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O Brasil é capaz de cuidar da Amazônia,


mas soberania traz responsabilidade
Daniel Buarque
11/09/2019 04h00

Detalhe de capa da revista semanal do jornal britânico The Guardian sobre fogo na floresta

A polêmica internacional sobre os incêndios registrados neste ano na


Amazônia e a associação entre o fogo e a péssima imagem do

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presidente Jair Bolsonaro no exterior transformaram o debate ambiental


numa disputa em torno da soberania brasileira. Bolsonaro reafirmou em
discurso no 7 de Setembro que "A Amazônia é nossa"; enquanto cada
vez mais vozes no resto do mundo discutem abertamente formas de
pressionar o Brasil a proteger as florestas –de doações e sanções a
'invasão'.

De acordo com a cientista política americana Kathryn Hochstetler,


professora de desenvolvimento internacional da London School of
Economics (No Reino Unido), a soberania brasileira sobre a Amazônia é
um fato inquestionável. A questão mais importante, segundo ela, é
outra: "Essa discussão deveria ocorrer menos em função da soberania e
mais em função da responsabilidade", explicou.

"Claro que o Brasil tem a soberania sobre o território, mas com


soberania vem responsabilidade. Se você vai insistir em soberania
brasileira sobre a Amazônia e para os outros ecossistemas brasileiros,
então o Brasil tem a responsabilidade de lidar bem com isso. E muitas
vezes o Brasil tem assumido essa responsabilidade e feito coisas boas
para o ambiente. É uma responsabilidade que vem com a soberania",
disse.

A entrevista foi concedida no fim de julho durante a gravação da série


documental "Brasil,Terra
Estrangeira", que vai tratar da importância de pesquisas sobre o Brasil
realizadas em universidades estrangeiras e do trabalho de brasilianistas
–como a própria Hochstetler. A produção é uma parceria do blog
Brasilianismo com a produtora brasileira Pomona Audiovisual.

Autora do livro "Greening Brazil: Environmental Activism in State and


Society", sobre o ativismo ambiental no país, Hochstetler estuda a
Amazônia e outras questões ambientais no Brasil desde os anos 1980.
Segundo ela, a pressão atual do resto do mundo sobre o Brasil tem
relação com a figura de Bolsonaro, mas também pode ser entendida
por um novo momento da preocupação global com questões
ambientais.

Segundo ela, além de ter a soberania, o país tem condições de proteger



a floresta. "O Brasil hoje tem capacidade de lidar com a Amazônia. A Topo

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questão é saber o que o Brasil quer fazer."

Leia abaixo a entrevista completa.

Brasilianismo – Você estuda a Amazônia desde 1989. Acha que o que


está acontecendo na floresta atualmente é diferente do que houve no
passado?
Kathryn Hochstetler – Não é a primeira vez que tem muita coisa
acontecendo no mundo ambiental brasileiro. Isso sempre tem muita
atenção e interesse internacional. Quando fui para o Brasil pela primeira
vez, em 1989, também havia muitos incêndios na Amazônia e as
entidades internacionais estavam preocupadas com a floresta. Também
naquela época havia uma resposta do Brasil de que era uma questão
interna do país. Então o momento atual não é tão novo. Para mim, o
interesse pelo meio ambiente brasileiro não é tão ligado a esses
momentos em que o mundo todo está de olho. É algo que é interessante
todo dia, todo ano. Tem sempre coisas acontecendo. E tem coisas mais
importantes do que esses momentos que todo mundo presta atenção.

Sempre estou atenta a processos de avaliação de impacto ambiental, o


processo de avaliar o impacto das atividades econômicas, as
mobilizações da sociedade civil, as decisões rotineiras, diárias. Essas
coisas sempre merecem atenção. São elas que fazem o pano de fundo
para esses momentos em que todo mundo presta atenção.

Algumas coisas têm mudado nesses 30 anos em que tenho olhado a


Amazônia brasileira. A possibilidade de ter dados é uma delas. Antes a
gente não sabia a taxa anual de desmatamento, o que começou em
1988. Agora tem um monte de informações, de dados, os cientistas
brasileiros mais do que tudo têm acompanhado todo esse processo.

Outra coisa que mudou muito é que havia uma política nova, montada
especialmente desde os anos 2000, que conseguiu diminuir a taxa
anual de desmatamento. O Brasil hoje tem capacidade de lidar com a
Amazônia. A questão é saber o que o Brasil quer fazer. E isso tem
mudado muito. Em alguns anos há um interesse maior em
desenvolvimento, em outros o interesse é em sustentabilidade, outras
pessoas acham que não há tanta diferença, e que desenvolvimento sem

sustentabilidade não é desenvolvimento. Mas há toda uma variedade de Topo

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perspectivas brasileiras sobre o ambiente.

