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FUNDAMENTOS E MÉTODOS DO

ENSINO DA HISTÓRIA E DA
GEOGRAFIA I
CURSO DE GRADUAÇÃO – EAD
Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I – Profa. Ms. Lizete
Paganucci Chueri e Prof. Ms. Rodrigo Touso Dias Lopes

Meu nome é Rodrigo Touso Dias Lopes. Sou mestre em História


pela Unesp, com concentração na área de História e Cultura So-
cial. Desenvolvi, no mestrado, um trabalho no qual relacionei
diversos discursos políticos e pessoais dos diplomatas portu-
gueses na virada do século 18 para o 19. Considero muito inte-
ressante buscarmos, através do tempo, as vozes que construí-
ram um cotidiano próprio, por meio da análise do que foi
escrito em documentos, cartas, bilhetes e, também, por meio
das artes plásticas, da música, da arquitetura e da culinária. A
vivacidade que encontrei na História é meu estímulo para a do-
cência: trazer mais vida à educação para que ela se torne uma
atividade cada vez mais dinâmica e instigante. Além do Ensino
Superior, também sou professor do Ensino Médio, no qual desenvolvo um pouco do tra-
balho que, aqui na Educação a Distância, como seu tutor nesta obra, juntos realizaremos.
E-mail: rodrigo.touso@claretiano.edu.br

Meu nome é Lizete Paganucci Chueri Teixeira. Sou graduada


em Pedagogia, pela Unesp, e mestre em Educação, com área
de concentração em Políticas Curriculares, pelo Centro Univer-
sitário Moura Lacerda, localizado em Ribeirão Preto-SP, lugar
onde defendi minha dissertação, sobre Processo de Alfabetiza-
ção: entre o Proposto e o Vivenciado. Sou professora de algu-
mas disciplinas da área de Educação e, também, coordenadora
pedagógica em uma escola de Ensino Fundamental da Rede
Municipal de Ensino.
E-mail: lizetepct@bol.com.br

Fazemos parte do Claretiano - Rede de Educação


Rodrigo Touso Dias Lopes
Lizete Paganucci Chueri Teixeira

FUNDAMENTOS E MÉTODOS DO
ENSINO DA HISTÓRIA E DA
GEOGRAFIA I

Batatais
Claretiano
2015
© Ação Educacional Claretiana, 2012 – Batatais (SP)
Versão: dez./2015

900 L855f

Lopes, Rodrigo Touso Dias


Fundamentos e métodos do ensino da História e da Geografia I / Rodrigo Touso Dias
Lopes, Lizete Paganucci Chueri Teixeira – Batatais, SP : Claretiano, 2015.
136 p.

ISBN: 978-85-8377-392-4

1. Ensino. 2. Metodologia. 3. História. 4. Geografia. 5. Ecoalfabetização. 6. Cartografia.


I. Teixeira, Lizete Paganucci Chueri. II. Fundamentos e métodos do ensino da História e da
Geografia I.

CDD 900

Corpo Técnico Editorial do Material Didático Mediacional


Coordenador de Material Didático Mediacional: J. Alves

Preparação Revisão
Aline de Fátima Guedes Cecília Beatriz Alves Teixeira
Camila Maria Nardi Matos Eduardo Henrique Marinheiro
Felipe Aleixo
Carolina de Andrade Baviera Filipi Andrade de Deus Silveira
Cátia Aparecida Ribeiro Juliana Biggi
Dandara Louise Vieira Matavelli Paulo Roberto F. M. Sposati Ortiz
Elaine Aparecida de Lima Moraes Rafael Antonio Morotti
Josiane Marchiori Martins Rodrigo Ferreira Daverni
Sônia Galindo Melo
Lidiane Maria Magalini Talita Cristina Bartolomeu
Luciana A. Mani Adami Vanessa Vergani Machado
Luciana dos Santos Sançana de Melo
Patrícia Alves Veronez Montera Projeto gráfico, diagramação e capa
Raquel Baptista Meneses Frata Eduardo de Oliveira Azevedo
Joice Cristina Micai
Rosemeire Cristina Astolphi Buzzelli
Lúcia Maria de Sousa Ferrão
Simone Rodrigues de Oliveira Luis Antônio Guimarães Toloi
Raphael Fantacini de Oliveira
Bibliotecária Tamires Botta Murakami de Souza
Ana Carolina Guimarães – CRB7: 64/11 Wagner Segato dos Santos

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SUMÁRIO
caderno de referência de conteúdo
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................... 7
2 ORIENTAÇÕES PARA ESTUDo........................................................................... 8
3 referências bibliográficas ...................................................................... 33
4 E-REFERÊNCIAS................................................................................................. 33

Unidade 1 – O Ensino de História e Geografia nas Séries Iniciais


do Ensino Fundamental de Nove Anos
1 OBJETIVOS......................................................................................................... 35
2 CONTEÚDOS...................................................................................................... 35
3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE................................................ 36
4 INTRODUÇÃO À UNIDADE................................................................................ 37
5 BREVE HISTÓRIA DO ENSINO DA HISTÓRIA E GEOGRAFIA............................ 41
6 AS ORIENTAÇÕES DOS PCNS DE HISTÓRIA E GEOGRAFIA ............................ 43
7 ENSINAR OU NÃO ENSINAR HISTÓRIA E GEOGRAFIA NAS SÉRIES INICIAIS DO
ENSINO FUNDAMENTAL?................................................................................. 45
8 A GEOGRAFIA E O DESENVOLVIMENTO DA ESPACIALIDADE........................ 48
9 A HISTÓRIA E O DESENVOLVIMENTO DA TEMPORALIDADE......................... 56
10 A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE E O ENSINO DE HISTÓRIA E GEOGRAFIA......59
11 L EITURA COMPLEMENTAR............................................................................... 62
12 Q UESTÕES AUTOAVALIATIVAS......................................................................... 63
13 C ONSIDERAÇÕES............................................................................................... 64
14 E-REFERÊNCIA................................................................................................... 64
15 R EFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................... 65

Unidade 2 – Fundamentos para o Ensino de Geografia nos Anos


Iniciais do Ensino Fundamental
1 OBJETIVOS......................................................................................................... 67
2 CONTEÚDOS...................................................................................................... 67
3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE................................................ 68
4 INTRODUÇÃO À UNIDADE................................................................................ 69
5 GEOGRAFIA NA SALA DE AULA........................................................................ 70
6 O ESTUDO DO MEIO AMBIENTE ..................................................................... 71
7 EDUCAÇÃO AMBIENTAL, ECOALFABETIZAÇÃO E PERMACULTURA ............ 74
8 COMPREENDENDO AS REGIÕES DO PAÍS........................................................ 78
9 A PAISAGEM DA REGIÃO NORTE...................................................................... 80
10 A PAISAGEM DA REGIÃO NORDESTE............................................................... 83
11 A PAISAGEM DA REGIÃO CENTRO-OESTE....................................................... 84
12 A PAISAGEM DA REGIÃO SUDESTE.................................................................. 86
13 A PAISAGEM NA REGIÃO SUL........................................................................... 87
14 I NTRODUÇÃO AO ESTUDO DA POPULAÇÃO BRASILEIRA ............................. 88
15 Q UESTÕES AUTOAVALIATIVAS......................................................................... 91
16 C ONSIDERAÇÕES .............................................................................................. 92
17 e-referências................................................................................................. 92
18 R EFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................... 93

Unidade 3 – Conteúdos de História nos Anos Iniciais do Ensino


Fundamental: a colônia e o Brasil Imperial
1 OBJETIVOS......................................................................................................... 95
2 CONTEÚDOS...................................................................................................... 95
3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE................................................ 96
4 INTRODUÇÃO À UNIDADE................................................................................ 97
5 A HISTÓRIA NA SALA DE AULA......................................................................... 98
6 DESCOBRINDO A HISTÓRIA DO BRASIL........................................................... 100
7 O OURO E A INCONFIDÊNCIA MINEIRA.......................................................... 106
8 A VINDA DA CORTE PORTUGUESA E A INDEPENDÊNCIA DO BRASIL........... 110
9 O IMPÉRIO BRASILEIRO.................................................................................... 112
10 O FIM DA ESCRAVIDÃO..................................................................................... 114
11 questões AUTOAVALIAtivas......................................................................... 115
12 C ONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................... 116
13 R EFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................... 117

Unidade 4 – Conteúdos de História nos Anos Iniciais do Ensino


Fundamental: O Brasil Republicano
1 OBJETIVOS......................................................................................................... 119
2 CONTEÚDOs ..................................................................................................... 119
3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE................................................ 120
4 INTRODUÇÃO À UNIDADE................................................................................ 120
5 A PROCLAMAÇÃO DA REPÚBLICA.................................................................... 121
6 A CONSOLIDAÇÃO DA REPÚBLICA................................................................... 123
7 O CAFÉ COM LEITE............................................................................................ 124
8 A ERA VARGAS................................................................................................... 127
9 OS ANOS DE JK E JANGO................................................................................... 130
10 O REGIME MILITAR NO BRASIL........................................................................ 132
11 A DEMOCRACIA NOVA...................................................................................... 133
12 Q UESTÕES AUTOAVALIATIVAS......................................................................... 134
13 C ONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................... 134
14 R EFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................... 135
EAD
Caderno de
Referência de
Conteúdo

CRC

Conteúdo––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
O saber histórico escolar. Métodos e didática de ensino de história. Os conteú-
dos escolares de história: organização e seleção. Tendências historiográficas na
história escolar: economia, política, sociedade, cultura e narrativa. História local,
cotidiano e globalidade. A história do ensino de geografia. A importância social do
conhecimento geográfico. Métodos em geografia: fato geográfico; alfabetização
cartográfica; estudos do meio; dinâmicas no ensino de geografia. Conteúdos de
geografia: organização e seleção. Educação Ambiental e ecoalfabetização.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

1. INTRODUÇÃO
Como ensinar História e Geografia na educação infantil e
nos ciclos iniciais do Ensino Fundamental? Quais conteúdos sele-
cionar? Como abordá-los em sala de aula? O que levar em conta
para preparar a aula? Essas e outras questões serão respondidas
no estudo de Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da
Geografia I, a obra que começamos agora. Você está pronto para
buscar essas respostas e levantar novas perguntas?
8 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

Atualmente, a escola não pode deixar de atender algumas


demandas específicas que são muito importantes para a qualidade
de vida das futuras gerações. Entre essas demandas, destacamos,
nesta obra, os cuidados com o meio ambiente e os modos de desen-
volvimento sustentável da nossa sociedade. Nos dias de hoje, falar
em preservação ambiental e em reciclagem de materiais não é mais
suficiente, porque estamos além do limite do planeta em conservar
nosso modo de vida. Assim, um novo equilíbrio deve ser encontrado
entre a nossa cultura de consumir e a capacidade do planeta em su-
portar essa cadeia de consumo: da extração ao tratamento do lixo.
Por isso, conteúdos de cultura sustentável serão tratados nesta obra.
Acreditamos, também, que seja importante você entrar em
contato com os conteúdos de Geografia e História para que possa
refletir sobre suas estratégias de ensino. Por essa razão, ao longo
das quatro unidades de estudo, você verá também as caracteriza-
ções das regiões geográficas do país e uma introdução à história
do Brasil, do período colonial até os dias atuais.
Portanto, nesta obra, nosso objetivo será o de apresentar
um conjunto de conteúdos que podem ser selecionados por você
para o trabalho em sala de aula, adequados a diferentes idades,
regiões e condições sociais, e também o de apresentar os métodos
de trabalho a partir desses conteúdos, possibilitando uma educa-
ção adequada e contextualizada.
Após esta introdução aos conceitos principais, apresentamos
a seguir, no Tópico Orientações para estudo, algumas orientações
de caráter motivacional, dicas e estratégias de aprendizagem que
poderão facilitar o seu estudo.

2. ORIENTAÇÕES PARA ESTUDo

Abordagem Geral
Neste tópico, apresenta-se uma visão geral do que será estu-
dado nesta obra. Aqui, você entrará em contato com os assuntos
© Caderno de Referência de Conteúdo 9

principais deste conteúdo de forma breve e geral e terá a oportu-


nidade de aprofundar essas questões no estudo de cada unidade.
Desse modo, essa Abordagem Geral visa fornecer-lhe o conheci-
mento básico necessário a partir do qual você possa construir um
referencial teórico com base sólida – científica e cultural – para
que, no futuro exercício de sua profissão, você a exerça com com-
petência cognitiva, ética e responsabilidade social. Vamos come-
çar nossa aventura pela apresentação das ideias e dos princípios
básicos que fundamentam esta obra.
Atualmente, falar em preservação ambiental, separação de
lixo e reciclagem de materiais não é mais suficiente no que tange
aos cuidados que temos de ter com o meio ambiente, porque es-
tamos vivendo além do limite da capacidade do planeta em con-
servar nosso modo de vida.
Assim, qualquer abordagem responsável sobre educação
ambiental deverá propor ações para um novo equilíbrio entre a
nossa cultura fortemente baseada no consumo e a capacidade do
planeta em suportar essa extensa cadeia de consumo: da extra-
ção da matéria-prima, passando pelos processos industriais, pela
poluição, pelos transportes, pela energia gasta no processo, pelo
comércio justo e pelo tempo de uso e vida útil dos produtos, che-
gando, enfim, na reciclagem e no tratamento do lixo.
Como podemos ver, a reciclagem, apesar de ser o aspecto
mais comentado na busca pela sustentabilidade, é apenas um en-
tre muitos pontos de intervenção do processo. Outros pontos de
intervenção são os conhecidos como cinco "R” da sustentabilida-
de. Vejamos:
1) Repensar os hábitos de consumo, ou seja, buscar com-
preender as reais necessidades das trocas e a influência
da cultura do consumo nas compras por impulso e moda
e compreender a influência das embalagens e da mídia
nas escolhas de compra, ao invés da qualidade dos pro-
dutos.

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10 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

2) Recusar produtos que prejudicam o meio ambiente e


a saúde, que significa aprender a ler rótulos, a conhe-
cer ingredientes, a ter noções de nutrição, de saúde, e
aprender a verificar a origem dos produtos, evitando os
que circularam o mundo poluindo e gastando energia,
preferindo os próximos, nacionais ou locais.
3) Reduzir o consumo desnecessário, adequando o consumo
às necessidades, inclusive no que se refere ao tamanho
das embalagens e ao excesso de produtos descartáveis.
4) Reutilizar ao máximo antes de descartar! Uma garrafa
pode ser reutilizada antes de reciclada, uma camisa não
fura antes de sair de moda e uma meia pode ser costura-
da, para não falarmos em carros e celulares!
5) Reciclar os materiais, que inclui separar os materiais re-
cicláveis dos não recicláveis, secar, armazenar adequa-
damente e garantir a chegada desse material a um posto
de coleta (LEGAN, 2007, p. 26).
Esses comportamentos, no entanto, não encerram as ati-
tudes que podemos tomar pela sustentabilidade! Na escola e em
casa, ainda precisamos pensar em segurança alimentar, nos cui-
dados com a água, desde a manutenção das fontes até a garantia
de que todas as pessoas tenham acesso às quantidades mínimas
de água limpa, na economia local na qual estamos inseridos, na
cultura do consumo cultuado como qualidade de vida ideal e, é
claro, com a natureza em si, na defesa das mais diferentes formas
de vida, que, por certo, não estão aqui por acaso.

As regiões do país
Partindo do que está proposto nos Parâmetros Curriculares
Nacionais, o ensino de Geografia deve compreender a espacialida-
de dos alunos e as paisagens locais.
Vamos ver isso melhor?
O Brasil é dividido em cinco grandes regiões que caracteri-
zam o país sob diferentes aspectos e permitem sua melhor com-
preensão, apesar de toda essa divisão ser artificial. A região norte
© Caderno de Referência de Conteúdo 11

é caracterizada pela presença da Floresta Amazônica com sua ve-


getação característica e os imensos rios, como o Rio Amazonas.
A região nordeste, talvez a mais famosa em termos turísti-
cos por causa do magnífico litoral, é também a região mais seca
do país, com o agreste e o sertão. Já o centro-oeste é caracteriza-
do pela vasta área alagável, conhecida como pantanal. O sudeste,
por sua vez, é caracterizado pela vida urbana, compreendendo as
maiores cidades do país, como as capitais São Paulo, Rio de Janei-
ro e Belo Horizonte, e mesmo cidades do interior, como a Grande
São Paulo, a região metropolitana de Belo Horizonte e do Rio de
Janeiro, além de Campinas e Ribeirão Preto, por exemplo. Por fim,
a região Sul é característica do clima frio e da herança cultural eu-
ropeia, sobretudo alemã.
Perceba que, assim, somos capazes de criar, grosso modo, as
formas das paisagens locais, remetendo cada descrição a um tipo
físico, a uma alimentação específica, a músicas, folclores, econo-
mias e tradições.
É óbvio que o tamanho do país ajuda a termos paisagens tão dis-
pares e culturas tão diferentes, mas perceba que, acima das diferenças,
temos uma grande semelhança, afinal, somos todos brasileiros!
Mas somos brasileiros a partir de 1822 ou somos brasileiros
anteriores à existência do Brasil?

A história do Brasil
A pergunta anterior mostra-nos que compreender a nossa
história é essencial para a compreensão da nossa identidade. Para
tanto, vamos retornar um pouco no tempo, vamos voltar para
março de 1500, quando, depois de 44 dias de viagem, a maior ar-
mada portuguesa até então posta ao mar para ir até as Índias pela
rota descoberta por Vasco da Gama chegou ao Brasil!
Existem muitas controvérsias sobre as condições dessa via-
gem e sobre a coincidência da descoberta, envolvendo o conheci-
mento das correntes marítimas do Atlântico, o clima propício na-

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12 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

quela época do ano, a aparente naturalidade do encontro, o fato


de ser uma armada de tantas naus (13 no total) e, principalmente,
a assinatura do Tratado de Tordesilhas, que, seis anos antes do
achamento oficial das terras brasileiras, convencionou a Portugal a
posse das terras após 370 léguas de Cabo Verde.
O desembarque foi registrado, em óleo sobre tela, pelo pin-
tor acadêmico Oscar Pereira da Silva em 1922, numa tela chamada
Descobrimento do Brasil, ou Desembarque de Pedro Álvares Cabral
em Porto Seguro em 1500. Tendo sido aluno de outro grande pintor
brasileiro, Victor Meirelles, Oscar Pereira da Silva teve preocupações
semelhantes às de seu mestre, ou seja, construir uma iconografia
da História Nacional. Para percebermos isso, vejamos, na Figura 1,
como Victor Meirelles retratou a Primeira Missa ocorrida no Brasil.
A tela é de 1861 e representa muito mais a intenção do homem do
século 19 na construção da História da pátria do que o que pode ter
se passado naquela primeira missa, ocorrida em 1500.
Perceba que, enquanto a ação é desenrolada pelos portu-
gueses, os indígenas se assombram com o acontecimento, se ad-
miram com a chegada da cruz e do português ao território e os
aceitam pacificamente. Talvez pacificamente até demais.

Figura1 Primeira Missa ocorrida no Brasil.


© Caderno de Referência de Conteúdo 13

No século 19, ainda veremos pelo menos mais dois exem-


plos de como a arte produziu o imaginário a partir de seus traços
em relação ao indígena, com a tela Moema (Figura 2), também de
Victor Meirelles, de 1866, e O Último Tamoio (Figura 3), de Rodolfo
Amoedo, de 1883.
Em ambas as obras, o mito do Bom selvagem é evocado,
bem como a ideia de identidade e solidariedade entre jesuítas e
indígenas. Vejamos:

Figura 2 Moema.

Figura 3 O último tamoio (Rodolfo Amoedo).

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14 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

Mas será que essas imagens correspondem à história do ín-


dio no Brasil Colonial?
O encontro entre portugueses e indígenas variou de natu-
reza muito rapidamente. O encontro descrito por Pero Vaz de Ca-
minha, em 1500, e a viagem descrita pelo diário da nau Bretoa,
em 1511, mostram situações bem diferentes ao longo dos 10 anos
iniciais da conquista: enquanto Caminha observou a gentileza e a
beleza dos índios – e das índias! – o diário da nau Bretoa dá conta
da leva, para Portugal, de mais de 5.000 toras de pau-brasil, 3.000
peles de onças, 600 araras vivas e 35 escravos índios, oficialmente
os primeiros escravos da nossa história.
Durante as três primeiras décadas que seguiram o desco-
brimento, a exploração portuguesa na América seguiu em grande
parte o modelo do qual a nau Bretoa foi exemplo: expedições sis-
temáticas para retirar do território a maior quantidade de madeira
que fosse possível.
Havia, também, algumas expedições de segurança, principal-
mente depois de percebido o interesse francês nas terras recém-
-descobertas. Esse interesse francês, pessoal, deu impulso a que
o governo português se decidisse pela organização e depois pela
colonização do território, para que a exploração fosse garantida:
assim, deu-se a expedição de Martin Afonso de Souza, em 1530,
que redundou na fundação de São Vicente, em janeiro de 1532, e
na escolha, em março do mesmo ano, pelo modelo de Capitanias
Hereditárias para a colonização do Brasil.
Ainda que somente duas capitanias vingassem, seu modelo
de exploração da terra alterou a economia e o modo de vida dos
envolvidos no processo, era o início da plantation, baseada no tra-
balho escravo e na cultura em larga escala da cana-de-açúcar.
A escolha do açúcar como produto de exploração privilegia-
do nas terras da colônia seguiu a mesma lógica da escolha das capi-
tanias: era a extensão da lógica portuguesa, já aplicada na madeira
e em açores, também ao plano econômico. Como a exploração do
pau-brasil era monopólio da Coroa, a cana-de-açúcar figurava uma
© Caderno de Referência de Conteúdo 15

escolha certeira. Mas certeira do ponto de vista estritamente eco-


nômico, pois a sua cultura abriu a brecha para a ganância do lucro
exagerado, para a devastação das florestas existentes aqui, quer
fosse para plantar, quer fosse para fazer arder as fornalhas. E, além
disso, foi a mola para a exploração em larga escala de indígenas e
para o tráfico de homens e mulheres feitos escravos no continente
africano e trazidos pra cá para animar este sistema com seu traba-
lho compulsório por mais três séculos.
Inicialmente vindos da Guiné, depois de Angola e, por fim,
da Costa da Mina, entre nove e 13 milhões de africanos embarca-
ram em seu continente rumo ao Brasil. Um terço desses africanos
nunca chegaram, morreram na viagem, vítimas de um sem fim de
doenças e problemas que poderia ter a bordo dos navios negrei-
ros, conhecidos como tumbeiros.

O ciclo do ouro
Chegamos ao momento de entender um dos mais pujantes
ciclos econômicos da nossa história, o ciclo do ouro!
Descoberto no final do século 17, a mineração, por todo o
século 18, era a atividade econômica mais rentável praticada na
colônia, rivalizada apenas pelo próprio tráfico de escravos africa-
nos. De fato, durante todo o século calcula-se que, aproximada-
mente, 850 toneladas de ouro foram extraídas das Minas Gerais
brasileiras.
Contudo, de acordo com Caio Prado Júnior, em sua obra For-
mação do Brasil Contemporâneo, "[...] ao contrário do que se dá
na agricultura e em outras atividades da colônia, a mineração foi
submetida desde o início a um regime especial de minuciosa e ri-
gorosa disciplina" (1973, p. 174).
Disciplina esta posta em exercício para que a Coroa pudesse
absorver esta riqueza. Toda área de mineração, assim que desco-
berta, deveria ser anunciada às autoridades locais competentes.
Elas faziam a demarcação da área aurífera e dos lotes de minera-

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16 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

ção que seriam distribuídos aos mineradores, os quais eram co-


nhecidos como datas.
O descobridor da área era o primeiro a escolher a sua data, a
Fazenda Real escolhia em segundo lugar e esta área seria, depois,
vendida em leilão público. Para o demais mineradores presentes,
a repartição era feita por sorte, cabendo a cada um uma data cor-
respondente ao número de escravos que possuía.
O organismo que deveria administrar tudo isso, bem como
dar conta dos problemas envolvendo mineradores, era a Intendên-
cia de Minas.
Todo o ouro extraído das áreas datadas deveria ser levado para
as Casas de Fundição, onde seria fundido em barras cunhadas, quin-
tado, ou seja, subtraído de seu total a parte fixada pela Coroa como
imposto. Por fim, seria certificado, ou seja, entregue ao portador ori-
ginal juntamente com um certificado de sua origem e, é claro, com
um aviso de que deste ouro já havia sido tirado a parte da Coroa.
Como podemos perceber, as Casas de Fundição e as Inten-
dências de Minas eram órgãos bastante centralizadores de poder,
pois deveriam lotear as áreas auríferas, administrar o processo,
vigiar a extração, legislar e julgar incidentes, além de cobrar os im-
postos – o quinto, no caso.
Mas, entre todas as atividades que deveria fazer, a cobrança
do imposto foi no que a Intendência mais se especializou, vejamos:
[...] os mineiros que se arranjassem lá como fosse possível; [afir-
mou Caio Prado], porque em caso contrário havia as derramas, os
confiscos, as masmorras do Limoeiro ou as deportações para a cos-
ta da África (PRADO JÚNIOR, 1973, p. 177).

Como a Coroa fixava a quantia anual que ansiava receber


como quinto, frequentemente a mineração não extraía ouro o su-
ficiente que chegasse a completar a parte da Coroa portuguesa.
Na verdade, Lisboa não era o destino final do ouro, ele apenas pas-
sava por lá rumo à Inglaterra, que, por acordos comerciais, como
o famoso Tratado de Methuen, conseguia vender seus produtos
para Portugal a peso de ouro, literalmente.
© Caderno de Referência de Conteúdo 17

Quando a quantia não era alcançada seguidamente, uma


derrama era anunciada, ou seja, a cobrança, de uma só vez, dos
valores atrasados dos quintos dos anos anteriores. Todavia, essa
cobrança não era feita na Casa de Fundição, sobre o ouro extraído,
mas sim a partir de um senso que indicava os bens em ouro que
os moradores das zonas auríferas possuíam e que os soldados da
Coroa se encarregavam de buscar.
O mote da Inconfidência Mineira foi uma declaração de der-
rama para fevereiro de 1789. Vamos ver isso melhor.

A Inconfidência Mineira
A região de Vila Rica, hoje Ouro Preto, após quase um sé-
culo como área de exploração aurífera, portanto administrada e
vigiada pela Intendência de Minas, tornou-se uma sociedade mais
burocratizada e, portanto, mais urbana. Ourives estabeleciam-se
na cidade, bem como toda uma gente que vivia de oferecer aos
mineiros o restante da base material que, justamente por serem
mineiros, não tinham meios de suprir: comerciantes de várias es-
pécies, mercadores, prestadores de serviços, artistas e poetas.
Além disso, os filhos das classes abastadas, ligadas à administra-
ção da Coroa e estudados em Coimbra ou na França, chegavam por lá,
trazendo consigo as ideias do iluminismo para dentro da zona aurífera.
Assim, a mistura entre o iluminismo, às vezes republicano
de alguns mineiros ilustrados, sua posição hegemônica dentro da
estrutura administrativa colonial e a ameaça da Coroa com mais
um desmando, cobrando deles e dos demais moradores das Minas
pelo ouro não extraído, foi o que forjou a Inconfidência Mineira.
A ideia era aproveitar a derrama para promover a revolução!
De acordo com o historiador inglês Kenneth Maxwell, seria fundada
uma República liberal cuja capital deveria ser São João del Rey. Tomás
Antônio Gonzaga seria o novo presidente, o ferro seria explorado para
o avanço técnico da nação, o distrito diamantino seria liberado, hos-
pitais e universidades seriam criadas e, quem sabe, até a escravidão

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18 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

seria abolida. Pelo menos os planos, vagos, eram esses.


No entanto, tendo vazado a ideia de um levante local, a ad-
ministração colonial suspendeu a derrama, desarticulando o movi-
mento. Depois, os envolvidos começaram a ser acusados e presos,
entre eles, Tomás Antônio Gonzaga e Joaquim José da Silva Xavier,
o Tiradentes. Cláudio Manuel da Costa foi encontrado morto na
Casa dos Contos, tendo, oficialmente, se suicidado.
Malogrado o levante, restava uma lição a ser dada, e coube a Ti-
radentes o papel de representar todos os envolvidos na inconfidência,
de representar a própria inconfidência e sua luta por liberdade.
A única sentença de morte mantida foi a sua, tendo sido en-
forcado e depois esquartejado em 1792. A imagem é bem conhe-
cida: Tiradentes, como um Cristo, sendo sacrificado em nome de
todos os brasileiros (Figura 4). Esse quadro foi feito em 1893 por
Pedro Américo, o mesmo que, cinco anos antes, em 1888, já havia
dado cores patrióticas ao Grito do Ipiranga, como veremos a seguir.

Figura 4 Tiradentes esquartejado.


© Caderno de Referência de Conteúdo 19

O início do século 19 foi tumultuado pelos acontecimentos


que se irradiaram da França, com a Revolução Francesa e com a
ascensão de Napoleão Bonaparte ao poder. E foi a política expan-
sionista francesa, concorrente com a política da Inglaterra, que nas
palavras do historiador David Rabelo colocou Portugal em uma si-
tuação semelhante à do marisco, espremido entre o mar e o ro-
chedo.
Foi nesse contexto que ocorreu o fato que, segundo muitos
historiadores, começou a mudar a face da colônia brasileira, que
foi a vinda da Corte Portuguesa para o Rio de Janeiro.

A vinda da Corte Portuguesa


Enquanto pôde, Portugal pagou à França pela sua neutrali-
dade no conflito europeu, ou seja, pagava à França para não ter
que tomar partido a favor dela e não precisar, assim, romper as
suas alianças comerciais tradicionais com a Inglaterra.
Essa política portuguesa de equilíbrio entre duas potências,
às vezes feita às claras, às vezes nos bastidores, foi analisada por
alguns historiadores como a expressão da sua ineficácia, que cul-
minou com a fuga do Príncipe Regente para a sua colônia do outro
lado do Atlântico e com a invasão de Portugal pelo exército francês.
Mas podemos tentar ver o outro lado dessa moeda: Portugal
não poderia sustentar um conflito aberto com a França, ainda mais
depois de 1795, quando a vizinha Espanha se tornou uma aliada
dos franceses. E por mais que os acordos comerciais com a Ingla-
terra não fossem os mais favoráveis, como o Tratado de Methuen
do início do século, as suas economias eram ainda complementa-
res, e os políticos portugueses envolvidos nas atividades comer-
ciais, em Portugal e no Brasil, sabiam muito bem disso.
Portanto, a política externa portuguesa, oscilante, era, tam-
bém, fruto da sua política interna, espaço no qual grupos políticos
e econômicos defendiam seus interesses próprios.

