobreza e estreiteza que cabe aos homens individualmente
como a contradição que caracteriza a sociedade capitalista. Defende que essa situação não é eterna
porque não o são as relações socioeconômicas que lhes dão origem, colocando a superação dessa
realidade como uma possibilidade no contexto atual. p. 20

A superação da alienação só se constitui uma possibilidade quando a compreendemos por


contradição quando consideramos a historicidade dos fatos humanos e quando podemos entender
para transformar as circunstâncias. É preciso considerar tanto um processo de educação para
permitir a humanização, quanto uma concepção de Psicologia que possa dar sustentação, no que a
ela compete como ciência, a esse processo de educação. p.20

Ao discutir as finalidades da educação escolar, destaca o caráter conservador e ao mesmo


tempo contraditório do projeto burguês de escola, pensando por contradição tanto as relações da
escola com a sociedade, quanto a função da escola e os temas relativos ao processo educativo. Toma
o processo de democratização da educação no sentido formal e substancial, defendendo a garantia
de acesso e permanência na escola, como uma condição de humanização no sentido da
"onilateralidade"'. p.21

Elementos que garantam a transformação da escola em instrumento de emancipação:

• a natureza e a especificidade do trabalho da escola, enfatizando a seleção e organização dos


conteúdos com base no saber universal, o movimento de continuidade e ruptura, e a
discussão sobre as práticas diárias.
• a competência técnico-pedagógica do professor para selecionar os conteúdos e os
procedimentos de ensino e o compromisso político com os pressupostos e as finalidades de
emancipação;
• o lugar do professor como coordenador da ação educativa e o trabalho coletivo;
• a compreensão da escola como um local ao mesmo tempo, conservador e revolucionário que
difunde a cultura, que é ao mesmo tempo fictícia e verdadeira.

Discutindo o espaço específico – e possível nas circunstâncias atuais – da escola no processo


de transformação da sociedade, Pucci (1995) sinaliza na direção da construção de uma teoria
comprometida com a transformação humana e social, destacando:

• a educação das consciências, para que os indivíduos possam tomar distância do material a
ser interpretado, ao mesmo tempo apreendendo no hiato entre um presente e um futuro
radicalmente diferentes, as contradições a serem superadas por ação individual e social;
• a necessidade de romper com a autoconfiança e a auto-satisfação do senso comum para
resistir/superar o estado estabelecido das coisas, indignando-se com a realidade;
• o restabelecimento das condições de autonomia, liberdade e consciência dos indivíduos,
trabalhando com o conhecimento necessário ao rompimento da consciência domesticada
pela via da formação cultural;
• a importância da conscientização dos mecanismos subjetivos da dominação e dos motivos
que levam a ela, para que a submissão se torne insuportável e o desejo de viver melhor tome
conta dos indivíduos.

Cabe à Psicologia oferecer subsídios para o desenvolvimento de uma concepção científica


do indivíduo, entendido como síntese da história social da humanidade, de cujo desenvolvimento
deve conscientemente participar para assegurar sua emancipação. Trata-se de tomar como tarefa
também da Psicologia o estabelecimento de mediações entre o desenvolvimento histórico-social da
humanidade e a vida particular dos indivíduos. p.23

Se no momento atual as relações entre os homens têm favorecido a alienação, estas


mediações teóricas não podem apenas explicar como e porque os indivíduos agem ou são de uma ou
de outra maneira, mas deverão também buscar responder como e porque os indivíduos podem vir a
agir ou tornarem-se seres emancipados. p.23

O projeto principal de Vigotski constituiu-se no estudo dos processos de transformação do


desenvolvimento humano em sua dimensão filogenética, histórico-social e ontongenética, buscando
chegar até à dimensão micro-genética Priorizou as funções psicológicas superiores. A finalidade de
seu trabalho era redefinir o método de compreensão do fenômeno humano, para descobrir o meio
pelo qual a natureza social se torna a psicológica dos indivíduos. p.24

Destaca o cérebro como órgão material da atividade mental, que também se adapta às
transformações no meio físico e social. p.24

