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Raquel Raichelis
Professora na Pontifíícia Universidade Catoí lica de Saã o Paulo, PUC/SP
1 Como amplamente analisado por Iamamoto e Carvalho (1982), em plena ditadura de Vargas, eí
criada, em 1942, a Legiaã o Brasileira de Assisteâ ncia (LBA), primeira instituiçaã o assistencial de porte
nacional, bem como as grandes instituiçoã es patronais que iraã o configurar o que hoje conhecemos como
sistema S – entre elas, SESI,
SENAI, SESC, SEBRAE.
2 Vaí rios autores, entre eles, Mattoso (1995), incorporaram o conceito de modernização
conservadora nas anaí lises do modelo de desenvolvimento econoâ mico-social adotado no Brasil pelos
governos militares. As bases deste “modelo”, conduzidas segundo os interesses do grande capital
monopolista, reforçaram o desenvolvimento dependente e associado e a integraçaã o subordinada do
Brasil na (des) ordem capitalista internacional, promovendo intensa centralizaçaã o e concentraçaã o no
seu interior. Para maior desenvolvimento da anaí lise, consultar Netto (1991), especialmente o cap.1.
3 Para aprofundamento da reflexaã o sobre as relaçoã es entre políítica social e Serviço Social,
consultar Behring e Boschetti, 2006.
Para finalizar, a última premissa destaca que embora seja frequente observar
o tratamento das categorias Estado e governo como sinoâ nimos – considerando que eí
o governo que fala em nome do Estado –, esse uso indiscriminado pode gerar
confusoã es com graves implicaçoã es polííticas (uma delas eí supor que assumir o poder
governamental eí equivalente a conquistar o poder do Estado).
Refletir sobre o Estado capitalista implica considerar referir-se a certo nuí mero
de instituiçoã es – o governo (executivo) nos nííveis central e subnacionais, a
administraçaã o puí blica, as forças militares, de segurança e policiais, os sistemas
judiciaí rio e legislativo nos seus diferentes nííveis de poder –, que compoã em em
conjunto a arena de conflitos e a condensaçaã o de forças polííticas denominadas
Estado.
2 Serviço Social, trabalho profissional e transformações recentes nas esferas
estatal e societária
De outro, mais aleí m dessas destituiçoã es, o que estaí em curso eí o esvaziamento
da proí pria noçaã o de direitos relacionado a uma suposta desnecessidade de tudo que
eí puí blico e estatal. Nas palavras de Vera Telles, trata-se do “encolhimento do
horizonte de legitimidade dos direitos”, que transforma direito em privileí gio em
nome da necessaí ria modernização da economia, cuja refereâ ncia maior eí o mercado e
suas demandas e prerrogativas.
O agravamento da questão social decorrente do processo de re-estruturaçaã o
produtiva e da adoçaã o do ideaí rio neoliberal repercute no campo profissional, tanto
nos sujeitos com os quais o Serviço Social trabalha – os usuaí rios dos serviços sociais
puí blicos – como tambeí m no mercado de trabalho dos assistentes sociais que, como
o conjunto dos trabalhadores, sofre o impacto das mudanças que atingem o exercíício
profissional.
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entanto, a administraçaã o puí blica consiga manter a regulaçaã o e o controle
estrateí gico de todo o processo.
As consequeâ ncias dessa forma de conduçaã o das polííticas puí blicas para o
trabalho social saã o profundas, pois a terceirizaçaã o desconfigura o significado e a
amplitude do trabalho teí cnico realizado pelos assistentes sociais e demais
trabalhadores sociais, desloca as relaçoã es entre a populaçaã o, suas formas de
representaçaã o e a gestaã o governamental, pela intermediaçaã o de empresas e
organizaçoã es contratadas; aleí m disso, as açoã es desenvolvidas passam a ser
subordinadas a prazos contratuais e aos recursos financeiros destinados para esse
fim, implicando descontinuidades, rompimento de víínculos com usuaí rios,
descreí dito da populaçaã o para com as açoã es puí blicas.
