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Documento 2
DEFENSOR DE LIGUGÉ. O livro das cintilações. Séc. VIII.
Leitor, quem quer que tu sejas, que lês este pequeno livro, eu, que o escrevi, rogo-te que
o leias com alma e acolhas com gratidão estas saborosas sentenças. Com exceção do
trabalho e da boa vontade, nada há aqui de meu. Das palavras do Senhor e de seus santos,
destacaram-se estas cintilações que, também elas, não se devem a meu engenho, mas
unicamente à graça de Deus e a meu mestre Ursino, que me encarregou deste trabalho e
ensinou-me a fazê-lo. Desejoso de obedecer, perscrutei páginas e páginas e, ao deparar
uma sentença fulgurante, colhia-a com a diligência de quem encontra uma pérola ou
gema. Tal como uma fonte, que se faz de muitas gotas, assim reuni testemunhos de
diversos volumes para tentar compor este opúsculo. Assim como do fogo procedem
centelhas, assim também fulgem, extraídas das Escrituras, estas breves sentenças neste
livro de cintilações. Quem quiser lê-lo, poupar-se-á trabalho; que não se canse pelo
caminho das outras páginas: aqui encontrará o que deseja. Mas, para que esta obra não
seja considerada sem autor ou tida por apócrifa, a cada sentença, por meio de siglas,
ajunto o nome do autor.
Ao mosteiro de S. Martinho de Ligugé, no qual recebi a tonsura, ofereço este livro. Que
este oferecimento me ligue a ele pela perpetuidade, pois desde minha juventude é nele
que habitam os mestres que tanto me enriqueceram com seus dons. Escrevi-o com a ajuda
de Jesus, eu mesmo, e ofereci a eles para crescer em Cristo, para obedecer suas ordens e
em tudo prestar-lhes serviço, o que faço com muito gosto.
Se ocorreu algum descuido, rogo-te, leitor, que não me censures com ira, mas corrige-me
com benevolência. Escrevo meu nome - Defensor - não por glória vã, mas para que todo
leitor se lembre de mim. Tal como o porto para o navegador, assim também para mim foi
com regozijo que cheguei à última linha. Conjuro a meus leitores e imploro a meus
ouvintes que rezem por mim, último de todos, para que, enquanto esteja vivo, seja
cumulado da sabedoria de Deus; e, ao sair desta carne, mereça eu gozar da bem-
aventurança da vida eterna.
Documento 3
GEOFFREY DE MONMOUTH. História dos reis da Bretanha. Séc. XII
Capítulo 19: Lúcio é o primeiro rei bretão que abraça a fé cristã, junto ao seu povo.
(...) Como ele [Lúcio] fez tanto bem a princípio, estava querendo fazer um melhor
fim: para esse propósito, envio cartas ao papa Eleutério, desejando ser instruído por ele
na religião cristã. Os milagres que os discípulos de Cristo realizaram em diversas nações
forjaram uma convicção em sua mente; então tão inflamado com um amor ardente da
verdadeira fé, obteve a concordância da sua pia requisição. Aquele santo papa, que
recebeu sua devota petição, enviou a ele dois doutores da maior religiosidade, Faganus e
Duvanus, os quais, depois de terem pregado sobre a encarnação da palavra de Deus,
administraram nele o batismo e o fizeram um prosélito da fé cristã. Imediatamente depois
disso, pessoas de todos os países, reunindo-se, seguiram o exemplo do rei e, sendo lavados
na mesma santa pia, foram feitas participantes do reino do céu. Os santos doutores, depois
de terem quase extinguido o paganismo em toda a ilha, dedicaram os templos, que foram
fundados em honra de muitos deuses, para aquele único Deus e seus santo e os preencheu
com congregações de cristãos.
Documento 4
Acusações contra os valdenses (1254)
Primeiro eles dizem que a Igreja Romana não é a Igreja de Jesus Cristo, mas uma
igreja de malignos e que apostatou com Silvestre, quando o veneno das temporalidade se
infundiu nela. E eles dizem que são a Igreja de Cristo, porque observam na palavra, nos
feitos, na doutrina de Cristo, do Evangelho e dos Apóstolos.
Seu segundo erro é afirmar (...) que o Papa é a cabeça de todos erros; (...) Que não
se deve obedecer aos prelados, mas somente a Deus (...)
Também afirmam que a doutrina de Cristo e dos Apóstolos é suficiente para
salvação sem os estatutos da igreja; que a tradição da igreja é a tradição dos fariseus; e
que deriva mais da infração de uma tradição humana que de uma lei divina (...). Também
rechaçam o sentido místico nas Sagradas Escrituras, principalmente no referente aos ditos
e feitos entregados à Igreja pela tradição (...).
Documento 5
MARGUERITE DE PORETE. Espelho das almas simples. Final do séc. XIII.
AMOR: Meditação de Amor puro não tem mais que uma só intenção, a dizer, a de
amar sempre lealmente sem buscar recompensa, coisa que a Alma não pode fazer se não
está ela sem ela, pois amor leal não se dignaria receber consolo algum que viesse de sua
aquisição. Certamente não, Meditação de Amor sabe bem, e para bem, que ela não deve
livrar-se mais que a sua própria obra, ou seja, a querer perfeitamente a vontade de Deus,
e deixar Deus operar e dispor de sua vontade. Pois quem tem a vontade de que Deus lhe
faça sentir Sua vontade de consolo não confia só em Sua bondade, Mas nos dons das
riquezas que Ele pode dar. (...) Está certo, pois tudo reside nisso; e tampouco pode esta
Alma querer nada do poder de Deus, pois seu querer não lhe pertence nem permanece
nela, mas naquele a quem ama, e isso não é já obra sua, mas de toda a Trindade que opera
nessa Alma a Sua vontade. (...)
AMOR: Esta Alma [que tem o amor a Deus] – disse Amor – nada no mar de alegria
que é o mar das delícias que escapam e fluem da Divindade; e não sente alegria alguma,
pois ela mesma é alegria e nada e flutua na alegria sem sentí-la, porque habita na Alegria
e Alegria habita nela; ela mesma é alegria em virtude de Alegria que a transformou em si
mesma.
Também disse que se alegra mais daquilo que não pode comunicar do que aquilo
que pode comunicar, pois isso é pouco e pontual e o outro, infinito e interminável
ALMA: Ah, docíssimo, puro e divino Amor! – disse esta Alma – quão doce é a
transformação de mim mesma naquilo que amo mais que a mim mesma! E a tal ponto
que me transformei que perdi meu nome para amar o eu apenas podia amor: em amor [me
transformei], pois não amo a outro que ao Amor.