A comunicação é fator de desenvolvimento. Deve ser clara, precisa, provocar dúvidas e o


desejo de iniciar novos processos construtivos. p.25

Sobre a relação aprendizagem/desenvolvimento, explica que a aprendizagem (escolar e


extra-escolar) possibilita e movimenta o processo de desenvolvimento e que ele é dinâmico, no qual
estágios de relativa estabilidade sucedem períodos de mudanças radicais, com ênfase nos momentos
de crise. De acordo com a perspectiva sociohistórica, o desenvolvimento ocorre no nível real e por
meio da Zona de Desenvolvimento Próximo – obtida pela diferença entre o que é capaz de fazer só
e aquilo que faz com ajuda e que explica a possibilidade de novas aprendizagens. p.25

A Psicologia deve estudar como os indivíduos elaboram conceitos, enfatizando as


estratégias, os erros, o processo de generalização. p.25

A formação da consciência individual envolve as relações entre pensamento/linguagem,


desenvolvimento/aprendizagem, o significado das mesmas e os afetos e emoções que oferecem as
condições para sua elaboração. O pensamento tem origem na esfera motivacional que explicam o
porquê de sua existência. p.25

Ênfase no papel do professor como mediador na dinâmica das relações interpessoais e na


relação da criança com os objetos do conhecimento, ressaltando um lugar importante para a
imitação e para o brinquedo. p.26

Ao espaço da Psicologia, cabe um posicionamento diante das finalidades sociais da


Educação e da própria Psicologia como ciência . p.26

A atuação do psicólogo deve visar uma multiplicidade de ações, uma vez que a identidade
profissional está nas finalidades a serem atingidas por recursos teóricos e práticas diferenciadas; a
pesquisa não pode se constituir em mera investigação científica, deve produzir efeitos, e permitir a
participação de todos no processo de transformação dos resultados em ações concretas para
transformar a realidade. p.26

Considerando que a Educação é o principal processo por meio do qual os indivíduos se


objetivam como humanos, apropriando-se dos bens produzidos pelo conjunto dos homens. Que a
Psicologia é a ciência que se propõe a explicar como a partir do mundo objetivo se constrói o
mundo subjetivo do indivíduo, então os processos de subjetivação / objetivação do mundo social
pelos indivíduos são o seu objeto de estudo. p.26

A Psicologia não pode desconsiderar a dimensão educativa em qualquer de suas áreas de


estudo / atuação / formação. A Psicologia Escolar não pode ser compreendida como especialidade
na formação do psicólogo. Há que se rever a Psicologia na Educação, atribuindo-lhe um novo
sentido, além de um outro lugar ao psicólogo. p.26

2. A ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO JUNTO A DEMANDA DE QUEIXA ESCOLAR

Situamos o psicólogo como mediador no processo de elaboração das condições necessárias


para a superação da queixa escolar. p.27

Defendemos a aprendizagem dos conceitos cotidianos e científicos como a atividade


principal da criança para garantir o seu processo de humanização, uma vez que ela possibilita e
movimenta o processo de desenvolvimento do pensamento, tendo a linguagem, a consciência e as
emoções como mediadoras desta ação. p.27

Sobre a ação do psicólogo, propomos a descrição e análise da relação entre o processo de


produção da queixa escolar e os processos de subjetivação/objetivação dos indivíduos nele
envolvidos, como uma mediação necessária à superação das histórias de fracasso escolar. p.28

A "queixa" é apenas a aparência, o nível imediato que se caracteriza como uma


representação isenta de análise, cabendo ao psicólogo mediar a compreensão da essência do que foi
apresentado como "queixa", por meio da investigação/explicação/ação conjunta. p.28

A avaliação e a intervenção não podem se pautar por métodos que visem encontrar nos
indivíduos a explicação para a "queixa". Não se trata de desfocar a criança, para culpabilizar a
família e/ou a escola. Mudamos a pergunta, em vez de nos dirigirmos a pessoas ou situações
isoladas – o que tem efeito paralisador – buscamos as circunstâncias, porque estas podem ser
transformadas. p.29

Se consideramos que a subjetividade só se constitui a partir das condições concretas de vida


dos indivíduos, é a historicidade dos fatos apresentados como "queixa" que deverá ser investigada.
Trata-se de buscarmos, com todos os envolvidos, as ações, os acontecimentos, as concepções que
"produziram" a "queixa" e "motivaram" seu encaminhamento. p.29

A avaliação aqui adquire caráter investigativo e não classificatório. Identificar as


possibilidades concretamente existentes para a superação dessa condição, constitui-se no desafio da
intervenção. p.29

O psicólogo deve olhar não para o que a criança não tem e não sabe, mas para o que ela sabe
e gosta de fazer. p.29.

