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Batatais
Claretiano
2013
© Ação Educacional Claretiana, 2010 – Batatais (SP)
Versão: dez./2013
371.912 P415l
ISBN: 978-85-8377-005-3
CDD 371.912
Preparação Revisão
Aline de Fátima Guedes Cecília Beatriz Alves Teixeira
Camila Maria Nardi Matos Felipe Aleixo
Carolina de Andrade Baviera Filipi Andrade de Deus Silveira
Cátia Aparecida Ribeiro Paulo Roberto F. M. Sposati Ortiz
Dandara Louise Vieira Matavelli Rodrigo Ferreira Daverni
Elaine Aparecida de Lima Moraes Sônia Galindo Melo
Josiane Marchiori Martins
Talita Cristina Bartolomeu
Lidiane Maria Magalini
Vanessa Vergani Machado
Luciana A. Mani Adami
Luciana dos Santos Sançana de Melo
Luis Henrique de Souza Projeto gráfico, diagramação e capa
Patrícia Alves Veronez Montera Eduardo de Oliveira Azevedo
Rita Cristina Bartolomeu Joice Cristina Micai
Rosemeire Cristina Astolphi Buzzelli Lúcia Maria de Sousa Ferrão
Simone Rodrigues de Oliveira Luis Antônio Guimarães Toloi
Raphael Fantacini de Oliveira
Bibliotecária Tamires Botta Murakami de Souza
Ana Carolina Guimarães – CRB7: 64/11 Wagner Segato dos Santos
Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução, a transmissão total ou parcial por qualquer
forma e/ou qualquer meio (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação e distribuição na
web), ou o arquivamento em qualquer sistema de banco de dados sem a permissão por escrito do
autor e da Ação Educacional Claretiana.
CRC
Ementa––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Vocabulário da Língua Brasileira de Sinais – Libras. Libras em contexto. Gra-
mática da Libras. A importância da Libras na comunicação e na educação do
indivíduo surdo. A história da educação dos surdos. Aspectos biológicos da sur-
dez. Abordagens educacionais. O indivíduo surdo e suas interações na escola
e na família. Estratégias, recursos didáticos e tecnológicos para a educação de
surdos. Implementação do bilinguismo na atualidade. Identidade e cultura surda.
Igualdade de direitos e exercício da cidadania. A função do intérprete e do pro-
fessor de Libras.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
1. INTRODUÇÃO
Estamos iniciando o Caderno de Referência de Conteúdo Lín-
gua Brasileira de Sinais e, desde já, é importante você saber que
dominar uma língua não se restringe a conhecer palavras ou mes-
mo frases. O domínio de uma língua exige sua aquisição na totali-
dade, além da fluência. É, também, sobre isso que vamos conver-
sar durante este estudo.
Especificamente em relação à língua de sinais, não basta ad-
quirir vocabulário em sinais, mesmo que ele seja amplo.
10 © Língua Brasileira de Sinais
Abordagem geral
Neste tópico, apresenta-se uma visão geral do que será estuda-
do neste Caderno de Referência de Conteúdo. Aqui, você entrará em
contato com os assuntos principais deste conteúdo de forma breve e
geral e terá a oportunidade de aprofundar essas questões no estudo de
cada unidade. No entanto, essa Abordagem geral visa fornecer-lhe o co-
nhecimento básico necessário a partir do qual você possa construir um
referencial teórico com base sólida – científica e cultural – para que, no
futuro exercício de sua profissão, você a exerça com competência cog-
nitiva, ética e responsabilidade social. Vamos começar nossa aventura
pela apresentação das ideias e dos princípios básicos que fundamen-
tam este Caderno de Referência de Conteúdo.
Faremos uma introdução ao estudo sobre o surdo e a sur-
dez. Falaremos sobre a história da educação dos surdos no cenário
mundial e no Brasil, enfatizando as três principais abordagens de
atuação com o surdo, ou seja, o oralismo, a comunicação total e
o bilinguismo. Além disso, estudaremos o processo de funciona-
mento normal da audição, esclarecendo sobre a configuração do
ouvido humano, bem como sobre as perdas auditivas e o processo
de diagnóstico e reabilitação nessas condições.
Ainda estudaremos as consequências que a surdez pode
proporcionar ao desenvolvimento cognitivo, linguístico e afetivo
do surdo, bem como suas consequências para todo o sistema fami-
liar. Discutiremos, também, sobre a importância da língua de sinais
para um desenvolvimento adequado da criança surda e a necessi-
dade do envolvimento de sua família no processo educacional.
Estudaremos as implicações educacionais da surdez, bem
como as adaptações e os recursos necessários para garantir que
os surdos aprendam, se desenvolvam adequadamente e possam,
dessa forma, exercer de maneira digna sua cidadania.
© Caderno de Referência de Conteúdo 13
Glossário de conceitos
O Glossário de Conceitos permite a você uma consulta rápi-
da e precisa das definições conceituais, possibilitando-lhe um bom
domínio dos termos técnico-científicos utilizados na área de conhe-
cimento dos temas tratados no Caderno de Referência de Conteúdo
Língua Brasileira de Sinais. Veja, a seguir, a definição dos principais
conceitos:
1) Concepção clínico-terapêutica: percebe a surdez como
doença/déficit e o surdo como deficiente auditivo. Sen-
do assim, a pessoa surda necessita de um trabalho para
suprir ou sanar essa falta e, assim, ser "curada". A "cura"
está relacionada ao aprendizado da linguagem oral, fi-
cando implícito que, quanto melhor a sua fala, melhor
© Caderno de Referência de Conteúdo 25
Brasileira de Sinais.
© Caderno de Referência de Conteúdo
Questões avaliativas
No final de cada unidade, você encontrará algumas questões
autoavaliativas sobre os conteúdos ali tratados, as quais podem ser
de múltipla escolha, abertas objetivas ou abertas dissertativas.
Responder, discutir e comentar essas questões, bem como
relacioná-las com a prática do ensino de Língua Brasileira de Sinais
pode ser uma forma de você avaliar o seu conhecimento. Assim,
mediante a resolução de questões pertinentes ao assunto tratado,
você estará se preparando para a avaliação final, que será disser-
tativa. Além disso, essa é uma maneira privilegiada de você testar
seus conhecimentos e adquirir uma formação sólida para a sua
prática profissional.
© Caderno de Referência de Conteúdo 31
Bibliografia básica
É fundamental que você use a Bibliografia Básica em seus
estudos, mas não se prenda só a ela. Consulte, também, as biblio-
grafias complementares.
Dicas (motivacionais)
O estudo deste Caderno de Referência de Conteúdo convida
você a olhar, de forma mais apurada, a Educação como processo
de emancipação do ser humano. É importante que você se atente
às explicações teóricas, práticas e científicas que estão presentes
nos meios de comunicação, bem como partilhe suas descobertas
com seus colegas, pois, ao compartilhar com outras pessoas aqui-
lo que você observa, permite-se descobrir algo que ainda não se
conhece, aprendendo a ver e a notar o que não havia sido perce-
bido antes. Observar é, portanto, uma capacidade que nos impele
à maturidade.
Você, como aluno do curso de graduação na modalidade
EaD, necessita de uma formação conceitual sólida e consistente.
Para isso, você contará com a ajuda do tutor a distância, do tutor
presencial e, sobretudo, com a interação com seus colegas. Suge-
rimos, pois, que organize bem o seu tempo e realize as atividades
nas datas estipuladas.
1
e Abordagens
Educacionais
1. OBJETIVOS
• Conhecer e caracterizar a história da educação dos surdos.
• Compreender e identificar as abordagens educacionais e
suas repercussões na escolarização dos surdos.
• Compreender e demonstrar a importância da língua de
sinais para a educação de surdos.
2. CONTEÚDOS
• Aspectos históricos da educação dos surdos.
• Abordagens educacionais: oralismo, comunicação total e
bilinguismo.
4. INTRODUÇÃO À UNIDADE
Vamos iniciar a primeira unidade de estudo de Língua Brasi-
leira de Sinais, dando continuidade aos temas abordados na aula
presencial.
Um de nossos objetivos, nesta Caderno de Referência de
Conteúdo, é propiciar a você a compreensão sobre a função da
língua de sinais na vida do sujeito surdo e, especificamente, na sua
escolarização.
Então, é preciso que, inicialmente, você conheça quem é o
sujeito surdo, a história da educação dos surdos no Brasil e com-
preenda os princípios que fundamentam as abordagens educacio-
nais que orientaram a educação desses alunos ao longo da histó-
ria, que são: oralismo, comunicação total e bilinguismo.
Antes de direcionar nosso estudo aos aspectos históricos da
educação dos surdos, é importante destacar que as pesquisas so-
© U1 - Escolarização dos Surdos: Marcos Históricos e Abordagens Educacionais 35
6. ORALISMO
A escolarização da criança surda se organizou, ao longo da
história, em função dos fundamentos do oralismo. Segundo Gol-
dfeld (1997), o oralismo é uma abordagem educacional que visa à
integração da criança surda na comunidade ouvinte, enfatizando o
aprendizado da língua oral do país.
O objetivo dessa abordagem é fazer a reabilitação da criança
surda em direção à normalidade, negando, dessa maneira, a sur-
dez, e enfatizando, predominantemente, a aquisição da fala.
Hoje, o oralismo é muito criticado. Vamos compreender o
motivo.
De acordo com Skliar (1999), o oralismo está fundamentado
pela visão clínico-terapêutica da surdez. Nessa perspectiva, a surdez é
vista como deficiência, limite e deficit biológico e pode ser minimizada
pelo desenvolvimento da função auditiva, que possibilitaria à criança
o aprendizado da língua majoritária do país, no caso do Brasil, a língua
portuguesa falada, e a integração na comunidade ouvinte.
Em outras palavras, o oralismo vê o surdo como um ouvinte
com defeito e entende que a aquisição da oralidade representa a
possibilidade de igualar os surdos aos ouvintes. É como se o surdo
deixasse de ser surdo ao aprender a falar, já que, segundo essa
abordagem, a ausência da fala seria o aspecto que o diferiria dos
ouvintes. Daí a razão da ênfase na oralidade e nos caminhos tera-
pêuticos que poderiam garantir o seu desenvolvimento.
Ao longo da história, por influência do oralismo, os alunos
surdos foram proibidos de utilizar os sinais nos contextos escolares
e nos núcleos familiares. Sabe-se que os médicos, fundamentados
no oralismo e na visão clínico-terapêutica, orientavam as famílias a
proibir o uso dos sinais, bem como o contato com outros surdos.