O que eí mais grave nessa dinaâ mica de terceirização dos serviços públicos eí que
se trata de um mecanismo que opera a cisaã o entre serviço e direito, pois o que
preside o trabalho naã o eí a loí gica puí blica, obscurecendo-se a responsabilidade do
Estado perante seus cidadaã os, comprimindo ainda mais as possibilidades de
inscrever as açoã es puí blicas no campo do direito.
No âmbito da sociedade civil, as duas uí ltimas deí cadas veâ m sendo palco de
muí ltiplas tendeâ ncias que se expressam com grande visibilidade, ganhando a opiniaã o
puí blica: o crescimento das ONGs e as propostas de parcerias implementadas pelo
Estado em suas diferentes esferas, principalmente nos planos municipal e local.
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Se isso naã o eí novo no campo das polííticas sociais, a conjuntura de 1990 traz
novos elementos que precisam ser analisados.
Esta dinaâ mica societaí ria vem implicando a desmontagem das instituiçoã es de
representaçaã o coletiva em todos os nííveis, a progressiva diminuiçaã o do alcance e da
qualidade das polííticas sociais, a reduçaã o dos espaços de negociaçaã o com diferentes
atores da sociedade civil, com amplo rebatimento na conformaçaã o da esfera puí blica
e na defesa de direitos. Para Oliveira (2007, p. 42), “o deslocamento do trabalho e
das relaçoã es de classe esvazia essa “sociedade civil” do conflito que estrutura
alianças, opçoã es e estrateí gias”, aleí m
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Portanto, a partir dos anos 1990, o campo das polííticas sociais e da luta por
direitos ficou muito mais complexo, especialmente se considerarmos que, apesar de
todos os desmontes e desmanches que teâ m atingido a esfera estatal, o Estado
permanece sendo a forma mais efetiva de operar a universalizaçaã o dos direitos.
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·4 cada vez mais frequente e necessaí rio o trabalho compartilhado com outros
profissionais na coordenaçaã o e implementaçaã o de projetos em diferentes
campos das polííticas sociais e nas atividades sociojuríídicas, que impoã em
novas exigeâ ncias para os assistentes sociais.
Como afirma Iamamoto (2002, p. 41), tal perspectiva de atuaçaã o naã o leva aà
diluiçaã o das identidades e competeâ ncias de cada profissaã o; ao contraí rio, exige maior
explicitaçaã o das aí reas disciplinares no sentido de convergirem para a consecuçaã o de
projetos a serem assumidos coletivamente.
O Serviço Social tem uma rica trajetoí ria de trabalho direto com a populaçaã o e
proximidade com o seu modo de vida no cotidiano. Nesses uí ltimos anos, poreí m, com
o refluxo dos movimentos populares e o enfraquecimento das instaâ ncias coletivas de
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Impactos e avanços na esfera puí blica somente seraã o possííveis pela articulaçaã o
dos variados sujeitos e organizaçoã es governamentais e naã o-governamentais, como
os conselhos de direitos, tutelares e de gestaã o, os foí runs e oí rgaã os de defesa dos
direitos, o poder judiciaí rio, o Ministeí rio Puí blico, as defensorias e ouvidorias
puí blicas, em uma efetiva cruzada pela ampliaçaã o de direitos e da cultura puí blica
democraí tica em nossa sociedade.
Para concluir, eí necessaí rio ressaltar que, apesar de todos os obstaí culos
encontrados no exercíício profissional, a categoria dos assistentes sociais vem
construindo uma histoí ria de lutas e de resisteâ ncia, apostando no futuro, mas
entendendo que ele se constroi agora, no tempo presente.
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Referências
______. e CARVALHO, Raul de. Relações Sociais e Serviço Social no Brasil. Saã o Paulo:
Cortez
Editora, 1982.
NETTO, Joseí Paulo. Ditadura e Serviço Social: uma anaí lise do Serviço Social poí s-64.
Saã o
Paulo: Cortez Editora, 1991.
______. Capitalismo monopolista e Serviço Social. Saã o Paulo: Cortez Editora, 2005.
______. Gestaã o puí blica e cidade: notas sobre a questão social em Saã o Paulo. Revista
Serviço
Social e Sociedade. Saã o Paulo, Cortez Editora, n. 90, junho, 2007.
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