Com a criança, observamos nas atividades realizadas durante os encontros, os aspectos que
estão relacionados com nossa investigação, elementos que revelam seu potencial de aprendizagem
quando colocada diante de situações-problema, desafios. Com a família e a escola, investigamos as
concepções, as hipóteses sobre a "queixa", o que fazem para superá-la e quais são suas expectativas.
Avaliamos e mobilizamos, portanto, as objetivações, os significados, os sentidos atribuídos ou a
serem atribuídos, visando preparar a apropriação de novas possibilidades. p.30

O psicólogo, como mediador na efetivação de todos esses objetivos, deve superar a condição
de "resolvedor de problemas", que espera finais felizes para encerrar “o caso”. p.36

As principais estratégias utilizadas:


• Temas/situações geradores de possibilidades de trabalho: condições necessárias para
provocar, desafiar as pessoas envolvidas, em busca da superação das condições postas no
momento, por meio da "queixa"; geradores, enfim, da atividade principal da criança e da
condição de participação de pais, professores e crianças.
• Jogos coletivos, como estratégias para a compreensão das contradições não explicitadas na
"queixa" ou para evidenciá-las.
• Dinâmicas que permitam ultrapassar os limites individuais colocados pela "queixa".
• Leitura e discussão de textos e relatórios e planejamento conjunto de atividades.
• Grupo de crianças para privilegiar a relação que elas têm com o que sabem, gostam, querem
fazer, enfatizando os conhecimentos de cada um no coletivo – tomado como o espaço de
manifestação dos diferentes níveis de conhecimento.
• Grupo de pais: para discutir diferentes formas de ocupar seu espaço na educação escolar do
filho e para se posicionarem em relação às questões da escola, da Psicologia, da
medicalização e outras tantas que surgem no decorrer do trabalho.
• Grupo de professores e reuniões na escola para colocar os conhecimentos da Psicologia a
serviço do trabalho pedagógico.
• Visitas domiciliares e ao bairro: para investigar e compreender a dinâmica familiar e as
relações entre o bairro e a escola.
• Eventos científicos para entender que todos os participantes do trabalho contribuem com a
elaboração do saber/fazer Psicologia Escolar.

O envolvimento das pessoas relacionadas às situações de escolarização em questão,


compreendendo-as e transformando-as, é o resultado geral das investigações. p.41

3. A ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO EM INSTITUIÇÕES DE ENSINO

O objeto do psicólogo em uma instituição de ensino - é o encontro entre os sujeitos e a


educação e a finalidade central de seu trabalho deve ser a de contribuir para a construção de um
processo educacional que seja capaz de socializar o conhecimento historicamente acumulado e de
contribuir para a formação ética e política dos sujeitos. p.41

O psicólogo não é um “resolvedor" de problemas, um mero divulgador de teorias e


conhecimentos psicológicos, mas um profissional que dentro de seus limites e de sua
especificidade, pode ajudar a escola a remover obstáculos que se interpõem entre os sujeitos e o
conhecimento e a formar cidadãos por meio da construção de práticas educativas que favoreçam
processos de humanização e reapropriação da capacidade de pensamento crítico. p.41

O psicólogo deve compreender de forma mais aprofundada tanto as maneiras pelas quais o
trabalho educativo produz nos indivíduos singulares a humanidade que é produzida histórica e
coletivamente pelo conjunto dos homens, quanto as funções e a natureza social do desenvolvimento
cognitivo, dos afetos e emoções no processo de humanização desses indivíduos pela via da
apropriação da cultura. p.42