7. COMUNICAÇÃO TOTAL
A comunicação total é uma filosofia de trabalho voltada ao
atendimento e à educação de pessoas surdas. Diferentemente do
oralismo, a comunicação total entende o surdo como uma pessoa,
e não como alguém portador de uma patologia médica, e entende
a surdez como um fenômeno com significações sociais.
A comunicação total, como o próprio nome indica, não exclui
técnicas e recursos para estimulação auditiva; adaptação de apa-
relho de amplificação sonora individual; leitura labial; oralização;
leitura e escrita. Pelo contrário, segundo Ciccone (1990), prega
uma completa liberdade na prática de quaisquer estratégias que
permitam o resgate de comunicação, seja por meio da oralidade,
dos sinais, da soletração ou pela combinação desses modos.
Com a influência da comunicação total, surgiram diversos siste-
mas de sinais que tinham como objetivo ensinar a língua majoritária.
O sistema de sinais mais utilizado no Brasil foi o português sinalizado.
Nesse ponto, cabe fazer algumas considerações. Se por um
lado o surgimento da comunicação total pode ter representado
um avanço ao priorizar a comunicação, por outro, reforçou a ênfa-
se na língua majoritária.
Para que isso fique mais claro, vale reforçar que a comunica-
ção total, embora contemple o uso dos sinais, este ocorre na estru-
tura da língua portuguesa e não na estrutura da língua de sinais.
Esse mecanismo é denominado de português sinalizado, ou seja, é
a língua portuguesa produzida em sinais. Desse modo, permanece
a ênfase na língua majoritária e na sua estrutura gramatical.
O português sinalizado é muito utilizado por ouvintes, espe-
cialmente em função da falta de fluência na língua de sinais. O que
acaba acontecendo, nesse caso, é o uso dos sinais, da língua de
sinais, na estrutura da língua portuguesa, simultaneamente.
© U1 - Escolarização dos Surdos: Marcos Históricos e Abordagens Educacionais 43
8. BILINGUISMO
Os pilares da educação bilíngue para surdos defendem o di-
reito e a necessidade desses indivíduos adquirirem a língua de si-
nais como primeira língua no contato com surdos adultos usuários
dessa língua (LODI, 2000) e a língua majoritária do país como se-
gunda. A educação bilíngue, ou o bilinguismo, tem como objetivo
educacional tornar presentes duas línguas no contexto escolar, no
qual estão inseridos alunos surdos (LACERDA, 2006). Além da pre-
sença da língua de sinais, o currículo de uma escola bilíngue deve
se orientar, também, pelas questões sociais, políticas e culturais da
comunidade surda (KYLE, 1999).
O bilinguismo tem sido considerado como a abordagem que
pode propiciar ao surdo as condições, ainda não encontradas na
escola, de que necessita para realizar seu potencial.
Estudos linguísticos realizados nos EUA, nas décadas de 1960
e 1970, por vários pesquisadores (QUADROS; KARNOPP, 2004) a
respeito da estrutura da língua de sinais, da sua gramática e com-
plexidade, que desmitificaram a ideia de que os sinais não pas-
savam de mímica e pantomima, contribuíram para o surgimento
do bilinguismo. Vale ressaltar que a insatisfação dos surdos com a
proibição da língua de sinais e a mobilização de diversas comuni-
dades a favor do uso dessa língua favoreceram, também, o surgi-
mento dessa abordagem.
No Brasil, os estudos sobre a língua de sinais utilizada pelos
surdos passaram a receber mais atenção a partir do final da déca-
da de 1980, com maior sistematização na década de 1990. Como
exemplo desses estudos, temos os realizados por Ferreira Brito
(1990, 1993 e 1995) e Felipe (1989).
Tais estudos reconheceram essa língua como a primeira (L1)
dos surdos no Brasil. Foi denominada, inicialmente, de Língua de
Sinais Brasileira (LSB), seguindo o padrão internacional de identifi-
cação das línguas de sinais, mas nacionalmente tornou-se conhe-
© U1 - Escolarização dos Surdos: Marcos Históricos e Abordagens Educacionais 45
9. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS
Ao finalizar seus estudos sobre a história da educação dos
surdos e as abordagens educacionais destinadas à pessoa com sur-
dez, procure responder para si mesmo às questões a seguir.
1) Sintetize, em poucas linhas, o processo histórico da educação dos surdos
desde o século 16 até a atualidade.
5) Como organizar uma educação bilíngue para os surdos que contemple suas
especificidades como usuários de uma língua visual especial e os pressupos-
tos da educação inclusiva?
10. CONSIDERAÇÕES
Conforme estudamos, a história da educação dos surdos
teve o oralismo como o caminho educacional predominante. En-
tretanto, ele não propiciou resultados satisfatórios e representou
um mecanismo de poder do ouvinte sobre o surdo ao legitimar o
domínio de um grupo sobre o outro pela obrigatoriedade da aqui-
sição da fala.
Os resultados, então, insatisfatórios do oralismo, fizeram
surgir uma segunda abordagem: a comunicação total. Essa, em-
bora contemplasse o uso dos sinais, não reconheceu a língua de
sinais como língua. Assim, estruturou-se com base no uso dos
sinais segundo a língua majoritária. Esse uso simultâneo foi en-
tendido como incompatível, e os resultados também não foram
satisfatórios.
Em consequência disso, surgiu uma terceira abordagem: o
bilinguismo.
Essa abordagem encontra-se em plena expansão. É aceita
pela comunidade surda e pelos profissionais e pesquisadores que
entendem a surdez como diferença, e não como deficiência.
Ainda há muito que se pesquisar sobre o bilinguismo. En-
tretanto, os estudos realizados em outros países e no Brasil estão
mostrando resultados muito satisfatórios no campo educacional e
também em relação ao desenvolvimento afetivo, cognitivo, social,
intelectual e linguístico, apontando que esse pode ser um caminho
mais apropriado para a educação dos surdos.
© U1 - Escolarização dos Surdos: Marcos Históricos e Abordagens Educacionais 51
11. E-REFERÊNCIAS
BRASIL. Decreto nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005. Disponível em: <http://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/decreto/d5626.htm>. Acesso em: 16
dez. 2010.
BRASIL. Decreto nº 10.436, de 24 de abril de 2002. Disponível em: <http://www.planalto.
gov.br/ccivil/leis/2002/L10436.htm>. Acesso em: 16 dez. 2010.
BRASIL. Lei nº 12.319, de 01 de setembro de 2010. Disponível em: <http://www.planalto.
gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Lei/L12319.htm>. Acesso em 25 dez. 2010.
2
1. OBJETIVOS
• Analisar o processo normal da audição.
• Demonstar o que é a deficiência auditiva/surdez e refletir
sobre ela.
• Reconhecer as formas de tratamento e de prevenção da
deficiência auditiva.
2. CONTEÚDOS
• Audição normal.
• Deficiência auditiva/surdez.
• Formas de tratamento e de prevenção da deficiência auditiva.
4. INTRODUÇÃO À UNIDADE
Dando continuidade aos estudos realizados na Unidade 1,
na qual você conheceu a história da educação dos surdos no Brasil
e as abordagens educacionais (oralismo, comunicação total e bi-
linguismo) que orientaram a educação desses alunos ao longo da
história, vamos, nesta unidade, estudar os aspectos relacionados à
audição normal e aos problemas do aparelho auditivo, enfocando
as implicações que uma perda de audição pode acarretar para ao
processo educacional.
Os conteúdos que abordaremos ajudarão você a compre-
ender a configuração do aparelho auditivo e seu funcionamen-
to normal. Trabalharemos, também, a definição e a classificação
das perdas auditivas, suas causas mais frequentes, os métodos de
prevenção, bem como o processo de diagnóstico e reabilitação,
incluindo uma discussão sobre a indicação e a adaptação de próte-
ses auditivas e de implante coclear.
Bons estudos!
© U2 - Audição e Surdez 55
5. AUDIÇÃO
A audição é o meio pelo qual o indivíduo entra em contato
com o mundo sonoro e com as estruturas da língua oral, possibi-
litando, dentre outras coisas, o desenvolvimento da linguagem. A
língua oral é o principal meio de comunicação entre os seres hu-
manos, e a audição participa efetivamente no processo de apren-
dizagem desde os conceitos mais básicos, até a aprendizagem da
leitura e da escrita. Adicionalmente, a audição influencia decisiva-
mente nas relações interpessoais, que permitirão um adequado
desenvolvimento pessoal e emocional (SILVA, KAUCHAKJE e GE-
SUELI, 2003).
Basicamente, a audição desempenha as funções de:
1) Localização e identificação: capacidade de reconhecer-
mos de onde vem um som e qual é a fonte sonora que o
está produzindo.
2) Alerta: capacidade de nos atentarmos para todos os es-
tímulos sonoros que nos rodeiam, como, por exemplo, a
buzina de um carro vindo em nossa direção.
3) Socialização: capacidade de nos relacionarmos, pois é
principalmente pela audição que entramos em contato
com as outras pessoas.
4) Intelectual: grande parte das informações nos é trans-
mitida por meio do código oral.
5) Comunicação: a fala é o meio de comunicação mais utili-
zado pelo homem, e é por meio da audição que a lingua-
gem e a fala se desenvolvem.
Para compreendermos o processo normal da audição, é ne-
cessário conhecer a anatomia do ouvido humano. O nosso ouvido
é formado pela orelha externa, média e interna. Vejamos, agora,
um pouco mais sobre cada uma delas.
Conforme mostra o esquema da Figura 1, a orelha externa
é constituída pelo pavilhão auricular, conduto auditivo externo e
membrana timpânica. Essas estruturas são responsáveis pela cap-
tação e condução do estímulo sonoro.
orelha externa
hélix
cartilagem
concha canal
tragus auditivo
anti-tragus externo
membrana do
timpano
cavidade da
orelha média tuba auditiva
bigorna
Figura 2 Orelha média.
janela cóclea
oval
6. DEFICIÊNCIA AUDITIVA/SURDEZ
A surdez é caracterizada como um problema sensorial não evi-
dente, que acarreta dificuldades na detecção e na percepção dos
sons. Na primeira infância, a presença de qualquer alteração no sis-
tema auditivo pode comprometer o desenvolvimento da criança em
vários aspectos, como o cognitivo, o linguístico e o social.