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20 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

Nesse sentido, a vinda da Corte para o Brasil representou a


manutenção de um acerto que já havia sido a tônica da política
portuguesa durante todo o século 18 e que teve como represen-
tantes homens como D. Luiz da Cunha, que foi diplomata português
em Londres na época do Tratado de Methuen e que frequentava
a refinada Corte Inglesa usando sempre tecidos portugueses para
deixar evidente seu desacordo. Dizia Luiz da Cunha que o tratado
faria os portugueses converterem em terras de vinhas as terras de
pão, precisando, depois, importar comida, além do vestuário.
Por certo, o embarque foi determinado apenas no momen-
to final por três motivos: primeiro porque, tendo a possibilidade
de viajar, o rei devia preferir não o fazer, e por isso devia esperar
um sinal qualquer que lhe desse a segurança necessária para adiar
mais uma vez e por mais tempo a transferência.
Em segundo lugar, porque os franceses não poderiam supor
o embarque, caso contrário ocorreria em Portugal o que já havia
se passado em diversas nações europeias: a coroa sairia de uma
cabeça portuguesa.
Em terceiro lugar, porque a maioria dos próprios portugue-
ses não poderia também supor uma saída como esta, apesar da
tese de que viam sua corte como uma corte itinerante, ir para o
campo é uma coisa, ir para a colônia é outra bem diferente.
Nesse quadro, é possível imaginarmos como ocorreu o em-
barque. Oliveira Lima (2006) narra com detalhes a partida: o caos
no porto, a chuva fina, a lama, as caixas espalhadas; a chegada de
famílias inteiras prontas para o embarque sem ter a devida autori-
zação; a pressa de outras que, descrentes, acabaram por embarcar
levando muito menos do que podiam carregar. Nessa aflição, se-
gundo Lilia Schwarcz (2002), teria sido deixada pra trás as precio-
sidades da Real Biblioteca portuguesa, já encaixotada, acumulada
no cais. A vinda desses livros e manuscritos, que só vieram par-
cialmente, ocorreu entre 1810 e 1811, discretamente, entre uma
invasão e outra de tropas francesas a Portugal.
© Caderno de Referência de Conteúdo 21

Sobre as pessoas que embarcaram, os números são contro-


versos, mas podemos supor que entre 12 e 15 mil pessoas acom-
panharam o Príncipe Regente no 29 de novembro de 1807, e tan-
tas outras mais nos meses posteriores.
Chegando no Brasil, a contrapartida do favor inglês ficou evi-
dente, por meio da proclamação da abertura dos portos para as
nações amigas.
D. João VI tornou-se, com essa viagem, o primeiro monarca
português a pisar na colônia brasileira, e isso teve também as suas
consequências. A fisionomia da colônia se alterou após os 13 anos
de presença da Corte e isso ocorreu em diversos aspectos: na eco-
nomia, na política, na arquitetura, na indústria, no comércio e na
vida social, ao incluir todo um calendário e uma dinâmica da qual
nunca havia participado.
Todas essas alterações no cotidiano citadino brasileiro não
foram aceitas silenciosamente e a figura de Pedro I, residente no
Brasil, passou a significar a esperança de uma saída que fosse uma
ruptura em relação a Portugal, mas sem muitos abalos em relação
à situação que o país já vivia no início de 1822.
Isso quer dizer que o acerto pela Independência não foi o
consenso que veio das ruas pela voz do povo, mas sim dos gabi-
netes conservadores paulistas e cariocas; e que, não sem festa,
encontrou no povo o eco esperado.
O manifesto que começou a dar força às aspirações de D. Pe-
dro foi escrito por José Bonifácio, homem que passou, em seguida,
a comandar o primeiro gabinete organizado por D. Pedro após a
retirada do Brasil das forças portuguesas. Por todo o ano de 1822,
as atitudes de D. Pedro I e do ministério de Bonifácio selaram a se-
paração de Portugal, que culminou com a declaração de Indepen-
dência no dia sete de setembro e a posterior coroação de D. Pedro
I como Imperador do Brasil, em primeiro de dezembro de 1822.

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22 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

Ao contrário de D. Pedro I, que não foi estudado para ser


rei, seu filho, Pedro de Alcântara, teve a educação necessária para
se tornar um grande monarca, mas nada o poderia preparar para
tornar-se órfão da nação, depois do retorno do pai a Portugal, em
1932.
Como um período chacoalhado por rebeliões, as regências
são associadas a uma ideia de desgoverno, mas talvez o que se
passava então era a manifestação de descontentamentos mui-
to antigos que nunca tinham encontrado oportunidades de vir à
tona, ameaçando, inclusive, a unidade nacional.
A solução cada vez mais aventada para as dificuldades do
governo, principalmente pelos grupos que não estavam fazendo
parte dele, era a maioridade declarada de Pedro II, de modo que
ele não precisasse esperar até os 18 anos para assumir o trono,
apaziguar os conflitos e, é claro, retribuir o apoio ao grupo que o
conduzisse até o poder.
É bastante comum ouvirmos em aulas ou vermos nos livros
que a monarquia no Brasil caiu do galho como uma fruta madu-
ra, ou seja, que não precisou haver um grande abalo para que ela
despencasse. Ainda assim, isso não explica o fim da monarquia,
que podemos contextualizar como tendo três fatores principais: o
abolicionismo, o republicanismo e o militarismo.
Sobre o abolicionismo, a partir do quarto final do século 19
a questão não era mais se haveria abolição, mas quando ela acon-
teceria. Os grupos se dividiam entre os que a desejavam imediata-
mente e os que defendiam uma transição lenta, gradual e, acima
de tudo, segura e indenizada. Entre esse segundo grupo estava o
Barão de Cotegipe, que era presidente do conselho de ministros
e líder do senado quando foi aprovada a lei Saraiva-Cotegipe, que
conhecemos como Lei dos Sexagenários.
A Princesa Isabel, por outro lado, ao assumir a frente no pro-
cesso abolicionista em 1888, fez o oposto de Cotegipe e promoveu
a abolição imediata, terminando oficialmente com a escravidão no
© Caderno de Referência de Conteúdo 23

Brasil. Dizem, então, que Cotegipe, ao ir cumprimentar a Princesa


pela assinatura da lei, teria dito: "vossa majestade redimiu uma
raça, mas acaba de perder o trono”.
Com a abolição, portanto, Isabel isolava a monarquia de
grande parte de seus aliados: os monarquistas abolicionistas e es-
cravistas, que se convertiam, em grande parte por ressentimento,
em republicanos de última hora.
O segundo ponto que precisamos articular pra pensar o iní-
cio da República, depois dos abolicionistas, é o republicanismo. O
primeiro partido republicano a existir oficialmente no Brasil foi o
do Rio de Janeiro, em 1870, quando foi lançado por lá o manifesto
republicano, escrito por Quintino Bocaiúva.
As assinaturas que seguem o manifesto mostram o perfil do
partido: a imensa maioria formada por advogados, médicos, enge-
nheiros, funcionários públicos, professores e negociantes – profis-
sionais liberais com carreiras urbanas interessados numa transição
pacífica da monarquia à república, talvez com a morte do impera-
dor.
Por fim, resta ainda um último elemento para que possamos
montar um quadro contextualizado do fim da monarquia no Brasil:
o militarismo, personificado no que conhecemos como a Questão
Militar.

A Proclamação da República
Uma das proibições aos militares de então era a de se ex-
pressarem publicamente sobre assuntos políticos, e foi exatamen-
te o que o Coronel Antonio de Sena Madureira fez ao defender
publicamente o fim da escravidão e ainda por cima num jornal re-
publicano chamado A Federação.
Do outro lado do país, no Piauí, o militar liberal Coronel
Cunha Matos apurava irregularidades contra um comandante cor-
rupto e passou a sofrer ataques públicos na Câmara pelos con-

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24 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

servadores, acusando-o de covardia na guerra do Paraguai. Cunha


Matos também usou os jornais para se defender e acabou preso
por dois dias, aumentando ainda mais a tensão entre os militares
liberais e os conservadores civis.
Os militares não melhoraram de condições e o descontenta­
mento entre eles era reinante, agravado pelas irregularidades
anunciadas anteriormente, as quais eram praticadas pelo capi-
tão Pedro José de Lima, oficial pertencente aos quadros do Parti-
do Conservador. Surge, assim, uma intensa discussão na Câmara
sobre essas irregularidades, com a presença do próprio ministro
da Guerra no Senado para discutir o assunto. Por esse motivo, os
debates ganharam os quartéis e envolveram chefes militares de
expressão. Diante desses fatos, os militares conscientizaram-se de
sua força como classe, tanto que, em 1887, fundaram, no Rio de
Janeiro, o Clube Militar, com a participação fundamental de Mare-
chal Deodoro e de Benjamin Constant.
Assim, amanheceu o 15 de novembro de 1889. Os milita-
res ocupavam o Campo de Santana, uns sabiam do plano, outros
apenas estavam lá, quando Deodoro, mesmo doente, apareceu,
mas não cumpriu completamente a sua parte: declarou derrubado
o gabinete comandado pelo ministro Ouro Preto, mas não disse
nada sobre a República.
Foi apenas à noite, em sua casa, que Deodoro, na presença
de Constant e de dois membros do Partido Republicano, Quintino
Bocaiúva e Aristides Lobo, finalmente declarou que a República
estava feita. E feita pelos militares!
A república teve como seus dois primeiros presidentes mi-
litares de carreira: o Marechal Deodoro e, em substituição a ele,
Floriano Peixoto, o Marechal de Ferro.
Foi sob o comando de Floriano que as duas primeiras rebe-
liões republicanas tiveram fim, a Revolta da Armada e a Revolução
Federalista do Rio Grande do Sul, ao fim da qual Floriano mandou
colocar o próprio nome na cidade insurrecta, como emblema da
© Caderno de Referência de Conteúdo 25

vitória. E assim a antiga Nossa Senhora do Desterro passou a ser


conhecida como Florianópolis.
Depois disso, enquanto no Rio de Janeiro o primeiro governo
civil se ajeitava no poder, no sertão da Bahia um povoado crescia
ao redor da figura emblemática de Antônio Conselheiro. Era o Ar-
raial de Belo Monte, mais tarde conhecido como Canudos.
Arraial de Belo Monte era nada mais que um aglomerado
de casebres pobres como tantos outros, mas com algumas dife-
renças: o arraial já era umas das maiores cidades no interior da
Bahia, havia estabelecido comércio, inclusive fora do país, a posse
da terra era comunal e, por fim, configurava uma alternativa para
os miseráveis da região. Mas não era só: na república que nascia,
Conselheiro era monarquista, um monarquista que assombrava o
governo da província.
O estopim para a primeira tentativa de invasão do exército
a Canudos foi uma banalidade levada às últimas consequências:
um carregamento de madeira que viria de Juazeiro, já pago, não
foi entregue. Conselheiro quis mandar seus homens atrás do co-
merciante para pegar a madeira. O juiz de Juazeiro, que já não ia
às boas com o povo do Arraial, pediu ajuda ao governador contra
o que considerava um saque à cidade e, sem esperar que o saque
ocorresse, resolveu por bem invadir o arraial.
Nem tudo saiu como o planejado e cada derrota militar ocor-
rida nesse "fim de mundo” ganhava repercussão nacional e ares
de desafio monarquista à República, o que justificava outro ataque
maior ainda. Foi o que aconteceu por quatro vezes: a última ex-
pedição contando com mais de quatro mil homens divididos em
duas colunas de ataque, com 700 toneladas de munição, metra-
lhadoras, fuzis, canhões de guerra e um imenso canhão chamado
de matadeira, tão pesado que era preciso 20 juntas de boi para
arrastá-lo pelo sertão.
Talvez nunca soubéssemos do massacre se na última expe-
dição não estivesse presente um correspondente de guerra do

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26 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

jornal estado de São Paulo, Euclides da Cunha. Ele transformou


esse episódio em objeto de seu épico "livro vingador”, Os Ser-
tões, e Canudos na Tróia de taipa dos jagunços, como ele mesmo
escreveu.
A estabilização da República como modo de governo ainda teria
vários percalços e também criaria seus símbolos. Um desses símbolos,
talvez o mais emblemático deles, teria sido as reformas pelas quais a
então capital do país, o Rio de Janeiro, passou nos primeiros anos do
século 20, sob a presidência de Rodrigues Alves, já eleito com o apoio
de São Paulo e Minas, e com a participação do então prefeito do Rio,
Francisco Pereira Passos com as suas Picaretas do Progresso.
A reforma urbana do Rio de Janeiro foi feita em tempo recor-
de: em praticamente um ano, mais de 600 imóveis foram demo-
lidos e deram lugar a um boulevard de inspiração francesa, com
33 metros de largura e dois quilômetros de extensão, espaço sufi-
ciente para quem pudesse flanar ao redor das novas boutiques e
cafeterias. Além disso, a avenida Beira-mar foi construída, dando
consciência aos moradores da cidade de como é belo o seu espaço.
No entanto, o valor dos imóveis, somado à pressão habita-
cional dos antigos moradores dos cortiços que foram demolidos no
centro, disparou ao redor dessas reformas. Assim, vemos a marcha
para os morros como a única saída possível aos cariocas que não
podiam passear pelas novas avenidas.
Mas as reformas não pararam por ai: o plano de moderniza-
ção do Rio contava com um aspecto também sanitarista, principal-
mente contra a febre-amarela, a peste bubônica e a varíola, contra
a qual, por fim, foi instituída a vacinação obrigatória. Essa ideia era
proposta pelo médico Oswaldo Cruz, mas o modo como se davam
essas vacinações e o medo dessas injeções envenenadas foi razão
para o levante popular de novembro de 1904, a Revolta da Vacina.
Ao final da década de 1920, nos bastidores do jogo político,
falava-se, cada vez mais, em golpe e revolução, principalmente no
© Caderno de Referência de Conteúdo 27

Rio Grande do Sul, um Estado acostumado com agitações desde o


início da República.
A Revolução começou no dia três de outubro de 1930 e, dois
dias depois, apenas São Paulo, Bahia e o Pará não haviam aderido
à causa. O Rio de Janeiro era a grande dúvida, mas no dia 24 a solu-
ção parecia se desenhar. Uma junta de militares depôs Washington
Luis e chegou a se insinuar no poder. Foi a vez de Vargas marcar
posição e avisar aos militares que o governo provisório teria ele
mesmo como chefe.
A Era Vargas
Vargas ocuparia o poder como presidente provisório até
1934, depois, como presidente constitucional, até 1937 e como
ditador no Estado Novo até 1945. Deposto, retornaria em 1951
pelo voto direto e ficaria até 1954, quando, segundo ele mesmo,
saiu da vida para entrar na história.
Com esse breve passeio pelo passado, pudemos perceber
que estudar a nossa história não é simplesmente fazer a genea-
logia das grandes tradições e dos grandes nomes. Ao contrário, é
tomar consciência da longa duração das questões mais atuais da
nossa sociedade.

Glossário de Conceitos
O Glossário permite a você uma consulta rápida e precisa das
definições conceituais, possibilitando-lhe um bom domínio dos
termos técnico-científicos utilizados na área de conhecimento dos
temas tratados em Fundamentos e Métodos do Ensino de História
e Geografia I. Veja a seguir a definição dos principais conceitos:

1) Bioma: é um conjunto de ecossistemas com característi-


cas homogêneas, por exemplo, as florestas, os polos ou
as áreas temperadas.
2) Ecoalfabetização: é um modelo de educação baseado
nos princípios de sustentabilidade.

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28 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

3) Sustentabilidade: pode ser entendida como a capacida-


de de desenvolvimento atual sem prejuízos para o de-
senvolvimento das gerações futuras. Ela reúne um gran-
de leque de atitudes, muitas das quais serão estudadas
nesta obra.
4) Ufanismo: é a atitude de atribuir a si mesmo coisas glo-
riosas. No Brasil, o termo ganhou popularidade com a
obra de Afonso Celso, à qual fazemos alusão nesta obra.

Esquema dos Conceitos-chave


Para que você tenha uma visão geral dos conceitos mais
importantes deste estudo, apresentamos, a seguir (Figura 1), um
Esquema dos Conceitos-chave. O mais aconselhável é que você
mesmo faça o seu esquema de conceitos-chave ou até mesmo o
seu mapa mental. Esse exercício é uma forma de você construir o
seu conhecimento, ressignificando as informações a partir de suas
próprias percepções.
É importante ressaltar que o propósito desse Esquema dos
Conceitos-chave é representar, de maneira gráfica, as relações en-
tre os conceitos por meio de palavras-chave, partindo dos mais
complexos para os mais simples. Esse recurso pode auxiliar você
na ordenação e na sequenciação hierarquizada dos conteúdos de
ensino.
Com base na teoria de aprendizagem significativa, entende-se
que, por meio da organização das ideias e dos princípios em esque-
mas e mapas mentais, o indivíduo pode construir o seu conhecimen-
to de maneira mais produtiva e obter, assim, ganhos pedagógicos
significativos no seu processo de ensino e aprendizagem.
Aplicado a diversas áreas do ensino e da aprendizagem es-
colar (tais como planejamentos de currículo, sistemas e pesquisas
em Educação), o Esquema dos Conceitos-chave baseia-se, ainda,
na ideia fundamental da Psicologia Cognitiva de Ausubel, que es-
tabelece que a aprendizagem ocorre pela assimilação de novos
conceitos e de proposições na estrutura cognitiva do aluno. Assim,
© Caderno de Referência de Conteúdo 29

novas ideias e informações são aprendidas, uma vez que existem


pontos de ancoragem. 
Tem-se de destacar que "aprendizagem" não significa, ape-
nas, realizar acréscimos na estrutura cognitiva do aluno; é preci-
so, sobretudo, estabelecer modificações para que ela se configure
como uma aprendizagem significativa. Para isso, é importante con-
siderar as entradas de conhecimento e organizar bem os materiais
de aprendizagem. Além disso, as novas ideias e os novos concei-
tos devem ser potencialmente significativos para o aluno, uma vez
que, ao fixar esses conceitos nas suas já existentes estruturas cog-
nitivas, outros serão também relembrados.
Nessa perspectiva, partindo-se do pressuposto de que é você
o principal agente da construção do próprio conhecimento, por
meio de sua predisposição afetiva e de suas motivações internas
e externas, o Esquema dos Conceitos-chave tem por objetivo tor-
nar significativa a sua aprendizagem, transformando o seu conhe-
cimento sistematizado em conteúdo curricular, ou seja, estabele-
cendo uma relação entre aquilo que você acabou de conhecer com
o que já fazia parte do seu conhecimento de mundo (adaptado do
site disponível em: <http://penta2.ufrgs.br/edutools/mapascon-
ceituais/utilizamapasconceituais.html>. Acesso em: 11 jan. 2012).

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30 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

Figura 1 Esquema dos Conceitos-chave de Fundamentos e Métodos do Ensino da História


e da Geografia I.
© Caderno de Referência de Conteúdo 31

Como pode observar, esse Esquema oferece a você, como


dissemos anteriormente, uma visão geral dos conceitos mais im-
portantes deste estudo. Ao segui-lo, será possível transitar entre
os principais conceitos e descobrir o caminho para construir o seu
processo de ensino-aprendizagem.
O Esquema dos Conceitos-chave é mais um dos recursos de
aprendizagem que vem se somar àqueles disponíveis no ambien-
te virtual, por meio de suas ferramentas interativas, bem como
àqueles relacionados às atividades didático-pedagógicas realiza-
das presencialmente no polo. Lembre-se de que você, aluno EaD,
deve valer-se da sua autonomia na construção de seu próprio co-
nhecimento.

Questões Autoavaliativas
No final de cada unidade, você encontrará algumas questões
autoavaliativas sobre os conteúdos ali tratados, as quais podem ser
de múltipla escolha, abertas objetivas ou abertas dissertativas.
Responder, discutir e comentar essas questões, bem como
relacioná-las com a prática do ensino de Pedagogia pode ser uma
forma de você avaliar o seu conhecimento. Assim, mediante a re-
solução de questões pertinentes ao assunto tratado, você estará se
preparando para a avaliação final, que será dissertativa. Além disso,
essa é uma maneira privilegiada de você testar seus conhecimentos
e adquirir uma formação sólida para a sua prática profissional.

As questões de múltipla escolha são as que têm como respos-


ta apenas uma alternativa correta. Por sua vez, entendem-se por
questões abertas objetivas as que se referem aos conteúdos
matemáticos ou àqueles que exigem uma resposta determinada,
inalterada. Já as questões abertas dissertativas obtêm por res-
posta uma interpretação pessoal sobre o tema tratado; por isso,
normalmente, não há nada relacionado a elas no item Gabarito.
Você pode comentar suas respostas com o seu tutor ou com seus
colegas de turma.

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32 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

Bibliografia Básica
É fundamental que você use a Bibliografia Básica em seus
estudos, mas não se prenda só a ela. Consulte, também, as biblio-
grafias complementares.

Figuras (ilustrações, quadros...)


Neste material instrucional, as ilustrações fazem parte inte-
grante dos conteúdos, ou seja, elas não são meramente ilustra-
tivas, pois esquematizam e resumem conteúdos explicitados no
texto. Não deixe de observar a relação dessas figuras com os con-
teúdos da obra, pois relacionar aquilo que está no campo visual
com o conceitual faz parte de uma boa formação intelectual.

Dicas (motivacionais)
O estudo desta obra convida você a olhar, de forma mais apu-
rada, a Educação como processo de emancipação do ser humano.
É importante que você se atente às explicações teóricas, práticas
e científicas que estão presentes nos meios de comunicação, bem
como partilhe suas descobertas com seus colegas, pois, ao com-
partilhar com outras pessoas aquilo que você observa, permite-se
descobrir algo que ainda não se conhece, aprendendo a ver e a
notar o que não havia sido percebido antes. Observar é, portanto,
uma capacidade que nos impele à maturidade.
Você, como aluno dos Cursos de Graduação na modalidade
EaD, necessita de uma formação conceitual sólida e consistente.
Para isso, você contará com a ajuda do tutor a distância, do tutor
presencial e, sobretudo, da interação com seus colegas. Sugeri-
mos, pois, que organize bem o seu tempo e realize as atividades
nas datas estipuladas.
É importante, ainda, que você anote as suas reflexões em seu
caderno ou no Bloco de Anotações, pois, no futuro, elas poderão ser
utilizadas na elaboração de sua monografia ou de produções científicas.
© Caderno de Referência de Conteúdo 33

Leia os livros da bibliografia indicada, para que você amplie


seus horizontes teóricos. Coteje-os com o material didático, discuta
a unidade com seus colegas e com o tutor e assista às videoaulas.
No final de cada unidade, você encontrará algumas questões au-
toavaliativas, que são importantes para a sua análise sobre os conteúdos
desenvolvidos e para saber se estes foram significativos para sua forma-
ção. Indague, reflita, conteste e construa resenhas, pois esses procedi-
mentos serão importantes para o seu amadurecimento intelectual.
Lembre-se de que o segredo do sucesso em um curso na
modalidade a distância é participar, ou seja, interagir, procurando
sempre cooperar e colaborar com seus colegas e tutores.
Caso precise de auxílio sobre algum assunto relacionado a
esta obra, entre em contato com seu tutor. Ele estará pronto para
ajudar você.

3. referências bibliográficas
LEGAN, L. A escola sustentável: ecoalfabetizando pelo ambiente. São Paulo: Imprensa
Oficial/Pirenópolis, GO: Ecocentro IPEC, 2007.
LIMA, O. Dom João VI no Brasil. São Paulo: Topbooks, 2006.
PRADO JÚNIOR, C. A formação do Brasil Contemporâneo. São Paulo: Brasiliense, 1977.
SCHWARCZ, L. M. A longa viagem da biblioteca dos reis. São Paulo: Cia das Letras, 2002.

4. E-REFERÊNCIAS
Lista de figuras
Figura 1 Primeira Missa ocorrida no Brasil. Disponível em: <http://peregrinacultural.
wordpress.com/2009/04/26/estampa-da-primeira-missa-poema-de-murilo-araujo/>.
Acesso em: 15 mar. 2012.
Figura 2 Moema. Disponível em: <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/
commons/5/56/Victor_Meirelles_-_Moema.jpg>. Acesso em: 2 nov. 2011.
Figura 3 O último tamoio (Rodolfo Amoedo). Disponível em: <http://www.overmundo.
com.br/banco/aimbere-tamoio-1567>. Acesso em: 15 mar. 2012.
Figura 4 Tiradentes esquartejado. Disponível em: <http://www.galeria.cluny.com.br/v/
Artes+Plasticas/Pintores+Brasileiros/Pedro+Americo/02+Tiradentes+Esquartejado.jpg.
html>. Acesso em: 15 mar. 2012.

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EAD
O Ensino de História
e Geografia nas Séries
Iniciais do Ensino
Fundamental de
Nove Anos 1
1. OBJETIVOS
• Apresentar o ensino de História e Geografia no contexto
das séries iniciais do Ensino Fundamental de nove anos.
• Explicar e justificar algumas das possibilidades de ensino
de História e Geografia para as séries iniciais do Ensino
Fundamental.
• Identificar e desenvolver os conceitos de espaço, tempo
e identidade para o ensino de História e Geografia nas sé-
ries iniciais do Ensino Fundamental.

2. CONTEÚDOS
• Breve história das disciplinas de História e Geografia.
• A teoria de Piaget e o ensino de História e Geografia.
• A construção das noções de espaço, tempo e identidade
nas séries iniciais do Ensino Fundamental.
36 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

3. ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE


Antes de iniciar os estudos desta unidade, é importante que
você leia as orientações a seguir:
1) Você pode acessar documentos e publicações oficiais
com orientações para a inclusão de crianças de seis anos
no Ensino Fundamental de nove anos pela internet (as-
sunto tratado no Tópico 7). Para isso, acesse o seguinte
endereço eletrônico: <http://portal.mec.gov.br>. Aces-
so em: 24 set. 2011. Em seguida, clique em Publicações!
2) É importante, para uma melhor compreensão desta uni-
dade, conhecer um pouco sobre a biografia de alguns
teóricos cujos pensamentos norteiam este estudo.

Antonio Carlos Castrogiovanni


Professor de Geografia e Turismo da PUC do Rio Grande do Sul e autor de obras
como Turismo urbano, Um outro turismo é possível e Geografia, este último em
coautoria.

Conde Afonso Celso, ou melhor, Afonso Celso de Assis


Figueiredo Junior (1860-1938)
Foi um monarquista ferrenho, advogado precoce, jornalista e professor de Eco-
nomia por formação e historiador por diletantismo. Escreveu diversas obras his-
tóricas, entre elas Por que me ufano de meu país, livro que exacerba as maravi-
lhas brasileiras, que serviu de esteio para o ensino de uma história nacionalista e
que tornou célebre a frase “em matéria de amor à pátria, como em carinho filial,
que se peque por excesso, nunca por deficiência”.

Circe Maria Fernandes Bittencourt


Historiadora, professora da Faculdade de Educação da USP em cursos como
História das Disciplinas Escolares e História dos Currículos. É autora, entre ou-
tras obras, de Ensino de História: fundamentos e métodos.

Jean Piaget (1896-1980)


Pesquisador do desenvolvimento cognitivo, sua teoria ficou conhecida como
Epistemologia Genética a partir dos conceitos de equilíbrio, assimilação e aco-
modação. Em seus estudos, procurou observar os estágios do desenvolvimento
humano e a maneira de construir conhecimento pelos sujeitos, delimitando qua-
tro etapas: sensório-motor (de zero a dois anos), pré-operatório (de dois a sete
anos), operatório-concreto (de sete a 11 ou 12 anos) e operatório-formal (de 11
ou 12 anos em diante), sustentando-a. É autor de uma vasta bibliografia, com
destaque para A construção do real na criança, A noção do tempo na criança e
A psicologia da criança.
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Vygotsky (1896-1934)
Psicólogo, pesquisador do desenvolvimento intelectual da criança, considerou as
interações com o meio social e cultural como fundamentais a esse desenvolvi-
mento. É autor de A formação social da mente e Linguagem, desenvolvimento e
aprendizagem, entre outras obras.

Celso Antunes
Geógrafo brasileiro, especialista em educação, é autor da coleção Como bem
ensinar, e dos livros A construção do afeto, A teoria das inteligências libertado-
ras, Marinheiros e professores (I e II), Antiguidades Modernas e Viagens ao redor
de uma sala de aula, entre outras obras.

Rosângela Almeida e Elza Passini


Geógrafas e professoras de Geografia com experiências que somam mais de
trinta anos, são autoras, em conjunto, da obra O espaço geográfico: ensino e
representação.

Marcelo Martinelli
Professor do Departamento de Geografia da USP, livre-docente em Cartografia
Temática. É autor de Mapas da Geografia, Cartografia Temática, entre outras
obras.

Hubert Hannoun
Pedagogo marxista, é autor de Educação: certezas e apostas.

4. INTRODUÇÃO À UNIDADE
Olá! Seja bem-vindo(a) ao estudo de Fundamentos e Méto-
dos do Ensino da História e da Geografia I! Esperamos que esta
obra lhe ofereça prazer em aprender e vontade de ensinar!
A atual concepção de uma formação generalista na pedago-
gia somada à exigência de trabalho com conteúdos de disciplinas
específicas, como Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, Histó-
ria e Geografia, colocam os pedagogos em uma situação paradoxal
na carreira docente: ter uma formação generalista e ter de traba-
lhar com conteúdos específicos.
Pensando nesse perfil, esta obra foi produzida com a finali-
dade de contribuir para a sua formação enquanto profissional da
educação, ou seja, enquanto pedagogo. Para tanto, este material

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não será apenas um componente curricular, mas também uma obra de
consulta, servindo como parâmetro para seu trabalho com o ensino de
História e Geografia nos anos iniciais do Ensino Fundamental de nove
anos, ou seja, do primeiro ao quinto ano escolar.
Acreditamos numa educação que conceba a criança como um ser
integral e protagonista de sua ação, não apenas como um braço que
aprende habilidades de escrita. E é pensando nessa criança que começa-
mos com a seguinte e simples pergunta:
Como realizar uma boa aula de História e Geografia?
A resposta a essa pergunta depende, em primeiro lugar, do que
chamamos de uma boa aula, e aqui começamos nossa reflexão sobre as
diferentes concepções de educação. Existem escolas que entendem uma
boa aula como aquela que gera silêncio na turma, existem boas aulas que
são medidas pela quantidade de palavras escritas nas lousas ou nos ca-
dernos dos alunos, e existem, ainda, aquelas boas aulas que são medidas
pelas notas tiradas pelos alunos nas provas, as quais são elaboradas pelos
mesmos professores que deram as aulas.
Mas essas são mesmo boas aulas? Para o nosso trabalho nesta obra,
vamos aceitar que uma boa aula é aquela em que o aluno aprendeu o que
o professor, conscientemente, planejou ensinar. Seja em silêncio ou com
barulho, em fileiras ou em grupos, em textos ou desenhos, em reflexões,
experimentos ou relatos, na sala de aula, no pátio ou no parque, imedia-
tamente ou assincronamente.
De maneira ainda bastante introdutória, nós podemos pensar em
cinco atitudes básicas que um professor faz para que sua aula seja uma
boa aula, em qualquer disciplina.
Vamos ver cada uma delas?
1) O professor deve saber selecionar os conteúdos com os quais
deverá trabalhar ao longo do ano e deve dominá-los concei-
tualmente.
2) O professor deve compreender a ideologia, a teoria e a meto-
dologia da construção desses conteúdos que selecionou.