Cada instituição apresenta necessidades e particularidades que devem ser compreendidas,


respeitadas e trabalhadas. p.42

Articulação entre teorias da aprendizagem e práticas pedagógicas

É possível localizar com maior ou menor grau de clareza e importância diferentes


contribuições da Psicologia, nos processos constitutivos dos ideários pedagógicos que fundamentam
práticas e propostas educacionais no Brasil. p.44

É fundamental que o psicólogo escolar compreenda e domine tanto os referenciais da


psicologia, quanto da educação. p.44

Existem múltiplas possibilidades de articulação entre teorias de aprendizagem e práticas


pedagógicas. p.44

Um processo pedagógico qualitativamente superior pode ser construído por meio de


inúmeros caminhos. Um bom ensino é aquele que garante uma aprendizagem efetiva. Neste sentido,
um bom professor é aquele que dá conta de ensinar seus alunos. p.45

Não se pode verdadeiramente ensinar se não se considerar como o aluno aprende, ou ainda,
porque às vezes ele não aprende. p.45

Se a escola é a instância socializadora do conhecimento historicamente acumulado e se a


finalidade da ação docente se concretiza na tarefa de ensinar, é preciso que o professor selecione
tanto os elementos culturais que precisam ser assimilados pelos alunos, quanto as formas mais
adequadas para atingir este objetivo. p.45

Os educadores devem nortear sua ação a partir de três objetivos fundamentais:


• a identificação das formas mais desenvolvidas em que se exprime o saber objetivo
socialmente produzido;
• a transformação deste saber objetivo em saber escolar que possa ser assimilado pelo
conjunto dos alunos
• e a garantia das condições necessárias para que estes não apenas se apropriem do
conhecimento, mas ainda elevem seu nível de compreensão sobre a realidade.

O professor ainda tem de enfrentar um novo desafio: o fato de que nem todos aprendem do
mesmo modo, no mesmo momento e ritmo. Alguns alunos parecem simplesmente não aprender
nada. p.45

Dentre as várias explicações para o não aprender, a mais conhecida é aquela que parte da
idéia de que os alunos não aprendem porque não estão "prontos". p.45

Essa abordagem maturacionista aponta para pelo menos duas questões principais: 1-
afirmação de imaturidade neurológica, intelectual ou emocional da criança só é possível se
tomarmos o adulto como padrão, o que significa que essas explicações desconsideram que o ser
humano é histórico e está em um permanente processo de construção. O conceito de imaturidade
colocado nesses termos não possui nenhuma legitimidade científica, não podemos considerar a
criança como um ser imaturo pelo simples fato de diferenciar-se de um adulto. 2- a idéia de que ela
depende diretamente do desenvolvimento. Esta perspectiva considera que determinados alunos
apresentam dificuldades porque não atingiram o nível de desenvolvimento psicointelectual
necessário. Assim, o professor não pode ensinar porque estes alunos não têm condições de aprender,
não lhe restando outra alternativa a não ser esperar que eles fiquem "maduros”, para só então
cumprir sua função social. p.46

Para rompermos com o maturacionismo, é preciso compreender de uma nova forma as


relações entre desenvolvimento e aprendizagem. p.46

Encontramos esse olhar nas contribuições de L. S. Vigotski, para quem o principal fato
humano é a transmissão e assimilação da cultura. p.47

Vygotsky concorda que existe uma relação entre um determinado nível de desenvolvimento
e a capacidade ou competência para a aprendizagem de certos conteúdos, porém defende que não
existe um único nível de desenvolvimento, mas sim dois: o nível de desenvolvimento atual e a zona
de desenvolvimento próximo. p47

Nível de desenvolvimento atual: nível desenvolvimento da criança que foi conseguido


como resultado de um processo de desenvolvimento já realizado. (o que cada criança consegue
resolver de maneira independente.)
Zona de desenvolvimento próximo: corresponde ao que a criança é capaz de realizar com
a ajuda de adultos ou companheiros mais experientes.