Principais Causas
da Perda Auditiva
Adultos
• Exposição Excessiva ao Ruído
• Presbiacusia - Envelhecimento
• Hereditariedade
• Distúrbios Vasculares e
Circulatórios
• Tumores e Outras Lesões
Crianças
Alterações do Ouvido Médio
• Otite Média
Causas Congênitas
• Anomalias Crâniofaciais
• Histórico Familiar de Perda
Auditiva
• Infecções Congênitas
Outras
• Trauma Craniano
• Medicamentos Ototóxicos
• Distúrbios Infecciosos na
Infância (Caxumba, Sarampo)
• Meningite Bacteriana
8. LEITURA COMPLEMENTAR
Nesta unidade, ao estudarmos sobre as formas de trata-
mento das perdas auditivas, mencionamos o Implante Coclear (IC)
como uma alternativa de reabilitação. No entanto, a comunidade
surda tem se mostrado contrária à realização desse procedimento,
fundamentando sua negação com base na valorização da língua de
sinais, no contato com a comunidade surda e no desenvolvimen-
to de pesquisas científicas que evidenciaram as línguas de sinais
como línguas naturais.
Tais aspectos, segundo Lichtig et al. (ver Tópico E-Referên-
cias), criaram um senso de coesão na comunidade surda, bem
como uma cultura surda e a evidência de identidade próprias. Os
autores afirmam que, em países como, por exemplo, os Estados
Unidos, onde a comunidade surda é mais consolidada, há as ex-
pressões "deaf power" ou "deaf world", que caracterizam a impor-
tância da língua, cultura e identidade dos surdos.
Vejamos a justificativa da comunidade surda em relação ao
IC de acordo com Lichtig et al. (2003):
© U2 - Audição e Surdez 67
Justificativa––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
A intolerância da comunidade surda com relação ao IC mostra-se contrária ao
uso do IC em crianças surdas, especialmente naquelas com surdez pre-lingual,
por acreditar que tal prática pode violar a integridade e os direitos humanos da
criança e por limitar a opção da criança de ser ou não um usuário da Língua de
Sinais ou do implante coclear (BDA, 1995). Ademais, o não uso de sinais pelas
crianças surdas pode significar o genocídio da comunidade surda, uma vez que
são as crianças as responsáveis pela sua sobrevivência (Bienvenu, 1994).
–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
A fim de ilustrar o posicionamento dos surdos perante o IC,
Lichtig et al. (2003) descrevem uma pesquisa realizada com 17 sur-
dos adultos da cidade de São Paulo. Os pesquisadores entrevis-
taram os surdos individualmente com questionários previamente
elaborados, obtendo os seguintes resultados:
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Todos os dezessete surdos entrevistados afirmaram ter alguma informação sobre o IC.
A maioria (13 sujeitos) apresentou uma visão negativa com relação ao IC. Contudo,
os sujeitos entrevistados pautaram-se em argumentos que denotavam um real des-
conhecimento sobre o assunto. Outros se mostraram preocupados com a perda da
identidade da cultura surda e com a manutenção do uso da língua de sinais. No que
se refere à realização do IC, novamente todos os 17 sujeitos se mostraram contrários à
mesma, por razões que abrangeram desde o medo de morrer na cirurgia até o orgulho
da condição da surdez.
Exceto por 1 sujeito, todos os demais (16) apresentaram objeção à realização
do IC em bebês. Quanto à implantação em crianças, verificou-se um panorama
diferente, já que 5 sujeitos apresentaram argumentos favoráveis, desde que a
criança pudesse ter a escolha de ser, ou não, submetida à cirurgia, após ter do-
mínio e conhecimento da língua e da cultura surda.
[...] De forma geral, um dos aspectos que se destaca é o desconhecimento preciso pe-
los surdos, tanto em relação à cirurgia quanto em relação aos benefícios e limitações
do IC. Tal desconhecimento não é relatado na literatura internacional. Contudo, nota-
se que, assim como as comunidades surdas de países desenvolvidos, as comunida-
des surdas paulistanas mostram-se preocupadas em preservar a língua, identidade e
cultura surda e em criar seus filhos dentro de um modelo no qual o surdo é visto como
integrante de uma minoria linguística e cultural e não como portador de uma condição
patológica.
–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Assim, os resultados obtidos com essa pesquisa demonstra-
ram que, apesar de todos afirmarem o conhecimento sobre o IC,
têm ainda dúvidas sobre a aplicação do procedimento em bebês,
crianças e adultos.
9. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS
Ao finalizar seus estudos sobre o processo de audição nor-
mal e as implicações da deficiência auditiva, procure responder
para si mesmo às seguintes questões:
1) Como se processa a fisiologia normal da audição?
3) Como as perdas auditivas podem ser classificadas? Defina cada uma dessas
possibilidades.
10. CONSIDERAÇÕES
Nesta unidade, você estudou os problemas de audição e
suas especificidades, inclusive a anatomia e a fisiologia do sistema
auditivo em condições normais de audição. Vimos os conceitos de
deficiência auditiva, suas causas, classificações e formas de pre-
venção e reabilitação.
A próxima unidade trata da importância da língua de sinais
para o desenvolvimento cognitivo, linguístico e afetivo da criança
surda. Você verá que a surdez pode afetar todo o sistema familiar,
que, apesar das dificuldades enfrentadas, deve formar interlocu-
tores em libras e envolver-se no processo educacional da criança
surda.
11. E-REFERÊNCIAS
Lista de figuras
Figura 1 Orelha externa. Disponível em: <http://www.audimaxpp.com/perda_auditiva.
htm>. Acesso em: 07 jan. 2011.
Figura 2 Orelha média. Disponível em: <http://www.audimaxpp.com/perda_auditiva.
htm>. Acesso em: 07 jan. 2011.
© U2 - Audição e Surdez 69
Site pesquisado
LICHTIG, I.; MECCA, F. F. D. N.; BARBOSA, F.; GOMES, M. O implante coclear e a comunidade
surda: desafio ou solução? In: II Seminário ATIID: Acessibilidade, TI e Inclusão Digital, São
Paulo (SP), 23 e 24 set. 2003. Disponível em: <http://www.prodam.sp.gov.br/multimidia/
midia/cd_atiid/conteudo/ATIID2003/MR4/01/ImplanteCoclear-ComunidadeSurda.pdf>.
Acesso em: 04 jan. 2011.
2. CONTEÚDOS
• Fala, língua e linguagem.
• Aquisição normal da linguagem.
72 © Língua Brasileira de Sinais
4. INTRODUÇÃO À UNIDADE
Na unidade anterior, você estudou os aspectos relacionados
à audição normal e aos problemas do aparelho auditivo, enfocan-
do as implicações que a perda de audição pode acarretar para ao
processo educacional da criança surda.
Agora, estudaremos as consequências que a surdez pode
proporcionar ao desenvolvimento cognitivo, linguístico e afetivo
© U3 - A Surdez na Família e o Desenvolvimento da Linguagem 73
9. FAMÍLIA
A família representa o primeiro núcleo social do qual o ser
humano participa. Os valores implícitos e explícitos da família são
bases para as experiências sociais de seus filhos (DORZIAT, 1999).
Nesse sentido, a família é, antes de tudo, o espaço em que ocor-
rem os primeiros aprendizados da criança.
Para Minuchin (1988), a família é um sistema em constante
transformação ou um sistema que se adapta às diferentes exigên-
cias das diversas fases do seu desenvolvimento. Vista como um todo
coeso, a família é inseparável e interdependente, estando todas as
suas partes relacionadas. Portanto, cada comportamento ou mudan-
ça de comportamento em um dos membros afeta todos os outros.
© U3 - A Surdez na Família e o Desenvolvimento da Linguagem 81
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Pelo fato de ser ouvinte, é esperado que, inicialmente, a família, em particular
a mãe, privilegie a fala, forma habitual de interação na sociedade ouvinte. No
entanto, à medida que a interação vai acontecendo, a representação que a mãe
vai fazendo das potencialidades linguísticas do seu filho vai determinar a modali-
dade que será usada na interação com o filho, se oral ou gestual.
[...] Tendo em vista o objetivo deste estudo, foram retirados das entrevistas dados
que permitissem relacionar as concepções de surdez e de pessoa surda que as
mães demonstram ter, com a modalidade de linguagem que elas pensam ser a
melhor para seu filho e para os surdos em geral.
Vale lembrar que a instituição onde foi realizado este estudo expõe as crianças
surdas à Língua de Sinais e à Língua Portuguesa, nas modalidades oral e escri-
ta, e oferece curso de Língua de Sinais para os pais e familiares.
A maioria das mães (M1, M2, M4, M5, M6, M7, M8, M9, M10) diz que o melhor
para o surdo seria usar os sinais e a fala: "Para início sem sombra de dúvida que
é a linguagem de sinais, para o início é fundamental porque eu lembro que quan-
do K era pequena, eu não falava nada para ela, [...] eu pegava dava banho, eu
trocava, sem falar para onde vai, o que vai fazer, o que vai acontecer. Então, se
não fosse os sinais, como eu ia explicar para ela, agora já quando eles já estão
maiores, aí sim, a linguagem oral também é importante." (M1).
[...] Diferentemente de todas as mães, M3 refere que a melhor forma para o surdo
se comunicar é por meio da fala e explica: "[...] é porque é mais fácil, o sinal é
muito difícil" (M3). A mãe deixa claro que tem muita dificuldade em aprender os
sinais, apesar de estar no CEPRE há mais de três anos. Como seu filho apre-
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Após analisar as concepções de surdez e de surdos que cada mãe revela
nas entrevistas e da modalidade que elas parecem privilegiar na interação,
procedeu-se ao estabelecimento de um paralelo, buscando relacionar as duas
categorias.
Observou-se que, entre as mães (M2, M3, M4, M5, M8, M9) que revelam ter uma
representação da surdez como deficiência, somente para uma delas (M3) a me-
lhor forma do surdo se comunicar é por meio da modalidade oral.
Ao referirem que a surdez é uma deficiência e que as crianças surdas precisam
de um trabalho para poder se tornar "normais", é de se esperar que as mães
valorizem a comunicação por meio da fala. No entanto, para todas os surdos
precisam utilizar os sinais e a fala, embora, em seus depoimentos, se perceba
que algumas privilegiam a fala, como a mãe 5, e outras privilegiam os sinais,
como a mãe 2.
A mãe 5, apesar de ter uma representação da surdez como deficiência, afirma
que os surdos são inteligentes, mas têm dificuldades no aprendizado. Como tem
essa visão reparadora da surdez, justifica o predomínio do uso da modalidade
oral da Língua Portuguesa com o filho, pois, aprendendo a falar, torna-se me-
nos deficiente. Ao referir que são inteligentes, parece atribuir a esta qualidade
o aprendizado da fala. No entanto, nota-se uma contradição, quando diz que
os surdos são inteligentes, mas têm dificuldades. Esta forma de se referir aos
surdos pode ser tomada como decorrência da representação que a mãe tem de
surdez, uma vez que a visão de deficiência traz embutida a visão de incapacida-
de e, assim, os surdos, apesar de serem inteligentes e conseguirem falar, terão
mais dificuldades em aprender.