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3) O professor deve refletir sobre como seus alunos apren-


dem de modo geral e como inserir esses conteúdos se-
lecionados no universo de possibilidades de aprendiza-
gem dos alunos nessa etapa escolar, de modo específico.
4) O professor deve, então, preparar a aula previamente,
com base na missão da escola, no projeto pedagógico,
no plano de ensino da disciplina e no contexto no qual
ele e a disciplina estão inseridos naquela turma, levando
ainda em conta o tempo, a extensão do conteúdo sele-
cionado, o público-alvo, as condições da escola naquele
momento e as estratégias de ensino que serão emprega-
das, entre outras variáveis.
5) O professor deve dar a aula, ou melhor, dar-se na aula!
Dessa pequena lista, percebemos que o primeiro embaraço
com o qual nos deparamos como professores é o de dominar os
conteúdos e saber selecioná-los. No atual modelo de educação de
formação generalista, de fato, não é raro o professor se deparar
com a necessidade de trabalhar com conteúdos que não conhece
apropriadamente.
Para desembaraçar este ponto, a nossa obra traz uma sele-
ção de temas de estudo que incluem os conteúdos que as séries
iniciais exigem, de modo que, ao fim do seu estudo, você domi-
nará, conceitualmente, esses conteúdos mínimos. Dito de outra
maneira: sem conhecer os conteúdos das disciplinas, não há como
ensiná-los!
Continuando, compreender a ideologia, a teoria e a meto-
dologia da construção dos saberes nos permite contextualizar sua
produção, perceber as influências recíprocas que eles estabelecem
com outros conteúdos e com as maneiras de se ensinar. Em nos-
sa obra, essa articulação dos saberes com seus lugares de origem
será feita ao longo da apresentação dos conteúdos, de modo a
aproximá-los das suas condições de produção como conhecimen-
tos acadêmicos específicos.
O terceiro item da nossa lista, compreender como um alu-
no aprende, é parte da sua jornada na graduação em Pedagogia,

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40 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

estudando Didática, Alfabetização, Psicologia, Filosofia, História e


Sociologia da Educação. Especificamente sobre as disciplinas de
História e Geografia, vamos abordar, ainda nesta unidade, as pos-
sibilidades do seu estudo nas séries iniciais.
Já a preparação da aula, desde o Plano de Ensino até cada aula
específica, geralmente é feita em condições precárias e em tempo
recorde, variando conforme as condições de trabalho encontradas
de escola para escola, de ano para ano. Mas, ainda que dependa das
condições de trabalho, é importante que você consiga se organizar
para aproveitar esse tempo da melhor maneira possível, tendo seus
próprios livros básicos, acesso a uma biblioteca e à internet, além
de tempo livre para o exercício do ócio criativo, ou seja, tempo para
pensar, refletir, ler, visitar exposições e parques, ouvir música, assis-
tir a filmes e a documentários. Numa palavra: ilustrar-se!
Por fim, sobre o último ponto, dar-se na aula, não há curso
que o habilite, disciplina que o ensine, conteúdo que o demonstre
ou estratégia que o possibilite. Dar-se na aula é a atitude do bom
professor, é a atitude de estar na sala de aula de corpo e mente,
espírito e coração, todos inteiros, entregues e abertos. Este último
ponto é aquele diferencial sem nome que separará os professores
que trazemos na memória afetiva de todos os outros que perde-
ram o rosto, a voz e os conteúdos nas nossas lembranças escolares.
Como escreveu o Professor Antonio Carlos Castrogiovanni:
Despertar e manter a curiosidade dos alunos deve ser sempre a
primeira tarefa da escola e um desafio constante para os professo-
res cujo trabalho é prazeroso, mas os resultados nem sempre são
imediatos. A maior vitória do professor é a vitória interna, aquela
de alcançar a satisfação em ser professor no dia-a-dia (2007, p. 46).

Depois dessa síntese inicial sobre uma boa aula, feita para
chamar a sua atenção para a nossa obra e lhe mostrar a orienta-
ção que seguiremos, vamos estudar, rapidamente, a trajetória das
disciplinas de História e Geografia nas escolas brasileiras ao longo
do século 20.
Vamos lá?
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5. BREVE HISTÓRIA DO ENSINO DA HISTÓRIA E GEO-


GRAFIA
Você se recorda das suas aulas de História e Geografia na
escola? Em História, lembro-me do desenho das caravelas, das ca-
pitanias hereditárias, dos desenhos dos escravos acorrentados, da
cana-de-açúcar, dos índios e do Tiradentes esquartejado, com sua
barba longa, a cabeça tombada para um lado, as pernas e braços
quebrados, inclusive com uns ossos aparecendo!
Já em Geografia, recordo-me do caderno de desenho de ma-
pas, com o mapa do Brasil dividido em Estados, cada um pintado
de uma cor, com as veias dos rios bem caprichadas, pintadas com
canetinha azul e o Espigão Mestre e a Serra do Mar pintados com
giz marrom. Lembro-me da nossa cara pintada como um índio an-
tes das férias (no primeiro semestre) e dos desfiles com banda, ba-
liza e estandarte depois das férias, comemorando o dia da Pátria.
As suas lembranças podem ser parecidas com essas caso te-
nha frequentado a escola primária até meados da década de 1980,
quando a História e a Geografia voltaram a se firmar como discipli-
nas isoladas nos currículos escolares. Antes disso, os seus conteú-
dos oscilaram entre a Educação Moral e Cívica, Estudos Sociais e
OSPB (Organização Social e Política Brasileira).
A Educação Moral e Cívica apareceu nos currículos escolares
no início do século passado, como comprova o conhecido livro de
Conde Afonso Celso, Porque me ufano de meu país, considerado
um marco do patriotismo histórico-geográfico. Nessa obra, Afon-
so Celso resume as razões da grandeza do Brasil, que incluem seu
território capaz de conter toda a população da Terra; as maravi-
lhas das florestas, das cachoeiras e dos rios; as riquezas minerais;
a eterna primavera de seu clima; a ausência de calamidades, como
vulcões, terremotos, ciclones e inundações; a existência de um
povo bom, pacífico, ordeiro, serviçal, sensível, sem preconceitos,
com uma história imaculada de derrotas e uma geografia cheia de
curiosidades naturais para se estudar e amar (Cf. CELSO, 1908).

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42 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

O tom desse ufanismo desmedido seria consolidado nos


anos 1930, com a criação do Ministério da Educação e a instaura-
ção do grande panteão dos heróis nacionais, como assinala a Pro-
fessora Circe Bittencourt:
Os anos 1930 foram marcados pela consolidação de uma memória
histórica nacional e patriótica nas escolas primárias. A partir dessa
época, com a criação do Ministério da Educação, o sistema esco-
lar foi organizando-se de maneira mais centralizada e os conteú-
dos escolares passaram a obedecer a normas mais rígidas e gerais.
Duas características identificaram o ensino de História nas escolas
primárias a partir de então: a sedimentação do culto aos heróis da
Pátria, consolidando Tiradentes como “herói nacional” e os festejos
também nacionais do Sete de Setembro (2009, p. 66-67).

Já na década de 1970, após as duas grandes guerras, foi pu-


blicada a Lei nº 5.692/71, pelo Governo Militar do então presiden-
te Médici, reformando a educação brasileira e tornando obrigató-
ria, pelo seu artigo 7º, a inclusão de Educação Moral e Cívica nas
grades de primeiro e segundo graus.
A existência dessa disciplina carregou de significados, ainda
mais moralistas e ufanistas, os conteúdos de História, e reduziram
a Geografia a uma longa descrição das potencialidades naturais do
país, da hidrografia à mineralogia, das estradas à vocação agrária
desse imenso país.
Na década de 1990, com a publicação da atual LDB e a vin-
da à tona dos Parâmetros Curriculares Nacionais, tanto a História
quanto a Geografia recuperaram seus espaços críticos de produção
e difusão do saber, mas ainda não se afastaram substancialmente
do modelo ufanista de ensino, seja pelo pouco tempo que nos se-
para da década de 1970, seja porque a influência daquele ensino
em nossa formação é bem maior do que gostaríamos de acreditar.
Como você pode perceber, o ensino de História e Geografia,
ao longo do século 20, compõe um retrato em cores vivas das con-
dições sociais e políticas que o país experimentava: do ufanismo
cívico do início do século representando a consolidação da Repú-
blica, passando pelo dogmatismo enciclopédico próprio da meta-
de do século, pela ordem travestida de patriotismo dos anos 1970,
© U1 – O Ensino de História e Geografia nas Séries Iniciais do Ensino Fundamental de Nove Anos 43

até a abertura democrática dos anos 1980, representada pelas di-


versas perspectivas de ensino que surgiram a partir de então.
O lugar da História e da Geografia nos currículos, portanto,
não é exatamente consagrado e, apesar de estarmos no século 21,
a História e a Geografia ufanista não são resquícios de um passado
distante, daí a importância de aprendermos a selecionar os con-
teúdos de modo a não apenas repetir os slogans modernistas de
grandeza e ordem que aprendemos na escola.

6. AS ORIENTAÇÕES DOS PCNS DE HISTÓRIA E GEO-


GRAFIA
Como acabamos de ver, antes dos Parâmetros Curriculares
Nacionais, vigoraram os estudos de Educação Moral e Cívica, nos
quais, muitas vezes, estavam fundidas as disciplinas de História e
Geografia. O estudo em Educação Moral e Cívica estava baseado
em círculos concêntricos fundamentados nos níveis de desenvolvi-
mento psicológico do aluno: do concreto ao abstrato; do próximo
ao distante.
A despeito do reforço trazido pela teoria piagetiana ao mo-
delo de círculos concêntricos, a hierarquização e, principalmente,
a mistura dos componentes de História e Geografia esvaziavam
ambas as disciplinas, resultando num ensino que tratava apenas
das relações entre a família e a comunidade e a escola e a comu-
nidade e entre os sujeitos que as compõem.
Dentro dessas relações, figuravam centrais as ideias de nor-
malidade, de comemorações dos dias cívicos, como o aniversário
da cidade, a independência do país e a proclamação da República,
que ocupavam, em preparações e ensaios, praticamente um terço
do calendário escolar; e, em menor escala, os dias do índio, da
árvore e da páscoa, entre outros “dias de”, que ocupavam outro
terço do tempo escolar disponível.

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44 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

Em que pese a publicação dos Parâmetros Curriculares Na-


cionais e as alterações nos espíritos e nos currículos, somos filhos
do tempo que narramos anteriormente, de modo que não tivemos
uma identidade criada, enquanto alunos, que valorizasse adequa-
damente os conhecimentos históricos e geográficos, mas apenas
os desfiles em datas cívicas, as carinhas pintadas de índio ou coe-
lho, as árvores plantadas e os hinos cantados, enfileirados, nos pá-
tios das escolas.
Criticar esse modelo de ensino pode parecer falta de civilida-
de ou um modernismo infundado, mas uma leitura nos PCNs nos
mostra que não: antes de mais nada, porque as datas cívicas ainda
estão presentes, mas com tentativas de abordagens contextualiza-
das; e, depois, porque os círculos concêntricos do ensino tradicio-
nal também estão presentes, evidenciados pelos Eixos Temáticos
dos Parâmetros Curriculares de História, por exemplo.
Assim, acreditamos que os problemas da educação não fo-
ram resolvidos pelos Parâmetros Curriculares Nacionais, mas de-
mos um passo importante em direção à construção de uma cida-
dania que ultrapasse a ideia do Brasil: ame-o ou deixe-o, ou seja,
a ideia de um patriotismo de hinos, nomes e datas, mas esvaziado
da conscientização de direitos e deveres, da noção de responsabi-
lidade social e de responsabilidade ambiental.
Uma das importantes inovações para o ensino de História
e Geografia, afirmada pelos Parâmetros Curriculares Nacionais,
foi a decisão de que os princípios conceituais fundamentais e os
conteúdos básicos dessas disciplinas passassem a integrar os cur-
rículos a partir das séries iniciais do Ensino Fundamental. Especifi-
camente sobre os conteúdos de História, a Professora Circe Bitten-
court assim enfatiza:
Existe a preocupação de introduzir noções e conceitos históricos a
partir dessa fase escolar, os quais serão progressivamente traba-
lhados ao longo de todo o ensino fundamental e médio. Os PCN de
História, os quais de certa forma consolidam essa tendência, tem
como conceitos básicos a cultura, a organização social e do traba-
lho e noções de tempo/espaço históricos, a serem introduzidos a
partir do processo de alfabetização (2009, p. 113).
© U1 – O Ensino de História e Geografia nas Séries Iniciais do Ensino Fundamental de Nove Anos 45

Além disso, os conteúdos de História e Geografia estão or-


ganizados nos PCNs a partir de Eixos Temáticos que delimitam o
modo de trabalho, em substituição ao modelo dos Estudos Sociais
que vigorou nas décadas de 1970 e 1980, fundado na figura dos
heróis nacionais atemporais, reafirmados nas datas cívicas, desco-
nectados de praticamente todos os aspectos da vida dos alunos.
Assim, o Eixo Temático para o trabalho com História no pri-
meiro ciclo do Ensino Fundamental é História Local e Cotidiano.
Para a Geografia, a proposta dos PCNs é o estudo a partir da Pai-
sagem Local.
Os Eixos Temáticos dos PCNs pressupõem a organização dos
conteúdos de modo que atendam ao seu pressuposto – caso con-
trário, os conteúdos não estariam organizados dentro dos eixos,
mas apenas em círculos concêntricos ou cronologicamente. Isso
quer dizer que, ao selecionar os conteúdos de História e Geografia,
o professor estará criando unidades que sejam coerentes com a
proposta de trabalho, com a História Local e com o Cotidiano do
aluno, em História, e com a Paisagem Local, em Geografia.

7. ENSINAR OU NÃO ENSINAR HISTÓRIA E GEOGRA-


FIA NAS SÉRIES INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL?
O ensino de História e Geografia para crianças de seis, sete e
oito anos não é consensual. Alguns especialistas já disseram que é
muito cedo para que os conceitos abstratos das ciências humanas
sejam corretamente aprendidos, outros já disseram que as únicas
disciplinas que importam nesse período são a língua materna e a
Matemática.
A teoria de Jean Piaget sobre a aprendizagem, em linhas
gerais, indica a existência de estágios de desenvolvimento cogni-
tivo nos quais se expressam as etapas da construção do mundo
pela criança. Assim, limitados pela maturidade biológica dos cére-
bros, as crianças passam por etapas de desenvolvimento que vão
da fase sensório-motora, que perdura do nascimento até os dois

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46 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

anos, aproximadamente, passando pelo estágio de inteligência


simbólica ou pré-operatória, entre os dois e os seis ou sete anos,
depois pelo estágio de inteligência operatória concreta, dos seis
ou sete até os onze ou doze anos, chegando, por fim, no estágio da
inteligência formal, a partir dos 12 anos, aproximadamente.
É exatamente no final do estágio pré-operatório e na sua
transição para o estágio operatório concreto que estão situadas as
crianças que ingressam no primeiro ano do Ensino Fundamental
de nove anos: aos seis anos.
Nessa fase pré-operatória, a criança ainda é marcada por um
egocentrismo intelectual que pode ser observado no que Piaget
chamou de jogo simbólico, no qual a criança transforma o real con-
forme seus desejos e necessidades do momento. Seu pensamento
ainda é dominado por representações simbólicas nas quais as ima-
gens são substitutas do real e não expressam sua conceituação,
contudo está ganhando maior generalidade.
Supondo que as fases do desenvolvimento cognitivo são de-
terminantes ao aprendizado e esquecendo que a experiência do
sujeito bem como a interação com o objeto de aprendizagem são
fundamentais à sua maturação, o pensamento de Piaget já foi uti-
lizado, erroneamente, para justificar que nas séries iniciais do Ensi-
no Fundamental não haveria a necessidade de se ensinar propria-
mente História, porque conceitos abstratos e sociais não estão, e
não seriam assimilados dentro do esquema proposto para a fase
pré-operatória.
Contudo, sabemos que dentro da teoria de Piaget o ensino
de História e Geografia não é apenas possível, como é importante,
porque entre os processos figurativos que devem ser desenvolvi-
dos no final da fase pré-operatória estão os esquemas corporal,
espacial e temporal!
Mas ainda que não se aceite completamente o esquema
de Piaget para justificar o ensino de História e Geografia, pode-
mos observar o que a psicologia social nos informa sobre o nosso
© U1 – O Ensino de História e Geografia nas Séries Iniciais do Ensino Fundamental de Nove Anos 47

desenvolvimento cognitivo. Nesse sentido, Vygotsky considerou


fundamental a dimensão histórica e cultural para o processo de
desenvolvimento de certas funções humanas, entre elas, a com-
preensão de conceitos.
Ora, conceitos são palavras, logo, a partir do desenvolvimen-
to e da apropriação da linguagem, o homem estará pronto para
construir conceitos sociais, socialmente. Para o pensador russo, as
condições sociais, culturais, econômicas e históricas contribuem
para que desenvolvimentos cognitivos aconteçam. Acompanhe:
A psicologia social enfatiza as relações entre o desenvolvimento
cognitivo, o amadurecimento intelectual e as condições sociocul-
turais da vida cotidiana. As inúmeras interferências sociais nesse
processo, sobretudo a organização familiar, a saúde e as condições
econômicas, entre outras contingências, forçam os indivíduos a re-
solver problemas e se 'reequilibrar' de modos diversos em seu pro-
cesso cognitivo e nem sempre dentro da faixa etária prevista. Res-
saltam todos esses autores [da psicologia social] a importância das
situações interindividuais e da aquisição social do conhecimento,
assim como da interferência do grupo de convívio, da afetividade e
dos níveis de socialização (BITTENCOURT, 2009, p. 188).

E isso não é tudo. Nas últimas décadas, além da Pedagogia


e da Psicologia, a Neurologia tem dado importantes contribuições
para a compreensão do processo de aprendizagem e para a eluci-
dação das possibilidades, ou não, do ensino de História e Geografia.
É sabido por todos nós, por exemplo, que o cérebro humano
não se lembra de tudo o que vimos, aprendemos, sentimos, vive-
mos. Existem espécies de “filtros” que auxiliam o cérebro na sele-
ção de informações, assim, esquecemos as que são consideradas
irrelevantes, como o que comemos semana passada ou muito do
que escutamos nas aulas durante o período escolar. Sobre isso, o
Professor Celso Antunes escreveu:
A aprendizagem se produz graças à ação simultânea de uma série
de processos químicos e elétricos. Toda informação que é captada
por nossos sentidos se dirige ao cérebro, mas como esse volume
informativo é colossal e insuportável, o cérebro possui certos “de-
fensores”, que funcionam como obstáculos (filtros) e impedem a
aprendizagem total e completa. [...]

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48 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

O conhecimento neurologicamente disponível sobre esses filtros


permite criar sistemas de aprendizagem que possam dominá-los,
facilitando a aprendizagem. Dessa maneira, um ensino eficiente
acontece mais ou menos como se pudéssemos “seduzir” esses fil-
tros, levando-os a deixar passar as aprendizagens que queremos.
(Esses filtros são conhecidos pela sigla RAD, ou seja, sistema radicu-
lar, amígdala e a intervenção da dopamina).
Para que a informação consiga passar pelo primeiro “R” deve-se
apresentar como novidade que seja, portanto, interessante. Toda
informação considerada “sem graça”, “chata” ou “repetitiva” é ime-
diatamente bloqueada no primeiro filtro. Se, ao contrário, é suges-
tiva, supera essa barreira e passa para o segundo “A”, que é a amíg-
dala, também conhecida por filtro “afetivo” ou “emocional”. Se a
informação que chega é nova e interessante, mas não agradável ou
emocionante, o segundo filtro trata de bloqueá-la.
Vencido o segundo obstáculo, a informação “banha-se” de “D”, do-
pamina, o neurotransmissor do prazer, e é assim assimilada (ANTU-
NES, 2010, p. 15-16).

Assim, podemos concluir que não apenas é possível ensinar Histó-


ria e Geografia para os alunos das séries iniciais do Ensino Fundamental,
como é um aprendizado muito importante para o seu desenvolvimento
cognitivo, abrangendo as noções de tempo e espaço, além de promover
a compreensão e a integração da criança em seu grupo sociocultural.
Esse aprendizado é possibilitado pelo desenvolvimento bioló-
gico e também pela ação do contexto sócio-histórico, é promovido
por estratégias de ensino adequadas e, além disso, também é auxi-
liar ao processo de letramento que ocorre nesse mesmo período.

8. A GEOGRAFIA E O DESENVOLVIMENTO DA ESPA-


CIALIDADE
No tópico anterior, vimos que existem conceitos importantes
a serem desenvolvidos no final da fase pré-operatória, que são o es-
paço, o tempo e o esquema corporal, que inclui a lateralidade. Neste
momento, vamos analisar o conceito de espaço e como o ensino de
Geografia, no primeiro e no segundo ano do Ensino Fundamental,
pode auxiliar você a desenvolver a noção de espaço nas crianças.
Vamos lá?
© U1 – O Ensino de História e Geografia nas Séries Iniciais do Ensino Fundamental de Nove Anos 49

A noção de espaço, nas crianças, desenvolve-se durante a


construção de três diferentes conceitos: o espaço vivido, o espa-
ço percebido e o espaço concebido. De acordo com Rosangela de
Almeida e Elza Passini:
O espaço vivido refere-se ao espaço físico, vivenciado através do
movimento e do deslocamento. É apreendido pelas crianças através
de brincadeiras ou de outras formas ao percorrê-lo, delimitá-lo, ou
organizá-lo segundo seus interesses. Daí a importância de exercícios
rítmicos e psicomotores para que ela explore com o próprio corpo
as dimensões e relações espaciais (ALMEIDA; PASSINI, 2010, p. 26).

Ao representar o próprio corpo, a criança começa, portanto,


a desenvolver a noção de espaço com o espaço vivido. Atividades
como o desenho do próprio corpo, o mapa do corpo, são interes-
santes nessa fase, pois retratam o nível de desenvolvimento em
que a criança está e a necessidade de continuarmos ou não o tra-
balho em busca da construção e da apropriação dos conceitos.
Com papel pardo, é possível contornar, em tamanho real, o
corpo dos alunos e trabalhar as partes, situando-as umas em rela-
ção às outras, com instruções como estas:
1) Pinte de verde o braço direito.
2) Circule de azul o joelho esquerdo.
3) Pinte de vermelho onde está o coração.
4) Desenhe a boca em seu lugar.
Sobre o espaço percebido, as autoras ressaltam:
O espaço percebido não precisa mais ser experimentado fisicamen-
te. Assim, a criança da escola primária é capaz de lembrar-se do
percurso de sua casa até a escola, o que não se dava antes, pois era
necessário percorrê-lo para identificar edifícios, logradouros e ruas
(ALMEIDA; PASSINI, 2010, p. 26).

Já o espaço concebido é a capacidade de raciocinar sobre


uma área num mapa sem nunca tê-la visto. Essa capacidade de-
senvolve-se aos onze ou doze anos.
Depois de haver representado o corpo, podemos continuar
a trabalhar com os alunos a representação do espaço, partindo do
seu espaço mais conhecido, a casa. Ao representar a casa, as crian-

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50 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

ças podem ir além do desenho frontal, envolvendo outras pers-


pectivas, muitas vezes sem conexão entre as partes. O tamanho e
a perspectiva importam menos do que a capacidade de elaborar
algumas relações básicas da percepção do espaço, como a própria
lateralidade e, como veremos a seguir, como as relações topológi-
cas espaciais elementares.
As relações topológicas espaciais elementares processam-
-se segundo uma ordem de vizinhança, separação, ordem, envol-
vimento e continuidade, e começam a ser desenvolvidas desde o
nascimento.
A relação de vizinhança é estabelecida entre objetos próxi-
mos, contíguos. Sua percepção é manifestada com a criança per-
cebendo o que está ao lado do que: o carrinho ao lado do boneco,
por exemplo.
Após a vizinhança, a criança irá compreender que estes objetos ao
lado não estão unidos, pela separação. Essa percepção aumenta
com sua capacidade de análise e é manifestada pelos espaços entre
coisas, como a parede entre a porta e a janela (Cf. ALMEIDA; PAS-
SINI, 2010, p. 30).

Compreender a separação implica o desenvolvimento da


noção de ordem, ou seja, primeiro o carrinho, depois o menino,
depois a casinha. Observe a Figura 1:

Figura 1 Noção espacial.


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A noção de envolvimento é a percepção da relação entre os


elementos ordenados no espaço. Por exemplo, a criança precisará
entender que o menino está entre o carrinho e a casinha.
A continuidade, por fim, é a compreensão da posição dos
objetos formando um todo coerente, contínuo; e, embora ainda
não leve em conta noções precisas de referências cartográficas, é
o início da sua construção.
Esse início de alfabetização cartográfica é acompanhado pelo
desenvolvimento do esquema corporal, a partir de vetores como
frente-atrás, direita-esquerda e acima-abaixo, que são desenvol-
vidos ao mesmo tempo. Sobre isso, o geógrafo Marcelo Martinelli
escreveu:
Na construção da noção de espaço, o indivíduo concebe uma série
de operações espaciais, que se iniciam quando criança. Primeiro
opera relações espaciais topológicas, que são as mais simples que
as crianças conseguem estabelecer. Localizam objetos sem consi-
derar distâncias, retas nem ângulos, com referenciais elementa-
res como: perto/longe, dentro/fora, em cima/abaixo, ao lado, na
frente/atrás. As crianças expõem, ainda, relações de vizinhança, de
ordem espacial, de inclusão e continuidade. A partir das relações
espaciais topológicas são estabelecidas, simultaneamente, as rela-
ções espaciais projetivas e euclidianas, que constituem dois siste-
mas de conjunto diferentes, porém, complementares. Nas relações
espaciais projetivas, as crianças localizam objetos ou pessoas de
acordo com o ponto de vista delas ou referenciais adotados. Nes-
sas, são fundamentais as noções de direita e esquerda (MARTINEL-
LI, 2006, p. 54).

As relações topológicas são, portanto, as primeiras relações


de espaço que uma criança irá elaborar, a partir do espaço vivido:
ela leva em consideração apenas os elementos que constituem a
área representada, sem importar a escala, os tamanhos e a pers-
pectiva.
As relações projetivas e euclidianas, por sua vez, situam os
elementos topológicos em relação a um outro objeto: inicialmen-
te, em relação à própria criança e, à medida em que ocorre a des-
centralização de si como referência, em relação a outras pessoas
ou objetos.

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52 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

Sobre essa trajetória de representações, Antonio Carlos Cas-


trogiovanni indicou que até os oito anos a criança projeta segundo
seu próprio ponto de vista, até os onze será capaz de utilizar o
outro à sua frente como referência e, após os doze, em relação a
outros objetos (Cf. CASTROGIOVANNI, 2003, p. 45).
Essa descentralização da criança como referencial para a
espacialidade, sobre a qual falamos anteriormente, ocorre, con-
forme aponta Hubert Hannoun, segundo algumas etapas, acom-
panhe:
- da análise do espaço ocupado pela criança para a análise do espa-
ço ocupado pelo objeto exterior;
- da análise da posição dos objetos em relação a ela, à análise da
posição dos objetos com relação a outros objetos;
- da análise da posição dos objetos em relação a ela, para a análise
do movimento dos objetos com relação a um ponto de referência
objetivo (Cf. apud ALMEIDA; PASSINI, 2010, p. 34-35).

O trabalho com o desenvolvimento do conceito de espaço


com as crianças não termina com sua descentralização, pelo con-
trário, ele é o ponto de partida para a alfabetização cartográfica.
Alfabetização cartográfica é o processo de aquisição das habilida-
des necessárias para a compreensão das representações contidas
num mapa, do título à legenda. Segundo Rosângela Almeida, a
compreensão de um mapa inicia-se com a leitura pela observação
do título, acompanhe:
Temos que saber qual o espaço representado, seus limites,
suas informações. Depois, é preciso observar a legenda ou a de-
codificação propriamente dita, relacionando os significantes e o
significado dos signos relacionados na legenda. É preciso também
se fazer uma leitura dos significantes/significados espalhados no
mapa e procurar refletir sobre aquela distribuição/organização.
Observar também a escala gráfica ou numérica acusada no mapa
para posterior cálculo das distâncias afim de se estabelecer com-
parações ou interpretações (ALMEIDA, 2003, p. 17).
© U1 – O Ensino de História e Geografia nas Séries Iniciais do Ensino Fundamental de Nove Anos 53

Para exemplificarmos isso, observe o mapa ilustrado na Fi-


gura 2:

Figura 2 As regiões do país.

Esse mapa do Brasil está na escala 1:250.000, ou seja, cada


centímetro no mapa representa 250.000 centímetros na realida-
de, que são 250 quilômetros. No Quadro 1, você pode encontrar
as principais relações de escalas e as suas funções:

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54 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

Quadro 1 Principais escalas em plantas e mapas.


ESCALA APLICAÇÃO
1:100 Plantas baixas de imóveis, usados na construção civil.
Plantas de bairros e cidades, evidenciam a localização e as
1:500 a 1:5.000
dimensões exatas de ruas, casas e prédios.
1:20.000 a Cartas Topográficas limitadas por coordenadas geográficas e
1:250.000 políticas.
1:500.000 Cartas Corográficas, usadas para representar uma região.
Mapas, evidenciam os limites políticos e possuem número
1:1.000.000
pequeno de detalhes.
Planisféricos, representam todo o globo terrestre de maneira
1:205.000.000
bidimensional, evidenciando o traçado dos meridianos e dos paralelos.

Fonte: Almeida e Passini (2010, p. 20).