O fato dos alunos não conseguirem realizar sozinhos determinadas atividades não significa
que eles não tenham condições para tanto. Ocorre que, naquele momento, as capacidades cognitivas
necessárias à realização das tarefas propostas encontram-se em processo de formação, razão pela
qual esses alunos necessitam do auxílio do professor. (Através de de novas explicações, apoio
afetivo, atividades diferenciadas, organização de trabalhos em grupo, jogos, brincadeiras, etc.). p.48

O ensino não deve estar "a reboque" do desenvolvimento. Ao contrário, um processo de


aprendizagem adequadamente organizado é capaz de ativar processos de desenvolvimento. p.48

Essa perspectiva aponta para o resgate do papel ativo do professor em relação aos processos
de aprendizagem e desenvolvimento de todos os alunos, especialmente daqueles que apresentam
mais dificuldades. p.48

O professor que sabe que o desenvolvimento cria potencialidades, mas que só a


aprendizagem as concretiza, é aquele que se volta para o futuro, para dar condições para que todos
os seus alunos se desenvolvam e que, portanto, busca intervir ativamente nesse processo, não se
limitando a esperar que as capacidades necessárias à compreensão de um determinado conceito
algum dia "amadureçam". Sabe que seus alunos se desenvolvem à medida em que os ensina e os
educa, que poderá contribuir para a reversão dos processos de produção do fracasso escolar. p.43

A sala de aula como local de formação social da mente

A sala de aula é de fato um local de formação social da mente. p.48

Várias questões podem decorrer dessa concepção de sala de aula:

• A aprendizagem é um processo. Em função do momento de desenvolvimento no qual se


encontra o ser humano compreende e interpreta de diferentes maneiras os fenômenos com os
quais se defrontam, sejam eles de natureza física, social ou psicológica. Por isso, é
fundamental conhecer e respeitar o processo de pensamento infantil como ponto de partida
do processo educativo;
• A aprendizagem escolar requer articulação entre os conceitos cotidianos ou espontâneos –
aqueles construídos pela experiência de vida – e os conceitos científicos – aqueles
conhecimentos sistematizados que, para serem adquiridos, dependem diretamente do
trabalho desenvolvido pela escola;
• A atividade do indivíduo é condição fundamental para que a aprendizagem ocorra. Assim, o
papel ativo do professor, pois é ele quem poderá garantir, pela organização intencional de
uma proposta de trabalho adequada, as condições necessárias à aprendizagem e ao
desenvolvimento de seus alunos;
• A aprendizagem depende da socialização. O conhecimento é construído, transmitido e
apropriado necessariamente na relação com outros (trabalho em grupo). A interação aluno-
aluno é fundamental no processo de socialização e desenvolvimento cognitivo;
• A aprendizagem requer motivação. Na medida em que é impossível separar processos
intelectuais e afetivos, para que a aprendizagem ocorra, é preciso que se estabeleça um
vínculo que possa levar o aluno a dirigir sua atenção para o objeto do conhecimento.
• A aprendizagem não se separa da individualidade. O desenvolvimento é determinado pelas
relações sociais, mas cada um dá um sentido particular a essas vivências (singularidade
pessoal). É a compreensão das representações e visões de mundo, dos interesses e valores
dos alunos, que poderá indicar os pontos de articulação com o conhecimento que deve ser
apropriado;
• O conhecimento é também conscientização e instrumento de transformação social. A
educação é prática de liberdade, é aproximação crítica da realidade. A conscientização que o
conhecimento possibilita pode colocar os homens no lugar de sujeitos que fazem e refazem
o mundo.

O conhecimento como instrumento do viraser


Para pensarmos o conhecimento como instrumento do vir a ser, é preciso, antes de mais
nada, rompermos com a idéia da existência de uma natureza humana fixa, imutável, natural, dada a
priori. p.51

O homem tem sido pensado, a partir dessa idéia de natureza humana, concebido como
portador de uma essência natural e universal, e a Psicologia não tem sido capaz de falar do
fenômeno psicológico em sua articulação com a vida, as condições econômicas, sociais e culturais
nas quais se inserem os homens. p.52

“Na verdade, não se fala de nada. Faz-se ideologia” (Bock, 2001, p.25).