Brasilianismo – E por que este momento está chamando tanta atenção, a


ponto de ser tratado como crise internacional no G7?
Kathryn Hochstetler – O tema da mudança climática está chegando o
topo da agenda internacional. Hoje fala-se mais sobre isso do que há
cinco ou dez anos. Como o Brasil é tão central na política global sobre
ambiente, faz sentido haver tanta atenção. Há outros problemas que têm
incêndios até maiores do que o Brasil, mas o Brasil está no foco por
conta desse ecossistema carismático que chama muita atenção. Mas a
amazônia é um lugar muito complexo e muito importante, que muita
gente não entende. Mas chegamos a este momento internacional de
maior atenção à problemática ambiental. Tem mais fogo, mas também
tem mais atenção.

Brasilianismo – A imprensa internacional tem responsabilizado o


presidente Jair Bolsonaro pelo aumento das queimadas. Acha que isso
faz sentido?
Kathryn Hochstetler – Com certeza a figura de Bolsonaro faz parte
disso. Ele é um presidente que tem chamado muita atenção no mundo,
é visto como parte de uma onda de presidentes que estão um pouco
fora do normal, que a gente não sabe exatamente o que vão fazer, que
rompem com a política normal. As pessoas já estão atentas a Bolsonaro.
Ele já tem fama de falar muito sobre o desenvolvimento na Amazônia,
ele já cria medo de que ele não vai proteger os indígenas. As pessoas
já estão olhando para ele. Então tem muito a ver com isso também. É
uma figura que o mundo está acompanhando. É um momento da
política brasileira que todo mundo tem interesse.

Brasilianismo – Acha que há motivo para uma preocupação maior do


mundo atualmente?
Kathryn Hochstetler – Existe um maior conhecimento sobre a Amazônia
e existe uma preocupação de que estejamos perto de um ponto
irreversível de destruição da floresta. Estamos chegando a um ponto de
inflexão, e depois dele a Amazônia pode realmente secar. Esse aumento
do conhecimento científico sobre a Amazônia estar à beira de mudança
muito grande aumenta a preocupação.


Brasilianismo – Seu trabalho lida muito com o contraste entre Topo

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desenvolvimento e sustentabilidade. Qual a melhor forma de equilibrar


os dois?
Kathryn Hochstetler – Com certeza existe desenvolvimento que gera
níveis de desmatamento e problemas ambientais maiores do que devem
ser. É possível fazer coisas como agricultura e mineração na Amazônia
de forma a minimizar os problemas. Minha preocupação é que o
governo fala como se quisesse maximizar os impactos ambientais, em
vez de minimizar eles. O jeito que ele fala de que o ambiente não
importa, isso pode criar consequências negativas máximas. Isso é
necessário evitar.

Brasilianismo – Qual a importância da Amazônia na projeção


internacional do Brasil?
Kathryn Hochstetler – Tenho a impressão de que, por muito tempo, o
Brasil não quis ser uma potência ambiental, mas não é possível o Brasil
evitar isso. O país tem os recursos, as florestas, os ecossistemas tão
importantes, que tem que ser uma potência internacional na área do
meio ambiente.

Em 1989, quando comecei a estudar o Brasil, o Brasil resistia a ser uma


potência nessa área, mas ao longo dos últimos 30 anos o país muitas
vezes liderou o mundo nisso. O país percebeu que este é um assunto
importante para o mundo e que eles podem ser uma potência, que é
um lugar em que o país fala e o mundo ouve. Em contraste com outros
assuntos como segurança e comércio, em que o país não tem uma
relevância tão grande, com o meio ambiente o país pode enfim se
mostrar uma potência. E os anos em que houve redução do
desmatamento, isso era motivo de orgulho, o Brasil podia mostrar isso
ao Brasil. O mundo sempre quis um poder grande do Brasil neste
assunto, mas o próprio país muitas vezes atuou esse papel com muito
orgulho e força, mas em outros momentos, como agora, resistiu a
assumir esse papel.

Brasilianismo – Historicamente, acha que o mundo vê com bons olhos a


perspectiva ambiental do Brasil?
Kathryn Hochstetler – O mundo sempre acha que o ambiente brasileiro
é muito importante, mas nem sempre acha que o Brasil lida muito bem
com essa riqueza. Muitas vezes, como agora, o mundo questiona e

critica o que o país está fazendo, recomendando mudanças. Quando o Topo

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Brasil faz coisas boas, também recebe muita estima do resto do mundo.
Depende muito do momento.

