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MAGAZINE DE FICÇÃO CIENTÍFICA
N0 5 AGOSTO DE 1970
Editorial
Contos Estrangeiros
Conto Brasileiro
Ciência
Cartas
Magazine de Ficção Científica é a edição brasileira de “The Magazine of Fantasy and Science
Fiction”’ — Copyright © Mercury Press, Inc., New York. É publicada mensalmente pela Re-
vista do Globo S.A.
osebodigital.blogspot.com
EDITORIAL
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REDUÇÃO DE ARMAMENTOS
Tom Purdom
J. W. Schutz
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EXPERIMENTE UMA FACA CEGA
Harlan Ellison
OBRIGADA, OBRIGADA
E a estranha jovem tinha mesmo o que agradecer. O confiante Jim, no
calor de sua conquista, aliás fácil, nunca poderia prever um fim tão extraordinário
para a aventura. . . se é que pôde perceber tal fim, em qualquer tempo. O conto
“... Se não fosse a graça de Deus”, de Gilbert Thomas, que aparecerá no próximo
número é arrojado e perturbador.
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ERA UMA VEZ...
Phyllis Murphy
Barney era bonito. Ainda lhe sinto a falta. Não creio, tampouco,
que os garotos o tenham esquecido.
Agora que tenho a oportunidade de examinar o passado, posso
verificar que não era a paixão que tornava nosso namoro tão delirante.
Barney simplesmente estava com pressa. Sempre foi apressado. Parece
que é isto o que mais recordo a seu respeito.
Antes que viesse a sabê-lo, já estávamos casados, a lua-de-mel se
fora e tínhamos uma casa na Ilha, um segundo carro, enquanto um bebê
se achava a caminho. “Não podemos dar-nos ao luxo de desperdiçar o
tempo” — costumava Barney dizer, sobretudo quando saía para o traba-
lho. Não lhe agradava o bate-papo.
Se dispusesse de cinco minutos para poupar, Barney faria alguma
coisa com eles. Arranjaria suas roupas para a semana, separaria os papéis
em sua pasta, tomaria notas no bloco de apontamentos ou engraxaria os
sapatos. Em dez minutos, poderia lavar o carro ou descer ao porão e cons-
truir metade de uma estante para livros. Era estupendo. Sempre se lem-
brava de nunca subir ou descer desnecessariamente pela escada. Durante
o dia, passaria por ela uma ou duas vezes, afora a descida pela manhã e
a subida à noite, e sempre com as mãos carregadas de coisas, que queria
recolocar nos seus lugares.
Fazia-me sentir como se fosse uma vadia. Não sei quantas vezes
me doutrinou acerca da importância de economizar o tempo. Dizia: “Isto
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só acontece uma vez na vida”. Ou então: “Faça a conta”. Receio ter sido
decepcionante para êle, mas, na verdade, fiz força. Creio que não tinha
talento para essa coisa. Imaginar como economizar o tempo sempre me
tomava tanto tempo, que não sobrava nenhum para economizar.
Recordo quando Barney leu um livro sobre o sono. O autor deve
ter sido sua alma irmã, porque afirmava constituir o sono um esbanja-
mento de tempo e sugeria processos de treinamento para dispensar a
necessidade de dormir.
Barney decidiu que reduziria o sono a quatro horas por noite e logo
começou a treinar. Eu tinha de admirá-lo. Chegaria para o café da manhã
com os olhos turvos e aturdido, mas quem é que diz que daria o braço a
torcer? Bastava perguntar-lhe:
— Barney não está cansado?
— Claro que não. Por que diz isso?
— Ora, não sei. Creio que é porque você não conseguiu me encon-
trar, quando me procurou para o beijo da manhã.
— Sinto-me bem, perfeitamente bem.
E sempre foi assim.
Passei a treinar junto com Barney, porém não porque o quisesse.
Êle dava um jeito de fazer um mundo de coisas nas horas que tirava do
sono, mantendo-me de vigília na maior parte da noite, martelando, pin-
tando e ouvindo discos, esquanto eu lia ou assistia à televisão. Depois de
certo tempo, comecei a adoecer e meu médico me disse que carecia de
um bom repouso. Pensei que isto levaria Barney a mudar de idéia, mas
êle apareceu com uma solução diferente. Passou algumas de suas horas
poupadas ao sono arranjando nosso dormitório, a fim de colocá-lo à prova
de som, de modo que eu pudesse dormir, qualquer que fosse o barulho
que êle fizesse.
Devo admitir que o treinamento deu resultado, embora tivesse uns
poucos efeitos colaterais. Barney passava com apenas quatro horas de
sono e já não ficava atordoado pela manhã. Mas envelhecia muito depres-
sa e começou e apresentar um olhar estranho, parado.