A visão sociohístórica alerta para o fato de que pensar o homem dessa forma significa
naturalizar os fenômenos humanos e desconsiderar todo o processo histórico que determina a
constituição do ser humano. p.52

É preciso trabalhar com a idéia de condição humana, de construção social do psiquismo


humano, que nos permita compreender a plasticidade do sistema psicológico humano. p.52

Metodologia de trabalho
É fundamental contribuir para a constituição de sujeitos capazes de olhar para o seu
cotidiano e relacioná-lo com a realidade num plano mais amplo, de se envolver com ações que
tenham como horizonte a transformação social. p.53

Para que a Psicologia possa contribuir com a construção da cidadania no interior das práticas
educativas é preciso construir metodologias de trabalho fundadas em um movimento de
ação/reflexão/ação de tal forma que todos os envolvidos possam refletir sobre a própria prática
social, buscar elementos teóricos que venham a iluminar essa prática de modo qualitativamente
diferente e comprometer-se com o desenvolvimento de projetos que traduzam em ações concretas
essa nova compreensão crítica sobre si mesmo e sobre a realidade social. p.53

Com isso, rompe-se com a idéia do psicólogo escolar como um técnico e se torna possível
pensá-lo como um elemento mediador que poderá avaliar criticamente os conteúdos, métodos de
ensino e as escolhas didáticas que a escola faz como um todo. p.53

Os possíveis beneficiários dos serviços da Psicologia devem ser, antes de mais nada, sujeitos
ativos e não apenas objetos passivos de ações sobre as quais não têm qualquer controle. p.54

Existem quatro "momentos" principais, embora existam diferenças mais ou menos


significativas na articulação dos passos metodológicos que caracterizam os processos de
intervenção:
1. Reflexão sobre a vida cotidiana da escola em suas mais diferentes expressões;
2. Análise crítica dessa realidade a partir do recurso a elementos teóricos disponíveis que
permitam compreendê-la como construção social historicamente datada.
3. Reflexão e planejamento de ações que podem ser desenvolvidas buscando as transformações
desejadas;
4. Desenvolvimento de projetos que traduzam em ações concretas o compromisso ético,
político e profissional com a construção de processos educacionais humanizadores.

Sistemática de trabalho

A sistemática de trabalho envolve quatro momentos principais: avaliação da realidade


escolar e/ou institucional, discussão dos resultados preliminares com todos os segmentos da
instituição educacional, elaboração e de execução do plano de intervenção. Na prática nem sempre
esses momentos sucedem-se da forma como estão sendo apresentados. p.55

O processo de avaliação
Uma avaliação adequada é a primeira condição para a articulação de um bom plano de ação,
com objetivos, metas e estratégias definidas. O processo de avaliação deve envolver uma
multiplicidade de fatores, trazendo pelo menos o seguinte conjunto de dados:

• Relativos à organização da escola: número de turmas (total, por período e série); número de
alunos (total, por período e série); número de professores (total e por série); número de
funcionários e descrição de funções e atividades; serviços prestados aos alunos e à
comunidade; esquema de reuniões (de direção e professores, de professores; de alunos, de
funcionários, de pais, etc);
• Informações sobre o corpo docente: formação dos professores, condições de estudo e
reflexão; salário e condições de trabalho; tempo médio de permanência dos professores na
escola; experiências educacionais anteriores;
• O trabalho pedagógico: metodologia utilizada; recursos didáticos; relação entre professores
e alunos; conteúdos trabalhados; tipo de rotina construída em sala de aula; critérios de
organização e atribuição das classes; processos de avaliação;
• A equipe que dirige a escola: formação, tempo de experiência e forma de escolha do diretor;
número de coordenadores e respectivas funções;
• Elementos quantitativos sobre a progressão escolar dos alunos: índices de evasão (total, por
série, professor e período); índices de repetência (total, por série, professor e período);
• Dados relativos ao nível de organização dos diferentes segmentos da escola: Associação de
pais e mestres; Conselho de escola; Grêmio estudantil; projetos em andamento; nível de
participação dos pais (nas organizações formais e não formais);
• As condições socioeconômicas dos alunos;
• A história da escola;
• O bairro no qual a escola está inserida;
• Dados relativos à compreensão que os diferentes segmentos da escola e/ou instituição
apresentam em relação a seus problemas mais fundamentais;
• As expectativas dos diferentes segmentos da escola e/ou instituição em relação ao trabalho
do profissional da Psicologia;
• As possibilidades e os limites que se apresentam em relação ao trabalho da Psicologia.