O mapa possui cores distintas em cada espaço dentro do de-


senho do Brasil, além de traços pontilhados e contínuos, estrelas e
círculos. Abaixo do mapa, existe uma legenda que informa o que cada
cor significa, bem como todos os outros símbolos. No mapa, você
também encontra a orientação do desenho, que, em geral, é o Norte.
Por evidenciar o Brasil, perceba que o restante da América
do Sul não está desenhada completamente, apenas seu contor-
no. Também não há nesse mapa indicações de estradas ou rios,
planícies ou outros limites que não sejam os limites políticos dos
Estados do país.
Lendo o mapa dessa maneira, podemos compreender o
seu significado e também supor os usos que podemos fazer dele:
não seria uma boa ideia carregar um desses numa viagem de
automóvel, mas a partir desse mapa podemos estudar a localiza-
ção e a composição das diferentes regiões do país com bastante
segurança.
Para a Professora Circe Bittencourt:
[...] normalmente, o uso da cartografia é a base para situar as so-
ciedades nos diferentes espaços assim como seus deslocamentos.
Mapas históricos possibilitam a localização das sociedades em de-
terminados espaços, assim como a verificação das mudanças na
sua ocupação (2009, p. 208).
© U1 – O Ensino de História e Geografia nas Séries Iniciais do Ensino Fundamental de Nove Anos 55

Isso quer dizer que estudar os espaços, além de demonstrar


as configurações atuais das sociedades, também mostra diversos
aspectos da sua história! E essa é uma relação absolutamente dia-
lética, porque podemos, ao estudar um local, construir deduções
acerca da sua sociedade e história, e podemos fazer o contrário: ao
estudar uma sociedade, deduzir seu local específico.
Prova disso são os sotaques, os modos de vestir, de comer
e de escrever, pois é possível identificar pelo sotaque, no Brasil, a
origem dos brasileiros, seja do interior de São Paulo ou de Minas
Gerais, do Rio de Janeiro, do sul, norte ou nordeste do país.
Compreender essas identidades nos leva ao estudo das pai-
sagens. Uma paisagem é composta por tudo aquilo que podemos
apreender do espaço observado, incluindo a distinção clássica de
elementos naturais e os elementos culturais.
Os elementos naturais são considerados aqueles não criados
pelo homem, como rios, oceanos, montanhas, vegetação original
etc. Já os elementos culturais são exatamente o oposto: os criados
pelo homem, como prédios, casas, ruas, pontes, fábricas, favelas
e aviões.
No entanto, essa distinção clássica, mais do que auxiliar
o trabalho do professor, pode impor ao aluno uma distinção do
mundo bastante irreal, já que praticamente não existe um espaço
intocado pelo homem, ou, pelo menos, um espaço no qual a sua
influência não tenha sido sentida de alguma maneira. Acompanhe
o comentário que está disponível no PCN:
[...] a maior parte dos elementos considerados naturais ou são pro-
duto de uma interação direta com a cultura humana (uma cenoura
ou uma alface, por exemplo, são na realidade produtos de manejo
genético por centenas de anos), ou provêm de ambientes em que a
atuação do homem não parece evidente porque foi conservativa e
não destrutiva, ou ainda consistem em sistemas nos quais já houve
regeneração, após um tempo suficiente.
De outro lado, consideram-se os elementos produzidos ou trans-
formados pela ação humana, que se pode chamar de elementos
construídos do meio ambiente: desde matérias-primas processa-

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56 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

das, até objetos de uso, construções ou cultivos. Em determinados


sistemas prevalecem os elementos adaptados pela sociedade hu-
mana, como cidades e áreas industriais, praias urbanizadas, planta-
ções, pastos, jardins, praças e bosques plantados, etc.
Esse tipo de diferenciação é útil principalmente para chamar a aten-
ção sobre a forma como se realiza a ação do homem na natureza
e sobre como se constrói um patrimônio cultural. Permite discutir
a necessidade, de um lado, de preservar e cuidar do patrimônio
natural para garantir a sobrevivência das espécies, a biodiversida-
de, conservar saudáveis os recursos naturais como a água, o ar e
o solo; e, de outro lado, preservar e cuidar do patrimônio cultural,
construído pelas sociedades em diferentes lugares e épocas. Tudo
isso é importante para garantir a qualidade de vida da população
(BRASIL, 2000, p. 27).

Desse modo, perceba como é fundamental que a paisagem


local seja apresentada aos alunos de modo que eles a possam re-
conhecer entre outras, descrevê-la em sua especificidade, compa-
rá-la com diferentes paisagens e explicar a sua existência e as suas
características. Em outras palavras: conscientizando-se dela.
Ter a consciência não é apenas saber o nome ou distinguir entre
elementos naturais e culturais, e também não é demonizar as caracte-
rísticas humanas das quais dependemos tanto. A conscientização é a
construção do saber crítico acerca do seu lugar e como ele se relacio-
na com outros lugares: recebendo turistas, produzindo monocultura
tradicional, mineração ou indústria pesada, poluindo o meio ambien-
te, protegendo as nascentes ou mantendo as praias limpas?
No estudo das paisagens naturais e culturais, a comparação
entre as paisagens rural e urbana é fundamental, pois é essa dico-
tomia que permite a reflexão sobre o que é e o que não é natural
na paisagem do lugar em que vivemos.

9. A HISTÓRIA E O DESENVOLVIMENTO DA TEMPO-


RALIDADE
A percepção da existência e da passagem do tempo é uma
noção importante que pode ser trabalhada, assim como a espacia-
© U1 – O Ensino de História e Geografia nas Séries Iniciais do Ensino Fundamental de Nove Anos 57

lidade, já no primeiro ano do Ensino Fundamental. A compreen-


são da existência do tempo ocorre na criança antes mesmo dela
chegar à escola, por meio de repetições que regem sua vida, como
“hora de acordar”, “hora de brincar”, “hora de almoçar”, “hora de
jantar”, “hora de dormir”.
No entanto, compreender essa divisão do dia não implica,
com segurança, o entendimento da noção de passagem do tem-
po, pois, para haver uma compreensão do que é o tempo, deve
haver uma maturação biológica, além do contexto social, como vi-
mos anteriormente.
Piaget afirmava que compreender o tempo é libertar-se do presen-
te, e esta capacidade corresponde a transcender o espaço por in-
termédio de um exercício de reversibilidade, remontando o tempo
passado ao presente e ao futuro e ultrapassando assim a marcha
real dos acontecimentos (BITTENCOURT, 2009, p. 203).

Piaget também concebeu, em sua obra A noção do tempo na


criança, as noções de tempo intuitivo, no qual apenas as relações
simples de sucessão acontecem, como antes e depois, além de ru-
dimentos de percepção de duração do vivido; e a noção de tempo
operatório, desenvolvido no estágio de pensamento operatório,
no qual a sucessão e a duração se desenvolvem, bem como as no-
ções de simultaneidade e duração, além da noção de que o tempo
pode ser medido em unidades numéricas (Cf. PIAGET, s/d, p. 14).
Portanto, assim como ocorreu com o conceito de espaço,
o tempo também surge para a nossa compreensão divido em di-
versos níveis de interpretação. Além das noções apresentadas por
Piaget, podemos ainda encontrar as noções de tempo vivido, de
tempo concebido e de tempo histórico. Vejamos cada um deles:
O tempo vivido é o tempo biológico, representado por
etapas bem delineadas da nossa existência (infância, juventude,
idade adulta e velhice) composta por marcações precisas de sua
passagem, como a data de aniversário, a festa de debutantes, a
permissão de votar, a permissão de dirigir, o alistamento militar, a
formatura, o dia do casamento, a aposentadoria etc.

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58 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

O tempo vivido é organizado nas sociedades conforme as


suas tradições e cultura. Em algumas sociedades indígenas, por
exemplo, o tempo vivido não permite a marcação do dia do nasci-
mento, mas sim a do dia da primeira caçada.
Além do tempo vivido, temos o tempo concebido, que é
também organizado de acordo com a cultura de uma sociedade e
tem por finalidade controlar o tempo biológico, ou seja, o tempo
vivido. O tempo concebido, em nossa sociedade, é formado pelo
tempo cronológico, o tempo astronômico e o tempo geológico,
todos criados para compreender e tomar conta da passagem do
tempo. Vejamos este interessante trecho:
Na sociedade capitalista, apenas para ilustrar, "tempo é dinheiro",
não se pode "perder tempo" e as pessoas são controladas pelo re-
lógio. Para alguns grupos indígenas brasileiros e mesmo de outros
lugares, essa concepção gera algumas perplexidades. Uma delas é
receber dinheiro pelo tempo de trabalho, e não pelo produto rea-
lizado. Tal procedimento provoca, às vezes, a incompreensão de
muitos povos indígenas que trabalham como assalariados para os
brancos e acolhem mal a ideia de "oito horas de trabalho", os feria-
dos e domingos, uma vez que o tempo cíclico é o mais significativo
para eles e indica outras formas de ordenar o trabalho ou mesmo
o descanso, o lazer, as festas, associando-os ao "tempo da chuva",
"da seca", "de plantar e colher" e dos respectivos rituais. A sema-
na de sete dias não faz parte do tempo indígena das aldeias, bem
como os anos, os meses, as mudanças dos fusos horários ou o "ho-
rário nacional de verão" (BITTENCOURTC, 2009, p. 201).

Como você pode perceber, o tempo em nossa sociedade é um


instrumento muito poderoso, além de ser um bem muito valioso!
Comprar tempo livre é uma opção para os que ganham muito di-
nheiro, e aproveitar o pouco tempo livre para arrumar mais uma
ocupação remunerada é o cotidiano de quem tem menos dinheiro!
O tempo histórico, por sua vez, é o construído nas narrati-
vas históricas e faz referência a processos históricos nominados
de modo a se tornarem inteligíveis e familiares. Assim, temos o
tempo do Brasil Colonial, o Brasil Império, o Brasil Republicano, e
temos, também, a Revolução Francesa, a Revolução Industrial e a
Grande Depressão, por exemplo. Esses recortes de tempos espe-
© U1 – O Ensino de História e Geografia nas Séries Iniciais do Ensino Fundamental de Nove Anos 59

cíficos encaixam-se em recortes tradicionais da História, que são


a Pré-História, a Antiguidade, a Idade Média, a Modernidade e a
Idade Contemporânea.
Essas balizas temporais organizam o passado como um todo
coerente, apesar de sabermos que a ordenação que fazemos dos
eventos no passado para que eles pareçam coerentes aos olhos do
presente não é efetivamente o passado em si, mas sim sua inter-
pretação.
Para encerrarmos este tópico vejamos, agora, duas dicas de
atividades para você praticar com seus alunos.

Dicas de Atividades Práticas––––––––––––––––––––––––––––


Atividade 1
Compreender o tempo (libertar-se do presente, como disse Piaget) exige en-
tendimento dos rudimentos do funcionamento do calendário. A construção e o
acompanhamento do andamento do calendário com a turma é uma interessante
atividade para trazer para o cotidiano do aluno o entendimento do tempo. Anotar
os dias de aniversário dos alunos, os feriados, os eventos significativos para a
turma (como jogos ou festas), auxiliam na tarefa de, paulatinamente, entender a
passagem do tempo!
Atividade 2
Inicialmente, os dias da semana eram baseados nos astros visíveis no céu, por
isso, por exemplo, a segunda-feira, em espanhol, chama-se lunes e em inglês
monday. Em português, não conservamos essas referências nos nomes dos dias
da semana. Assim, estimule seus alunos a procurarem a origem dos nomes dos
dias da semana em outras línguas, como espanhol, inglês e francês, e descubra
seus significados em atividades interdisciplinares!
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

10. A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE E O ENSINO DE


HISTÓRIA E GEOGRAFIA
Tomar consciência de si é um passo importante para a com-
preensão da existência do outro e para a imprescindível vida pa-
cífica e prazerosa em comunidade. Mas se pensarmos bem, so-
mente é possível ter consciência de si enquanto percebemos a
diversidade cultural do outro, seja essa diferença social, religiosa,
econômica, cultural, física ou étnica.

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60 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

Para começar esse processo de tomada de consciência, po-


demos assumir como ponto de partida as certidões de nascimen-
to, as histórias dos nomes próprios, as fotografias dos alunos em
suas festas de aniversário ou a criação de autorretratos, tudo irá
depender das condições materiais de existência desses alunos – já
que em determinados lugares do Brasil as certidões não são corri-
queiras e existem poucos retratos, mas histórias faladas são abun-
dantes por todo o país!
Vejamos, nesse contexto, mais uma dica de atividade:

Dica de Atividade Prática–––––––––––––––––––––––––––––––


A brincadeira de criar contornos em tamanho real em papel pardo pode ser o
início do processo de construção da representação de si, como você estudou na
construção do espaço. Nessa mesma atividade, você pode sugerir aos alunos
que desenhem, no seu contorno, as suas próprias características físicas.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
A representação do corpo auxilia na construção das noções
de lateralidade e do esquema corporal. Segundo Rosângela Almei-
da, a consciência corporal é construída até a adolescência, em fun-
ção do amadurecimento do sistema nervoso, da representação de
si e da relação eu-mundo. Ainda segundo a autora:
Outro aspecto importante na organização espacial, relacionado com o
esquema corporal, refere-se ao predomínio de um lado do corpo. Esse
predomínio verifica-se no melhor adestramento de uma das mãos, de
um olho, de uma das pernas e de um pé, o que implica viver uma divisão
do espaço em duas partes assimétricas. Divisão que será a raiz da análise
do espaço percebido. Trata-se de um processo de lateralização do corpo e
do espaço, baseada no corpo. O corpo tem lados e partes – que também
tem lados -, com funções diferentes e que atuam sobre o meio permitindo
um certo domínio espacial pela ação e pelo movimento (ALMEIDA, 2003,
p. 37).

Como você lida com a sua própria lateralidade? Você já tentou,


por apenas um dia, trocar algumas funções entre os lados direito
e esquerdo, como escovar os dentes, escrever, usar o relógio e os
talheres? Esse exercício nos mostra como desenvolvemos mais o
uso de um dos lados do nosso corpo!
© U1 – O Ensino de História e Geografia nas Séries Iniciais do Ensino Fundamental de Nove Anos 61

Seguindo as indicações dos Parâmetros Curriculares Nacio-


nais de que o letramento é importante no primeiro ano do Ensino
Fundamental de nove anos, devemos propor atividades que envol-
vam a História e a Geografia da perspectiva do local e do igual, que
contemplem, também, a leitura e a escrita. Assim, você poderá
trabalhar com atividades de retrato falado, de escrita dos nomes
iguais e diferentes dos colegas de sala, da compreensão do signifi-
cado dos nomes, das leituras de certidões de nascimento etc.
Essas atividades permitem que comecemos a trabalhar o
início das relações de parentesco e são uma oportunidade para
fazermos as crianças perceberem que as constituições das famílias
também são muito distintas, umas são formadas por pai e mãe,
outras por apenas um dos pais, outras por madrastas e padrastos
ou mesmo por avós, entre outras configurações possíveis!
Nesse contexto, é importante não deixarmos de mostrar aos
alunos que as pessoas não são todas iguais. É importante, tam-
bém, criarmos condições para que eles possam perceber como as
diferenças são importantes do ponto de vista da valorização cultu-
ral, e, para isso, podemos trabalhar com casos concretos em sala
de aula ou com indicações dessas diferenças em crianças ao redor
do Brasil e do mundo.
Podemos debater com os alunos, por exemplo, como essas
crianças vivem, o que comem, do que brincam, onde vivem, e a
partir desse debate trazer questões para dentro da sala de aula e
procurar fazer os alunos respondê-las, pois percebendo que exis-
tem pessoas diferentes deles, a sua singularidade começa a surgir
de maneira natural, ao mesmo tempo em que surge o reconheci-
mento de que nem tudo é igual a si mesmo.
Uma estratégia para alcançar esse objetivo é incentivar os
alunos a contar suas próprias histórias para toda a turma ou di-
vididos em pequenos grupos. Pergunte se conhecem pessoas de
outras religiões, de outras regiões do país, de outros países ou com
necessidades especiais. Além disso, investigue com eles as prefe-

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62 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

rências desses grupos, encontrando pontos de aproximação e de


distanciamento entre eles e suas próprias culturas.
Um mapa do Brasil ou um globo terrestre podem ajudar nes-
sa investigação, pois é uma oportunidade de perceberem, numa
representação material (e não apenas conceitual), as distâncias
que separam as diferentes culturas, sejam as brasileiras ou as in-
ternacionais.
No início do segundo ano do Ensino Fundamental, os con-
teúdos acerca da construção da identidade podem ser retomados,
mas agora sob uma nova perspectiva: a do aluno enquanto pro-
dutor de sua própria história. Com a ajuda da família, é possível
ao aluno, com as indicações do professor, construir a sua própria
história a partir de perguntas simples como: Onde eu nasci? Por
que meu nome é tal? Quem o escolheu? Qual a história do meu
nome? Existem outras pessoas com o mesmo nome que o meu?
Quem são meus padrinhos?
As respostas para essas pequenas questões colocam a crian-
ça em contato com uma história que não está escrita em lugar al-
gum, que é a sua própria história. Portanto, incentive as crianças a
registrar essa história e compartilhá-la com a turma!

11. LEITURA COMPLEMENTAR


Para complementar seus estudos a respeito das noções de
espaço, recomendamos a leitura do texto das professoras Rosan-
gela de Almeida e Elza Passini, do qual reproduzimos alguns tre-
chos para que você, futuro educador, seja instigado a conhecer
sempre mais.

Perspectiva, Coordenadas e Categorias Espaciais––––––––––


A noção de perspectiva permanece durante muito tempo inconcebível para a
criança, mesmo depois dos 8-9 anos, pois ela não consegue separar o mundo
exterior de sua representação. Por exemplo, desenha uma linha de trem sempre
paralela, pois sabe que os trilhos nunca se encontram, apesar de reconhecer a
perspectiva em uma figura que mostre os trilhos aproximando-se ao longe. [...]
© U1 – O Ensino de História e Geografia nas Séries Iniciais do Ensino Fundamental de Nove Anos 63

Outro problema que deve ser considerado é a lateralidade quanto à distinção


entre direita e esquerda. As crianças de 5 a 8 anos distinguem apenas o que se
acha à sua direita e à sua esquerda, sendo impossível, para a maioria, projetar
essas posições para alguém à sua frente, pois exige descentralização e rever-
sibilidade.
Para a criança de 8 a 11 anos isso já é possível, podendo definir a direita e a es-
querda de alguém de frente para ela. No entanto, somente a partir dos 11 ou 12
anos que a criança será capaz de situar os objetos independentemente de sua
própria posição. Por exemplo: a janela está à direita da lousa.
Essa questão da lateralidade deve ser considerada devidamente pelo professor
ao trabalhar noções de orientação para levar à descentralização necessária ao
entendimento de referenciais geográficos e não reforçar o egocentrismo ligado
ao esquema corporal.
Os referenciais geográficos de orientação são definidos a partir dos movimentos
da Terra. Seu entendimento exige grande capacidade de abstração para coor-
denar o movimento de rotação da Terra com o movimento aparente do sol e a
resultante sucessão de dias e noites. O leste (nascente), não pode ser ensinado
apenas como ‘o lugar onde o sol nasce’ e o oeste (poente) como ‘o lugar onde o
sol se esconde’. Na verdade, são os pontos da entrada da Terra na luz e/ou na
sombra do lugar onde o sujeito se encontra, sendo observáveis pela presença do
sol ou pela sua ausência. No entanto, o leste e o oeste não são os pontos. São
antes o sentido de que se pode tomar indo na direção do surgimento da luz ou da
sombra considerando o sentido do movimento de rotação da Terra que se faz de
oeste para leste (ALMEIDA; PASSINI, 2010, p. 42).
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

12. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS


Agora, você deve responder às questões autoavaliativas pro-
postas a seguir para testar seus conhecimentos e verificar quais
aspectos precisam ser mais aprofundados.
A autoavaliação pode ser uma ferramenta importante para
você testar o seu desempenho. Se você encontrar dificuldades em
responder a essas questões, procure revisar os conteúdos estuda-
dos para sanar as suas dúvidas. Esse é o momento ideal para que
você faça uma revisão desta unidade. Lembre-se de que, na Edu-
cação a Distância, a construção do conhecimento ocorre de forma
cooperativa e colaborativa; compartilhe, portanto, as suas desco-
bertas com os seus colegas.
Confira, a seguir, as questões propostas para verificar o seu
desempenho no estudo desta unidade:

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64 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

1) Qual a proposta do Eixo Temático dos PCNs para o trabalho com História?

2) Qual a proposta do Eixo Temático dos PCNs para o trabalho com Geografia?

3) O que significa a sigla RAD e como isso pode auxiliar a dar uma boa aula?

4) O que são as relações topológicas elementares?

5) O que são os espaços vivido, percebido e concebido?

6) O que são as noções piagetianas de tempo intuitivo e tempo operatório?

7) Qual a diferença entre os tempos vivido, concebido e histórico?

8) Que tipos de atividades poderíamos aplicar em sala de aula para proporcio-


narmos uma construção saudável da relação eu-mundo nas crianças?

13. CONSIDERAÇÕES
Nesta unidade, estudamos a inserção das disciplinas de His-
tória e Geografia no currículo escolar, bem como as importantes
noções de espaço, tempo e identidade para os alunos das séries
iniciais do ensino fundamental. Buscamos apresentar, também, a
grande necessidade de conhecermos e refletirmos sobre os con-
teúdos mínimos de História e Geografia com os quais trabalhare-
mos na escola e sem os quais acreditamos não ser possível ao pro-
fessor desenvolver um bom trabalho.
Pautados nessa crença, vamos estudar juntos, nas próximas
unidades, os conteúdos dessas duas disciplinas que você terá o
prazer e a responsabilidade de levar para sua sala de aula!
Até lá!

14. E-REFERÊNCIA
Lista de figura
Figura 2 As regiões do país. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/7a12/mapas/brasil/
brasil_grandes_regioes.pdf>. Acesso em: 24 set. 2011.
© U1 – O Ensino de História e Geografia nas Séries Iniciais do Ensino Fundamental de Nove Anos 65

15. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


ALMEIDA, R. D. Do desenho ao mapa: iniciação cartográfica na escola. São Paulo:
Contexto, 2003.
ALMEIDA, R. D.; PASSINI, E. Y. O espaço geográfico: ensino e representação. São Paulo:
Contexto, 2010.
ANTUNES, C. (Coord.). Geografia e didática. Coleção como bem ensinar. Petrópolis:
Vozes, 2010.
BITTENCOURT, C. M. F. Ensino de história: fundamentos e métodos. São Paulo: Cortez,
2009.
BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria da Educação Fundamental.
Parâmetros Curriculares Nacionais: história e geografia. 2. ed. Rio de Janeiro: DP&A,
2000.
______. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria da Educação Fundamental.
Parâmetros curriculares nacionais: meio ambiente e saúde. 2. ed. Rio de Janeiro: DP&A,
2000b.
CASTROGIOVANNI, A. C. (Org.). Ensino de geografia: práticas e textualizações no
cotidiano. Porto Alegre: Mediação, 2003.
______. Para entender a necessidade de práticas prazerosas no ensino de geografia na
pós-modernidade. In: REGO, N.; CASTROGIOVANNI, A. C.; KAERCHER, N. A. Geografia.
Porto Alegre: Artmed, 2007.
CELSO, C. A. Porque me ufano de meu país. Rio de Janeiro: Laemert & C. Livreiros –
Editores, 1908.
MARTINELLI, M. O ensino da cartografia. In: CASTELLAR, S. (Org.). Educação geográfica:
teoria e práticas docentes. São Paulo: Contexto, 2006.
PIAGET, J. A noção de tempo na criança. Rio de Janeiro: Record, s/d.

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Claretiano - Centro Universitário
EAD
Fundamentos para o
Ensino de Geografia nos
Anos Iniciais

2
do Ensino
Fundamental

1. OBJETIVOS
• Identificar os elementos do meio ambiente e os modos de
abordá-los em sala de aula.
• Sintetizar as ideias de ecoalfabetização e permacultura no
contexto escolar.
• Distinguir as regiões do país a partir de componentes físi-
cos, históricos e culturais.
• Compreender o Brasil como um conjunto de realidades
desiguais e merecedoras de atenção.

2. CONTEÚDOS
• O meio ambiente no contexto das séries iniciais do Ensino
Fundamental.
• A composição das regiões do país.
• A população brasileira.
68 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

3. ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE


Antes de iniciar os estudos desta unidade, é importante que
você leia as orientações a seguir:
1) Sugerimos que você faça um passeio virtual pelos índices
mundiais de população, PIB, mortalidade infantil, densi-
dade demográfica e crescimento da população, dispo-
níveis no site do IBGE, <www.ibge.gov.br/paisesat>, e
reflita sobre os resultados demonstrados. Essa pesquisa
complementará os assuntos que serão abordados no de-
correr da unidade.
2) É interessante, também, antes de iniciar os seus estudos,
conhecer um pouco sobre a biografia de alguns teóricos
cujos pensamentos norteiam este estudo.

Celso Antunes
Geógrafo brasileiro, especialista em educação, é autor da coleção Como bem
ensinar e dos livros A construção do afeto, A teoria das inteligências libertadoras,
Marinheiros e professores (I e II), Antiguidades Modernas e Viagens ao redor de
uma sala de aula, entre outras obras.

Jurandyr Ross
É geógrafo e professor do Departamento de Geografia da USP. É autor, entre
outras obras, do compêndio Geografia do Brasil (primeira edição de 1996) e Geo-
morfologia, Ambiente e Planejamento (1998).

Loic Wacquant
É um sociólogo francês preocupado com a questão da desigualdade urbana. É
autor de Os condenados da cidade (2001), As prisões da pobreza (1999), entre
outras obras.

Lana Cavalcanti
É geógrafa, pesquisadora sobre ensino de geografia e geografia urbana e autora
de A geografia escolar e a cidade (2008), obra que reflete os modos como o ensi-
no da Geografia podem auxiliar nas questões da vida urbana cotidiana.

Fritjof Capra
É um físico austríaco que, atualmente, se dedica ao estudo do pensamento sis-
têmico e à educação ecológica, mantendo uma escola de ecoalfabetização nos
Estados Unidos. É autor, entre outras obras, de O ponto de mutação (1982), além
de O tao da física (1975), Sabedoria Incomum (1988), Pertenço ao Universo
(1992) e A teia da vida (1996).
© U2 – Fundamentos para o Ensino de Geografia nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental 69

Lucia Legan
Pedagoga australiana, trabalhou na Alemanha, na Tailândia, na Inglaterra, na
Austrália e no Brasil, onde é uma das fundadoras do Ecocentro IPEC, o Instituto
de Permacultura e Ecovilas do Cerrado, em Pirenópolis, Goiás. Legan é, tam-
bém, autora do livro A escola sustentável (2007).

Martin Rees e Mathis Wackernagel


Criaram a ideia de footprint, ou seja, a pegada ecológica, que mede o impacto
ambiental produzido pelos nossos modos de consumo e comportamentos em
relação ao transporte, à alimentação, à moradia e à geração de resíduos.

4. INTRODUÇÃO À UNIDADE
Na unidade anterior, estudamos três conceitos fundamen-
tais para o ensino de História e Geografia no Ensino Fundamental:
o espaço, o tempo e a identidade. Nesta unidade, avançaremos
em temas não menos complexos que esses, mas agora visando
criar subsídios para o trabalho a partir de outros temas importan-
tes no Ensino Fundamental de nove anos, especialmente para a
Geografia, como, por exemplo, a nossa relação com o meio am-
biente, a caracterização das diferentes regiões brasileiras com suas
paisagens, incluindo os aspectos de relevos e vegetação, fauna e
cultura humana.
Estudaremos, também, a formação da população brasileira
de maneira introdutória, refletindo sobre sua distribuição pelo país
e sua organização política, e, por fim, refletiremos sobre os modos
de trabalho no Brasil e os aspectos de responsabilidade social.
A dimensão política do aprendizado de História e Geogra-
fia está em evidência atualmente, sobretudo porque não é mais
possível escapar das frequentes notícias sobre guerras, atentados,
massacres étnicos, escândalos éticos, desastres ambientais, fome,
miséria, questões raciais e políticas afirmativas entre outras notí-
cias.
A conscientização sobre a existência desses problemas e
a construção de mecanismos de ação a partir dessa tomada de
consciência são comportamentos que o aprendizado de História e

Claretiano - Centro Universitário


70 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

Geografia, ainda no Ensino Fundamental, pode proporcionar. Com


essa finalidade, os conteúdos trabalhados nesta unidade poderão
servir para a sensibilização acerca de muitos desses problemas e
também de sugestões de ação.
Em outras palavras, o estudo da nossa formação no tempo e
no espaço nos possibilitará o descortinamento das razões para os
usos inconsequentes que fazemos do nosso solo, com ocupações
inadequadas das cidades, em várzeas de rios ou encostas de mor-
ros, para o desmatamento criminoso, para a poluição e a destrui-
ção do suporte natural à nossa própria existência.

5. GEOGRAFIA NA SALA DE AULA


Ao lado da História, criticada superficialmente porque estuda
o passado que não vai mais mudar, ou porque estuda gente que já
morreu, a Geografia também sofreu vários preconceitos por estudar
apenas os aspectos físicos do ambiente, ou seja, os afluentes desse
rio, aquela planície, o serrado, a tundra ou a localização do Trópico
de Capricórnio. Essas críticas ocorreram porque, descolados de seu
contexto, qualquer conteúdo torna-se alienante e desinteressante.
Em Geografia, não acontece diferente. Para que não corra-
mos o risco de uma definição menor, acompanhe como Celso An-
tunes fez sua definição sobre o que é a Geografia e como o profes-
sor que trabalha com esses conteúdos deve proceder:
A Geografia é o estudo da natureza e também do homem que ocu-
pa e transforma essa natureza. Mas, enquanto outras ciências es-
tudam aspectos particulares e peculiares da natureza e do homem,
cabe à Geografia examinar e explicar a estreita relação e interde-
pendência entre esses elementos. Nisso reside sua peculiaridade e
nesse ponto o professor de Geografia não é necessariamente um
geólogo, sociólogo ou um biólogo, mas se vale desses estudos para
examinar e aprofundar as relações entre essas ciências. A Terra
vista pelo geólogo, por exemplo, é um planeta, um elemento es-
sencialmente natural; mas, para a Geografia, o que é natural e o
que é humano se fundem e se explicam. Nessa relação de inter-
dependência é que ela se estrutura e apóia seu método de estudo
essencial (2010, p. 34-35).
© U2 – Fundamentos para o Ensino de Geografia nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental 71

A geografia é, portanto, uma ciência interdisciplinar por na-


tureza, localizada na fronteira onde se expressam as influências
recíprocas do mundo natural e da ação do homem. Com essa per-
cepção dialética do mundo, a Geografia nos auxilia a compreender
os diferentes aspectos que envolvem a vida em sociedade.
Esse espaço em que o mundo natural e o homem interagem é
o Meio ambiente, que, segundo o PCN desse Tema Transversal, “[...]
é o espaço, com seus componentes bióticos e abióticos, no qual um
ser vive e se desenvolve, interagindo e trocando energia com o espaço,
transformando-o e sendo transformado por ele” (Cf. PCN, 2000, p. 26).