Não suspeitei de nada desastroso, quando Barney chegou em casa,
uma noite, agitando um folheto e subindo às pressas para seu pequeno
gabinete de trabalho. Fazia, então as refeições na escrivaninha, para eco-
nomizar tempo, e eu já havia aprontado sua bandeja. Quando a levei para
cima, deixou que lesse o folheto por cima do seu ombro. Era propaganda
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de um curso de leitura dinâmica e nunca vi Barney tão excitado.
— Já pensou? — disse êle — podemos aprender a ler seis jornais
em meia hora!
Fiquei preocupada com a despesa. Comprávamos um jornal e me
parecia que o gasto subia num lapso de poucos meses. Revoltei-me ao
pensar no que nos custariam seis jornais. E como nos desfaríamos deles?
Barney, porém, não concordou. Afirmou que eu raciocinava negativamen-
te. Naquela mesma noite, preencheu um formulário de assinatura e assi-
nou um cheque, para acompanhá-lo.
Barney lançou-se, de fato na leitura dinâmica. Exercitava-se duran-
te várias horas por noite e fazia tudo o que lhe ensinavam os professores.
Às vezes, quando escorava um livro sobre sua cômoda e se exercitava para
correr os dedos pela página, da maneira como lhe ensinaram, parecia re-
produzir um dos velhos filmes de Chaplin. Não se aborrecia, porém, com
a minha importunação.
Creio que o curso foi eficaz, uma vez que Barney lia um monte de
coisas.
Recebíamos seis jornais, já que Barney não poderia carregá-los no
trem. Toda noite, chegava em casa com os bolsos cheios de livrinhos. Cer-
ta noite, vi-o tentando algo novo. Disse que era uma invenção sua. Lia um
livro de bolso e, toda vez-que concluía uma página, rasgava-a, em vez de
virá-la. Havia, aos seus pés, uma pilha de páginas rasgadas.
— Não será isto terrivelmente dispendioso? — perguntei.
— Na verdade, não — respondeu, sem perder tempo para olhar.
Sabe que tempo também é dinheiro e que um minuto poupado pode ser
um dólar ganho.
Levou-me algum tempo tentar compreendê-lo e, afinal, desisti.
Barney gostava de reservar vinte minutos completos para ler os
jornais. Certa manhã, durante os cinco minutos que se concedia a si mes-
mo para o café, perguntei-lhe:
— Será que isto dá resultado?
— O quê?
— A leitura dinâmica. É realmente capaz de ler todas as palavras
tão depressa?
Confesso que estava ligeiramente ciumenta. Leio devagar e, com
freqüência, retorno aos trechos que agradam.
— Claro — respondeu. — Não lemos exatamente todas as pala-
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vras, mas apenas as importantes.
— Neste caso como pode entender o que estiver lendo?
— A maioria das pessoas desperdiça palavras — disse Barney, dan-
do um olhar de relance no seu relógio apoiado contra o saleiro. — Na
leitura dinâmica, lemos o que faz sentido e pulamos o que não faz.
Já começava a pensar que tinha razão, quando algo estranho pas-
sou a acontecer. Barney nunca foi de muita falação, mas, ultimamente,
vinha reduzindo suas manifestações verbais até o osso. Em vez de me di-
zer “boa noite”, dizia algo que soava como “noit” e nem isto, quando se
tratava dos filhos. A esta altura, tínhamos três filhos e Barney sempre dera
“boa noite” especial a cada um deles. Agora, apenas botava a cabeça no
quarto das crianças e fazia um gesto, quando passava. Nossa menina mais
velha afirmou estar certa de que ouvira o som de sua voz, quando fazia o
gesto, porém era incapaz de distinguir alguma palavra.
Uma ocasião liguei o telefone para o seu escritório, a fim de lem-
brar-lhe de trazer para casa um fio elétrico para meu ferro de passar rou-
pa. Ao pegar no telefone, Barney limitou-se a dizer: “Alô, até logo”. Foi
tudo. E desligou.
Chamei-o de novo e sua secretária me informou que havia saído,
de modo que deixei o recado com ela. Barney trouxe o fio e não mencio-
nou o incidente ao telefone. Pensei que estivesse mais apressado do que
costume. Nada mais do que isso.
No entanto na semana seguinte, no sábado, tivemos conosco al-
guns amigos e estes notaram o que se passava. Barney indagou de cada
um o que desejava beber. As pessoas que êle omitiu, ficaram inicialmente
um pouco ofendidas, mas eu tentei dar à coisa aspecto de brincadeira. De-
pois passamos à sala de jantar e Barney só havia arrumada três cadeiras à
mesa. Éramos oito para jantar.