No que se refere aos procedimentos de avaliação, os dados podem ser coletados junto a
documentos da escola. Dependendo das possibilidades e condições, os dados podem ser obtidos
diretamente por meio de conversas ou da aplicação de questionários e/ou entrevistas dirigidas. p.57
O relatório de avaliação

O segundo momento do trabalho é a discussão dos resultados preliminares, de preferência


com todos os segmentos organizados da instituição. p.57

Para subsidiar essa discussão é importante que o psicólogo prepare e apresente um relatório
escrito contendo todos os dados obtidos no processo de avaliação. P57

O profissional coloca-se como um mediador que pode contribuir, nas questões que lhe são
pertinentes, para a abertura de espaços de discussão e de resgate da capacidade de pensamento
crítico, o que pode colocar todos os segmentos da escola no lugar de sujeitos ativos. p.58

A discussão do relatório permite que todos possam contribuir para uma compreensão mais
aprofundada sobre sua própria realidade e se comprometerem, de alguma forma, com as
transformações que se fizerem necessárias para a melhoria do trabalho desenvolvido pela escola.
p.58

A elaboração do plano de intervenção

O terceiro momento do trabalho é a elaboração do plano de intervenção, deve constituir-se


em uma resposta às questões levantadas no processo de avaliação. Para tanto, devem ser indicados
os segmentos que deverão ser envolvidos (direção, professores, funcionários, pais, famílias,
comunidade) e os objetivos que se pretende atingir a curto, médio e longo prazos com cada um
deles, bem como algumas estratégias que serão utilizadas. p.59

Não existe um modelo único de plano de intervenção, mas alguns itens não podem deixar de
ser destacados: objetivo geral do trabalho; objetivos específicos dos projetos a serem realizados
com cada um dos segmentos a curto, médio e longo prazos; principais estratégias a serem utilizadas;
condições objetivas necessárias para a realização da intervenção, tais como horários de reunião,
materiais de apoio e de consumo, recursos humanos, etc. p.60

O processo de intervenção

O quarto momento do trabalho é o processo de intervenção. Na medida em que cada


realidade é única, não se pode definir a priori uma forma de intervenção, podemos afirmar que o
psicólogo escolar deve contribuir de diferentes formas para:

• a construção de uma gestão escolar democrática, a partir de uma organização do trabalho


coletiva e solidária;
• a melhoria da situação docente e o resgate da autonomia, do papel dirigente e do valor
social do professor;
• a construção de relações sociais que propiciem a formação de vínculos que garantam o
máximo desenvolvimento possível das possibilidades humanas de todos os envolvidos;
• o desenvolvimento de ações que contribuam para ampliar a participação popular na escola;
• a definição de planejamentos e diretrizes educacionais que levem em - conta o nível de
desenvolvimento, os interesses e a realidade dos alunos;
• a identificação e a remoção dos obstáculos que possam estar impedindo os alunos de se
apropriarem dos conhecimentos;
• a definição de conteúdos e métodos de ensino que não só garantam a apropriação do saber,
mas que também expressem o objetivo de formação de um ser humano pleno de
potencialidades e possibilidades;
• a escolha de materiais didáticos que estimulem o pensamento crítico e criativo dos alunos.

Todas estas questões a respeito do trabalho do psicólogo escolar em instituições


educacionais não podem ser pensadas de forma desvinculada dos diferentes contextos nos quais ele
se insere pois, as maneiras pelas quais os psicólogos constroem suas propostas de trabalho estão
sujeitas a uma multiplicidade de fatores que se relacionam (seus posicionamentos filosóficos,
teóricos e metodológicos X a política educacional das instituições e as expectativas construídas em
relação à ação da Psicologia).

No entanto, permite-nos afirmar que é possível abrir espaços que podem diminuir os limites
e ampliar nossas possibilidades de concretização de uma prática contextualizada e criticamente
comprometida com a humanização. p.62

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