6. O ESTUDO DO MEIO AMBIENTE


O senso comum liga a ideia de meio ambiente à de natureza,
em frases como “gosto de ir à praia para ficar em contato com o
meio ambiente”, por exemplo. No entanto, meio ambiente é o espa-
ço no qual o ser vivo se desenvolve e interage com o que está ao seu
redor. No caso dos seres humanos, o espaço sociocultural é também
parte do meio ambiente. Mas o que é espaço sociocultural?
Espaço sociocultural é o espaço no qual o homem vive em
sociedade e cria, permanentemente, condições para continuar a
fazer isso, alterando o espaço e alterando o seu próprio comporta-
mento. Por exemplo: conforme degradamos o meio ambiente ao
longo dos dois últimos séculos, fomos tomando consciência dessa
degradação, de modo que, ao transformar o ambiente para man-
ter um padrão de vida, também vamos, consequentemente, alte-
rando o que desejamos como padrão de vida!
Levando em consideração as instruções dos Parâmetros Cur-
riculares Nacionais, ou seja, partindo do espaço vivido em direção
ao espaço concebido, o meio ambiente deverá ser entendido, pe-
los alunos, a partir da sua cidade.
Então, ao estudarmos a formação de um rio, podemos apli-
car o conhecimento teórico do que é um rio a um dos rios que,
certamente, cortam o município no qual trabalhará.

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72 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

Os rios foram tão importantes para a formação das primeiras


grandes sociedades que as chamamos de civilizações hidráulicas,
ou seja, civilizações que se desenvolveram nas margens de um rio,
usando-o para coletar água, para a higiene, para o transporte e
para a irrigação das plantações. Entre as civilizações hidráulicas,
destacamos a mesopotâmica, entre os rios Tigre e Eufrates; a egíp-
cia, ao longo do rio Nilo; a indiana, entre os rios Ganges e Indo;
e a chinesa, ao longo do rio Amarelo. No Brasil, podemos refle-
tir sobre a importância de diversos rios, como o Amazonas, o São
Francisco, o Paraná, o Rio Grande e o Tietê!
Um rio é um curso de água. O lugar onde o rio nasce pode ser
uma mina ou uma fonte, chamada também de olho d'água. Esse
lugar é a nascente do rio. O canal por onde o rio corre é o seu leito,
e as curvas que o rio cava na terra em seu caminho são chamados
de meandros. Quando um rio deságua em outro, chamamos o pri-
meiro de afluente, e para determinar o lado do rio em que o outro
deságua devemos nos imaginar de costas para a nascente.
No percurso, o rio pode apresentar quedas d'água, chama-
das de cachoeiras, que podem ser pequeninas ou gigantescas. Por
fim, o local onde o rio deságua é a sua foz, assim, Foz do Iguaçu,
por exemplo, é o lugar onde o rio Iguaçu termina.
Os rios podem se formar pela precipitação da água da chuva,
pelo derretimento de geleiras ou por fontes subterrâneas. No Brasil,
o mais comum é termos rios formados por nascentes subterrâneas.
Entre as questões que devem surgir ao trabalharmos com o
tema do rio no município está a importância desse rio para a vida na
cidade, incluindo, quando for o caso, a captação de água para consu-
mo humano, a irrigação de plantações, a pesca e a piscicultura, a ge-
ração de energia elétrica, o transporte, o lazer e o despejo de esgoto.
Com tantas possibilidades ligadas à nossa vida diária, os rios
nos ajudam, também, a compreender e a formar a identidade cultu-
ral (no sentido de pertencimento) e a responsabilidade ambiental.
Com base nesse contexto, vejamos agora uma dica de atividade.
© U2 – Fundamentos para o Ensino de Geografia nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental 73

Dica de Atividade Prática–––––––––––––––––––––––––––––––


Entre as atividades que podem ser desenvolvidas no Ensino Fundamental dentro
dessa temática, está a visita à estação de coleta de água, para que o aluno com-
preenda como a água chega à sua casa, e uma visita à estação de tratamento
de esgoto da cidade, para a compreensão do que acontece com a água que sai
da nossa casa.
Para significar o aprendizado dos seus alunos, você deverá investigar, previa-
mente, como é feita a coleta e o tratamento da água da sua cidade, além das
outras atividades que envolvem a água do rio que cruza a sua cidade.
Você também pode ter acesso a mapas e materiais de consulta acessando o site
do IBGE, <http://www.ibge.gov.br> e clicando no canal “IBGE – 7 a 12”.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
O estudo dos rios brasileiros pode ser feito a partir das Regiões
Hidrográficas do país. Uma região hidrográfica é composta por uma
bacia ou por várias bacias hidrográficas, que são, por sua vez, as áreas
banhadas por um rio principal e seus afluentes. São 12 as regiões hi-
drográficas brasileiras, as principais, indicadas na Figura 1, são a Ama-
zônica (em verde), a do Tocantins (verde claro), a do Paraná (em roxo)
e a do Atlântico, composta pelo Atlântico Nordeste Oriental (amarelo)
e Ocidental (bege), Leste (bege claro), Sudeste (rosa) e Sul (rosa claro).

Figura 1 Regiões hidrográficas.

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74 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

Vejamos, novamente, uma dica de atividade que você pode


desenvolver com seus alunos.

Dica de Atividade Prática–––––––––––––––––––––––––––––––


Envolvendo o estudo do rio, você pode inserir um componente de responsabilida-
de sócio-ambiental, que é o uso consciente da água por parte das crianças. Para
tanto, elas deverão compreender a noção de desperdício, que é gastar mais
que o necessário. A duração do banho, a torneira aberta na escovação dental, o
uso da descarga, as brincadeiras com água de mangueira e o uso da mangueira
como vassoura podem estar presentes na sua explicação.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Ainda pensando sobre o meio ambiente, você sabe o que
é educação ambiental, quais são os materiais recicláveis e como
a reciclagem pode ajudar a cuidar do meio ambiente como um
todo? Vamos ver isso juntos?

7. EDUCAÇÃO AMBIENTAL, ECOALFABETIZAÇÃO E


PERMACULTURA
Educação Ambiental é o nome utilizado para designar as ini-
ciativas de diversos grupos em busca da conscientização das pes-
soas no que se refere às questões ambientais, ou seja, não é um
programa de ações fechado e restrito, mas, ao contrário, envolve a
escola, a família e a sociedade como um todo numa grande quan-
tidade de atividades.
Por isso, refletiremos sobre as atitudes, no dia a dia da esco-
la, que são ambientalmente corretas, como gestos de solidarieda-
de, hábitos de higiene pessoal e coletiva, renúncia ao desperdício,
consciência sobre o uso da água e de outros recursos.
Um dos pontos mais importantes da educação ambiental
atualmente diz respeito ao que nos acostumamos chamar de sus-
tentabilidade. Mas você sabe o que é a sustentabilidade?
Segundo a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente, ser sus-
tentável é conseguir satisfazer as nossas necessidades presentes
sem comprometer a capacidade das gerações futuras em suprir
© U2 – Fundamentos para o Ensino de Geografia nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental 75

suas próprias necessidades. O problema dessa definição é justa-


mente saber quando é que estamos garantindo ou não a capaci-
dade das gerações futuras em suprir as suas necessidades, e é por
isso que a educação ambiental é tão importante!
A ação mais conhecida em prol de uma existência sustentá-
vel é a reciclagem. Os materiais recicláveis mais conhecidos hoje
são o vidro, o papel, o alumínio, o ferro e o plástico, mas, além
desses, uma grande quantidade de outros materiais podem (e de-
vem) ser reciclados, como a borracha, a madeira, os orgânicos e
até mesmo o entulho das construções.
A reciclagem garante uma finalidade adequada aos produtos
que são descartados das casas, indústrias e hospitais, mas reci-
clar, apenas, não garante que nosso modo de consumo seja sus-
tentável. Isso se deve ao fato de não ser possível reciclar tudo o
que consumimos e de não sabermos a quantidade de energia e
de recursos naturais que são empregados no próprio processo de
reciclagem.
Vejamos uma dica de atividade com base no assunto abor-
dado até o momento.

Dica de Atividade Prática–––––––––––––––––––––––––––––––


Uma interessante atividade para você aplicar e adequar aos seus alunos é a
medição da sua pegada ecológica. A pegada ecológica mede o tamanho do im-
pacto ambiental proporcionado pelo seu modo de vida e consumo. O ponto de
equilíbrio dessa pegada, criada por Martin Rees e Mathis Wackernagel, é de
1,8 hectares por habitante do planeta. Os brasileiros consomem, em média, 2,2
hectares e os norte-americanos, 9,6 hectares. Nesse ritmo, como você pode per-
ceber, não há planeta para todos consumirem igualmente!
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
O que fica claro, portanto, é que a educação ambiental prati-
cada na escola não pode se restringir à reciclagem. O físico e edu-
cador Fritjof Capra, depois de refletir anos a fio sobre a questão da
existência sistêmica, que é um modo de pensar que busca as liga-
ções entre os seres e as coisas, desenvolveu um método de ensino
já existente conhecido como ecoalfabetização. A ecoalfabetização

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76 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

compreende os princípios básicos da ecologia, do funcionamento


dos ecossistemas, da cultura humana e da sustentabilidade, visan-
do o desenvolvimento, nos alunos, de habilidades, e, sobretudo,
de sensibilidades para perceber o modo como influímos no plane-
ta e as possibilidades de intervenção favorável em qualquer nível.
Para tanto, o pensamento da ecoalfabetização leva em con-
sideração os cinco “R” que auxiliam os alunos a determinar o que
é uma vida sustentável.
Vamos ver mais de perto:

Os Cinco “R”–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Repensar os hábitos de consumo: buscar compreender as reais necessidades
das trocas e a influência da cultura do consumo nas compras por impulso e
moda, e compreender a influência das embalagens e da mídia nas escolhas de
compra, ao invés da qualidade dos produtos.
Recusar produtos que prejudicam o meio ambiente e a saúde: aprender a ler
rótulos, a conhecer ingredientes, a ter noções de nutrição, saúde e aprender a
verificar a origem dos produtos, evitando os que circularam o mundo poluindo e
gastando energia, preferindo os próximos, nacionais ou locais.
Reduzir o consumo desnecessário: adequar o consumo às necessidades, in-
clusive no que se refere ao tamanho das embalagens e ao excesso de produtos
descartáveis.
Reutilizar ao máximo antes de descartar: uma garrafa pode ser reutilizada antes
de reciclada, uma camisa não fura antes de sair de moda, uma meia pode ser
costurada, para não falarmos em carros e celulares!
Reciclar os materiais: separar os materiais recicláveis dos não recicláveis, secar,
armazenar adequadamente e garantir a chegada desse material a um posto de
coleta (LEGAN, 2007, p. 142).
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Como podemos perceber, a tão famosa reciclagem é apenas
o último ponto da busca pela existência sustentável, sendo preci-
so, antes, refletir seriamente sobre os hábitos de consumo, a fim
de diminuir a pressão do planeta em oferecer matérias-primas,
obviamente finitas. A pedagoga australiana Lucia Legan vai além
da ecoalfabetização e propõe a ideia de uma permacultura, ou
seja, uma cultura sustentável baseada em seis conjuntos de ações
integradas. Vejamos:
© U2 – Fundamentos para o Ensino de Geografia nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental 77

Cultura Sustentável: Seis Conjuntos de Ações Integradas–––


Segurança alimentar: restauração dos solos danificados; polinização aberta;
nutrição; florestas de alimentos orgânicos e distribuição equitativa de alimentos.
Água: acesso à água limpa para todos; oceanos vivos; bacias hidrográficas sau-
dáveis; conservação e captação da água da chuva.
Energia e tecnologia: reciclar, reduzir, reparar, recusar e repensar; uso ético dos
recursos naturais; consumo justo de energia; acesso equitativo às tecnologias;
uso de fontes renováveis de energia.
Comunicação e cultura: compartilhar conhecimento; cooperar ao invés de com-
petir; dar poder aos indivíduos; criar consensos; proteger os direitos humanos e
valorizar a cultura local.
Espécies e ecossistemas: manutenção da diversidade de plantas e animais;
respeitar todas as formas de vida; reflorestar; ter responsabilidade individual por
todas as criaturas vivas.
Economia local: consumo sustentável; consumo de produtos da localidade; co-
mércio ético e justo; manejo de recursos; minimização do lixo; empresas ecoló-
gicas (Cf. LEGAN, 2007, p. 11).
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

Conforme conhecemos mais sobre educação ambiental, a


ideia de uma reciclagem simples vai ficando para trás e, em seu
lugar, surgem as noções realmente importantes sobre sustentabi-
lidade: não separar apenas o lixo, mas pensar em sua produção,
em sua quantidade, em seu destino, em sua real necessidade para
a manutenção da sua qualidade de vida, respeitadas as necessida-
des de qualidade de vida das gerações futuras à nossa.
Vejamos outra dica de atividade.

Dica de Atividade Prática–––––––––––––––––––––––––––––––


Eu quero/eu preciso. Para trabalhar com seus alunos a criação de uma cultura
sustentável, você pode criar uma brincadeira de associação entre figuras e os
conceitos de Eu quero e Eu preciso. Você poderá, com a turma, recortar ima-
gens publicitárias de roupas, brinquedos, tipos diferentes de alimentos, carros,
casas, cobertores etc. Depois, convide os alunos a buscarem as figuras e sepa-
rá-las nos montinhos de querer, precisar e não precisar, sempre convidando os
alunos a opinarem sobre suas escolhas. Você poderá incluir o que é o desejo, as
reais necessidades de algumas coisas e a função das propagandas.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Por certo, num país continental como o Brasil, com realida-
des sociais tão diferentes, todas as ações de educação ambiental
necessitam ser adequadas às realidades e personificadas em cada

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78 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

grupo. Por esse motivo, conhecer as paisagens do Brasil é o pri-


meiro passo para uma educação ambiental de qualidade.
Vamos lá!

8. COMPREENDENDO AS REGIÕES DO PAÍS


O Brasil é um país de dimensões continentais, ou seja, possui
um território vasto que engloba uma série de diversidades climáti-
cas, de relevo, flora e fauna. São essas diversidades que estudare-
mos agora, você está pronto?
Para facilitar o domínio, o conhecimento, a fiscalização,
o controle da circulação de pessoas e mercadorias e, também,
a administração política do território brasileiro, ele foi, desde a
colonização, dividido em regiões. As primeiras divisões foram as
chamadas capitanias hereditárias, passando pelos vice-reinos e as
províncias, até chegarmos na atual divisão por Estados e regiões.
Atualmente, o país é dividido em 27 unidades federativas,
sendo 26 Estados e o Distrito Federal, onde está Brasília, a capital
do país. Os Estados estão agrupados em regiões, que são unidades
políticas produzidas pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística), com base em semelhanças nas características vege-
tais, climatológicas, econômicas e histórico-culturais dos Estados.
São cinco regiões, determinadas conforme demonstra o Quadro 1:

Quadro 1 As regiões do país.


REGIÃO UNIDADES FEDERATIVAS
Acre, Amazonas, Amapá, Roraima, Rondônia, Pará e
Região norte
Tocantins.
Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba,
Região nordeste
Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia.
Região centro-oeste Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás e Distrito Federal.
Região sudeste Espírito Santo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo.
Região sul Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

Fonte: IBGE (2011).


© U2 – Fundamentos para o Ensino de Geografia nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental 79

Vejamos a distribuição dessas regiões na Figura 2.

Figura 2 Grandes regiões.

Perceba que a divisão em regiões não é uma divisão natural,


mas sim uma divisão artificial, produzida pelo homem e não ine-
rente à paisagem. Para que os alunos compreendam essa divisão,
são diversas as propostas de atividades que envolvem os mapas
políticos e físicos brasileiros: desde assinalar as diferentes regiões,
associar Estados a regiões, ou capitais a Estados, ou até mesmo
associar alguns municípios aos Estados correspondentes.
De todo modo, o mais importante é que a criança com-
preenda as unidades físico-culturais que determinam as divisões
regionais brasileiras, para que essas divisões deixem de ser apenas

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80 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

imposições didáticas e se tornem unidades de representação do


Brasil, com sua gente, sua história, sua vegetação e seu clima. Para
tanto, procure conceituar, paulatinamente, as principais caracte-
rísticas de cada região do país, formando uma paisagem. Vamos
ver isso mais de perto?

9. A PAISAGEM DA REGIÃO NORTE


A região norte possui como principal bioma a Amazônia,
com a Floresta Amazônica, a maior floresta do mundo, alcançando
35% de todas as áreas florestais do planeta, portanto, bem maior
que a região norte, sendo composta, também, por partes da Bolí-
via, do Peru, da Colômbia, da Venezuela, da Guiana Francesa e do
Suriname (Cf. ROSS, 2008).
Talvez seja um pouco difícil para os alunos imaginarem uma
mata fechada como a amazônica. Isso ocorre porque lá as plantas
estão muito próximas às outras, com espécies aéreas que cruzam
os espaços entre as árvores, aumentando a dificuldade de andar
por dentro da mata. Acostumados que estão com as plantações
ordenadas em linhas retas, as crianças da cidade podem não com-
preender, com facilidade, essa diferença inicial.
Por isso, é importante que o professor explique a formação
da floresta, composta por mais de 90% de matas de terra firme
não alagáveis, onde crescem as maiores árvores, como o famoso
jequitibá.
O restante da floresta é composto por várzeas, ou seja, ter-
ras alagáveis nas cheias, e por igapós, que são terras permanente-
mente alagadiças, onde crescem bromélias, vitórias-régias e cipós,
por exemplo. Além da floresta, são também símbolos da região o
grande Rio Amazonas e a presença de diversos povos indígenas.
O Rio Amazonas é considerado o maior rio do mundo, seja
em extensão (6.992 km) ou em volume de água. O Amazonas
nasce no Peru, como um pequenino filete de água, atravessa o
continente e deságua no Oceano Atlântico, causando o fenômeno
© U2 – Fundamentos para o Ensino de Geografia nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental 81

da pororoca, que são imensas ondas formadas pelo encontro das


águas do rio com as águas do mar.
Antes de ser o Amazonas, o rio é conhecido como Solimões,
que, depois de receber as águas do afluente Rio Negro, passa a
ser chamado de Rio Amazonas. A importância do Amazonas para
a região norte é muito grande, já que o rio é o principal meio de
transporte de pessoas e mercadorias da região.
Uma floresta, com seus rios, plantas e animais pode ser mui-
to rica, você já pensou sobre isso? Não apenas pelo valor da ma-
deira que está contida nela, mas também pelos diversos extratos
vegetais que podem ter uso medicinal, bem como pelas frutas,
sementes e castanhas que a floresta oferece. E o melhor, essa ri-
queza depende do manejo sustentável da floresta, e não da sua
derrubada.
Por muitos anos, aqui no Brasil, acreditou-se que derrubar
uma árvore era símbolo do progresso que chegava a um lugar.
Hoje, felizmente, sabemos que não. Uma floresta não é um monte
de plantas que atrapalham o modo de vida do homem, servindo
para dar madeira para móveis, navios e para a queima. A floresta
oferece remédio, proteção, alimento e até perfumes e cosméticos!
O manejo sustentável é um modo de as pessoas que vivem
na floresta retirarem dela o que não irá atrapalhar seu desenvol-
vimento, permitindo, com isso, que as futuras gerações possam
usufruir não apenas da floresta, mas também dos benefícios que
ela continuará a oferecer.
Assim, os povos ribeirinhos, os extrativistas e os indígenas
têm uma oportunidade de conviver com a floresta retirando dela
palha, látex, castanhas diversas, babaçu, palmitos e uma infinida-
de de itens sem ser preciso derrubar árvore alguma.
Mas se é possível e rentável explorar a floresta sem desma-
tá-la, por que os níveis de desmatamento aumentam tanto?

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82 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

Parte dessa resposta está nas pessoas que não são indíge-
nas, extrativistas ou ribeirinhos. Interessadas em utilizar as terras
da Amazônia para criar gado de modo extensivo ou plantar soja e
arroz, por exemplo, elas promovem a derrubada das árvores mile-
nares e sua queima ou venda, para que o solo dê espaço ao gado e
a outros itens da nossa cesta básica.
Vejamos uma dica de atividade relacionada ao que foi abor-
dado neste tópico.

Dica de Atividade Prática–––––––––––––––––––––––––––––––


As atividades que você pode desenvolver dentro da temática abordada ante-
riormente envolvem o aprendizado sobre a Amazônia de maneira sustentável,
incluindo reflexões com os alunos sobre que impactos a ausência da floresta
pode acarretar em nossa vida, mesmo estando longe da floresta.
Sobre isso, pesquisas indicam que a Amazônia é responsável por parte do nos-
so equilíbrio climático, portanto, quanto menos florestas, maiores podem ser as
temperaturas e também as tempestades. Assim, pesquise outros problemas re-
lacionados ao desmatamento, como, por exemplo, a camada de ozônio, a deser-
tificação e a perda do suporte à vida local com seus alunos!
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Para completar a montagem da paisagem da região norte,
abordaremos, brevemente, o que se come nessa região.
Os alimentos típicos da região norte incluem o tacacá, o tu-
cupi, o carimã e a maniçoba – todas receitas de variação sobre os
mesmos ingredientes: a mandioca e a mandioca brava. A mandio-
ca brava é rica em ácido cianídrico, o qual é muito tóxico, mas co-
mestível se cozido por bastante tempo. Por isso, muitas receitas do
norte são de longa cocção, com os preparos chegando a cinco dias!
As castanhas e o açaí são outros alimentos muito importan-
tes no norte do país, os quais, pouco a pouco, vão sendo descober-
tos também pelo restante do Brasil e do mundo. “A castanha do
Pará, por exemplo, é conhecida fora do país como brazilian nut”
(Cf. ALGRANTI, 2000, p. 115).
© U2 – Fundamentos para o Ensino de Geografia nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental 83

10. A PAISAGEM DA REGIÃO NORDESTE


A região nordeste tem como símbolos lugares idílicos, como as
belas praias e também o arquipélago de Fernando de Noronha. Por ou-
tro lado, também possui como emblema o sertão de chão árido e seco,
terra de desesperança e morte. O fruto desse paradoxo, grosso modo,
é uma região que oferece luxo no turismo e falta de condições básicas
para muitos de seus moradores locais. Mas será que ela é apenas isso?
O nordeste pode ser dividido em quatro sub-regiões: a zona
da mata, uma faixa de terra entre o continente e o mar que se es-
tende do litoral da Bahia até o do Rio Grande do Norte; o agreste,
uma faixa menor, concentrado após a zona da mata nos estados da
Bahia, Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraíba e uma pequena par-
te do Rio Grande do Norte; o sertão, que ocupa o restante dos es-
tados da Bahia, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, além
de todo o Ceará e boa parte do Piauí; e o meio-norte, ocupando o
restante do Piauí e todo o Maranhão (Cf. ROSS, 2008).
A seca, que afeta principalmente a área de sertão, é causada
pelo bloqueio do ar úmido vindo do mar, provavelmente feito pelo
planalto da Borborema, que se estende de Alagoas até o Rio Gran-
de do Norte. Apesar da criação de programas de irrigação (como a
canalização do Rio São Francisco) atualmente permitirem a planta-
ção em diversas épocas do ano, a seca ainda é a responsável pela
migração temporária de muitas pessoas para a região sudeste em
busca de melhores condições de trabalho.
O tema da migração do nordeste para o sudeste esteve pre-
sente na obra do pintor Cândido Portinari e nos poemas de João
Cabral de Melo Neto. Você pode utilizar a força dos discursos des-
ses artistas para compor suas aulas.
Entre os elementos culturais e folclóricos típicos do nordeste
brasileiro, podemos assinalar o bumba meu boi (apesar de hoje a fes-
ta fazer muito sucesso no Amazonas), as festas juninas, os artesana-
tos, o frevo, a capoeira, a literatura de cordel e também o carnaval.

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84 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

A alimentação no nordeste também é um dos traços mar-


cantes de sua cultura, e inclui pratos como o vatapá e o acarajé da
Bahia, tradicional bolinho de massa de feijão experimentado pela
maioria dos turistas, além do arroz de cuxá do Maranhão, entre
outros pratos muito conhecidos, como os bobós, o baião de dois e
o feijão de corda. A cultura alimentar nordestina é parte tão repre-
sentativa dessa cultura que se apresenta onde quer que estejam
seus representantes, além de transbordar para outras manifesta-
ções culturais como a literatura de cordel e os versos populares,
segundo o historiador da alimentação Luiz da Câmara Cascudo.
O verso a seguir, popular no século 19 (apesar de inapro-
priado para os alunos), mostra a nós, professores, a força dessa
ligação: “Nossa carne-seca / Que vem do sertão, / Paio, presuntos
/ Melhores não são! / Comendo feijão / Bebendo cachaça, / Assim
com prazer / A vida se passa” (CASCUDO, 1967, p. 704).
Vejamos uma dica prática de atividade para a região nor-
deste.

Dica de Atividade Prática–––––––––––––––––––––––––––––––


As atividades que você pode realizar com os alunos acerca da região nordeste
podem envolver toda essa diversidade cultural de festividades e alimentos que
mencionamos anteriormente. Você pode propor, por exemplo, que os alunos ex-
perimentem pratos típicos nordestinos, numa atividade interdisciplinar que extra-
pola os muros da escola e envolve toda a família!
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11. A PAISAGEM DA REGIÃO CENTRO-OESTE


A região centro-oeste é marcada pela Planície do Pantanal,
uma imensa área alagável localizada entre o Mato Grosso e o Mato
Grosso do Sul, além de partes do Paraguai e da Bolívia. Para com-
pararmos, assim como o Rio Amazonas é uma referência no norte
e o Rio São Francisco uma referência no nordeste, o Rio Paraguai
é um dos mais importantes rios do pantanal matogrossense, onde
um dos animais mais famosos é o jacaré.
© U2 – Fundamentos para o Ensino de Geografia nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental 85

O pantanal possui dois períodos importantes, que se alter-


nam e proporcionam equilíbrio à região: as cheias e as vazantes.
Durante as cheias, muitas terras baixas se alagam, transbordando
rios e lagos, fertilizando a terra com nutrientes e permitindo que
uma vasta quantidade de animais se desenvolva.
Já durante as vazantes, as terras secas permitem que o pasto
se desenvolva e o gado circule. A vegetação no pantanal é variada
devido aos seus ciclos de águas, o que não acontece com outra
vegetação típica do centro-oeste: o cerrado.
A vegetação do cerrado é formada por espécies resistentes,
com casca grossa, arbustos e vegetação rasteira. Entre as árvores
mais conhecidas estão o ipê e o pequizeiro, da qual se colhe o pe-
qui, um fruto adstringente e espinhoso, bastante característico por
necessitar uma técnica para ser mordido, com o qual se faz um
arroz típico do cerrado, o arroz com pequi.
Assim como acontece hoje com o norte, no centro-oeste
muito da ocupação deveu-se a um processo de interiorização do
país, por processos políticos ou pelo chamado avanço da fronteira
agrícola, quando muitas famílias de outras regiões, incluindo o sul
e o sudeste, foram para o centro-oeste criar gado, plantar soja,
milho e arroz.
O Distrito Federal com a capital do país, Brasília, emblemati-
camente, estão no centro-oeste. Brasília é uma cidade planejada,
ou seja, ela foi concebida para ser a sede administrativa do gover-
no brasileiro, inaugurada em 21 de abril de 1960.
A construção de Brasília tornou-se um dos símbolos da ideia
de integração nacional, com a transferência da sede do governo do
Rio de Janeiro, no litoral, para o centro-oeste, no coração do país.
O formato do Plano Piloto da cidade, desenhado como um avião,
além das rodovias que cortaram o país para alcançar essa nova
fronteira, são emblemas do progresso que marcaram a fisionomia
nacional a partir da construção na nova capital.

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86 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

Paradoxalmente, o símbolo da modernidade, a rodovia, não é o


meio de transporte mais adequado ao relevo brasileiro. O transporte
ferroviário e hidroviário são mais adequados, econômicos e susten-
táveis, podendo levar quantidades maiores de carga por custos mais
baixos, desde que, claro, ferrovias e hidrovias sejam instaladas.
Vejamos uma dica de atividade voltada para essa região.

Dica de Atividade Prática–––––––––––––––––––––––––––––––


As atividades que podem ser desenvolvidas a partir do estudo da região centro-
-oeste englobam o pantanal e o cerrado, por um lado, e, por outro, a construção
da sede do governo brasileiro. Pensando sobre a vegetação, podemos analisar a
existência dos jacarés no pantanal, e, a partir do que entendemos da sua vege-
tação, compreender porque o pantanal é um habitat muito adequado aos jacarés.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

12. A PAISAGEM DA REGIÃO SUDESTE


A região sudeste é marcada pela paisagem urbana. Afinal,
além de ser a região mais populosa do país, possui duas das cinco
maiores cidades da América Latina: São Paulo (a maior cidade da
América Latina e a sexta do mundo) e Rio de Janeiro (a quinta da
América Latina e a 27ª do mundo). E não apenas isso, entre as 30
maiores cidades do país, 14 estão na região sudeste!
Além dessas características, no sudeste a imensa maioria da
população (cerca de 92%, segundo o IBGE) residem nas cidades,
enquanto a média nacional é de aproximadamente 50%, e a região
soma, ainda, mais de 40% da população total do país (Cf. IBGE, 2011).
Vamos refletir juntos sobre o significado de todas essas in-
formações?
O sudeste não tem apenas maior população, como também
mais pessoas morando em cidades há mais tempo, o que nos in-
dica que, ao longo do século 20, houve uma imigração sistemática
de pessoas de outras regiões do país para o sudeste, como vimos
no estudo da região nordeste, em busca de melhores condições de
vida e trabalho.
© U2 – Fundamentos para o Ensino de Geografia nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental 87

Todavia, ter mais pessoas morando nas cidades não quer di-
zer que elas vivam melhor. Muitas das pessoas que vieram para
o sudeste tornaram-se operários nas indústrias, trabalhadores da
construção civil, trabalhadores domésticos entre outros trabalhos,
porém, muitos não conseguiram sequer isso. São prestadores
de serviços temporários, sem condições adequadas de trabalho,
saúde e moradia, residentes em favelas espalhadas por todas as
grandes cidades do sudeste, como São Paulo, Rio de Janeiro, Belo
Horizonte, Campinas e Ribeirão Preto, no interior do Estado de São
Paulo.
Mesmo estando na região sudeste, o Estado de Minas Gerais
guarda algumas características distintas do restante da região. É o
único estado da região que não possui saída para o mar, e, além
disso, tem um relevo diverso do restante, pois é formado por Pla-
naltos, como a Serra da Canastra, a Serra do Espinhaço, a Serra da
Mantiqueira e a Serra do Caparaó, onde está o Pico da Bandeira, o
ponto mais alto da região sudeste.
Vamos à nossa dica de atividade?