A mãe 2 também demonstra ter uma concepção de surdez como deficiência, na
medida em que afirma que o trabalho de reabilitação pode melhorar a vida do
© U3 - A Surdez na Família e o Desenvolvimento da Linguagem 91
surdo e ele pode vir a tornar-se uma pessoa normal. Seria de se esperar que ela
privilegiasse a fala, já que é assim que o surdo poderia deixar de ser deficiente.
No entanto, a mãe refere que seria melhor para o surdo usar os sinais e a fala, e,
por enquanto, a filha usa predominantemente os sinais. Parece que a mãe usa
sinais porque sua filha é pequena e não conta ainda com recursos orais para se
comunicar e, assim, o uso dos sinais parece ser transitório, apenas para facilitar
a comunicação entre elas.
As outras mães (M1, M6, M7, M10), que revelaram não conceber a surdez como
deficiência, também mencionaram a importância das duas línguas (de Sinais e
Língua Portuguesa). Contudo, uma delas, a de número 7, prioriza os sinais. Faz-se
importante considerar que a criança da mãe 7 é pequena e, portanto, não dispõe
de muitos recursos orais para se comunicar, por isso parece priorizar os sinais.
Na relação entre concepção de surdez e modalidade de linguagem, percebe-se
que tanto as mães que têm uma concepção mais clínica da surdez como as que
não a encaram como deficiência mencionam a importância do surdo adquirir as
duas línguas.
Como os pais são ouvintes, parece ser natural que tenham a expectativa de que
seus filhos sejam bilíngues para poder conviver tanto com o grupo de surdos,
como com o grupo de ouvintes, já que é a minoria de ouvintes que aprende a
Língua de Sinais. No entanto, vale lembrar que, pelo fato de frequentarem o CE-
PRE, que segue uma abordagem bilíngue, essas mães receberam orientações
sobre a importância e a necessidade do uso da Língua de Sinais, o que pode
ter contribuído para que elas percebessem que a criança pode se desenvolver
melhor se utilizar a Língua de Sinais e que esta não impede ou atrapalha o de-
senvolvimento da fala. Apesar de todas terem a mesma orientação, percebem-se
diferenças na ênfase que as mães dão à modalidade de língua. O quanto a mãe
privilegia uma modalidade em detrimento da outra vai depender da concepção
que ela tem de surdez e da representação que construiu das possibilidades lin-
guísticas do seu filho surdo.
É importante ressaltar que, por vezes, a relação entre a concepção de surdez
e a escolha da modalidade é influenciada pelas opções que os pais têm à sua
disposição na comunidade em que estão inseridos.
Verificou-se que das 10 mães somente duas delas apresentaram posições mais
definidas e opostas em relação à concepção de surdez e da pessoa surda. Uma
delas, a M10, parece se aproximar de uma concepção socioantropológica da
surdez, na medida em que concebe o surdo como diferente, aceita a Língua
de Sinais e não esquece em nenhum momento que a filha é surda. Prioriza a
via visual-gestual para a criança ter acesso às informações e conhecimento de
mundo. Essa mãe optou pelo trabalho bilíngue e a filha, em idade escolar (nove
anos), usa as duas línguas, a de Sinais e a Portuguesa, dependendo do seu
interlocutor.
A mãe 3 revela, em seus depoimentos, se identificar com uma concepção clínico-
terapêutica da surdez, acreditando que tanto o aparelho auditivo quanto a fala
trazem a cura para a perda da audição. Apesar de frequentar o CEPRE, relata
que não consegue aprender a Língua de Sinais e o filho entende tudo pela fala.
O filho, em idade escolar (sete anos e oito meses), faz uso constante do aparelho
auditivo, ficando "nervoso" quando a pilha acaba. Ele apresenta uma fala inteli-
gível, mais para pessoas que estão acostumadas a ouvir a voz de surdos, e usa
assistematicamente os sinais com os colegas surdos no CEPRE.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
15. CONSIDERAÇÕES
Nesta unidade, você pôde refletir sobre a importância da lín-
gua de sinais para o desenvolvimento cognitivo, linguístico e afeti-
vo da criança surda. Vimos que a surdez pode afetar todo o siste-
ma familiar; porém este deve formar interlocutor(es) em libras e
envolver-se no processo educacional do filho surdo.
Na próxima unidade, você terá a oportunidade de refletir so-
bre a escolarização de crianças surdas, enfocando sua condição na
classe de ouvintes e a presença ou não da língua de sinais nesse
contexto. Estudaremos, também, o Atendimento Educacional Es-
pecializado para os Alunos com Surdez, uma nova proposta elabo-
rada pelo Ministério da Educação a fim de garantir aos surdos uma
educação mais adequada às suas reais necessidades.
16. E-REFERÊNCIA
PAIVA E SILVA, A. B.; PEREIRA, M. C. C.; ZANOLLI, M. L. Mães ouvintes com filhos surdos:
concepção de surdez e escolha da modalidade de linguagem. Psicologia: Teoria e
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DORZIAT, A. Concepção de surdez e de escola: ponto de partida para um pensar pedagógico
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(Dissertação de Mestrado).
VYGOTSKY, L. S. Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1991.
EAD
A língua de Sinais na
Educação de Surdos
4
1. OBJETIVOS
• Estudar e caracterizar os aspectos da educação dos surdos
à luz dos pressupostos da educação bilíngue e bicultural.
• Compreender e demonstrar a importância da língua de
sinais na educação dos surdos.
• Compreender e discutir a importância da língua de sinais
para a prática docente.
• Conhecer e analisar o Atendimento Educacional Especiali-
zado (AEE) para pessoas com surdez.
2. CONTEÚDOS
• Princípios da educação para a diversidade.
• Educação para a diversidade: formação de professores e
a língua de sinais.
• Atendimento Educacional Especializado (AEE) para pesso-
as com surdez.
96 © Língua Brasileira de Sinais
4. INTRODUÇÃO À UNIDADE
Na unidade anterior, você estudou a importância da língua
de sinais para o desenvolvimento cognitivo, linguístico e afetivo da
criança surda e pôde constatar as implicações da surdez em todo
o sistema familiar.
Nesta unidade, irá refletir sobre a escolarização de crianças
surdas, enfocando, especialmente, sua condição na classe de ou-
vintes e da presença ou não da língua de sinais nesse contexto.
Estudaremos, também, o Atendimento Educacional Especializado
para os Alunos com Surdez, uma nova proposta elaborada pelo
Ministério da Educação a fim de garantir aos surdos uma educação
mais adequada às suas reais necessidades.
Consideramos esse espaço de reflexão e discussão de funda-
mental importância, tendo em vista que o objetivo deste curso é
formar professores. Assim, é imprescindível que você tenha aqui
uma oportunidade para estudar algumas questões essenciais so-
bre a educação dos surdos e a língua de sinais.
© U4 - A língua de Sinais na Educação de Surdos 97
8. LEITURA COMPLEMENTAR
A seguir, apresentaremos os três momentos didático-peda-
gógicos do Atendimento Educacional Especializado, segundo Da-
mázio (2007, p. 26-45).
Dessa forma, os alunos precisam se atentar para todas as pistas oferecidas para
compreenderem a mensagem. O atendimento em Língua Portuguesa contribui
enormemente para o avanço conceitual do aluno na classe comum.
Em resumo, podemos afirmar que:
• O Atendimento Educacional Especializado para aprendizagem da Língua Por-
tuguesa exige que o profissional conheça muito bem a organização e a estru-
tura dessa Língua, bem como, metodologias de ensino de segunda língua.
• O uso de recursos visuais é fundamental para a compreensão da Língua
Portuguesa, seguidos de uma exploração contextual do conteúdo em estu-
do;
• O atendimento diário em Língua Portuguesa, garante a aprendizagem dessa
língua pelos alunos.
• Para a aquisição da Língua Portuguesa, é preciso que o professor estimule,
permanentemente, o aluno, provocandoo a enfrentar desafios.
• O atendimento em Língua Portuguesa é de extrema importância para o de-
senvolvimento e a aprendizagem do aluno com surdez na sala comum.
• A avaliação do desenvolvimento da Língua Portuguesa deve ocorrer continu-
amente para assegurar que se conheçam os avanços do aluno com surdez e
para que se possa redefinir o planejamento, se for necessário.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
9. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS
Confira, a seguir, as questões propostas para verificar o seu
desempenho no estudo desta unidade:
1) De que forma a educação dos surdos deve ser estruturada para contemplar
os pressupostos da educação bilíngue e bicultural?
4) O que é uma escola polo? Quais as vantagens para o aluno surdo no ensino
comum?
10. CONSIDERAÇÕES
Nesta unidade, você pôde refletir sobre a escolarização de
crianças surdas, enfocando, especialmente, a sua condição na clas-
se de ouvintes e da presença ou não da língua de sinais nesse con-
texto. Você pôde conhecer, também, a proposta de organização do
Atendimento Educacional Especializado (AEE).
Na próxima unidade, você irá conhecer as estratégias e os re-
cursos didáticos e tecnológicos que estão sendo utilizados na edu-
cação dos surdos, promovendo acessibilidade para que os surdos
possam exercer plenamente sua cidadania.
11. E-REFERÊNCIAS
BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Resolução CNE/CEB n. 2/2001, de 11 de setembro
de 2001. Institui diretrizes nacionais para a Educação Especial na Educação Básica.
Disponível em: <www.mec.gov.br/seesp/diretrizes1.shtm>. Acesso em: 11 abr. 2006.
DAMÁZIO, M. F. M. Atendimento Educacional Especializado: pessoa com surdez. Brasília:
SEESP/SEED/MEC, 2007. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/
aee_da.pdf>. Acesso em: 05 mar. 2010.
SOUZA, R. M. Língua de sinais e língua majoritária como produto de trabalho discursivo. Caderno
Cedes, Campinas, v. 19, n. 46, 1998. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_
arttext&pid=S01012621998000300006&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 21 nov. 2006.
TARTUCI, D. Re-significando o "ser professora": discursos e práticas na educação de
surdos. CAC-UFG, 2005. Disponível em: <http://www.anped.org.br/reunioes/29ra/
trabalhos/trabalho/GT15-1866--Int.pdf>. Acesso em: 05 jan. 2011.