Também estava quase desconexo, o que me fêz pensar que tivesse
tomado uns tragos na cozinha. Compreendo, agora, que não era a bebi-
da que o fazia falar de modo tão estranho. Após o jantar, conversávamos
acerca da eleição do conselho escolar e êle disse algo como: “Malditos
idiotas!”. Ninguém conseguiu entender, de modo que sorrimos agradàvel-
mente e nos esforçamos para não fazer caso.
Depois de todos sairem, Barney me ajudava a arrumar a sala de
visitas, quando me aconteceu mencionar que um de nossos amigos per-
dera muito peso. Mencionei, de fato, Tim Hart, um dos melhores amigos
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de Barney.
— Quem? — perguntou Barney.
— Tim.
— Quando viu?
Tanto quanto pude entender, Barney me perguntava quando vira
Tim. Indaguei-lhe se era isto e êle concordou com a cabeça.
— Justamente em nossa casa. Hoje à noite.
Ao dizê-lo, comecei a ter horrível pressentimento.
Tudo o que êle disse a seguir era completamente adulterado. Esta-
va furioso e só pude pegar as palavras “brincando por aí”.
— Barney, não está ouvindo o que digo.
— Estou.
— Não, não está! Não percebe o sentido de minhas palavras, quan-
do nem mesmo sabe que Tim esteve aqui à noite e lhe falou. Como pode-
ria eu estar brincando por aí com êle?
Barney encheu os braços de coisas do andar superior e se dirigiu
para o gabinete. Tentei ficar desperta até que viesse dormir, porém, não
agüentei. Sentia-me exausta.
Também me encontrava preocupada. Não sabia ainda que Barney
tinha igualmente problemas no escritório, mas já não conseguíamos co-
municar-nos reciprocamente. Talvez êle fosse capaz de me compreender,
mas eu ficava feliz se compreendesse duas de suas palavras num dia.
Foi o patrão de Barney quem me falou acerca do que acontecia.
Também se preocupava com Barney e, certo dia, chamou-me e sugeriu
que o levasse a um médico, preferivelmente a um psiquiatra. Não que
duvidasse da honestidade de Barney, fique claro, mas era preciso verificar
as causas dos erros de contabilidade que meu marido cometia.
— Pula colunas inteiras de algarismos! — informou-me o patrão.
— Seus totais são ridículos!
Disse que faria o melhor ao meu alcance, porém, não pensei real-
mente em levar Barney a um médico. Na verdade, Barney era a única pes-
soa que não se achava transtornada com o que lhe acontecia. Até nossos
filhos se encolhiam de medo, quando êle corria pela casa, fazendo seus
misteriosos ruídos. Mas êle estava feliz. Economizava muito tempo e era
o que queria.
Nada poderia fazer, exceto aguardar pelo fim da coisa. E este veio
depressa, como tudo o que se referisse a Barney.
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Morávamos num conjunto residencial onde existem mil outras ca-
sas parecidas com a nossa, o que, de fato, nunca incomodou a ninguém
que morasse por ali. Costumávamos contar piadas sobre pessoas que,
no escuro, entravam na casa errada, porém, tanto quanto soubesse, nin-
guém o havia feito. Mas notei que Barney vinha tendo dificuldade em
identificar sua própria casa. Vinha correndo pela rua, olhando de soslaio
para os números das casas e, uma vez ou duas, recuava um pouco e dava
uma olhadela para a casa vizinha. Por prevenção comecei a esperar na
janela da frente, na hora de sua chegada.
Era uma noite de sexta-feira, quando aconteceu. Eu me achava à
janela e Barney chegou correndo pela rua, um pouco mais rápido do que
de costume. Uma estranha espécie de terror se passou de mim e me pre-
cipitei para abrir a porta. Gritei:
— Barney!
Ele nem se voltou. Continuou correndo, sem sequer olhar os nú-
meros das casas. Iria percorrer toda a rua, talvez o conjunto residencial in-
teiro! Corri atrás dele enquanto pude, mas, por fim, tive de parar, porque
não tinha mais fôlego.
Esperei que desaparecesse de minha vista e pensei no que diria às
crianças. E os vizinhos? E o patrão de Barney?
Nunca mais vi Barney, nem ninguém que o houvesse conhecido.
Pulou por cima de todos nós. Senti-me magoada por não ser bastante
importante para que êle me retivesse na memória, mas acabei superando
a crise. Vez por outra sinto sua falta, principalmente quando penso nele. E
continuo a pensar nele. Esquisito.
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SEGREGAGIONISTA
Isaac Asimov
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A CASA DO MAR
William M. Lee
116
TRINTA DIAS DE SETEMBRO
Robert Young
132
A TOCA
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141
O CONFLITO DOS SEXOS
Issac Asimov
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CARTAS
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