Dica Prática de Atividade–––––––––––––––––––––––––––––––


As atividades indicadas para o trabalho sobre a região sudeste devem estar rela-
cionadas às questões urbanas e às desigualdades sociais existentes em todo o
país, mas explícitas na região.
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13. A PAISAGEM NA REGIÃO SUL


A região sul, formada pelos Estados do Paraná, Santa Cata-
rina e Rio Grande do Sul, é a região com a maior preservação da
influência europeia no modo de vida da população, notadamente
dos povos alemães e italianos. Essas influências enraizaram-se nos
modos de falar, dançar, morar, comer e vestir, manifestados em
festas folclóricas tradicionais.
Além da influência europeia, a região é marcada pelas fron-
teiras ativas com os países vizinhos, ou seja, a Argentina, o Uruguai

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88 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

e o Paraguai, com o qual, inclusive, dividimos a Usina Hidrelétrica


de Itaipu, a maior geradora de energia hidrelétrica do mundo.
A vegetação dominante no estado do rio grande do sul é o
pampa, que se estende por todo o Uruguai, além de parte da Ar-
gentina. O pampa é marcado pela presença de vegetação rasteira,
como as gramíneas e arbustos, que possibilitaram que toda a re-
gião se tornasse base de uma grande produtora de gado de corte.
O clima da região sul merece destaque porque se diferencia
das altas temperaturas que registramos em quase todo o restante
do país. As serras gaúchas são famosas por registrarem, frequen-
temente, temperaturas próximas do zero grau, além de neve, oca-
sionalmente.
Acompanhe a dica de atividade para esta região.

Dica de Atividade Prática–––––––––––––––––––––––––––––––


As atividades para esta região podem incluir as fortes marcas da imigração de
povos europeus, por meio de temas interdisciplinares, envolvendo línguas, his-
tória e geografia.
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14. INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA POPULAÇÃO BRA-


SILEIRA
Conforme vimos no estudo das paisagens regionais do Bra-
sil, um dos traços mais marcantes de nosso país é exatamente a
diversidade de culturas, costumes e origens. De um modo geral,
no entanto, a desigualdade mais profunda da nossa sociedade não
está ligada aos traços culturais, mas sim à economia: a diferença
entre pobres e ricos é um verdadeiro abismo que isola e oprime
grande parte da população brasileira.
Essa diferença mostra-se evidente no trabalho, na alimenta-
ção, na educação, na saúde e, sobretudo, na habitação. Pensan-
do nessa desigualdade ao redor do mundo, o sociólogo Loic Wac-
quant escreveu:
© U2 – Fundamentos para o Ensino de Geografia nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental 89

Favela no Brasil, poblacione no Chile, villa miseria na Argentina,


cantegrill no Uruguai, rancho na Venezuela, banlieue na França,
gueto nos Estados Unidos: as sociedades da América Latina, da
Europa e dos Estados Unidos dispõem todas de um termo especí-
fico para denominar essas comunidades estigmatizadas, situadas
na base do sistema hierárquico de regiões que compõem uma me-
trópole, nas quais os párias urbanos residem e onde os problemas
sociais se congregam e infeccionam, atraindo a atenção desigual e
desmedidamente negativa da mídia, dos políticos e dos dirigentes
do Estado (WACQUANT, 2005, apud CAVALCANTI, 2008, p. 125).

Mais do que pensar nas diferenças entre cidade e campo, as


diferenças na própria cidade cada vez mais se tornam emergentes
de serem estudadas, sobretudo porque muitos de nossos alunos
podem ser oriundos dessas áreas desprestigiadas pelas políticas
públicas de assistência e segurança pacífica.
O Quadro 2 mostra-nos os contingentes de imigrantes euro-
peus e asiáticos que vieram para o Brasil entre 1819 e 1940, nos
revelando as grandes linhas de força da composição das famílias
brasileiras atuais, vejamos:

Quadro 2 Imigrantes europeus e asiáticos que entraram no Brasil


entre 1819 e 1940.
NACIONALIDADE 1819-1883 1884-1940 TOTAL
Alemães 62.327 170.645 232.972
Austríacos 8.404 85.790 94.194
Franceses 8.008 32.373 40.381
Espanhóis 15.337 581.718 597.055
Ingleses 6.678 23.745 40.381
Italianos 96.018 1.412.263 1.508.281
Iugoslavos - 22.838 22.838
Japoneses - 185.799 185.799
Poloneses - 47.765 47.765
Portugueses 223.626 1.204.394 1.428.020
Russos 8.835 108.121 116.956
Sírios - 20.507 20.507

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90 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

NACIONALIDADE 1819-1883 1884-1940 TOTAL


Suíços 7.289 10.270 17.559
Turcos - 78.455 78.455

SUBTOTAL 436.522 3.984.683 4.421.205


OUTROS 110.128 174.034 284.162
TOTAL GERAL 546.650 4.158.717 4.705.367
Fonte: Alvim (1998, p. 233).

Por meio da análise do Quadro 2, podemos perceber que os


cinco povos mais presentes no país são, respectivamente, os italia-
nos, os portugueses, os espanhóis, os alemães e os japoneses. Por-
tanto, como a distribuição dessas populações não é homogênea,
cada região formou uma espécie de reduto dessas pessoas. Esses
redutos, bairros, centros comunitários ou cidades inteiras têm ma-
neiras próprias de preservar sua cultura de origem e de expressá-
-la. Exemplos clássicos desses redutos são os bairros da Liberdade
e do Bexiga em São Paulo, as comunidades japonesas no Paraná e
no interior de São Paulo, os alemães no sul entre outros.
Para criar um panorama geral da população brasileira, deve-
mos, ainda, levar em conta os movimentos que incentivaram (se
não exigiram) a criação das favelas como áreas de oferta de mão
de obra abundante e barata. Para ilustrar, acompanhe o cresci-
mento populacional brasileiro ao longo do século 20 no Quadro 3:

Quadro 3 Tabela populacional brasileira (1872-2010).


ANO POPULAÇÃO
1872 9.930.478
1890 14.333.915
1900 17.438.434
1920 30.635.605
1940 41.236.315
1950 51.944.397
1960 70.119.071
© U2 – Fundamentos para o Ensino de Geografia nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental 91

ANO POPULAÇÃO
1970 93.139.037
1980 119.070.865
1991 146.155.000
2000 169.799.170
2010 190.755.799
Fonte: Ross (2007, p. 387) e IBGE (2011).

O último censo oficial mostra que chegamos, praticamen-


te, a 200 milhões de habitantes, com mais de 80% das pessoas
morando nas cidades, muitas delas, nas condições descritas an-
teriormente por Wacquant. No mundo todo, chegamos agora aos
sete bilhões de pessoas, o que quer dizer: nunca fomos tantos! As
implicações de sermos muitos exige, ao mesmo tempo, que te-
nhamos responsabilidade com o planeta, para que nosso modo de
vida não comprometa a vida de pessoas do outro lado do mundo,
hoje e amanhã.

15. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS


Como fizemos na Unidade 1, aproveite este momento para
exercitar o que aprendeu até agora. Após ter feito uma leitura
proveitosa dos conteúdos desta segunda unidade, responda com
atenção às questões autoavaliativas. Se necessário, procure revi-
sar os conteúdos estudados para sanar as suas dúvidas.
Confira, a seguir, as questões propostas para verificar o seu
desempenho no estudo desta unidade:
1) Qual a importância da educação ambiental?

2) Por que a educação ambiental não pode se restringir à ideia de reciclagem?

3) Quais os princípios da ecoalfabetização? Como podemos levá-los para a escola?

4) A cultura sustentável é baseada em seis princípios. Quais são eles?

5) Considerando os seus aspectos físicos e culturais, quais são as cinco princi-


pais paisagens das regiões do Brasil?

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92 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

16. CONSIDERAÇÕES
Chegamos ao final desta unidade, depois de estudarmos
juntos alguns conceitos importantes para a educação ambiental,
como a ecoalfabetização e a cultura sustentável. Com esses con-
ceitos, ampliamos a nossa percepção sobre a prática da recicla-
gem e pensamos em nosso comportamento enquanto consumido-
res conscientes. No estudo sobre as paisagens brasileiras, fizemos
uma rápida viagem pelas cinco regiões, observando as característi-
cas do relevo, da fauna, da cultura e dos modos de vida.
Na próxima unidade, continuaremos nossa viagem pelo Bra-
sil, observando o nosso passado e como ele pode ser importante
na sala de aula.
Até lá!

17. e-referências
Lista de figuras
Figura 1 Regiões hidrográficas. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/ibgeteen/
atlasescolar/mapas_pdf/brasil_bacias.pdf>. Acesso em: 15 mar. 2012.
Figura 2 Grandes regiões. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/7a12/mapas/brasil/
brasil_grandes_regioes.pdf >. Acesso em: 10 out. 2011.

Sites pesquisados
IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Home page. Disponível em: <www.
ibge.gov.br>. Acesso em: 10 out. 2011.
IDEC. Calculadora de emissões – Clima e consumo. Disponível em: <www.idec.org.br/
climaeconsumo>. Acesso em: 10 out. 2011.
PEGADA ECOLÓGICA BRASIL. Home page. Disponível em: <www.pegadaecologica.
siteonline.com.br>. Acesso em: 10 out. 2011.
WWF. Pegada ecológica. Disponível em: <www.wwf.org.br/pegadaecologica>. Acesso
em: 10 out. 2011.
© U2 – Fundamentos para o Ensino de Geografia nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental 93

18. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


ALGRANTI, M. Pequeno dicionário da gula. Rio de Janeiro: Record, 2000.
ALMEIDA, R. D.; PASSINI, E. Y. O espaço geográfico: ensino e representação. São Paulo:
Contexto, 2010.
ANTUNES, C. (Coord.). Geografia e didática. Coleção Bem Ensinar. Pretópolis: Vozes,
2010.
BRASIL. Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Departamento de
Documentação e Divulgação Geográfica e Cartográfica. Curso para professores de
geografia do ensino de I e II graus. Rio de Janeiro: IBGE, 1972.
­______. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria da Educação Fundamental.
Parâmetros curriculares nacionais: história e geografia. 2. ed. Rio de Janeiro: DP&A,
2000.
______. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria da Educação Fundamental.
Parâmetros curriculares nacionais: meio ambiente e saúde. 2. ed. Rio de Janeiro: DP&A,
2000b.
BORBA, M. P.; OTERO, P. Consumo sustentável. Coleção Consumo Sustentável e Ação. São
Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo / 5 Elementos, 2009.
CAPRA, F. A teia da vida. São Paulo: Cultrix, 1996.
CARLOS, A. F. A. (Org.). Novos caminhos da geografia. São Paulo: Contexto, 2010.
CASCUDO, L. C. História da alimentação no Brasil. São Paulo: Global, 2004. Original de
1967.
CASTROGIOVANNI, A. C. (Org.). Ensino da geografia: caminhos e encanto. Porto Alegre:
EDIPUCRS, 2007.
______. (Org.). Ensino de geografia: práticas e textualizações no cotidiano. Porto Alegre:
Mediação, 2003.
CAVALCANTI, L. S. A geografia escolar e a cidade: ensaios sobre o ensino de geografia
para a vida urbana cotidiana. Campinas: Papirus, 2008.
DONATO, H. História dos usos e costumes do Brasil: 500 anos de vida cotidiana. São
Paulo: Melhoramentos, 2005.
LEGAN, L. A escola sustentável: ecoalfabetizando pelo ambiente. São Paulo: Imprensa
Oficial / Pirenópolis, GO: Ecocentro IPEC, 2007.
ROSS, J. L. S. (Org.). Geografia do Brasil. São Paulo: Edusp, 2008.
SACHS, I. Caminhos para o desenvolvimento sustentável. Rio de Janeiro: Garamond,
2002.
WACQUANT, L. Os condenados da cidade. Rio de Janeiro: Revan, 2005.

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EAD
Conteúdos de História nos
Anos Iniciais do Ensino
Fundamental: a

3
colônia e o Brasil
Imperial

1. OBJETIVOS
• Refletir sobre a construção da história.
• Identificar os principais processos históricos da História
do Brasil colonial e imperial.
• Articular os conteúdos de história no contexto escolar.

2. CONTEÚDOS
• A história na sala de aula.
• História do Brasil colonial: o descobrimento, a posse e a
exploração da terra, a inconfidência mineira e a vinda da
corte.
• História do Brasil império: a independência, os reinados
de Dom Pedro I e Dom Pedro II, a guerra do Paraguai e o
fim da escravidão.
96 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

3. ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE


Antes de iniciar os estudos desta unidade, é necessário co-
nhecer um pouco sobre a biografia de alguns teóricos cujos pensa-
mentos norteiam este estudo.

Alfred Métraux
Foi um antropólogo suíço que se dedicou ao estudo dos índios sul-americanos.
Importante combatente contra teorias de superioridade racial, foi um dos colabo-
radores na elaboração da Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Tomás Antônio Gonzaga


“Advogado português formado em Coimbra, foi juiz em Portugal, depois Ouvidor
em Vila Rica, entre outros cargos. Poeta afamado, foi, de acordo com Kenneth
Maxwell, um dos principais líderes intelectuais do levante mineiro. Foi degredado
para Moçambique em 1792” (VAINFAS, 2000, p. 551).

Cláudio Manuel da Costa


“Mineiro nascido em Mariana (então Vila do Carmo), estudou filosofia no Rio de
Janeiro e Cânones em Coimbra, Portugal. Assim como Tomás Antônio Gonza-
ga foi poeta e esteve também envolvido no levante mineiro como um de seus
principais intelectuais. Foi encontrado enforcado dois dias após ser preso, em
Ouro Preto, e sob sua morte ainda pairam suspeitas de suicídio ou assassinato”
(VAINFAS, 2000, p. 123).

Hernani Donato
Historiador, é membro da Academia Paulista de Letras e do Instituto Histórico e
Geográfico de São Paulo. É autor da obra ilustrada História dos usos e costumes
do Brasil (2005).

Karl von den Steinen


Médico e explorador alemão, explorou toda a extensão do rio Xingu, estudando
o grupo indígena dos bacairis. Foi dele a conclusão sobre a ascendência desse
grupo entre os caraíbas, ao invés do tupi-guarani.

Kenneth Maxwell
Historiador britânico dedicado aos assuntos ibero-americanos, sobretudo o Bra-
sil, Maxwell é autor de A devassa da devassa (1977), Marquês de Pombal - pa-
radoxo do iluminismo (1996), entre outras importantes obras.

Joaquim José da Silva Xavier – Tiradentes


“Foi o acusado de menor poder socioeconômico entre todos os envolvidos na
Inconfidência. Foi também o único entre 11 condenados a ter cumprida a pena de
© U3 – Conteúdos de História nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental: a colônia e o Brasil Imperial 97

morte. Preso por três anos, foi enforcado e esquartejado em 1792. O historiador
José Murilo de Carvalho, entre outros, repara a fragilidade dos heróis históricos
nacionais na época da Proclamação da República, que passa a celebrar Tiraden-
tes como um dos maiores mártires brasileiros, inclusive revestido de aspectos
sagrados – construindo o mito de um cristo cívico” (VAINFAS, 2000, p. 549-550).

4. INTRODUÇÃO À UNIDADE
Nas unidades anteriores, você estudou os fundamentos de
conceitos importantes para o ensino de História e Geografia, como
a identidade, o tempo e o espaço. Além disso, estudou os principais
temas relacionados ao ensino de Geografia nas séries iniciais do En-
sino Fundamental de nove anos, incluindo a educação ambiental.
Recordando o início do nosso estudo, dissemos que não é
possível ensinar aquilo que não sabemos, e, pensando nisso, ob-
servamos que grande parte da dificuldade em trabalhar com histó-
ria no Ensino Fundamental advém do fato de que o único alicerce
conceitual são aquelas lembranças vagas do nosso próprio tempo
de escola. Por isso, nesta unidade, estudaremos os principais te-
mas e conteúdos para o ensino de História nas séries iniciais. Você
está pronto?
A História não é uma ciência estática que conta as coisas
como elas realmente aconteceram. Para isso, nem uma máquina
do tempo serviria! A História, pelo contrário, é uma produção do
presente sobre o passado, marcada pela data em que foi produ-
zida. Isso quer dizer que a História olha para o passado com os
olhos do presente, com os olhos do momento da pesquisa, e disso
decorre que as grandes questões do presente influenciam sobre-
maneira o modo como nós construímos a narrativa sobre o nosso
próprio passado.
É nesse sentido que a História é uma ciência viva, contro-
versa, constantemente reavaliada e reescrita – e é por isso que
ela é, também, um instrumento de construção da identidade tão
importante, porque ela significa o passado numa correspondência
dialética com o presente.

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98 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

Tomemos como exemplo o feminismo. À medida que a ter-


ceira onda feminista ganha espaço e voz, os estudos históricos
sobre o feminismo também avançam. Ou seja, enquanto o ma-
chismo não foi rivalizado pelo feminismo e as mulheres não encon-
traram, pelo menos na maioria das sociedades ocidentais, espaços
de poder maiores e consolidados, as pesquisas históricas também
não se interessaram firmemente por elas. Mas como a mulher e o
feminismo são parte do nosso universo cultural e de poder atual-
mente, elas tornaram-se, cada vez mais, parte da nossa tentati-
va de construção do entendimento do passado também (Cf. DEL
PRIORE, 1997).

5. A HISTÓRIA NA SALA DE AULA


Como acabamos de ver, a história não é o passado em si.
Ela é um discurso construído sobre o passado. Isso quer dizer que,
ao ensinar História, não trabalhamos com o passado tal qual ele
realmente aconteceu, mas sim com uma visão particular do que
acreditamos que tenha acontecido. Essa reconstrução do passado
é o trabalho do historiador: ele pesquisa em diversas fontes histó-
ricas e reconstrói, a partir delas e de outros livros, o discurso sobre
o passado.
Entre as fontes históricas disponíveis para pesquisa, pode-
mos citar documentos oficiais antigos; restos materiais de outros
povos, como vasos, urnas funerárias e ruínas de casas; livros; jor-
nais; fotografias; vídeos; músicas; traços culturais e, até mesmo, a
história preservada apenas na memória, transmitida entre as pes-
soas pela oralidade.
No entanto, não é apenas o historiador que constrói a histó-
ria: todas as pessoas, sejam crianças, jovens ou adultos, produzem
um tipo muito especial de história à medida que vivem a própria
vida. Elas produzem a sua própria história! A primeira expressão
dessa história de vida pessoal é a memória. Todos nós nos lembra-
© U3 – Conteúdos de História nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental: a colônia e o Brasil Imperial 99

mos da nossa própria vida, desde pequeninos, e as crianças têm,


também, as suas próprias recordações.
No Ensino Fundamental, a História não tem por objetivo
a reconstrução das histórias pessoais, tampouco apenas a com-
preensão dos elementos básicos da história local e nacional. Ela
tem um compromisso com o patrimônio cultural da humanidade,
seu reconhecimento, valorização e preservação, vinculando esse
patrimônio às suas raízes, ao seu contexto social e ao seu tempo!
Sobre isso, Jaime Pinsky e Carla Pinsky escreveram:
Nosso aluno, cada aluno, tem de se perceber como um ser social,
alguém que vive numa determinada época, num determinado país
ou região, oriundo de determinada classe social, contemporâneo
de determinados acontecimentos. Ele precisa saber que não pode-
rá nunca se tornar um guerreiro medieval ou um faraó egípcio. Ele
é um homem do seu tempo, e isso é uma determinação histórica.
Porém, dentro do seu tempo, dentro das limitações que lhe são de-
terminadas, ele possui a liberdade de optar. Sua vida é feita de es-
colhas que ele, com grau maior ou menor de liberdade, pode fazer,
como sujeito de sua própria história e, por conseguinte, da História
Social do seu tempo (2003, p. 28).

Desse modo, percebemos que, assim como falamos em in-


clusão digital, podemos falar numa inclusão histórica, que significa
a construção dos laços de pertencimento e compromisso com o
seu lugar, o seu passado, a sua gente, a sua história e o seu tempo!
Esse laço de pertencimento é fundamental para a criação da
sua identidade histórico-cultural, expressa não por um documento
ou por rótulos impostos de fora para dentro, mas por uma prática
cotidiana que envolve o modo de falar, de vestir, de comer, de dor-
mir, de aceitar o outro e a si mesmo. Uma identidade que se mostra
na música, na dança, no modo de trabalhar e nas atividades de lazer,
enfim, nas suas macro tradições e nas microexpressões familiares.
Pensando nisso, percebemos que a história está em todos
os lugares, basta termos os “olhos para ver”! O lanche no recreio,
a música no intervalo, os adereços que aparecem nos cadernos e
nos corpos, as brincadeiras em grupo, os esportes preferidos, os

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100 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

sotaques, os sobrenomes e os apelidos, tudo isso são expressões


e coisas que se moldaram no tempo e chegaram até os alunos não
por acaso, mas pela história!
No entanto, para termos esses olhos para “ver a história”, ou
seja, para podermos, de fato, partir do passado local dos alunos,
percebidos pela sensibilidade do professor, e vincular esse passa-
do a um patrimônio histórico maior, é preciso que saibamos a his-
tória que compõe esse patrimônio.
É isso que estudaremos no próximo tópico. Contudo, antes
de iniciarmos tais estudos, vejamos uma dica de atividade relacio-
nada ao assunto abordado até o momento.

Dica de Atividade Prática–––––––––––––––––––––––––––––––


Para que a criança consiga “ver a história”, é importante que você a estimule a
lembrar e a contar as suas próprias histórias. Ela pode, por exemplo, procurar
os seus primeiros documentos pessoais ou mostrar os seus álbuns de fotografia.
Essa estimulação, portanto, pode ser feita por meio de relatos pessoais, de en-
trevistas ou de objetos. Você também pode incentivá-la a reconstruir a sua histó-
ria, exercitando a memória e entrevistando parentes, amigos e vizinhos antigos!
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

6. DESCOBRINDO A HISTÓRIA DO BRASIL


É comum situarmos o começo da nossa História com o Des-
cobrimento do Brasil. Mas o que significa dizermos que o Brasil foi
descoberto, se não havia Brasil antes de os portugueses chegarem
aqui e, mesmo depois que eles chegaram, essas terras não passa-
ram a ser chamadas, imediatamente, de Brasil?
Descobrimento é o nome dado ao achamento, por parte dos
europeus, de terras para eles ainda incógnitas, e isso mostra expli-
citamente quem é que está contando essa história: os portugueses!
Especificamente no caso do Brasil, como emblema desse
descobrimento, existe a Carta de Pero Vaz de Caminha, que narra
o primeiro encontro entre os portugueses e os indígenas. Sobre
essa carta, o jornalista Eduardo Bueno escreveu:
© U3 – Conteúdos de História nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental: a colônia e o Brasil Imperial 101

Poucas são as nações que possuem uma "certidão de nascimento"


tão precisa e fluente como a carta que Pero Vaz de Caminha enviou
ao rei de Portugal, dom Manuel, relatando o achamento da nova
terra (2003, p. 27).

Portanto, os portugueses não descobriram um território va-


zio, muito pelo contrário, descobriram um território onde viviam
centenas de povos distintos, falando mais de 350 línguas diferen-
tes. Sobre a composição indígena do Brasil anterior à chegada dos
portugueses, o historiador Hernani Donato informou existirem
quatro grupos principais, divididos pela origem e por traços cultu-
rais, ainda no século 19, por Karl von den Steinen: os caraíbas; os
naipures; os tapuias ou jês; e o grande grupo tupi-guarani, que se
subdividiu em tupi e guarani.
Acompanhe:
Tupis e guaranis formavam um complexo de raça e língua. Há uns
2.000 anos, eles deixaram a Cordilheira Oriental Colombiana, ru-
mando para o sul e o leste. Os futuros guaranis desceram pelos va-
les dos rios Madeira e Guaporé. Os que viriam a ser os tupis, pelas
praias do oceano e os vales dos rios Araguaia e Tocantins. Mil anos
depois, tupis e guaranis se reencontraram entre os rios Tietê e Pa-
ranapanema. Para se estabelecer, expulsaram ou eliminaram popu-
lações pertencentes a culturas das quais ignoramos praticamente
tudo: os paleoíndios. Estes seriam grupos nômades, incapazes de
erguer malocas e por isso mesmo vivendo ao relento. [...] Confor-
me Alfred Métraux, a dispersão final dos tupis e guaranis teria ocor-
rido a partir da Bacia do Prata, no sentido sul-norte.
Os tupis tomaram pé na extensa área entre o Pará e o sul de São
Paulo, preferindo o litoral. Pelo nordeste vagaram os tupis poti-
guares, tabajaras, caetés. A atual Bahia acolheu tupiniquins e tu-
pinambás. Do Espírito Santo ao norte do Paraná, dominaram os
tamoios. No planalto paulista mandaram os guaianases. Pelo baixo
Amazonas, os mundurucus e os parintintins conservaram-se 'ilhas'
tupi em meio a outros povos. Na vastidão do seu domínio, os tupis
conviveram, ora bem, ora mal, com tribos estranhas: coroados, goi-
tacás, puris.
Aos guaranis coube o chão que vai do Paraná ao Rio Grande do Sul,
o Mato Grosso do Sul e terras da Argentina, da Bolívia e do Paraguai.
Por aí suportaram a vizinhança rixenta com os chiriguanos e outros.
Sob o rótulo jê haveria um grupo etnográfico de extensão ainda
não delimitada, sendo os tapuias seus principais representantes.

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102 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

Não sabemos como eles se autodenominavam, pois a palavra ta-


puia é da língua tupi, significando não-tupi, estrangeiro, bárbaro.
Jês foram os caiapós, goitacás, cariris, aimorés, botocudos, suiás,
bugres, coroados, apinajés.
Arauaques e caribes ou caraíbas, igualmente vindos do nordeste
continental, das Antilhas e da América Central, partilharam o vale
amazônico e o norte do planalto mato-grossense. Karib era o nome
que se davam, traduzindo o orgulho de serem considerados valen-
tes, guerreiros, heróis (DONATO, 2005, p. 12).

Como podemos perceber, existia uma extensa ocupação do


território, às vezes não por vias pacíficas, anterior à chegada dos
portugueses. E mesmo depois do descobrimento, com a imposição
do trabalho e da catequização dos índios, as influências das tradi-
ções indígenas ainda são marcantes na sociedade brasileira.
Para perceber isso, podemos pensar nos nomes de lugares
preservados da cultura indígena, como Corumbá, Anhangabaú,
Ceará, Curitiba, Paranapanema, Goiás, Cataguases e Garanhuns,
entre muitos outros! Aliás, a língua tupi, disciplinada pelos jesuí-
tas, foi a língua predominante no Brasil até o século 18, quando foi
proibida por lei. O uso dessa língua brasílica parece ser a origem
do sotaque caipira, abundante pelo nosso país, veja:
Pelo fato de não existirem entre as dezenove letras do tupi as letras
“f”, “l”, “j”, “z”, “v” e também o “r” forte, o “s” sibilante e os grupos
“lh”, “rr”, sucedeu que o som palatal “lh” soou “ie” (paia em vez
de palha, fio em vez de filho) e o “l” gutural (o l da palavra animal)
soou “r” = animar. Assim diz o povo no modo de falar tupinizado ou
acaipirado: paia, fio, animar (DONATO, 2005, p. 15).

Durante os primeiros 30 anos depois do descobrimento, não


houve efetiva ocupação do solo, ainda que os portugueses, mas
não somente eles, viessem nessas terras buscar pau de tinta, ou
pau-brasil.
O pau-brasil é uma árvore de médio porte muito visada pelos
europeus do século 16 para tingir linho, seda e algodão e dar-lhes
um nobre tom avermelhado, bastante apreciado na moda euro-
peia de então. Foram derrubados, aproximadamente, 70 milhões
de pés em três séculos de exploração. Seu tom avermelhado, um
© U3 – Conteúdos de História nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental: a colônia e o Brasil Imperial 103

brasil ardente, deu nome à árvore e, depois disso, a todo o país.


Já o nome brasileiro, até a independência, designou o trabalhador
que vivia de explorar o pau-brasil, e não o homem que por aqui
nascia. Por traduzir um trabalho, e não uma cidadania, o brasileiro
é, talvez, o único povo a carregar o sufixo eiro, raro nas nacionali-
dades, mas muito comum para designar um ofício.
Mas não apenas o pau-brasil era explorado no país. A nau
Bretoa, em 1511, carregou 5.000 toras de pau-brasil, 3.000 peles
de onças, 600 araras ainda vivas e 35 índios, levados para atender
a curiosidade europeia sobre seu exotismo.
O interesse francês pelas terras portuguesas, no entanto,
mudou o rumo dessa história: para garantir a exploração do terri-
tório e sua posse por Portugal, era então preciso ocupá-lo. Assim
ocorreu a expedição de Martin Afonso de Souza, em 1530, que
terminou por fundar São Vicente em janeiro de 1532 e determinar
a ocupação do território por meio das Capitanias Hereditárias.
Mas o que eram as Capitanias Hereditárias?
Uma capitania hereditária era uma faixa de terra, variando
entre 30 e 100 léguas, entre a costa e a linha do Tratado de Torde-
silhas, que era oferecida a um donatário, ou seja, um homem que
a poderia governar com poderes extraordinários, inclusive com o
direito da hereditariedade.
Em contrapartida ao ganho da terra, o donatário deveria ar-
car com todas as despesas de ocupação, transporte, exploração e
administração das suas terras. De acordo com Caio Prado Júnior,
não apareceu nenhum grande fidalgo português disposto a se ar-
riscar nessa aventura de vir para o lado de cá do Atlântico, e os 12
donatários que toparam a empreitada perderam todas as posses,
e alguns perderam a vida. Apenas Martin Afonso de Souza e Duar-
te Coelho tiveram sucesso: o primeiro em São Vicente, o segundo
em Pernambuco (Cf. PRADO JÚNIOR, 1972).