2. CONTEÚDOS
• Acessibilidade e cidadania na surdez.
• Recursos tecnológicos à disposição dos surdos.
• Estratégias e recursos didáticos utilizados no processo
educacional do aluno com surdez.
118 © Língua Brasileira de Sinais
4. INTRODUÇÃO À UNIDADE
Na Unidade 4, refletimos sobre a escolarização dos alunos
surdos e, nesse processo, enfocamos, principalmente, a sua condi-
ção na classe de ouvintes e a presença ou não da língua de sinais
nesse contexto.
Agora, vamos estudar as estratégias e os recursos didáticos e
tecnológicos disponíveis para os surdos atualmente, visando ao exer-
cício de sua cidadania. Sendo assim, conheceremos os seguintes re-
cursos: o software do Dicionário da Língua Brasileira de Sinais; o MSN
para o surdo; o Telefone para surdos (TS); o Projeto TLIBRAS – Tradu-
tor Português/Libras (Língua Brasileira de Sinais), dentre outros.
Depois, discutiremos a interface entre a tecnologia e a educa-
ção dos surdos com vistas às estratégias didáticas e metodológicas.
Aproveite este momento e bons estudos!
© U5 - Acessibilidade: Estratégias, Recursos Didáticos e Tecnológicos Utilizados na Educação de Surdos
119
5. ACESSIBILIDADE E CIDADANIA
Falar em tecnologias é pensar em facilidade, em acessibili-
dade. Em relação aos surdos, existem vários projetos que estão
sendo utilizados para promover a acessibilidade e garantir o di-
reito de exercício da cidadania pelos surdos, tais como softwares,
dicionários e equipamentos de adaptação.
Essas ferramentas são importantes para a promoção da
justiça social e das oportunidades para o surdo. Elas estimulam
o desenvolvimento cognitivo, aprimoram e potencializam a apro-
priação de ideias, de conhecimentos, de habilidades e de informa-
ções que influenciam na formação de identidade, de concepção
da realidade e do mundo em que vivemos. Adicionalmente, elas
ampliam as possibilidades de comunicação e de autonomia pes-
soal, promovendo o desempenho intelectual, fazendo com que se
deixem de lado as limitações. Modificam o estilo de vida, promo-
vem interações e condutas sociais ao inovar hábitos e atitudes em
relação à educação, ao lazer e ao trabalho, à vida familiar e comu-
nitária.
Telefone celular
O telefone celular, dentre as atuais tecnologias de comuni-
cação, foi a que melhor se adaptou à acessibilidade do surdo, pois
possui recursos que atendem as especificidades dos surdos, como
o envio de mensagens de texto e o aviso de recebimento de men-
sagens por vibração do aparelho ou iluminação do visor.
Entretanto, o telefone celular ainda é usado por uma parcela
pequena de surdos, pois, para sua efetiva utilização, o surdo preci-
sa saber se comunicar por meio de linguagem escrita, no caso do
Brasil, da Língua Portuguesa.
Mesmo apresentando ressalvas, esse instrumento é capaz
de promover certa independência de comunicação, de expressão
e de mobilidade da pessoa com surdez na sociedade.
Aluno surdo
2) Ordene as letras para formar a palavra que representa
rdene
2) as
2) Ordene letras para
rdene
Ordene formar
as letras a palavra
para formar que representa
a palavra queo sinal:
representa o sinal:
o sinal:
3) Olhe o sinal, circule o desenho correspondente e escreva seu
significado no quadro: Claretiano - Centro Universitário
3) Olhe o sinal, circule o desenho correspondente e escreva seu
130 © Língua Brasileira de Sinais
3) Olhe o sinal, circule o desenho correspondente e escreva seu
significado
3) Olhe onosinal,
quadro:
circule o desenho correspondente e escre-
va seu significado no quadro:
8. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS
Confira, a seguir, as questões propostas para verificar seu de-
sempenho no estudo desta unidade:
1) O que é acessibilidade e quais as formas de garantir esse direito ao surdo?
9. CONSIDERAÇÕES
Nesta unidade, você pôde refletir sobre as estratégias e os
recursos didáticos e tecnológicos que, atualmente, estão sendo
utilizados na educação dos surdos. Destacamos os recursos visuais
como uma possibilidade para garantir aquisição de conhecimento
e desenvolvimento da pessoa com surdez, bem como um caminho
para o exercício de sua cidadania.
© U5 - Acessibilidade: Estratégias, Recursos Didáticos e Tecnológicos Utilizados na Educação de Surdos
131
10. E-REFERÊNCIAS
Lista de figuras
Figura 1 Imagem de página site do Dicionário da Língua Brasileira de Sinais. Disponível
em: <http://www.guanabara.info/wpcontent/uploads/2008/04/Libras.jpg.>. Acesso em:
03 jun. 2010.
Figura 2 Telefone para surdos (TS). Disponível em: <http://csjonline.web.br.com/Imagem/
img_telefone.jpg>. Acesso em: 03 jun. 2010.
Figura 3 Projeto TLIBRAS – Tradutor Português/Língua Brasileira de Sinais (Libras).
Disponível em: <http://1.bp.blogspot.com/_ckDXprs-xKM/SfIf1SY3LTI/AAAAAAAAAFc/
L5D3q43NGcQ/s1600-h/20030910-tradutor.jpg>. Acesso em: 03 jun. 2010.
Sites pesquisados
BRASIL. Lei nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000. Disponível em: <http://www.planalto.
gov.br/ccivil/leis/L10098.htm>. Acesso: 09 jun. 2010.
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br/Libras/>. Acesso em: 05 jan. 2011.
BRASIL. Decreto nº 5.296, de 02 de dezembro de 2004. Disponível em: <http://www.planalto.
gov.br/ccivil/_ato2004-2006/2004/decreto/d5296.htm>. Acesso em: 10 jan. 2011.
2. CONTEÚDOS
• Igualdade de direitos na surdez.
• Identidade surda.
• Cultura surda.
4. INTRODUÇÃO À UNIDADE
Na Unidade 5, você pôde refletir sobre as estratégias e os
recursos didáticos e tecnológicos que estão sendo utilizados atu-
almente na educação dos surdos. Destacamos os recursos visuais
como uma possibilidade para garantir aquisição de conhecimento
e desenvolvimento da pessoa com surdez, bem como um caminho
para o exercício de sua cidadania.
Nesse mesmo sentido e procurando ainda criar oportunida-
des de condições de igualdade para os surdos, iremos estudar ago-
ra os aspectos relacionados à identidade e à Cultura Surda.
5. IGUALDADE DE DIREITOS
A igualdade de direitos para todos os cidadãos é uma dis-
cussão muito antiga. A Declaração dos Direitos do Homem e do
© U6 - Identidade e Igualdade de Direitos dos Surdos 135
Essa autora afirma, ainda, que para a maioria das pessoas dos
grupos minoritários que vivem em uma situação social desfavorá-
vel, configurada pela pobreza, pela privação ou pela ineficiência no
atendimento aos seus direitos sociais, a exclusão pode se sobressair,
intensificando outras exclusões fundamentadas na diferença.
Em uma sociedade semelhante a essa em que vivemos, onde
encontramos uma desigualdade social acentuada, os direitos das
pessoas que fazem parte dos grupos minoritários, tais como os
surdos, tendem a ser repetidamente desrespeitados. Segundo
Kauchakje (2003, p. 63-64), "a desigualdade social potencializa ou-
tras formas de injustiça social, como as baseadas na diferença".
Mas será que, ainda hoje, há tanto desrespeito em nossa so-
ciedade? Sim, infelizmente isso ainda acontece apesar de a legisla-
ção brasileira garantir vários direitos às pessoas com necessidades
especiais, dentre elas os surdos.
Vejamos, a seguir, o que nos dizem os textos de algumas de
nossas leis, a começar pela Constituição Federal de 1988.
7. A CULTURA SURDA
As pessoas que utilizam a comunicação espaço-visual como
principal meio de conhecer o mundo em substituição à audição e à
fala fazem parte de um grupo cultural, o grupo dos surdos. A maio-
ria das pessoas surdas, no contato com outros surdos, desenvolve
a Língua de Sinais.
Vários pesquisadores que estudam a surdez têm se dedicado
a estudar a Cultura Surda (GOLDIFELD, 1997; MOURA, 2000; QUA-
DROS, 1997; SÁ, 1999; SKLIAR, 2000). Definir o que vem a ser Cultura
Surda é, ainda nos dias de hoje, uma tarefa bastante difícil, pois há
muitas controvérsias. Entretanto, algumas questões serão levanta-
das com o pressuposto de seguir os estudos culturais que propõem
pensar a surdez em uma perspectiva antropológica e multicultural.
Segundo Santana e Bergamo (2005), a discussão da litera-
tura em torno da Cultura Surda pressupõe uma diferença entre
surdos e ouvintes e admite que haja hegemonia em cada um dos
extremos dessa díade. No entanto, essa diversidade faz parte de
um processo de divisão social antiga, assim como o próprio discur-
so sobre a desigualdade. Segundo esses autores:
[...] um processo que, ao invés de aproximar os surdos dos ouvin-
tes, distancia-os, já que enfatiza sempre o que eles têm de diferen-
te e nunca o que eles têm em comum" (SANTANA e BERGAMO,
2005, p. 11).
8. LEITURA COMPLEMENTAR
A seguir, apresentamos fragmentos de um artigo intitulado
Surdez, linguagem e cultura, de José Geraldo Silveira Bueno (ver
E-Referências). Neste texto, o autor procura analisar, de maneira
crítica, a relação entre a surdez, a linguagem e a cultura. Para isso,
utiliza três referenciais teóricos básicos: a história, a abordagem
multiculturalista e a relação normalidade-patologia.
Bueno (1998) apresenta uma visão diferente da apresentada
nesta unidade e pretende, com este artigo, questionar a integração
social do indivíduo surdo, buscando, segundo ele, superar a visão
dicotômica e a-histórica que centra toda sua análise na divisão do
meio social entre "sociedade ouvinte" e "comunidade surda".
