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Poder Judiciário da União

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS


TERRITÓRIOS

Órgão 8ª Turma Cível

Processo N. APELAÇÃO CÍVEL 0702736-43.2017.8.07.0014


APELANTE(S) ANA APARECIDA DOS SANTOS
APELADO(S) AMIL ASSISTENCIA MEDICA INTERNACIONAL S.A.
Relatora Desembargadora ANA CANTARINO

Acórdão Nº 1183185

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. COBRANÇA DE MULTA COMINATÓRIA FIXADA EM TUTELA


ANTECIPADA EM OBRIGAÇÃO DE FAZER. AUSÊNCIA DE DETERMINAÇÃO DE PRAZO
PARA CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO. MULTA INEXIGÍVEL. HONORÁRIOS.
MAJORADOS.

1. A imposição de multas ou astreintes tem por objetivo coagir o devedor a satisfazer, com maior
retidão, a prestação de uma obrigação de fazer ou não fazer fixada em decisão judicial, visando dar
efetividade ao decisum (artigo 537, §1º, do CPC).

2. Conquanto seja possível a fixação de multa diária pelo descumprimento de obrigação determinada
em sede de tutela antecipada, deve ser fixado prazo razoável ao cumprimento da medida imposta, a
teor do que dispõe o artigo 537 do CPC, sob pena de inexigibilidade da multa.

3. Ante a sucumbência recursal, devem os honorários advocatícios ser majorados, nos termos do art. 85
§ 11º do CPC.

4. Recurso conhecido e improvido.

ACÓRDÃO

Acordam os Senhores Desembargadores do(a) 8ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito


Federal e dos Territórios, ANA CANTARINO - Relatora, DIAULAS COSTA RIBEIRO - 1º Vogal e
EUSTAQUIO DE CASTRO - 2º Vogal, sob a Presidência da Senhora Desembargadora , em proferir a
seguinte decisão: RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. UNÂNIME., de acordo com a ata do
julgamento e notas taquigráficas.

Brasília (DF), 26 de Junho de 2019

Desembargadora ANA CANTARINO


Relatora

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por ANA APARECIDA DOS SANTOS contra sentença proferida em
ação de cobrança de multas diárias fixadas em sede de tutela antecipada em obrigação de fazer ajuizada
pela ora apelante em face de AMIL ASSISTENCIA MEDICA INTERNACIONAL S.A.

Na inicial, a autora narrou que propôs ação de obrigação de fazer com pedido de tutela antecipada,
visando o restabelecimento do plano de saúde, uma vez que necessita da retirada da mama direita, com
a devida reconstituição mamária, em razão de câncer de mama diagnosticado em 02/05/2017.

Relatou que foi proferida decisão nos referidos autos deferindo parcialmente o pedido de tutela de
urgência, nos seguintes termos: “(...) DEFIRO PARCIALMENTE o pedido de tutela de urgência para
determinar que a ré restabeleça o plano de saúde da autora, nas mesmas condições que gozava
anteriormente, mantendo-a no plano coletivo pelo período de seis meses, contados da data do
falecimento do titular, à custa da autora, nos termos do art. 30, §§1º e 3º, da Lei 9.656/98, sob pena de
multa diária de R$1.000,00.”

Ressaltou que o mandado de citação foi cumprido em 21/07/2017, todavia, ao tentar marcar consulta
médica no Hospital Brasília – DF, em 25/07/2017, foi-lhe negado atendimento, em razão da exclusão
do plano de saúde.

Destacou a gravidade da patologia em questão e a necessidade de majorar o valor das astreintes, como
forma de coagir a ré a cumprir a decisão liminar.

Ao final, requereu o pagamento do valor de R$4.000,00 a título de astreintes, em razão da ausência de


cumprimento da obrigação; bem como a majoração da multa diária para o montante de R$5.000,00,
enquanto perdurar o descumprimento.

Regularmente intimada, a ré não se manifestou, razão pela qual foi deferida na decisão de Id. 8294866
o bloqueio via Bacenjud da quantia de R$4.000,00.

A ré apresentou impugnação no Id. 8294874, alegando que não foi designado prazo para cumprimento
da obrigação na decisão que deferiu a tutela de urgência, apesar de ter sido estipulada multa diária para
o caso de descumprimento.

Destacou que a jurisprudência pátria entende que, no caso de ausência de fixação de prazo para
cumprimento da obrigação, a multa diária é inexigível. Colacionou julgados em respaldo a sua tese.

Ao final, informou que foi comprovado o cumprimento em prazo razoável da tutela antecipada na ação
principal, razão pela qual pleiteou o desbloqueio dos valores penhorados ou a expedição de alvará para
levantamento do valor da penhora, com a consequente extinção do processo.