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104 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

Ao todo, foram 14 as Capitanias, divididas em 15 lotes (a Ca-


pitania do Maranhão era dividida em dois), distribuídos a 12 do-
natários.
O modelo de exploração da terra que passou a ser sistema-
ticamente utilizado a partir dessas Capitanias e também depois
delas foi o plantation.
Uma plantation é caracterizada por ter três elementos: pos-
suir uma vasta extensão de terra, ser uma monocultura e utilizar
mão de obra escrava. O produto escolhido para ser cultivado nas
plantations era já conhecido dos portugueses, a cana-de-açúcar.
A escolha da cana-de-açúcar foi a mola propulsora da econo-
mia colonial, da exploração em larga escala de indígenas e do trá-
fico de homens e mulheres feitos escravos no continente africano.
Escravizados, indígenas e africanos animaram as plantations
por mais três séculos. O trabalho nesses lugares não era nada fácil:
fosse lavrando no campo, lidando com os tachos incandescentes
no engenho, ou cumprindo os deveres na casa grande, os escravos
eram explorados sistematicamente.
Já para os donos da terra e suas famílias, vivendo nas casas-
-grandes, a situação era bem diferente, mas não exatamente fácil,
dado o isolamento e a precariedade do espaço. Acompanhe o co-
mentário de Gilberto Freyre:
A casa-grande, completada pela senzala, representa todo um sis-
tema econômico, social, político: de produção (a monocultura lati-
fundiária); de trabalho (a escravidão); de transporte (o carro de boi,
o bangüê, a rede, o cavalo); de religião (o catolicismo de família,
com capelão subordinado ao pater familiar, culto dos mortos, etc.);
de vida sexual e de família (o patriarcalismo polígamo); de higiene
do corpo e da casa (o “tigre”, a touceira de bananeira, o banho de
rio, o banho de gamela, o banho de assento, o lava-pés); de polítua
(o compadrismo). Foi ainda fortaleza, banco, cemitério, hospeda-
ria, escola, santa casa de misericórdia amparando os velhos e as
viúvas, recolhendo órfãos (1964, p. 73).

Como você pode imaginar, as plantations não poderiam, ex-


clusivamente, plantar cana-de-açúcar sem que faltassem alimen-
© U3 – Conteúdos de História nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental: a colônia e o Brasil Imperial 105

tos básicos para seus moradores, fossem homens livres ou escra-


vos. Assim, entre as plantações de cana-de-açúcar, de maneira não
sistemática, podia ser plantado milho ou feijão, e, em áreas não
cultivadas, mandioca e ervas. Contudo, o fornecimento de carne
bovina não era típico das plantations, sendo a pecuária uma ativi-
dade desenvolvida pelas áreas livres, de maneira extensiva.
Segundo Furtado,
Ao expandir-se a economia açucareira, a necessidade de animais
de tiro tendeu a crescer mais proporcionalmente, pois a devasta-
ção das florestas litorâneas obrigava a buscar a lenha a distâncias
cada vez maiores. Por outro lado, logo se evidenciou a impraticabi-
lidade de criar o gado na faixa litorânea, isto é, dentro das próprias
unidades produtoras de açúcar.
Os conflitos provocados pela penetração de animais em plantações
devem ter sido grandes, pois o próprio governo português proibiu,
finalmente, a criação de gado na faixa litorânea. E foi a separação
das duas atividades econômicas – a açucareira e a criatória – que
deu lugar ao surgimento de uma economia dependente na própria
região nordestina (2000, p. 59-60).

Percebemos, então, que a pecuária surgiu como uma ativida-


de complementar à plantation, e, dada a proibição da sua atividade
nas áreas “nobres” da cana-de-açúcar, foi natural que ela implemen-
tasse, em especial no nordeste, uma interiorização da colônia.
A criação de gado, ao longo dos dois primeiros séculos de
colonização do Brasil, era uma atividade quase totalmente itine-
rante, sem ainda podermos falar em fazendas de gado, mas sim
em rebanhos vivos que venciam as distâncias entre os engenhos,
as vilas e o litoral, consagrando caminho e estabelecendo novas
rotas de viagens.
Com base no assunto abordado neste tópico Veja uma dica
de atividade.

Dica de Atividade Prática–––––––––––––––––––––––––––––––


Ao trabalhar com a pecuária, podemos associar as viagens dos rebanhos vivos
aos modos de preservação da carne. A carne de sol, carne seca, charque ou
carne estrelada, por exemplo, são todos meios de se preservar a carne nessas
viagens. Desse modo, reflita com seus alunos como a proibição de criar gado

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106 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

no litoral pode ter contribuído com a expansão do conhecimento do interior do


Nordeste. Sendo obrigado a abandonar o litoral nordestino, rapidamente, o gado
atravessou o sertão, pois este não suportaria alimentar os animais. Assim, a
criação cruzava o rio São Francisco e alcançava o rio Tocantins, rumo ao interior.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

Vimos, até agora, quem eram os índios, a chegada do portu-
guês e a consequente exploração da madeira, da cana-de-açúcar
e da pecuária, atividades existentes, em maior ou menor grau, até
os dias de hoje e que podem nos fornecer pistas para entender a
história de quem somos.
Agora, estudaremos brevemente outra formação social bra-
sileira que emergiu de uma atividade econômica: a sociedade mi-
neradora.
Vamos lá?

7. O OURO E A INCONFIDÊNCIA MINEIRA


O modo de viver no Brasil foi praticamente o mesmo nos
dois primeiros séculos após a chegada dos portugueses, baseados
na plantação de cana-de-açúcar para a produção e a exportação
do açúcar. No final do século 17, essa condição iria ser severamen-
te alterada com o descobrimento de ouro na região de Minas Ge-
rais, especificamente onde hoje se encontram as chamadas cida-
des históricas de Minas.
Ao contrário da pecuária e da plantation, a mineração foi
uma atividade controlada muito de perto pela Coroa Portuguesa,
desde a descoberta da mina até a sua travessia para Portugal. Isso
ocorria porque a mineração foi uma das atividades econômicas
mais rentáveis durante o século 18, rivalizada apenas pelo tráfico
de escravos africanos. Mas como acontecia, efetivamente, a mine-
ração? Vamos ver isso juntos!
Para começar, quando o ouro era descoberto em qualquer
área das minas, o descobridor era obrigado a avisar as autorida-
des locais. Feito isso, as autoridades demarcavam a região e divi-
© U3 – Conteúdos de História nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental: a colônia e o Brasil Imperial 107

diam nela lotes para serem minerados. Esses lotes de terra eram
conhecidos como datas. O descobridor da área era o primeiro a
escolher o seu lote, ou melhor, a sua data, e, depois, a Fazenda
Real escolhia a sua própria área, que seria leiloada. Para os demais
mineradores presentes e desejosos de participar, a repartição era
feita por sorte, cabendo a cada um uma data correspondente ao
número de escravos que possuía.
Todo o ouro extraído das áreas datadas (ou seja, das áreas
divididas em datas) deveria ser levado para as Casas de Fundição,
local onde seria fundido em barras cunhadas, quintado (ou seja,
subtraído de seu total a parte fixada pela Coroa como imposto,
chamado de quinto) e, por fim, certificado, ou seja, entregue ao
portador original juntamente com um certificado de sua origem e,
é claro, com um aviso de que daquele ouro já havia sido retirada a
parte da Coroa.
Mas, ao invés da Coroa cobrar uma porcentagem de imposto
sobre o ouro efetivamente extraído das minas, ela fixava, antes, a
quantia anual que deveria receber, e os mineiros que dessem con-
ta de extrair o suficiente! Assim, se a quantidade de ouro quintado
não fosse suficiente, a Coroa poderia cobrar a sua parte tendo os
mineiros que pagar com ouro já certificado. Quando a quantia ne-
cessária de ouro não era alcançada, uma Derrama podia ser anun-
ciada, ou seja, a cobrança, de uma só vez, dos valores atrasados
devidos à Coroa.
Um senso indicava os bens em ouro dos moradores da zona
aurífera, e os soldados eram encarregados de buscá-los. A razão
inicial da Inconfidência Mineira foi a declaração de que haveria
uma Derrama na zona aurífera de Minas, em fevereiro de 1789.
Vamos ver isso melhor?
Nas cidades da zona aurífera, como Vila Rica (hoje Ouro Pre-
to), Mariana, São João del Rey e São José del Rey (hoje Tiraden-
tes), depois de quase um século de atividade mineradora, viviam
muitas pessoas que dependiam da mineração, sem, contudo, ser

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108 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

mineradores: eram funcionários do Estado, como juízes, fiscais,


intendentes, encarregados, escrivães, soldados; ou comerciantes
privados, mercadores, prestadores de serviços, artistas, poetas
etc. Pela primeira vez, o Brasil tinha cidades se desenvolvendo lon-
ge do litoral, onde havia os portos de exportação!
Além dessas pessoas, os filhos das famílias mais abastadas,
que haviam estudado na Europa, trouxeram de lá ideias de liberdade
até então estranhas ao Brasil colonial. Eram as pessoas ilustradas:
O termo iluminismo, ou ilustração, tem três dimensões comple-
mentares: em primeiro lugar, designa as ideias filosóficas desen-
volvidas, sobretudo, na França e que atribuem à razão (no lugar da
fé) a primazia como instrumento do homem para compreender o
mundo; em segundo lugar, exprime uma transformação de valores
e de instituições que são consideradas as raízes do mundo contem-
porâneo; e, em terceiro lugar, designa o período histórico corres-
pondente à segunda metade do século 18, no qual estas ideias flo-
resceram (VAINFAS, 2000, p. 296).

Pois bem, você pode imaginar o resultado explosivo da mis-


tura que envolve, de um lado, um governo absolutista que cobra à
força o imposto não pago, e, de outro, uma elite ilustrada cheia de
ideias sobre liberdade, democracia e república? Foi dessa mistura
que emergiu a Inconfidência Mineira!
Reuniões secretas aconteciam envolvendo padres, profissio-
nais liberais e, até mesmo, funcionários do alto escalão do governo!
Os membros dessas reuniões eram chamados de conjurados. A ideia
dos conjurados era aproveitar o dia da Derrama, quando a popula-
ção estivesse revoltosa contra a Coroa, para promover a revolução!
De acordo com o historiador inglês Kenneth Maxwell, deve-
ria seria fundada uma República liberal cuja capital seria São João
del Rey. Tomás Antônio Gonzaga seria o novo presidente dessa re-
pública nascente, o ferro seria explorado para o avanço técnico
da nação, ao invés, apenas, do ouro, o distrito diamantino seria
liberado da forte vigilância do governo, hospitais e universidades
seriam criados e, quem sabe, até a escravidão seria abolida! Pelo
menos, esse era o plano.
© U3 – Conteúdos de História nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental: a colônia e o Brasil Imperial 109

O que houve de fato é que a notícia do levante no dia da Der-


rama vazou, tendo um dos conjurados, Silvério dos Reis, contado o
segredo ao governo, que suspendeu a Derrama. No dia combina-
do, ao invés dos conjurados saírem às ruas para instigar a popula-
ção para uma revolta, eles acabaram presos, desarticulando todo
o movimento independentista.
Entre os presos estavam o próprio Tomás Antônio Gonzaga,
Cláudio Manuel da Costa e Joaquim José da Silva Xavier, o Tira-
dentes. Cláudio Manuel da Costa morreu ainda em Vila Rica, onde
hoje é a Casa dos Contos, outros 12 foram sentenciados à morte,
mas, no dia seguinte, a pena converteu-se em degredo. Apenas
uma sentença foi efetivamente cumprida, a de Tiradentes.
Talvez por ser o menos rico, talvez por ter sido o único a não
se declarar inocente das acusações, Tiradentes foi enforcado e es-
quartejado três anos depois. Nos anos seguintes do Brasil Colonial
e mesmo ao longo do século 19, com o país já independente, a
inconfidência mineira e a memória de Tiradentes não foram glo-
rificadas, porque mesmo livre o país tornou-se um império (e não
uma república como propunham os inconfidentes) e nessa casa
reinante estavam, sucessivamente, o filho e o neto da rainha que
condenou o mártir. Apenas com a proclamação da república é que
sua memória seria glorificada, seu semblante aproximado ao de
Cristo e, até mesmo a cidade onde residiu, São José del Rey, rece-
beria seu nome, tornando-se a charmosa Tiradentes.
Vejamos, como de praxe, uma dica de atividade com base no
assunto abordado neste tópico.

Dica de Atividade Prática–––––––––––––––––––––––––––––––


Estudar o sistema de cobrança de impostos é uma ferramenta para compreen-
dermos como funciona o Estado e as maneiras de arrecadação de impostos
atualmente. Você pode falar com seus alunos sobre os sistemas eletrônicos de
cobrança do Imposto de Renda hoje, além do pedágio, do IPVA, do IPTU, do
ICMS, do CPMF, entre tantos outros impostos que nos são impostos!
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110 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

8. A VINDA DA CORTE PORTUGUESA E A INDEPEN-


DÊNCIA DO BRASIL
O início do século 19 foi bastante tumultuado para os paí-
ses da Península Ibérica e suas colônias americanas: esse tempo
compreende os processos de independência da maioria dos países
que, ate então, eram colônias de Espanha e Portugal.
No caso brasileiro, no entanto, um acontecimento veio al-
terar e mesmo ameaçar o fim até então inexorável para os siste-
mas coloniais: a administração do reino português, incluindo a
Rainha e o Príncipe Regente em pessoa, mudou-se para o Brasil
em 1808!
A transferência da Corte Portuguesa para seus domínios
americanos foi enredo de histórias muito curiosas, a maioria fruto
de relatos sobre o atropelo do embarque, das condições da via-
gem e dos problemas que envolveram a instalação, do dia para a
noite, de 12 mil pessoas no Rio de Janeiro! (Cf. GOMES, 2006).
A guerra entre Inglaterra e França forçava os portugueses,
desde o final do século 18, a tomar um lado na contenda. Mas a
escolha era impossível: parceira comercial dos ingleses, não pode-
ria fechar-se a esse importante comércio; vizinha da Espanha, que
por sua vez estava aliada aos franceses, não podia romper com a
França sem a certa retaliação espanhola. A saída portuguesa foi
o equilíbrio entre uma política aparente de neutralidade aliada a
uma política discreta de apaziguamento, aqui e ali, à medida que
os ultimatos chegavam a Lisboa.
Apesar da fama de Inapto, D. João VI acabou sendo o único
Príncipe ameaçado por Napoleão a manter a coroa sobre a própria
cabeça e a posse das colônias. A saída para isso foi sua retirada de
Lisboa rumo ao Rio de Janeiro (Cf. LOPES, 2002).
Como prova disso, vejamos as realizações que D. João fez no
Rio de Janeiro durante o tempo de sua estadia:
© U3 – Conteúdos de História nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental: a colônia e o Brasil Imperial 111

Além de abrir os portos, declarar o Brasil um reino unido a Portugal


e remodelar o Rio de Janeiro, ele permitiu a instalação de indústrias
e aparelhou as Forças Armadas, criando a Academia da Marinha, a
Academia Militar e uma fábrica de pólvora (assim como as outras
obras, essa foi paga pelos traficantes de escravos do Rio). Construiu
o Jardim Botânico, um observatório astronômico e um museu mi-
neralógico. Fez o teatro, a biblioteca pública e a tipografia real, cuja
primeira publicação foi A riqueza das nações, de Adam Smith (BUE-
NO, 2003, p. 145).

Com a vinda Corte, portanto, o Rio de Janeiro passou de por-


to mercantil à sede do império português, literalmente, da noite
para o dia, e, ao longo dos anos em que a corte ficou por lá, o Rio
ia transformando sua fisionomia e criando o ambiente no qual a
ideia de independência seria gestada.
Mas todas as alterações ocorridas desde 1808 sofriam a
ameaça de desaparecer, pois em Portugal revogavam-se, nas Cor-
tes Gerais Extraordinárias e Constituintes da Nação Portuguesa,
todas as ações com vistas a mudar o status da colônia. Assim, re-
vogaram o privilégio de Reino Unido e eliminaram todo o aparato
burocrático necessário à administração da Corte no Rio de Janeiro,
obrigando também D. João VI a retornar a Portugal. Sem escolha,
o rei, que se afeiçoara tanto ao clima e, sobretudo, a distância que
estava de Inglaterra e França, voltou a Portugal, deixando no Rio
seu filho Pedro de Alcântara.
Essas alterações vindas de Portugal não foram aceitas silen-
ciosamente por aqui, e a figura do Príncipe Pedro, residente no
Brasil desde os cinco anos de idade, passou a significar a esperança
de uma saída que fosse uma ruptura em relação a Portugal, mas
sem muitos abalos em relação à situação que o país já vivia desde
1808.
O manifesto que deu força às aspirações de D. Pedro e culmi-
nou com o Dia do Fico foi escrito por José Bonifácio, homem que
passou, em seguida, a comandar o primeiro gabinete organizado
por D. Pedro após a retirada do Brasil das forças portuguesas.

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112 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

Por todo o ano de 1822, as atitudes de D. Pedro e do mi-


nistério de Bonifácio selaram a separação de Portugal, que culmi-
nou com a declaração do Sete de Setembro e a posterior coroação
como Imperador do Brasil, em primeiro de dezembro de 1822.
Dois anos depois da coroação de D. Pedro, foi outorgada a
primeira Constituição do Brasil, conforme veremos no texto a se-
guir:

A Primeira Constituição do Brasil––––––––––––––––––––––––


A primeira constituição brasileira, outorgada em 1824, foi feita sob medida para
atender as vontades do novo monarca e estabelecer as regras gerais que per-
durariam por todo o Império: uma monarquia hereditária; um poder moderador
exercido pelo monarca e pelo qual ele não devia responsabilidade legal; direitos
de escolha individual, pelo monarca, para o Executivo, para as presidências das
províncias, para o Senado e para os Conselhos e Assembleias gerais; voto cen-
sitário e senado vitalício. Em vista desse fato, veremos como ocorreu o Império
Brasileiro.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

9. O IMPÉRIO BRASILEIRO
D. Pedro I foi um monarca de personalidade forte e instável,
com uma biografia repleta de desavenças, amores, violências e des-
mandos. Orgulhoso, amoroso e aventureiro, teve as características
necessárias para romper com as Cortes Portuguesas, com seu pai e
com seu país natal, arriscando-se na aventura de tornar o Brasil in-
dependente e tornar-se imperador. Por essa razão, é considerado o
monarca português mais eficiente do século 19, apesar de ter mor-
rido precocemente, em Portugal, aos 36 anos de idade, deixando no
Brasil seu filho e herdeiro do trono que criara, D. Pedro II.
Tendo se transformado no órfão da nação aos cinco anos de
idade, Pedro II, ao contrário de seu pai e seu avô, foi educado para
ser um monarca, mas não o podia ser tão cedo! Por isso, o Brasil
viveu sua primeira experiência regencial.
Com a arena política em efervescência, pois, pela primeira
vez, a figura do monarca forte não estava presente, muitas forças
© U3 – Conteúdos de História nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental: a colônia e o Brasil Imperial 113

políticas díspares apareciam e se chocavam, sobretudo, os liberais


e os conservadores.
O Partido Conservador era formado, predominantemente,
pelos magistrados, juízes, grandes comerciantes e burocratas do
Rio de Janeiro, além dos grandes ruralistas do nordeste, já o Par-
tido Liberal era constituído por padres, pela classe média urbana
da capital e pelos proprietários de terra das regiões de São Paulo,
Minas Gerais e do sul do país (Cf. BUENO, 2003, p. 182).
Em meio à turbulência política, a solução, cada vez mais
aventada para as dificuldades de governo entre os partidos, era a
maioridade declarada de Pedro II, de modo que ele não precisasse
esperar até os 18 anos para assumir o trono, apaziguar os conflitos
e, é claro, retribuir o apoio do grupo que o conduzisse até o poder.
O Golpe da Maioridade, portanto, fez com que um jovem
de 14 anos, tímido e acanhado, se tornasse imperador! Aclamado
pelo povo e símbolo de esperança para todos os problemas na-
cionais, o jovem imperador, não sem iniciativa, teve de aprender
rápido a lidar com as facetas da política nacional.
No plano externo, se o grande desafio de D. Pedro I foi ten-
tar resistir às pressões portuguesas quanto ao seu retorno, o que
acabou acontecendo em 1831, já para seu filho, D. Pedro II, o prin-
cipal desafio exterior foi a longa campanha militar conhecida como
Guerra do Paraguai, entre 1864 e 1870.
A bacia do rio da Prata, local estratégico para o transporte ma-
rítimo e o escoamento dos produtos do sul, era uma área utilizada
pela Argentina, pelo Brasil, pelo Paraguai e pelo território atual do
Uruguai. Todos os países, em maior ou menor medida, já haviam
procurado dominar a bacia, controlado o comércio e o transporte
do Prata, mas as intenções de expansão paraguaias, controlada por
Francisco Solano López, levaram Argentina, Brasil e Uruguai a com-
porem a Tríplice Aliança, união militar que levou à derrota do Para-
guai, depois de seis anos de luta e custando a vida de mais de 150
mil pessoas, entre todas as nacionalidades envolvidas.

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114 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

Façamos uma pausa para verificarmos uma dica de atividade


para o assunto abordado até o momento.

Dica de Atividade Prática–––––––––––––––––––––––––––––––


A guerra do Paraguai foi o conflito mais violento da História da América do Sul,
marcando profundamente, até os dias atuais, a fisionomia da região e a consti-
tuição populacional do Paraguai. Pensando nisso, reflita com os alunos sobre o
absurdo da guerra e o fato de que todos os países envolvidos sempre perdem
suas guerras, não importa quem a vença no campo de batalha.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
No plano econômico, o café foi o responsável, a partir de
1830, por praticamente metade das exportações brasileiras e as-
sim permaneceu até a década de 1870, quando o Brasil, sozinho,
já era o responsável por metade da produção anual de café. No en-
tanto, o que sustentava a política e a economia nacional e permitia
a pujança do café era a base de trabalho escravo, explorada a mais
de 300 anos e, então, em vias de entrar em colapso.
Vamos ver isso juntos?

10. O FIM DA ESCRAVIDÃO


O Brasil foi o último país a abolir, oficialmente, a escravidão.
Mesmo depois de terminada, no entanto, seus efeitos continua-
ram a ser sentidos na sociedade brasileira, pois a clivagem produ-
zida nunca foi completamente resolvida, apesar das leis e de todo
o progresso na noção de direitos humanos ocorrido desde então.
A primeira lei contra o tráfico de africanos foi a Eusébio de
Queiróz, aprovada em setembro de 1850, na verdade uma ade-
quação brasileira ao Slave Trade Suppression Act, ato do governo
inglês que o permitia apreender navios com escravos saídos da
África. Todo escravo que entrasse no país a partir de então seria
considerado ilegal.
20 anos depois, a Lei do Ventre Livre (em 28 de setembro de
1871) decretou que os filhos de escravos nascidos a partir daquele
dia seriam livres, mas viveriam com os pais (e seus “donos”) até os
© U3 – Conteúdos de História nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental: a colônia e o Brasil Imperial 115

21 anos custeados pelo governo, ou seriam imediatamente entre-


gues ao poder público.
Já em 1885, a lei Saraiva-Cotegipe, ou lei dos sexagenários,
decretava a liberdade imediata de todo escravo com mais de 65
anos e um pedágio de três anos de trabalho para a liberdade dos
que tivessem entre 60 e 65 anos. Na prática, no entanto, a lei libe-
rava os donos de escravos do fardo de lidar com escravos velhos e
“improdutivos”.
Por fim, a Lei Áurea, decretada no dia 13 de maio de 1888.
Ela abolia, imediatamente, todos os escravos do país. Aproxima-
damente, um contingente de pouco mais de dois milhões de pes-
soas, num país com 14,5 milhões de habitantes. No beija-mão que
se seguiu ao decreto, dizem que o Barão de Cotegipe teria dito à
Princesa Isabel: vossa majestade redimiu uma raça, mas acaba de
perder o trono (Cf. BUENO, 2003).
Você já se perguntou para onde foram os escravos após o fim
da escravidão?
Alguns permaneceram nas fazendas, como homens livres,
apesar de, na prática, os velhos hábitos permanecerem. Muitos
foram em direção às cidades em busca de trabalho, mas apenas
encontraram subempregos e moradias precárias, em geral cortiços
no centro ou favelas nas periferias.
Com a abolição, de fato, a Princesa Isabel isolou a monarquia
de grande parte de seus aliados: os monarquistas abolicionistas e
os escravistas que se convertiam, em grande parte por ressenti-
mento, em republicanos de última hora, aumentavam o coro dos
partidários do fim da monarquia e da proclamação da república,
como veremos na próxima unidade.

11. questões AUTOAVALIAtivas


Vamos, neste momento, novamente, testar os seus conhe-
cimentos.

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116 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

A autoavaliação pode ser uma ferramenta importante para


você avaliar o seu desempenho. Se você encontrar dificuldades em
responder a essas questões, procure revisar os conteúdos estuda-
dos para sanar as suas dúvidas. Este é o momento ideal para que
você faça uma revisão desta unidade. Lembre-se de que, na Edu-
cação a Distância, a construção do conhecimento ocorre de forma
cooperativa e colaborativa; compartilhe, portanto, as suas desco-
bertas com os seus colegas.
A seguir, estão as questões propostas para esta unidade. Siga
em frente!
1) O que significa dizer que todos somos produtores da história?

2) O que quer dizer a história não ser o passado em si, mas uma construção a
partir dele?

3) Qual é a ligação existente entre a fala caipira e a fala indígena? Qual a impor-
tância dessa descoberta?

4) Por que o pau-brasil foi tão importante no início da ocupação da colônia?

5) O que eram as plantations? Como elas funcionavam?

6) Que ligações podemos fazer entre a Inconfidência Mineira e as atuais co-


branças de impostos?

7) Quais mudanças a vinda da Corte Portuguesa proporcionou ao Rio de Janeiro?

8) Como podemos caracterizar o período imperial no Brasil?

9) Como ocorreu o processo de abolição dos escravos no Brasil? Quais as suas


principais consequências?

12. CONSIDERAÇÕES FINAIS


Nesta unidade, estudamos os conteúdos de História do Bra-
sil, desde o descobrimento do país até o final do período impe-
rial. Durante nossos estudos, pudemos reparar que o processo
de construção da história é uma atividade permanente e não um
retrato fiel do passado, o que quer dizer, na prática, que nosso
© U3 – Conteúdos de História nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental: a colônia e o Brasil Imperial 117

estudo não pode parar por aqui! Com persistência e curiosidade,


descobriremos sempre mais facetas da história, o que tornará nos-
sas aulas e seu respectivo conteúdo mais interessantes, relevantes
e contextualizados.
Na próxima unidade, continuaremos nosso passeio pela His-
tória do Brasil, refletindo sobre os acontecimentos do século 20
que fazem parte dos currículos escolares de história.
Até lá!

13. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


ALVIM, Z. Imigrantes: a vida privada dos pobres no campo. In: NOVAIS, F. (Dir.).;
SEVCENKO, N. (Org.). História da vida privada no Brasil. República: da belle èpoque à era
do rádio. São Paulo: Cia das Letras, 1998. v. 3.
ANTUNES, C. (Coord.). História e didática. Pretópolis: Vozes, 2010. (Coleção Como Bem
Ensinar).
BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria da Educação Fundamental.
Parâmetros Curriculares Nacionais: história e geografia. 2. ed. Rio de Janeiro: DP&A,
2000.
BOXER, C. R. O império marítimo português: 1415-1825. São Paulo: Cia das Letras, 2002.
1ª edição de 1969.
BUENO, E. Brasil: uma história. São Paulo: Ática, 2003.
DEL PRIORE, M. História das Mulheres no Brasil. São Paulo: Contexto / Unesp, 1997.
DONATO, H. História dos usos e costumes do Brasil: 500 anos de vida cotidiana. São
Paulo: Melhoramentos, 2005.
FREYRE, G. Casa grande & senzala. Rio de Janeiro: José Olympio, 1964.
FURTADO, C. Formação econômica do Brasil. São Paulo: Cia. Editora Nacional, 2000.
GOMES, L. 1808 – Como um rainha louca, um príncipe medroso e uma corte corrupta
enganaram Napoleão e mudaram a história de Portugal e do Brasil. São Paulo: Planeta,
2006.
LIMA, O. D. João VI no Brasil. Rio de Janeiro: Topbooks, 1996.
LOPES, R. T. D. A trajetória de uma idéia: o pensamento da transferência da Corte de
Bragança para a América portuguesa. Revista Ensaios de História, v. 7, n. 1 / 2, 2002.
MAXWELL, K. A devassa da devassa. A Inconfidência Mineira: Brasil-Portugal, 1750-1808.
Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985.
PINSKY, J. A escravidão no Brasil. São Paulo: Contexto, 1993.
PINSKY, J.; PINSKY, C. B. História da cidadania. São Paulo: Contexto, 2003.
PINSKY, C. B. (Org.). Fontes históricas. São Paulo: Contexto, 2005.

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118 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

PRADO JÚNIOR, C. História econômica do Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1972.


SCHWARCZ, L. M. A longa viagem da biblioteca dos reis: do terremoto de Lisboa à
independência do Brasil. São Paulo: Cia das Letras, 2002.
VAINFAS, R. (Dir.). Dicionário do Brasil Colonial (1500-1808). Rio de Janeiro: Objetiva,
2000.
EAD
Conteúdos de História nos
Anos Iniciais do Ensino
Fundamental: O
Brasil Republicano
4
1. OBJETIVOS
• Identificar os principais processos históricos da história
do Brasil republicano.
• Comparar os quadros históricos com as questões da atua-
lidade.
• Contextualizar o conhecimento histórico na escola.

2. CONTEÚDOs
• História do Brasil Republicano.
• A proclamação da república.
• A república velha.
• O café.
• A semana de arte moderna de 1922.
• A Revolução de 1930 e 1932.
120 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

• A Era Vargas.
• A ditadura militar no Brasil.
• A República Nova.

3. ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE


Antes de iniciar os estudos desta unidade, pode ser inte-
ressante conhecer um pouco sobre a biografia de alguns teóricos
cujos pensamentos norteiam este estudo.

Antonio Carlos Castrogiovanni


É professor de Geografia e Turismo da PUC do Rio Grande do Sul e autor de
obras como Turismo urbano, Um outro turismo é possível e Geografia, este últi-
mo em coautoria.