Vejamos fragmentos do texto que comprovam a visão do autor
sobre tal questão. Inicialmente, Bueno (1998) discute alguns aspec-
tos sobre a Cultura Surda dentro de uma perspectiva multicultural:
© U6 - Identidade e Igualdade de Direitos dos Surdos 145
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
[...] a comunidade dos surdos é entendida, por esses autores, como o "lugar onde os
Surdos se encontram, onde o Surdo se sente entre iguais, seja na escola residencial,
clubes de Surdos, eventos esportivos de Surdos, festas de Surdos etc.". Procuram
não utilizar o termo [sic] comunidade surda, por entenderem que existem situações
em que os membros da Comunidade de Surdos não são Surdos, mas se identificam
com os problemas da surdez (parentes, profissionais) ou fazem parte de uma família
Surda (filhos ouvintes de pais Surdos), ou ainda Surdos que vêm de outros lugares
e que ainda não aprenderam toda a escala de habilidades requeridas para aquela
comunidade. [...] Existe a questão também daqueles surdos que não pertenciam à
Comunidade de Surdos e que se juntam a ela mais tarde na vida.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
[...] A primeira consideração a ser feita é de que a recuperação histórica realizada
por esses autores procura explicar o presente pela trajetória passada. Em outros
termos, o que justifica o fato de que o surdo não tivesse um lugar ao sol é a impo-
sição feita pelos ouvintes para a incorporação de uma língua que não era sua.
Por outro lado, para esses mesmos autores, a sucessão dos fatos históricos é
uma constante progressão, do menos adequado ao cada vez mais adequado, ou
seja, desde a imposição da língua oral e de sua progressiva e adequada substi-
tuição pelo sinal.
Essa concepção "presentista e progressivista" produz uma história justificadora
da realidade atual, uma vez que coloca o presente como consequência inexorá-
vel do suceder dos fatos históricos. Assim é que essa visão parte do princípio de
que, tendo em vista a desvalorização que se deu no suceder da história sobre
a importância do sinal, só poderíamos desembocar na situação atual, em que
apenas alguns conseguem enxergar toda sua riqueza e propriedade com relação
à "comunidade surda".
Por outro lado, a visão "presentista" leva-nos a encarar o passado com base
nas perspectivas e necessidades do presente. Assim, a visão de Aristóteles ou
de [Pedro] Ponce de León sobre a linguagem oral parece acarretar uma visão
de surdez e não o inverso, isto é, de que as condições socioestruturais dessas
sociedades acarretavam uma visão de linguagem e, consequentemente, de sur-
dez.
[...] Em suma, a história assim produzida é a dos "carrascos", personificados pe-
los "oralistas", e dos "defensores dos oprimidos", os gestualistas. Para os primei-
ros, ficam as qualificações, ou melhor, desqualificações: de defensor os direitos
dos filhos da nobreza (Ponce de León), de falta de originalidade (Bonet), de não
trabalhar com os completamente surdos (Pereira), de copiador de idéias (Am-
man), de ocultador do método (Braidwood), de criador da concepção de surdez
como doença (Itard), de não entender nada de surdez (Ordinaire), de comparar
surdos a criminosos (Howe), de pior inimigo dos surdos e de salvar os ouvintes
da convivência indesejável com grupos de surdos (Bell); para os segundos, as
qualificações de colocar os surdos na categoria de humanos (L’Epée), de brilhan-
te professor (Clerk), de grandes iniciativas (E. Gallaudet).
É interessante verificar, entretanto, que, dos nomes citados como defensores da "co-
munidade dos surdos", raros são aqueles que eram surdos: entre L’Epée, Gallaudet
pai, Gallaudet filho, Clerk, Sicard, Massieu, Wallis, Weld, Watson (Londres), Vaïsse,
Moritz Hill (Alemanha), apenas dois eram surdos (Clerk e Massieu). Isto é, os defen-
sores dos sinais, arautos da autonomia e do respeito à comunidade surda, consegui-
ram produzir dois indivíduos de destaque em 200 anos (Moura 1996).
Essa posição intransigente e ideológica, na verdade, retira do estudo da história
aquilo que seria o mais significativo: a análise dos conflitos e das contradições
das ações e representações dos sujeitos históricos que refletem, por um lado,
os determinantes sociais macroestruturais e, por outro, os próprios caminhos e
descaminhos dos sujeitos e das instituições que contribuem para a reprodução
(ou não) dessas mesmas contradições e conflitos.
[...] Uma outra questão a ser apontada é a de que essas obras analisam a histó-
ria como produto de pessoas notáveis (para o bem e para o mal) desvinculadas
de suas relações pessoais, institucionais e sociais. Assim, a história é produto
da ação desses senhores, uns por motivações intrinsecamente meritórias (os
defensores do sinal) e os outros, por motivações preconceituosas e prejudiciais
ao surdo (os defensores do oralismo). As poucas tentativas de contextualização
sociocultural não conseguem explicar o fundamental: por que os oralistas não
conseguiram fazer com que os surdos se apropriassem dessa linguagem e por
que os gestualistas não conseguiram fazer com que os surdos se constituíssem
numa comunidade forte e autônoma.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Quanto à relação surdez-normalidade, o autor afirma ser uma
distinção conceitual e, portanto, teórica. Nesse sentido, segundo
Bueno (1998) ela deve ser devidamente estuda e analisada:
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Boa parte da literatura que procura defender a concepção da existência de uma
comunidade surda coloca-se em contraposição, às vezes explícita e às vezes
implícita, da surdez considerada como deficiência.
[...] Ele não deve ser considerado como excepcional, nem como patológico. Mas
não se pode considerá-lo como normal, já que ele sofre uma restrição. Nesse
sentido, assim como outros indivíduos pertencentes a diferentes minorias (ne-
gros, gays etc.), o surdo deve ser encarado como membro de uma comunidade
que sofre restrição daqueles que não o são.
Cabe aqui, porém, uma pergunta básica: afinal de contas, a surdez é ou não uma
deficiência?
Todas as evidências científicas, sociais e culturais indicam que é. E mais, deve-
mos envidar todos os esforços para evitá-la. A vacina contra a rubéola materna
deve ser implementada porque previne um dos fatores que podem ocasionar
surdez em recém-nascidos. Isto é, previne um mal. Considerar o surdo como um
grupo minoritário pode ser importante do ponto de vista das diferenças culturais,
mas confundi-lo com outros grupos minoritários é, a meu ver, esconder uma dis-
tinção entre o patológico e a mera diferença.
Em outras palavras, qualquer iniciativa de intervenção para homogeneizar dife-
renças, como, por exemplo, o embranquecimento das populações negras, ou a
eliminação de características como a homossexualidade ou os olhos "puxados"
das etnias orientais, no meu modo de entender, devem ser combatidas, pois
representam uma visão "arianis" incompatível com as diferenças e com a cons-
trução da democracia. Isto, entretanto, não se estende a outros casos, como os
patológicos, porque se houver possibilidade de evitar o seu advento, isto é, se
houver formas de prevenir sua incidência ou de se solucionar este mal, isso deve
ser feito.
© U6 - Identidade e Igualdade de Direitos dos Surdos 149
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
O nó da questão da integração social do indivíduo surdo, envolvendo a existência
de grupos de surdos e sua convivência com os ouvintes, pode ser assim coloca-
do: apesar de ser uma condição intrinsecamente adversa, a surdez e os surdos
não podem ser tratados meramente como doentes, pois não o são. Essa visão
só poderá ser modificada se ultrapassarmos as decorrências diretas da perda
auditiva e analisarmos de forma mais abrangente as consequências geradas por
ela, aliadas às consequências construídas e produzidas pelas relações sociais.
Caberia, então, perguntar: defender a existência de comunidades surdas, con-
siderando a língua de sinais como sua primeira língua em contraposição a uma
língua imposta pela "sociedade ouvinte", é contribuir para a superação de sua
condição socialmente adversa?
Por outro lado, desconsiderar o fato de que existem agrupamentos de surdos
que se utilizam de formas de representação diferentes daquelas utilizadas pelos
ouvintes, e exigir deles a mesma produtividade em relação à linguagem oral dos
que ouvem, é a resposta?
Do meu ponto de vista, nenhuma das duas perguntas pode guiar nossa trajetória
porque, independentemente de nossas intenções, elas continuam a restringir o
indivíduo às manifestações intrínsecas da surdez.
Somente no momento em que nos debruçarmos sobre o fenômeno social da defi-
ciência auditiva, levando em consideração as restrições efetivamente impostas por
9. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS
Confira, a seguir, as questões propostas para verificar seu de-
sempenho no estudo desta unidade:
1) O que você entende por igualdade de direitos?
10. CONSIDERAÇÕES
Nesta unidade, você estudou os aspectos relacionados à
identidade e à cultura surda, compreendendo esta discussão sob a
perspectiva da igualdade de direitos a todos os cidadãos, indepen-
dentemente do fato de eles serem surdos ou não.
A próxima unidade irá apresentar os aspectos específicos re-
lacionados à gramática da Libras.
© U6 - Identidade e Igualdade de Direitos dos Surdos 151
11. E-REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: <http://www.
senado.gov.br/sf/legislacao/const/con1988/CON1988_05.10.1988/CON1988.htm>.
Acesso em: 21 maio 2010.
______. Declaração de Salamanca. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seesp/
arquivos/pdf/salamanca.pdf>. Acesso em: 18 maio 2010.
______. Plano Nacional de Educação – Educação Especial. Lei nº 10.172. Disponível em:
<http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/lei10172.pdf>. Acesso em: 18 maio 2010.
______. Resolução CNE/CEB nº 2. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seesp/
arquivos/pdf/diretrizes.pdf>. Acesso em: 12 maio 2010.
______. Convenção da Guatemala. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seesp/
arquivos/pdf/politica.pdf>. Acesso em: 05 jun. 2010.
BUENO, J. G. S. Surdez, linguagem e cultura. Campinas: Cadernos Cedes, v. 19, n. 46,
set. 1998. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid
=S0101-32621998000300005>. Acesso em: 20 de maio 2010.
CASTELLS, M. O poder da identidade. São Paulo: Paz e Terra, 1999.
ONU. Declaração Universal dos Direitos do Homem. 10 dez. 1948. Disponível em:
<http://portal.mj.gov.br/sedh/ct/legis_intern/ddh_bib_inter_universal.htm>. Acesso
em: 11 jan. 2011.
PINTO, P. L. F. Identidade cultural surda na diversidade brasileira. Disponível em: <http://
www.ines.gov.br/paginas/revista/debate3.htm>. Acesso em: 07 jun. 2010.
SANTANA, A. P.; BERGAMO, A. Cultura e identidade surdas: encruzilhada de lutas sociais
e teóricas. Educ. Soc., Campinas, vol. 26, n. 91, p. 565-582, maio/ago. 2005. Disponível
em: <http://www.scielo.br/pdf/es/v26n91/a13v2691.pdf>. Acesso em: 11 jan. 2011.
UNESCO. Declaração Mundial sobre Educação para Todos: satisfação das necessidades
básicas de aprendizagem – 1990. Disponível em: <http://unesdoc.unesco.org/
images/0008/000862/086291por.pdf>. Acesso em: 11 jan. 2011.