Resposta da autora à impugnação apresentada no Id. 8294880, aduzindo que o cumprimento da


obrigação deveria ter sido imediato à intimação da ré, que ocorreu em 21/07/2017.

Eventualmente, defendeu que o prazo para cumprimento da decisão seria de cinco dias, contados da
intimação da ré, a teor do que dispõe o artigo 218, §3º, do CPC; bem como deveria ser contado em dias
corridos, nos termos do artigo 219, § un., do CPC, tendo como termo final o dia 25/07/2017.

Ao final, postulou pela total improcedência da impugnação.

A sentença de Id. 8294881 acolheu a impugnação para rejeitar o pedido de execução da multa fixada
anteriormente.

Ao final, condenou a autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes
fixados em 10% sobre o valor da causa, nos termos do artigo 85, §2º, do CPC, ressalvando a suspensão
da exigibilidade, em razão da gratuidade de justiça.

A autora apela no Id. 8294884 alegando que o presente caso se enquadra no disposto no §3º do artigo
231 do CPC, razão pela qual o cumprimento da obrigação deveria ter sido imediato, a partir da
intimação da ré, que se deu no dia 21/07/2017.

Eventualmente, aduz que, não tendo o magistrado a quo fixado prazo para cumprimento da decisão,
este seria de cinco dias corridos, a teor do que dispõe o artigo 218, §3º, e 219, § un., ambos do CPC.

Acrescenta que, em 27/07/2017, foi expressamente determinado que a ré apresentasse em cinco dias a
comprovação do cumprimento da decisão que antecipou os efeitos da tutela, tendo tal prazo
transcorrido sem qualquer manifestação.

Salienta que, embora o descumprimento da decisão tenha ocorrido por um lapso temporal maior do que
cinco dias, a multa foi fixada em R$4.000,00 na decisão proferida em 17/11/2017.

Ao final, requer o conhecimento e provimento do recurso para que a ré seja condenada ao pagamento
da multa de R$4.000,00.

Sem preparo, em face da gratuidade de justiça.

Contrarrazões apresentadas pela ré no Id. 8294888, pugnando pelo improvimento da apelação.

É o relatório.

VOTOS

A Senhora Desembargadora ANA CANTARINO - Relatora

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Cuida-se de apelação cível interposta por ANA APARECIDA DOS SANTOS em face de sentença
que, nos autos da ação de cobrança de multas diárias fixadas em sede de tutela antecipada em
obrigação de fazer ajuizada pela ora apelante em face de AMIL ASSISTENCIA MEDICA
INTERNACIONAL S.A., acolheu a impugnação da ré para rejeitar o pedido de execução das
astreintes.

Ao final, condenou a autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes
fixados em 10% sobre o valor da causa, nos termos do artigo 85, §2º, do CPC, ressalvando a
suspensão da exigibilidade, em razão da gratuidade de justiça.
Cinge-se a presente questão à análise da possibilidade de cobrança do valor de R$4.000,00, atinente às
multas diárias, em razão de suposto descumprimento da tutela de urgência deferida parcialmente nos
autos da ação de obrigação de fazer nº 0702293- 92.2017.8.07.0014.

Acerca do tema, impende destacar que a imposição de multas ou astreintes tem por objetivo coagir o
devedor a satisfazer, com maior retidão, a prestação de uma obrigação de fazer ou não fazer fixada em
decisão judicial, visando dar efetividade ao decisum (artigo 537, §1º, do CPC).

Compulsando os autos, verifica-se que o Juízo a quo proferiu decisão na ação de obrigação de fazer
no Id. 8274253 deferindo parcialmente a tutela antecipada requerida pela autora, nos seguintes termos:

“Ante o exposto, DEFIRO PARCIALMENTE o pedido de tutela de urgência para determinar que a ré
restabeleça o plano de saúde da autora, nas mesmas condições que gozava anteriormente,
mantendo-a no plano coletivo pelo período de seis meses, contados da data do falecimento do titular,
à custa da autora, nos termos do art. 30, §§1º e 3º, da Lei 9.656/98, sob pena de multa diária de
R$1.000,00.”

Dessa forma, observa-se que houve a fixação das multas diárias ora cobrada, contudo não foi
estipulado prazo para cumprimento da obrigação na referida decisão.

A teor do que dispõe o artigo 537 do CPC deve ser fixado prazo razoável para o cumprimento da
medida imposta. Veja-se:

“Art. 537. A multa independe de requerimento da parte e poderá ser aplicada na fase de
conhecimento, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução, desde que seja suficiente
e compatível com a obrigação e que se determine prazo razoável para cumprimento do preceito.”
(g.n.)

Da mesma forma, é remansoso o entendimento jurisprudencial de que a ausência de fixação de prazo


para cumprimento da obrigação disposta em sede de tutela de urgência torna a multa diária inexigível,
até que o juiz designe o devido prazo para cumprimento.