Lilia Schwarcz
É historiadora, professora livre-docente do Departamento de Antropologia da
USP. É autora, entre outros livros, de Racismo no Brasil (2001), Negras imagens
(1997), Contrastes da intimidade contemporânea (1998), As barbas do Impera-
dor (1998) e A longa Viagem da biblioteca dos reis (2003).

4. INTRODUÇÃO À UNIDADE
Na unidade anterior, estudamos conteúdos de História do
Brasil referentes ao período colonial e também imperial. Nesta
unidade, prosseguiremos nosso estudo, mas agora com um pas-
seio pelos conteúdos de história do Brasil republicano. Vamos lá?
Quanto mais perto no tempo estudamos a história, menos
dependentes apenas dos livros ficamos. Ao estudar, por exemplo,
o período de governo de Vargas, o regime militar ou a redemocra-
tização, poderemos recorrer às histórias de vida de colegas profes-
sores, pais e avós de alunos, que poderão ser incluídos nos nossos
estudos!
Como estudamos anteriormente, os grupos abolicionistas
apoiaram o surgimento da República porque estavam desapon-
© U4 – Conteúdos de História nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental: O Brasil Republicano 121

tados com a abolição da escravidão providenciada pela Princesa


Isabel. No entanto, esse apoio apenas veio se juntar ao pensamen-
to republicano que se desenvolvia há mais de 20 anos no Rio de
Janeiro, organizado como Partido Republicano.
O manifesto desse grupo foi escrito por Quintino Bocaiúva e
atacava a constituição de 1824, o senado vitalício e a existência de
um monarca. As assinaturas que acompanharam o manifesto de-
monstram o perfil dos seus partidários: grande parte eram advo-
gados, médicos, engenheiros, funcionários públicos, professores
e, também, negociantes, ou seja, eram profissionais liberais muito
ligados à vida urbana, interessados numa transição pacífica da mo-
narquia à república.
Vamos ver de perto como isso aconteceu?

5. A PROCLAMAÇÃO DA REPÚBLICA
Além dos republicanos, dos abolicionistas e de muitos
ex-escravistas, um último grupo foi essencial para que a monar-
quia chegasse ao fim no Brasil. Trata-se dos militares.
Uma das proibições imposta aos militares era a de que não se
expressassem em jornais, sobretudo sobre questões políticas. No
entanto, o Coronel Antonio da Sena Madureira e o Coronel Cunha
Matos utilizaram os jornais para defender o fim da escravidão, no
caso de Sena Madureira, e para fazer uma defesa da própria honra
na guerra do Paraguai, no caso de Cunha Matos.
Isso foi o suficiente para que as alas mais conservadoras,
tanto militares quanto civis, se indispusessem contra os militares
liberais, que, influenciados pelo pensamento positivista, se reu-
niam em Clubes Militares e lá debatiam sobre as vantagens de um
governo republicano.
Um dos principais focos do pensamento positivista entre os
militares era a Escola Militar da Praia Vermelha, no Rio de Janeiro.

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122 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

Era lá que Benjamin Constant dava aulas de matemática e incen-


tivava seus alunos em suas conspirações contra a monarquia. A
participação de Benjamin Constant, um professor militar avesso
à guerra e ao uso da farda, mostra bem que um dos problemas
dos militares era a falta de prestígio e, sobretudo, de recursos (Cf.
BUENO, 2003).
Assim, o Clube Militar carioca, formado pela mocidade mili-
tar letrada, inspirada nos ideais positivistas transmitidos por Ben-
jamin Constant e tendo na figura consolidada do Marechal Deodo-
ro da Fonseca um emblema, conspirava por uma república. Mas
uma república governada por militares.
O dia 15 de novembro de 1889, data da proclamação da re-
pública, amanheceu com o Campo de Santana ocupado pelos mi-
litares. O plano era revoltarem-se contra o gabinete do ministro
Visconde de Ouro Preto, e foi apenas isso que o Marechal Deodoro
fez. Declarou derrubado, pela força do exército, esse ministério.
Enquanto isso ocorria, o Imperador estava em Petrópolis, longe
dos acontecimentos.
O restante do dia parece ter sido de muita confusão, com a
mocidade militar propalando que a monarquia havia caído, com os
conservadores anunciando apenas a queda do ministro e com os
nobres sem saber muito bem o que fazer, talvez menosprezando
a ação militar. O imperador, que, como mencionamos, estava em
Petrópolis durante todo o desenrolar do golpe de Estado, apenas
na tarde do dia 15 de novembro parece descobrir o verdadeiro
rumo dos acontecimentos. Acompanhemos a passagem descrita
pela historiadora Lilia Schwarcz:
Deixando um pouco de lado as pequenas passagens, que revelam
interpretações diversas do golpe, o que se sabe é que entre a de-
missão de Ouro Preto e a proclamação da República houve um hia-
to. O imperador ficara esperando em Petrópolis uma visita de Deo-
doro que jamais ocorreria, pois, pelo que tudo indica, o marechal
evitava encarar de frente o velho monarca. É só quando recebe os
telegramas de Ouro Preto em que é participado sobre a deposição
do Ministério que, em 15 de novembro, retorna a corte (1998, p.
459).
© U4 – Conteúdos de História nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental: O Brasil Republicano 123

Já de noite, reunidos os militares Marechal Deodoro e Ben-


jamin Constant, além de dois membros do Partido Republicano,
Quintino Bocaiúva e Aristides Lobo, a Proclamação da República
foi finalmente declarada por Deodoro, que, adoentado, fez isso e
voltou para a cama.
Não houve resistência por parte de D. Pedro II, que, de início,
não chegou a levar o golpe a sério, nem quando recebeu, do che-
fe da guarnição militar que cercava o paço imperial, o telegrama
informando a queda da monarquia. Isso porque o próprio militar,
com o império terminado e a República proclamada, ainda chama-
va D. Pedro II de Vossa Majestade! (Cf. SCWUARCZ, 1998).

6. A CONSOLIDAÇÃO DA REPÚBLICA
Proclamada titubiantemente a república, como acabamos
de ver, os interesses dos grupos que se alinharam temporariamen-
te ao redor da mesma causa rapidamente se desencontraram, re-
velando que mesmo entre republicanos, abolicionistas, ex-escra-
vistas, ex-monarquistas e militares liberais havia pouco consenso
que não fosse o próprio fim da monarquia. Sobre essa aparente
desordem, o historiador Renato Lessa escreveu:
Nem mesmo aqueles que acreditam ter a história algum sentido
podem honestamente supor que havia ordem subjacente e invisí-
vel a regular o caos da primeira década republicana no Brasil (1990,
p. 73).

Sem consenso entre os grupos e feita pelos militares em


nome do positivismo, a república que nascia teve, como seus dois
primeiros presidentes, militares de carreira. Primeiro, o próprio
Marechal Deodoro da Fonseca, que ficaria por apenas nove me-
ses, e, em substituição a ele, Floriano Peixoto, conhecido como o
Marechal de Ferro.
O apelido de Floriano justifica-se no fato de que as duas pri-
meiras rebeliões da República foram contidas em seu governo.
Primeiro a Revolta da Marinha, ou da Armada, como era conhe-

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124 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

cida, terminada em 1893. Ao mesmo tempo, conteve a Revolução


Federalista do Rio Grande do Sul, ao fim da qual Floriano mandou
colocar o próprio nome na cidade insurrecta, como emblema da
vitória. Assim, segundo Eduardo Bueno, a antiga Nossa Senhora do
Desterro passou a ser conhecida como Florianópolis (Cf. BUENO,
2003).

Canudos: a Troia de Taipa de Euclides da Cunha–––––––––––


Enquanto no Rio de Janeiro o primeiro governo civil de Prudente de Morais se
ajeitava no poder, no sertão da Bahia um povoado crescia ao redor da figura
emblemática de Antônio Conselheiro. Era o Arraial de Belo Monte, mais tarde
conhecido simplesmente como Canudos.
Era um aglomerado de casebres pobres como tantos outros, mas com algumas
diferenças: o arraial já era umas das maiores cidades do interior da Bahia, havia
estabelecido comércio inclusive fora do país, a posse da terra era comunal e, por
fim, ele configurava uma alternativa para os miseráveis da região. Mas não era
só: na república que nascia, Conselheiro era monarquista, um monarquista que
assombrava o governo da província.
O estopim para a primeira tentativa de invasão do exército a Canudos foi uma
banalidade levada às últimas consequências: um carregamento de madeira que
viria de Juazeiro, já pago, não foi entregue. Conselheiro quis mandar seus ho-
mens atrás do comerciante para pegar a madeira. O juiz de Juazeiro, que já
não ia às boas com o povo do Arraial, pediu ajuda ao governador contra o que
considerava um saque à cidade e, sem esperar que o saque ocorresse, resolveu
por bem invadir o arraial.
Nem tudo saiu como o planejado, e cada derrota militar ocorrida nesse fim de
mundo ganhava repercussão nacional e ares de desafio monarquista à Repúbli-
ca, o que justificava outro ataque maior ainda. Foi o que aconteceu por quatro
vezes, a última expedição contando com mais de quatro mil homens divididos em
duas colunas de ataque, com 700 toneladas de munição, metralhadoras, fuzis,
canhões de guerra e um imenso canhão chamado de “matadeira”, tão pesado
que era preciso 20 juntas de boi para arrastá-lo pelo sertão.
Talvez nunca soubéssemos do massacre se na última expedição não estivesse
presente um correspondente de guerra do jornal Estado de São Paulo, o ex-
-aluno da Escola Militar da Praia Vermelha e naquele momento correspondente
de guerra Euclides da Cunha. Ele transformou Canudos em objeto de seu épico
livro vingador, Os Sertões, a sua Troia de Taipa dos jagunços, como ele mesmo
escreveu.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

7. O CAFÉ COM LEITE


Ainda durante a presidência de Prudente de Moraes, os lati-
fundiários retornaram ao poder. Eles haviam sido um dos grandes
© U4 – Conteúdos de História nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental: O Brasil Republicano 125

suportes do poder imperial, mas estavam afastados do poder du-


rante os primeiros anos da nova República.
Com o apoio do presidente, novos acordos comerciais com
bancos ingleses permitiram que os cafeicultores resolvessem seus
problemas econômicos imediatos, mas colocavam a economia na-
cional em estado de alerta.
Diversos impostos sobre produtos acabaram sendo criados
para que a receita do governo aumentasse, incluindo um selo que
deveria ser colocado nos alimentos para comprovar o pagamento
desses novos impostos. Campos Sales, o presidente impopular que
criou os novos impostos, era até mesmo chamado de Campos se-
los! (Cf. BUENO, 2003, p. 250).
Na arena política, Campos Sales criou um acerto político que
ficou conhecido como a política dos governadores. Ignorando os
partidos políticos e as Assembleias Estaduais e Federais, o presi-
dente apoiou diretamente os governos estaduais fiéis a ele que,
em contrapartida, ofereciam bases eleitorais regionais ao governo
central.
Para que essa política funcionasse, na prática ocorreram
fraudes eleitorais e ameaças para que os contingentes votassem
nos candidatos do governo. O resultado disso foi a chamada polí-
tica do café com leite, ou seja, a alternância dos estados de Minas
Gerais (produtor de gado) e São Paulo (produtor de café) no poder,
o que duraria até o final da década de 1920.
No Rio de Janeiro, ainda no início do século, uma importan-
te iniciativa mudava a fisionomia da cidade e, ao mesmo tempo,
aumentava a tensão social. Eram as reformas urbanas do prefeito
Francisco Pereira Passos. Em um ano, mais de 600 imóveis antigos,
muitos dos quais funcionando como cortiços, foram demolidos e
deram lugar a um largo boulevard de inspiração francesa, com 33
metros de largura e dois quilômetros de extensão. O resultado
da reforma, além do belo boulevard, foi a expulsão de um grande
contingente populacional rumo aos morros cariocas.

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126 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

Dentro do plano de modernização e sanitarização do Rio de


Janeiro estava, também, o combate à febre amarela, à peste bubô-
nica e à varíola, contra a qual foi instituída a vacinação obrigatória.
A ideia da vacinação obrigatória, proposta pelo médico Os-
waldo Cruz, era imunizar a maior parte das pessoas, mas a obri-
gatoriedade, a desinformação e o medo da população levaram ao
uso da força e da violência nesse processo, ocorrendo, em 1904, a
chamada Revolta da Vacina.
Nesse contexto, veja, a seguir, qual atividade podemos apli-
car aos alunos.

Dica de Atividade Prática–––––––––––––––––––––––––––––––


A vacinação é um tema muito importante, portanto, relembrar com seus alunos a
história da vacinação pode ser bastante oportuno para que eles aprendam não
apenas o valor da vacina, mas também a importância das campanhas de cons-
cientização da população.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Em São Paulo, também na década de 1920, um pequeno mo-
vimento artístico tomava forma e assombrava crítica e público: era
a Semana de Arte Moderna de 1922, ocorrida entre 13 e 17 de
fevereiro no Teatro Municipal de São Paulo. Os modernistas an-
siavam romper com o clássico brasileiro, com a cópia estrangeira,
com a pintura ufanista e com a literatura burguesa.
Talvez as imagens do Abaporu, o comedor de gente, símbo-
lo do movimento antropofágico deflagrado com a semana de 22,
hoje se diluam em adjetivos e com isso perca a sua força crítica.
Mas não se trata de imagem infantil e sim primitiva.
Os nomes envolvidos no movimento são hoje bastante fa-
mosos: Mario de Andrade, Oswald de Andrade, Anita Malfatti,
Villa-Lobos e Tarsila do Amaral. Mas se hoje eles são famosos, na
década de 1920 não receberam mais do que críticas do público
daquela revolução estética da arte brasileira.
© U4 – Conteúdos de História nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental: O Brasil Republicano 127

O fim da política do café com leite ocorreria em 1930, fruto,


inicialmente, de um desarranjo interno, com a insistência de São
Paulo em permanecer no poder, pulando a vez de Minas Gerais e
de seu candidato, Antonio Carlos Ribeiro de Andrada, em favor do
paulista Julio Prestes, o candidato apoiado pelo então presidente,
o também paulista Washington Luis.
Minas Gerais organizou, então, sua dissidência e propôs o
sulista Getúlio Vargas como candidato a presidente e João Pessoa,
da Paraíba, como candidato a vice-presidente. Mas ainda que Var-
gas tenha mesmo se tornado o próximo presidente, nem tudo sai-
ria como planejado. Vamos ver isso juntos?

8. A ERA VARGAS
As eleições de 1930 foram vencidas por Julio Prestes que,
como vimos, era o candidato de São Paulo. No entanto, os rumores
de golpe e revolução alastravam-se entre os Estados, sobretudo
Minas Gerais e Rio Grande do Sul, o Estado acostumado com agi-
tações desde o início da República!
Um assassinato aceleraria os acontecimentos: o candidato a
vice de Getúlio Vargas, o paraibano João Pessoa, havia sido mor-
to pouco antes do anúncio oficial do resultado das eleições. Sua
morte acirrou os nervos e o governo foi acusado pelo assassinato.
Uma resposta era esperada. Essa resposta foi a Revolução de 1930.
A maioria dos Estados aderiram rapidamente à Revolução,
que começou em três de outubro de 1930. Dois dias depois, ape-
nas São Paulo, Bahia e o Pará não haviam aderido ao movimento.
O Rio de Janeiro era ainda uma incógnita, mas com a deposição de
Washington Luís e a montagem do governo provisório liderado por
Getúlio Vargas, a capital do país tomava o partido da Revolução.
Vargas ocuparia o poder como presidente do governo pro-
visório até 1934, depois seria presidente constitucional até 1937
e ditador, durante o Estado Novo, até 1945. Deposto, retornaria

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128 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

em 1951 pelo voto direto e ficaria até 1954, quando, segundo ele
mesmo, saiu da vida para entrar na história.
Como presidente, Vargas buscou apoio em diversos setores,
como os cafeicultores, que já estavam em crise mesmo antes da
crise da Bolsa de Nova York. A compra dos excedentes de café foi
um expediente frequente do governo para garantir aos produtores
de café a sobrevida da produção, muitas vezes queimando esses
excedentes para valorizar a oferta do produto. Mas o apoio po-
pular ao governo Vargas veio também como fruto de sua política
trabalhista, um dos pontos de maior coerência de seu governo e
um dos fatores que o faz ser lembrado por muitos ainda hoje.
Se em muitos estados as medidas centralizadoras do gover-
no central se mostraram adequadas, ou pelo menos eficientes, em
São Paulo ocorria o inverso: a centralização política, a nomeação
de um tenente não paulista para governar o Estado e a ausência
de uma constituição eram as principais causas dos protestos pau-
listas, além, é claro, do seu afastamento do poder central e da au-
sência de uma constituição.
O descontentamento paulista tornou-se, em 1932, a Revolu-
ção Constitucionalista, inflamada pelo episódio dramático do as-
sassinato, a tiros, de quatro jovens em frente a um jornal ocupado.
Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo deram nome a um dos agru-
pamentos revolucionários, o MMDC.
A revolução estourou em nove de julho, com o estado de São
Paulo contando com o apoio do Rio Grande do Sul e até mesmo de
Minas Gerais, mas ambos negaram-se a apoiar uma revolução con-
tra um governo que, menos de dois anos antes, tinham ajudado a
colocar no poder. O estado do Mato Grosso manteve seu apoio à
causa da revolução, enviando apoio militar liderado pelo general
Bertoldo Klinger.
A campanha para arrecadação de fundos para os revolucio-
nários paulistas, chamada dê ouro para o bem se SP, incentivava
a doação de ouro e até de joias de família para a causa constitu-
© U4 – Conteúdos de História nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental: O Brasil Republicano 129

cionalista, e o governo usou seu parque industrial para criar armas


das quais não dispunha, como munições e até um trem blindado.
Além disso, o uso de aviões como arma de guerra sistemática foi
feito no Brasil pela primeira vez durante a revolução. Talvez por
isso, em 23 de julho, em meio à guerra, Santos Dumont se suicidou
no Guarujá.
A guerra entre paulistas e federais durou quase três meses,
e quando a invasão da cidade de São Paulo pelas tropas federais
era uma possibilidade bastante real, a rendição da força pública
constitucionalista pôs fim à revolução e poupou a vida de civis e
alistados.
O fim da guerra ocorreu com a rendição das forças cons-
titucionais antes da invasão da cidade de São Paulo, e, um ano
depois do conflito, um interventor civil, paulista e alinhado com
os interesses políticos do Estado foi nomeado para São Paulo, era
Armando de Salles Oliveira, cunhado de Júlio de Mesquita Filho,
então diretor do jornal Estado de São Paulo e um dos porta-vozes
dos interesses políticos do Estado junto à sociedade e ao governo
Vargas.
Em 1935, ocorreram sublevações militares em Natal, Rio de
Janeiro e Recife, conhecidas como Intentona Comunista. Esse mo-
vimento trouxe a justificativa para o governo aumentar a vigilância
em nome da segurança nacional e, na sequência desse, um gol-
pe de Estado dentro do golpe. Era o Estado Novo, que duraria até
1945.
Nesse momento, em muitos países ideologias totalitárias
encontravam espaço e se disseminavam em regimes autoritários
e nacionalistas, como Mussolini na Itália, Stálin na União Soviéti-
ca, Hitler na Alemanha, além de Salazar em Portugal e Franco na
Espanha. Essas ideologias não se confinaram na Europa e pode-
mos perceber híbridos dessas correntes também no Brasil, dentro
do próprio governo Vargas e nos movimentos que apareciam pelo
país, como a Aliança Nacional Libertadora e a Ação Integralista
Brasileira, fundada por Plínio Salgado.

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130 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

O autoritarismo do Estado Novo gerou sua própria queda,


isolando o governo inclusive dos aliados tradicionais. A renúncia
de Vargas ocorria em meio a pressões de muitos lados: classe mé-
dia urbana, estudantes universitários representados pela UNE,
conservadores tradicionais e militares. Mas sua saída da presidên-
cia não significou abandono da vida pública.
Aproveitando-se da lei eleitoral, Vargas candidatou-se a se-
nador por cinco estados diferentes e a deputado por nove estados.
Elegeu-se senador por dois e deputado por sete! Escolheu ser in-
vestido como senador pelo Rio Grande do Sul, seu estado natal.
De volta à arena política, venceu sem dificuldades a eleição
de 1950 com mais de 48% dos votos. Outra vez presidente, outra
vez se isolando no poder. Primeiro o isolamento dos militares, dos
coronéis e da aeronáutica, depois alguns ministros, a oposição,
os industriais, os conservadores e, por fim, até os nacionalistas o
abandoram.
Como seu último ato isolado, Vargas suicidou-se em agosto
de 1954, deixando a seguinte mensagem em sua carta-testamento:
Lutei contra a espoliação do Brasil. Lutei contra a espoliação do
povo. Tenho lutado de peito aberto. O ódio, as infâmias, a calú-
nia não abateram meu ânimo. Eu vos dei a minha vida. Agora vos
ofereço a minha morte. Nada receio. Serenamente dou o primeiro
passo no caminho da eternidade e saio da vida para entrar na His-
tória (Cf. BUENO, 2003, p. 337).

9. OS ANOS DE JK E JANGO
Com o fim da Era Vargas, o clima político ficou bastante tu-
multuado, e foi nesse cenário que Juscelino Kubitschek e João
Goulart conseguiram assumir como novos presidente e vice-pre-
sidente do Brasil.
No entanto, depois de assumir o poder, o primeiro ano do
governo JK no Brasil foi de calmaria política e otimismo quanto ao
futuro, embalados por slogans otimistas de “nacionalistas desen-
volvimentismo”, como “50 anos em 5”!
© U4 – Conteúdos de História nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental: O Brasil Republicano 131

A figura de JK era a antítese de Vargas: alto, boa-pinta e


bem-humorado. Chamado de “presidente bossa-nova”, encarnava
o espírito moderno da época, que confundia modernidade com
indústria pesada e integração nacional com devastação florestal.
De todo modo, as principais escolhas do nosso modelo de desen-
volvimento foram consolidadas ali e são muito fortes até hoje: a
estrada, o automóvel e o caminhão, a despeito de uma vocação
natural do país pelo transporte hidroviário e ferroviário.
Juscelino idealizou e mandou erguer a nova capital federal,
Brasília. A ideia de uma capital no interior do país não era nova e
estava, inclusive, na constituição. Mas, até então, ninguém havia
ainda se proposto a arriscar a carreira numa tarefa dessas!
O desenho de Brasília foi concebido por Lúcio Costa e Os-
car Niemeyer e erguido numa velocidade impressionante, fruto da
carta branca de JK em não passar as verbas de Brasília pelo Con-
gresso, e tendo como consequência silenciosa a grande quantida-
de de acidentes de trabalho ocorridos durante a obra.
Fora do Brasil, o clima internacional entre os Estados Unidos
da América e a União Soviética tornava-se mais tenso, o que fazia
com que os militares brasileiros ficassem cada vez mais atentos
ao alinhamento político brasileiro, sempre contra os comunistas,
mas isso era tudo o que Juscelino e Jânio Quadros não fizeram.
Numa tacada, romperam com o Fundo Monetário Internacional e
negaram apoio ao bloqueio norte-americano contra Cuba. JK ain-
da recebeu Che Guevara em visita ao Brasil e o condecorou com a
medalha do Cruzeiro do Sul, e Jânio visitou a China e a Alemanha
Oriental para cumprimentar o soviético Gagárin por ter ido ao es-
paço!
Essas ações políticas, apesar de não significarem, de manei-
ra nenhuma, que o Brasil se tornaria uma nova Cuba, faziam com
que, aqui no país, os militares nacionalistas pensassem em tomar
as rédeas do governo em nome da segurança nacional.
Para finalizar este tópico, vejamos uma dica de atividade
com base no assunto abordado.

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132 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

Dica de Atividade Prática–––––––––––––––––––––––––––––––


Brasília é uma cidade planejada, o que quer dizer que um plano de tudo o que
deveria conter na cidade foi feito previamente, incluindo a melhor localização das
ruas, das casas e dos prédios. Essa atividade pode ser repetida com os alunos,
debatendo com eles quais são os elementos essenciais de uma cidade!
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

10. O REGIME MILITAR NO BRASIL


Assumindo o poder em 1964, os militares sairiam apenas
quase 21 anos depois, em 1985. Os Atos Institucionais (AI) eram
a base legal sobre a qual se organizou o governo militar, acima,
inclusive, da constituição.
A consolidação do governo, ou “o golpe dentro do golpe”,
foi o decreto do Ato Institucional número 5, o AI-5, em 13 de de-
zembro de 1968. Por meio do AI-5, o Congresso e o Senado eram
fechados, o Executivo legislaria, as garantias constitucionais esta-
vam suspensas e o presidente poderia demitir, remover, aposentar
ou transferir qualquer funcionário público que achasse convenien-
te, incluindo professores de escolas e universidades, juízes e até
mesmo militares. Com isso, o golpe militar que pretendia garantir
a liberdade e se proclamava como um movimento legalista aca-
bou sendo o contrário, suspendendo as liberdades individuais e
tornando-se uma ditadura.
Durante a ditadura militar, as vozes dissonantes contra o re-
gime foram atacadas com violência, assim como os movimentos
armados de contestação ao regime. Os jornais resistentes, como
Movimento, tiveram seus exemplares incendiados com bombas
em bancas de jornal e a censura colocava uma mordaça nos movi-
mentos artísticos.
O número de mortos durante a ditadura ainda não foi cor-
retamente estabelecido e a falta de acesso aos documentos não
permite que viremos essa página da nossa história. A Comissão de
Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos vem publicando, já
© U4 – Conteúdos de História nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental: O Brasil Republicano 133

há alguns anos, um Dossiê com os nomes e as histórias dos desa-


parecidos políticos que foram comprovadamente mortos. A última
edição trouxe 436 nomes, entre os assassinados, os desaparecidos
e os suicidados (Cf. DOSSIÊ DITADURA, 2009).

Cultura e Censura na Ditadura militar–––––––––––––––––––––


A existência da ditadura e da censura não impediu que diversas manifestações
artísticas acontecessem, permitindo mesmo que possamos falar em uma cultu-
ra de protesto muito presente na música, no cinema e no teatro. Assim, peças
teatrais como O rei da vela e filmes como Terra em Transe, ambos de 1967, são
marcantes como movimentos artísticos que foram influenciados pelo clima políti-
co e inauguraram novos movimentos, como o cinema novo.
Na música, enquanto a bossa-nova e a jovem guarda trilhavam um caminho
menos contestador, outros movimentos, como o Tropicalismo dos Novos Baianos
buscavam formas de agressão e protesto por meio de uma estética que escapas-
se à percepção dogmática da censura.
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11. A DEMOCRACIA NOVA


A redemocratização do país ocorreu em 1985, na esteira do
movimento das Diretas Já. Desde então, a democracia passou por
um novo processo de amadurecimento por parte dos políticos e
da sociedade como um todo, incluindo a morte de um presiden-
te recém-eleito, uma variedade alarmante de planos econômicos,
um impeachment, a aprovação da reeleição, a transição pacífica
de poder entre partidos opositores e a eleição da primeira mulher
para a presidência da república.
No plano econômico, a estabilidade alcançada com o Real,
uma moeda que dura mais de quinze anos, nos faz esquecer que,
desde a redemocratização, em 1985, o Brasil teve cinco moedas
diferentes! Tudo isso nos mostra que a roda da história não para
de girar, que nossas experiências são importantes para a História
do país e que essa história é fundamental para que possamos com-
preender a nossa própria história.

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134 © Fundamentos e Métodos do Ensino da História e da Geografia I

12. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS


Para encerrar os estudos desta obra, responda às questões
autoavaliativas, procurando fechar e amarrar todos os seus conhe-
cimentos sobre os temas estudados.
Sempre utilize a autoavaliação para acompanhar o seu
aprendizado e verificar quais são os pontos que ainda precisam
ser revistos. Caso não se sinta seguro em responder às perguntas
propostas com propriedade, releia os conteúdos.
A seguir, são apresentadas as questões propostas para verifi-
car o seu desempenho no estudo desta unidade:
1) Como se deu a Proclamação da República no Brasil?

2) O que foi a guerra contra Canudos?

3) O que foi a Semana de Arte Moderna de 1922?

4) Em quais circunstâncias Getúlio Vargas foi presidente do Brasil?

5) Qual a importância da construção de Brasília para o governo brasileiro? Por


que sua construção pôde ser tão rápida?

6) Como se desenvolveu a cultura brasileira durante a ditadura militar?

13. CONSIDERAÇÕES FINAIS


O ensino de História, a partir do que está fundamentado na
LDB, é praticado a partir da realidade dos alunos e, obviamente,
de sua idade. Os conteúdos que estudamos nesta obra, necessa-
riamente, ultrapassam os conteúdos escolares, mas são mínimos
para a sua formação. Para tudo que expusemos aqui, haverá sem-
pre a necessidade de uma complementação, adequando a forma e
o conteúdo ao seu trabalho cotidiano.
No entanto, você tem agora um percurso realizado, no qual
pôde conhecer os principais temas norteadores de nossa história,
e poderá ter mais segurança e prazer em lecionar.
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14. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


BUENO, E. Brasil: uma história. São Paulo: Ática, 2003.
CALDEIRA, J. Viagem pela história do Brasil. São Paulo: Cia das Letras, 1997.
CARVALHO, A. M. P. (Coord.). Ensino de história. São Paulo: Cengage Learning, 2010.
CUNHA, E. Os sertões. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves Editora; Publifolha, 2000.
DOSSIÊ DITADURA. Mortos e desaparecidos políticos no Brasil (1964-1985). Comissão de
Familiares mortos e Desaparecidos Políticos. IEVE – Instituto de Estudos sobre a violência
do Estado. São Paulo: Imprensa Oficial, 2009.
FABREGAT, C. H.; FABREGAT, M. H. Como preparar uma aula de história. Rio Tinto,
Portugal: Edições ASA / Clube do Professor, 1991.
FAUSTO, B. História do Brasil. São Paulo: Edusp, 1994.
KARNAL, L. (Org.). História na sala de aula. Conceito, prática e propostas. São Paulo:
Contexto, 2008.
LESSA, R. A invenção republicana. Rio de Janeiro: Topbooks, 1990.
NIKITIUK, S. L. (Org.). Repensando o ensino de história. São Paulo: Cortez, 1996.
PINSKY, C. B. (Org.). Novos temas nas aulas de história. São Paulo: Contexto, 2009.
SCHWARCZ, L. M. As barbas do imperador: D Pedro II, um monarca nos trópicos. São
Paulo: Cia das Letras, 1998.

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