7
1. OBJETIVOS
• Entender e caracterizar os fundamentos linguísticos apli-
cados à língua de sinais.
• Desmistificar ideias equivocadas relacionadas às línguas
de sinais.
• Estudar, compreender e caracterizar a fonologia e a mor-
fologia da língua de sinais.
2. CONTEÚDOS
• Aspectos linguísticos das línguas de sinais.
• Aspectos fonológicos e morfológicos da língua de sinais.
4. INTRODUÇÃO À UNIDADE
Na unidade anterior, você estudou os aspectos relacionados
à identidade e à cultura surda, e pôde perceber que esta discussão
nos remete à compreensão de que é urgente garantir aos surdos a
igualdade de direitos para que eles possam aprender e se desen-
volver e, dessa forma, exercer sua cidadania plenamente.
Agora, nesta unidade, vamos estudar aspectos específicos
relacionados à gramática da Língua Brasileira de Sinais, a Libras.
Cabe destacar que é fundamental conhecer a gramática da
Libras, tendo em vista que ela é diferente da gramática da Língua
Portuguesa e apresenta características próprias.
Para que você compreenda efetivamente essa gramática é
preciso, inicialmente, adquirir alguns conceitos fundamentais da
linguística.
Você pode considerar estranho o uso dos termos fonológico e
fonologia aplicados à língua de sinais, uma língua visual-espacial, sem
referência sonora, mas logo veremos a aplicabilidade deles na Libras.
As línguas de sinais conquistaram o status de língua por apre-
sentarem os elementos linguísticos constituintes de uma língua,
ou seja, fonologia, morfologia e sintaxe, além de terem um léxico
(conjunto de símbolos convencionais) e uma gramática (sistema
de regras que regem o uso desses símbolos).
Então, para iniciar nossa conversa sobre esse tema, vamos,
no tópico a seguir, compreender a aplicação do conceito de fono-
logia à língua de sinais e seu objeto de estudo.
© U7 - Linguística e Língua de Sinais 155
Mito 1–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
A língua de sinais seria uma mistura de pantomima e gesticulação concreta
incapaz de expressar conceitos abstratos.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Acreditou-se que a língua de sinais não fosse capaz de repre-
sentar conceitos abstratos, pois ela estaria baseada em gestos e
pantomimas. Tais gestos ou sinais teriam uma relação icônica com
seus referentes, ou seja, eles representariam nitidamente uma ideia
ou um objeto, como, por exemplo, os sinais de "casa" e de "não".
Esse mito não se sustenta, pois estudos já mostraram que as
línguas de sinais expressam conceitos abstratos. Sabe-se, hoje, que é
possível discutir qualquer assunto em língua de sinais: política, econo-
mia, matemática, física, psicologia, poesia ou literatura, por exemplo.
Outro dado importante que desmistifica essa ideia é que, de
acordo com Quadros e Karnopp (2004), apenas 30% dos sinais têm
significados identificáveis com a forma do sinal, ou seja, são icônicos.
Portanto, os demais 70% não podem ser reconhecidos na sua repre-
sentação, o que mostra a necessidade de que essa língua seja, de fato,
aprendida pelos ouvintes. Além disso, há uma seleção arbitrária das
características icônicas desses sinais, por exemplo: o não poderia ser
sinalizado pela cabeça e, a casa, por outra de suas características.
Mito 2–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Há uma única e universal língua de sinais usada por todas as pessoas surdas.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Uma dúvida muito comum dos ouvintes em relação à língua
de sinais é se ela é universal. Ela não é universal: cada país possui
a sua própria língua de sinais, assim como possuem a sua própria
língua oral. A língua de sinais americana é diferente da língua de
sinais brasileira, assim como essas diferem da língua de sinais ar-
gentina, francesa, alemã e assim por diante.
Portanto, o fato de um surdo brasileiro ser fluente em Libras
não garante que ele se comunique com surdos de outros países.
Para que ocorra essa comunicação, é preciso que haja entre eles
uma língua de sinais comum. É possível, tanto para surdos como
para ouvintes, aprender a língua de sinais de outro país.
Outro aspecto importante a ser considerado é o fato de haver,
dentro de um mesmo país, dialetos – modalidades regionais – no
uso da língua de sinais.
Por exemplo, é possível identificar variações em relação a
alguns sinais da Libras nas diferentes regiões do Brasil, ou entre as
diferentes comunidades surdas. Entretanto, essas diferenças não
impossibilitam a comunicação entre os surdos em um mesmo país.
As diferenças são facilmente apreendidas por meio de estratégias,
como a soletração.
A soletração manual não é uma língua distinta, mas um
simples código baseado nas línguas orais. Assim, nenhum surdo
se utiliza apenas da soletração para se comunicar. Ela é, como já
dissemos, um recurso utilizado em situações específicas, quando
necessário para nomes de pessoas e para explicar o significado de
sinais desconhecidos, por exemplo.
Para entendermos isso melhor, veja a seguinte situação:
Dois surdos encontram-se na rodoviária, um de São Paulo
e outro de Belo Horizonte. Durante a conversa, um deles usa um
© U7 - Linguística e Língua de Sinais 159
Mito 3–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Há uma falha na organização gramatical da língua de sinais derivada das línguas
de sinais, sendo um pidgin sem estrutura própria, subordinado e inferior às lín-
guas orais.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
A ideia de subordinação apresentada por esse mito também
não se sustenta. A língua de sinais não estabelece com a língua
majoritária do país uma relação linguística de subordinação, mas
apresenta uma gramática diferente e independente dela.
A Libras tem uma gramática diferente da gramática da Língua
Portuguesa, entretanto, possui a mesma complexidade. Portanto,
é um equívoco considerar que as línguas de sinais são subordina-
das às línguas faladas.
O uso dos sinais da Libras na estrutura da Língua Portuguesa
(Português Sinalizado) não garante, por essa sobreposição, a com-
Mito 4–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
A língua de sinais seria um sistema de comunicação superficial, com conteúdo
restrito, sendo estética, expressiva e linguisticamente inferior ao sistema de co-
municação oral.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Orientação 1 –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Vas a un restaurante con una amiga. Lo primero que haces después de sentarte es
retirar el centro de flores para que puedas ver las manos de tu amiga sin obstáculos.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Para completar a discussão sobre esse mito, cabe ressaltar que é
muito comum as pessoas, equivocadamente, afirmarem que o empobre-
cimento estrutural das línguas de sinais liga-se ao fato de que elas não
apresentam, por exemplo, elementos de ligação, tais como preposições
e conjunções. De acordo com Quadros e Karnopp (2004), essa caracte-
rística não empobrece a língua de sinais, pois ela apresenta uma riqueza
de expressividade diferente das línguas orais. É possível comprovar esse
aspecto assistindo aos vídeos constantes no Dicionário de Libras e às vi-
deoaulas que compõem este Caderno de Referência de Conteúdo.
As línguas de sinais, como línguas visual-espaciais, apresen-
tam elementos próprios, como expressão facial, expressão corpo-
ral, movimento, velocidade e direção, que, incorporados ao sinal,
garantem a mesma riqueza de expressão que as línguas orais.
Mito 5–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
A língua de sinais deriva da comunicação gestual espontânea dos ouvintes.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
De acordo com as colocações anteriores, a língua de sinais
não é um conjunto de gestos isolados. A ideia de que a língua de si-
nais é uma comunicação derivada dos gestos usados naturalmente
pelos ouvintes é bem antiga e está fundamentada na concepção
de que a linguagem está estritamente relacionada à capacidade do
indivíduo de falar. Dentro dessa concepção, a fala seria a expressão
mais nobre e a língua de sinais uma forma de expressão inferior,
limitada, universal e sem prestígio. Mas a ciência já mostrou dis-
tinção entre fala, língua e linguagem; portanto, essa ideia também
não se sustenta.
Mito 6–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
A língua de sinais, por ser organizada espacialmente, estaria representada no
hemisfério direito do cérebro, uma vez que esse hemisfério é responsável pelo
processamento de informação espacial, enquanto o esquerdo é responsável pela
linguagem.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Estudos realizados por Stokoe (1965), Klima e Bellugi (1979)
foram determinantes na mudança de concepção em relação à lin-
guagem e à surdez. Esses estudos mostraram que os surdos com
lesões no hemisfério direito do cérebro processaram todas as in-
formações linguísticas em língua de sinais. Já os surdos com lesões
no hemisfério esquerdo processaram informações espaciais não
linguísticas e não conseguiram lidar com essas informações.
O que essas pesquisas mostraram é que as línguas de sinais,
mesmo sendo visual-espaciais, são produzidas no hemisfério es-
querdo, como qualquer outra língua.
Neste tópico, você aprendeu alguns conceitos linguísticos funda-
mentais relacionados à língua de sinais. Foi possível, também, conhecer
alguns mitos que foram amplamente difundidos e desmistificados.
Agora, conhecendo esses conceitos, é possível avançar nos
estudos teóricos sobre a língua de sinais, especificamente em rela-
ção aos aspectos fonológicos.
Até o momento, vimos que:
© U7 - Linguística e Língua de Sinais 165
Movimento (M)
O movimento é uma importante unidade mínima. Além de
participar ativamente na produção do sinal, ele dá graça, beleza e
dinamismo a essa língua.
Se você já teve a oportunidade de presenciar dois surdos con-
versando em língua de sinais, deve se lembrar de que, ao produzir
os sinais, eles faziam, concomitantemente, alguns movimentos cor-
porais, faciais e manuais, associados aos sinais, ou os próprios sinais
eram produzidos com movimento e não de maneira estática.
As pessoas ouvintes, ao usarem a língua de sinais, o fazem,
normalmente, de maneira mais estática. Isso ocorre porque o mo-
vimento, embora seja uma parte integrante da língua, é realizado
com mais propriedade pelos surdos, que são mais fluentes e co-
nhecem a língua profundamente.
Sabe-se que associar à produção do sinal aspectos como o
movimento e as expressões não manuais não é algo simples. Essa
habilidade exige muita competência e fluência na língua, além de
uma boa coordenação motora, domínio do movimento e orienta-
ção no espaço.
Para os ouvintes, usuários de língua oral-auditiva, o domí-
nio dessas habilidades é algo bem complexo. Os surdos, por serem
mais visuais, adquirem essas habilidades com muito mais natura-
lidade e facilidade do que os ouvintes, por isso têm uma fluência
mais completa e mais autêntica da língua que os ouvintes.