Colaciona-se julgados do Superior Tribunal de Justiça sobre o assunto:

“AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. OBRIGAÇÃO DE FAZER. NECESSIDADE DE


FIXAÇÃO DO PRAZO PARA CUMPRIMENTO PARA INCIDÊNCIA DA MULTA COMINATÓRIA.
NULIDADE DA DECISÃO QUE ESTIPULA AS ASTREINTES SEM A ESTIPULAÇÃO DE PRAZO
RAZOÁVEL PARA O CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO. RECURSO NÃO PROVIDO.

1. O arbitramento da multa coercitiva e a definição de sua exigibilidade, bem como eventuais


alterações do seu valor e/ou periodicidade, exige do magistrado, sempre dependendo das
circunstâncias do caso concreto, ter como norte alguns parâmetros: i) valor da obrigação e
importância do bem jurídico tutelado; ii) tempo para cumprimento (prazo razoável e periodicidade);
iii) capacidade econômica e de resistência do devedor; iv) possibilidade de adoção de outros meios
pelo magistrado e dever do credor de mitigar o próprio prejuízo (duty to mitigate de loss) (AgInt no
AgRg no AREsp 738.682/RJ, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, Rel. p/ Acórdão Ministro
LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 17/11/2016, DJe 14/12/2016).

2. Não fixado prazo para o cumprimento da obrigação de fazer, não cabe a incidência da multa
cominatória uma vez que ausente o seu requisito intrínseco temporal.

3. Agravo interno não provido. (AgInt no REsp 1361544/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO,
QUARTA TURMA, julgado em 03/10/2017, DJe 05/10/2017)” (g.n.)

“RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. ART. 535 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.


SÚMULA Nº 284/STF. EXECUÇÃO DE ASTREINTES. PRAZO RAZOÁVEL PARA CUMPRIMENTO
VOLUNTÁRIO. ART. 461, § 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. REQUISITO TEMPORAL
INTRÍNSECO.

1. O recurso especial que indica violação do artigo 535 do Código de Processo Civil, mas traz
somente alegação genérica de negativa de prestação jurisdicional, é deficiente em sua
fundamentação, o que atrai o óbice da Súmula nº 284/STF.

2. De acordo com o art. 461, § 4º, do Código de Processo Civil, o juiz poderá, em medida liminar ou
na própria sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for
suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-lhe prazo razoável para o cumprimento do
preceito.

3. A fixação de prazo para cumprimento da obrigação é requisito intrínseco para incidência da


multa cominatória. Precedentes do STJ.

4. Recurso especial provido. (REsp 1455663/PE, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA,
TERCEIRA TURMA, julgado em 07/08/2014, DJe 25/08/2014)” (g.n.)

Por oportuno, confira-se também julgado deste Tribunal de Justiça:

“DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ASTREINTES. PRAZO PARA


CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO. DETERMINAÇÃO. VALOR TOTAL. LIMITAÇÃO. I -
Conquanto seja possível a fixação de multa diária pelo descumprimento do preceito cominatório,
deve ser fixado prazo razoável ao cumprimento da medida imposta, conforme art. 537 do CPC. II -
Embora a multa cominatória possa ser revista em qualquer fase do processo, não há impedimento
para que se fixe sua limitação quando presentes fundamentos razoáveis para tanto, notadamente o
perigo de que o valor total da multa supere o valor da própria obrigação. III - Deu-se parcial
provimento ao recurso. (Acórdão n.1159138, 07210521520188070000, Relator: JOSÉ DIVINO 6ª
Turma Cível, Data de Julgamento: 20/03/2019, Publicado no DJE: 26/03/2019. Pág.: Sem Página
Cadastrada.)”

Considerando que o despacho que determinou o prazo para cumprimento da obrigação se refere a
período posterior ao cobrado no presente feito (Id. 8294858), a manutenção da sentença que rejeitou o
pedido de execução de multa cominatória de R$4.000,00 é medida que se impõe.

Quanto ao pedido de majoração das astreintes, a via judicial eleita não é adequada para apreciação da
questão, tratando-se o presente feito de execução de multas anteriormente fixadas.

Ante o exposto, CONHEÇO e NEGO PROVIMENTO à apelação.

Em razão da total improcedência da apelação da autora, majoro em 2% (dois por cento) os honorários
advocatícios fixados em sentença, percentual o qual se soma àquele fixado na origem, nos termos do
artigo 85, §11, do CPC, ficando suspensa a exigibilidade, em face do benefício da gratuidade de
justiça concedido.

É como voto.

O Senhor Desembargador DIAULAS COSTA RIBEIRO - 1º Vogal


Com o relator
O Senhor Desembargador EUSTAQUIO DE CASTRO - 2º Vogal
Com o relator
DECISÃO

RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. UNÂNIME.

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