Cabe destacar, então, que para que haja movimento é preci-
so haver espaço. Portanto, o movimento é indissociável do espaço.
Klima e Bellugi (1979) definem o movimento como um parâmetro
complexo que pode envolver vários aspectos, tais como:
© U7 - Linguística e Língua de Sinais 171
MANEIRA
Qualidade, tensão e velocidade
- contínuo
- de retenção
- refreado
FRENQÜÊNCIA
Repetição
- simples
- repetido
Fonte: Quadros e Karnopp (2004, p. 56).
5) grau ou aspecto.
Cabe destacar que duas expressões podem ocorrer ao mes-
mo tempo, como, por exemplo, as marcas de interrogação e nega-
ção que envolvem franzir de sobrancelhas e projeção da cabeça.
O Quadro 2 apresenta diferentes expressões que fazem par-
te da Língua Brasileira de Sinais.
Quadro 2 Diferentes expressões da Língua Brasileira de Sinais
Rosto
Parte superior
Sobrancelhas franzidas
Olhos arregalados
Lance de olhos
Sobrancelhas levantadas
Parte inferior
Bochechas infladas
Bochechas contraídas
Lábios contraídos e projetados e sobrancelhas franzidas
Correr da língua contra a parte inferior interna da bochecha
Apenas bochecha direita inflada
Contração do lábio superior
Franzir o nariz
Cabeça
Balanceamento para frente e para trás (sim)
Balanceamento para os lados (não)
Inclinação para frente
Inclinação para o lado
Inclinação para trás
Rosto e cabeça
Cabeça projetada para frente, olhos levemente cerrados, sobrancelhas franzidas
Cabeça projetada para trás e olhos arregalados
© U7 - Linguística e Língua de Sinais 175
Tronco
Para frente
Para trás
Balanceamento alternado dos ombros
Balanceamento simultâneo dos ombros
Balanceamento de um único ombro
Fonte: Ferreira-Brito e Lavengin (1995).
8. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS
Ao finalizar seus estudos sobre a gramática da Língua Bra-
sileira de Sinais, procure responder para si mesmo às seguintes
questões:
1) Quais os fundamentos linguísticos aplicados à língua de sinais?
9. CONSIDERAÇÕES
Nesta unidade, você pôde estudar aspectos específicos rela-
cionados à gramática da Libras) e, por meio deste estudo, compre-
ender sua organização.
Na próxima unidade, você irá estudar o intérprete de língua
de sinais. Veremos que a profissão de intérprete de língua de sinais
no Brasil é recente e foi legislada com a publicação do Decreto nº
5.626/05. Além disso, discutiremos a presença do intérprete em
sala de aula e como se dá sua atuação nesse contexto.
© U7 - Linguística e Língua de Sinais 177
10. E-REFERÊNCIAS
Figura 1 LIBRAS. do Dicionário da Língua Brasileira de Sinais. Disponível em: <http://
www.acessobrasil.org.br/libras/>. Acesso em: 12 jan. 2011.
Sites pesquisados
BRASIL. Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002. Disponível em: <http://www.planalto.gov.
br/ccivil/leis/2002/L10436.htm>. Acesso em: 12 jan. 2011.
BRASIL. Decreto nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005. Disponível em: <http://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/decreto/d5626.htm>. Acesso em: 12
jan. 2011.
8
1. OBJETIVOS
• Reconhecer e identificar o campo de atuação do intérpre-
te de língua de sinais.
• Refletir e analisar a história da profissionalização do intér-
prete de língua de sinais.
• Reconhecer os critérios de formação e atuação intérprete
de língua de sinais.
• Identificar os critérios de atuação do intérprete de língua
de sinais na escolarização de surdos.
2. CONTEÚDOS
• Campo de atuação do intérprete de língua de sinais.
• Histórico da profissionalização do intérprete de língua de
sinais.
180 © Língua Brasileira de Sinais
4. INTRODUÇÃO À UNIDADE
Nesta, que é a última unidade de Língua Brasileira de Sinais,
iremos estudar o intérprete de língua de sinais.
Pelo exposto nas unidades anteriores, deve ter ficado claro
que a inclusão de alunos surdos nos contextos comuns de ensino
é uma questão bastante complexa, pois envolve uma reorganiza-
ção completa no modelo de escola predominante na atualidade,
visando ao atendimento dos pressupostos da educação inclusiva,
bilíngue e bicultural.
Uma das questões envolvidas nessa reorganização refere-se
à garantia da presença da língua de sinais na escolarização de alu-
nos surdos.
De acordo com o que foi estudado nas Unidades 1 e 4, a
organização de uma escola inclusiva para surdos envolve a parti-
cipação de novos agentes educacionais: professor ouvinte fluente
em língua de sinais (professores bilíngues), educador surdo e in-
térprete de língua de sinais.
© U8 - O intérprete de língua de sinais 181
escolher sua escola e que nela ele será atendido na sua especificidade
linguística, ou seja, que o ensino será ministrado em língua de sinais,
como previsto na Resolução CNE/CEB nº 2 (BRASIL, 2001).
Não podemos deixar de considerar, porém, a realidade da
educação brasileira marcada pela escassez de recursos, falta de
compromisso político com a educação, falta de vontade política de
promover uma educação de qualidade e formação precária dos pro-
fessores, o que nos faz pensar, inicialmente, que a organização da
educação inclusiva e da educação bilíngue não passa de utopia.
Ainda assim, na qualidade de professor comprometido com
a educação, é preciso ter em mente o esforço no sentido de trans-
formar essa realidade, fazendo sua parte nesse contexto.
A qualidade da escolarização do aluno surdo no contexto
da educação inclusiva depende, basicamente, da reorganização
da escola, o que contempla, entre outras condições, a atuação de
novos agentes educacionais, como, por exemplo, o intérprete de
língua de sinais.
Tendo em vista o estudo desse panorama, nesta unidade,
você terá a oportunidade de conhecer com maior profundidade
as questões que permeiam a identidade profissional e o campo de
atuação do intérprete de Libras.
Para iniciar seus estudos sobre a atuação do intérprete, va-
mos, no próximo tópico, apresentar dados significativos sobre a
história da constituição da profissão de intérprete de língua de si-
nais e, especificamente, de Libras.
são expostos a essa língua na interação com seus pais desde bem
pequenos, viabilizando a sua aquisição de maneira natural.
Esses sujeitos acabam intermediando as interações de seus pais
com as pessoas ouvintes em diversas situações do cotidiano. Mesmo
assim, também não podem ser considerados intérpretes, pois eles
desconhecem as técnicas e as estratégias acerca dos processos de in-
terpretação. Alguns filhos de pais surdos dedicam-se à profissão de
intérprete, no entanto, a fluência na língua não garante que sejam
bons profissionais nessa área (QUADROS; KARNOPP, 2004).
Esperamos que tenha ficado claro para você que a atuação
profissional do intérprete de Libras não é uma atividade simples.
Para o intérprete atuar profissionalmente, ele necessita conhecer as
duas línguas envolvidas na interpretação e ter qualificação específi-
ca, ou seja, conhecer as estratégias e as técnicas de interpretação.
Complementarmente, a qualidade do trabalho do intérprete
pode ser melhorada quando ele tem formação na área de sua atua-
ção, o que possibilita conhecimento contextualizado mais preciso e
aprofundado dos conceitos envolvidos na interpretação. Por exem-
plo, se o seu campo de atuação é na área da educação, uma forma-
ção nessa área poderá contribuir para a qualidade do seu trabalho.
Especificamente em relação à interpretação para o aluno
com surdez nos contextos escolares, a formação em educação, por
exemplo, em Pedagogia ou Letras, irá possibilitar ao intérprete fa-
zer escolhas mais assertivas quanto aos conceitos trabalhados na
língua-fonte, contextualizando-os e, consequentemente, facilitan-
do a compreensão.
As considerações evidenciam que a atuação do intérprete na
educação dos alunos surdos no Brasil é uma questão que ainda está
por ser discutida e sistematizada. O Decreto nº 5.626/05 representa
uma vitória dos surdos, contudo, precisa, também, ser analisado cri-
teriosamente, especialmente em relação à formação e à atuação do
instrutor e do professor da Língua Brasileira de Sinais.
© U8 - O intérprete de língua de sinais 199
9. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS
Ao finalizar seus estudos sobre a atuação do intérprete de
língua de sinais no processo educacional dos alunos surdos, procu-
re responder para si mesmo às seguintes questões:
1) Descreva o percurso histórico da profissão de intérpretes de Libras no Brasil.
10. CONSIDERAÇÕES
Nesta unidade, estudou a função do intérprete de língua de
sinais. Vimos que, no Brasil, a profissão de intérprete de língua
de sinais é recente e foi legitimada com a publicação do Decreto
nº 5.626/05, o qual buscou organizar a profissão do intérprete de
Libras e a difusão dessa língua em cursos superiores.
Além disso, discutimos a presença do intérprete em sala de
aula e os benefícios dessa presença na comunicação entre surdos
e ouvintes no ambiente escolar. Discutimos também que, apesar
de reconhecido, os ganhos que a presença do intérprete em sala
de aula representa para os surdos, aspectos metodológicos preci-
sam ser aprimorados, assim como os critérios de formação e atua-
ção do intérprete de língua de sinais.
Ao término desta unidade, encerramos nossos estudos do-
presente Caderno de Referência de Conteúdo com a certeza de que
os conhecimentos aqui apresentados demonstraram a importân-
cia que a língua de sinais assume na vida do surdo.
11. E-REFERÊNCIAS
BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Resolução CNE/CEB n. 2/2001, de 11 set. 2001.
Institui diretrizes nacionais para a Educação Especial na Educação Básica. Disponível em:
<www.mec.gov.br/seesp/diretrizes1.shtm>. Acesso em: 11 abr. 2006.
______. Decreto nº 10.436, de 24 abr. 2002. Disponível em: <http://www.planalto.gov.
br/ccivil/leis/2002/L10436.htm>. Acesso em: 16 dez. 2010.
______. Decreto nº 5.626, de 22 dez. 2005. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/_ato2004-2006/2005/decreto/d5626.htm>. Acesso em: 16 dez. 2010.
______. Lei nº 12.319, de 1º de set. 2010. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Lei/L12319.htm>. Acesso em: 25 out. 2010.
LACERDA, C. B. F. A inserção da criança surda em classe de crianças ouvintes: focalizando a
organização do trabalho pedagógico. In: Anais da 23. Reunião Anual da ANPED, Caxambú,
2000b. Disponível em: <www.anped.org.br/23/textos/1518t.pdf> Acesso em: 20 jun. 2006.