Brasilianismo – Pela primeira vez em muito tempo está havendo um


debate internacional sobre soberania, enquanto o Brasil reafirma a posse
do território da floresta. Como fica, neste sentido a ideia de soberania e
de ingerência e pressão internacional na floresta? Faz sentido debater
de quem é a Amazônia?
Kathryn Hochstetler – No mundo ambiental, há muitas pessoas que
acham que o meio ambiente é tão fundamental para o ser humano e a
sobrevivência da vida no planeta, que a soberania nacional não deveria
ser considerada. Mas, se você acompanha as negociações
internacionais, vai ver que quase todos os países do mundo insistem
que a soberania nacional tem que ser parte da política internacional do
meio ambiente. O Brasil insiste nisso, e a soberania brasileira é um fato.
A Amazônia está em terras brasileiras. As negociações internacionais
têm dito que a soberania faz parte da política internacional, e que o país
tem essa capacidade. Mas na minha opinião, essa discussão deveria
ocorrer menos em função da soberania e mais em função da
responsabilidade. Claro que o Brasil tem a soberania sobre o território,
mas com soberania vem responsabilidade. Se você vai insistir em
soberania brasileira sobre a Amazônia e para os outros ecossistemas
brasileiros, então o Brasil tem a responsabilidade de lidar bem com isso.
E muitas vezes o Brasil tem assumido essa responsabilidade e feito
coisas boas para o ambiente. É uma responsabilidade que vem com a
soberania.

Brasilianismo – E como o mundo pode pressionar o Brasil a assumir


essa responsabilidade?
Kathryn Hochstetler – Os mecanismos mais eficientes são os
mecanismos econômicos. E é importante entender que existe pressão
dos consumidores europeus por proteção da florestas, mas também há
pressões gerais dos mercados internacionais que levam à destruição
dos ecossistemas para produzir mais coisas para exportar. As
influências internacionais não são só para proteger o ambiente. As
influências políticas são só uma parte dessa questão. Não diria que o
mundo apenas favorece o ambiente.


Brasilianismo – Estamos falando sobre Amazônia, mas há menos de seis Topo

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meses, conversamos sobre o desastre ambiental de Brumadinho.


Quanto a Amazônia representa da questão ambiental no Brasil e que
outros assuntos são também relevantes nessa área?
Kathryn Hochstetler – Desastres ambientais são muito importantes, mas
me interesso muito por desastres evitados. Não temos desastres todos
os dias. O Brasil tem um sistema normalizado de monitorar,
acompanhar, planejar e controlar o ambiente. Isso é muito importante. E
nem todos os países têm isso. As pessoas costumam falar de
burocracia como uma coisa má, mas a burocracia é uma coisa boa,
pois permite o acompanhamento frequente do ambiente. Além disso,
estou terminando um livro sobre a questão energética no país, que é um
assunto muito relevante também. E precisamos pensar também sobre
política ambiental urbano, pois a maioria da população do país vive em
cidades, e o ambiente não está só nas florestas.

Brasilianismo – Acha que a crise atual ameaça o papel que o Brasil pode
desempenhar em política ambiental no mundo? Qual vai ser o lugar do
Brasil nessa questão ambiental no futuro?
Kathryn Hochstetler – O Brasil está em um ponto muito alto nessa
questão, ao ter conseguido burocratizar e monitorar o ambiente, mas a
perda nessa área vem desde antes de Bolsonaro. Desde 2014, 2015 já
começaram os cortes no orçamento, cortes no número de pessoas
trabalhando na área. A verba disponível para ciências, por exemplo,
caiu muito nos últimos anos. Atualmente o Brasil ainda tem muita
capacidade na área, perdendo cientistas. Temo que o Brasil pode vir a
ter problemas com isso e perca muito dessa capacidade que construiu.
Não é tarde demais agora, mas mais cinco anos assim podem ser
suficientes para destruir muito do que o Brasil construiu nessa área.
Então estou olhando com preocupação para isso.

Brasilianismo – Mais cedo falamos sobre a relação entre


desenvolvimento e sustentabilidade, mas sua última resposta parece
indicar que há um outro lado dessa questão, e que o desenvolvimento
econômico pode ajudar a investir em sustentabilidade, e que crises
econômicas levam a uma destruição maior do ambiente…
Kathryn Hochstetler – Esse é o argumento histórico dos economistas.
Mas acho que é um círculo. Ter só prosperidade econômica sem cuidar
do ambiente não é sustentável, mas é verdade que mais prosperidade

libera recursos para proteger o ambiente também. É um círculo. Topo

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Queremos um círculo virtuoso, mas pode ser um círculo muito negativo


também.

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SOBRE O AUTOR
Daniel Buarque vive em Londres, onde faz doutorado em relações
internacionais pelo King's College London (em parceria com a USP). Jornalista
e escritor, fez mestrado sobre a imagem internacional do país pelo Brazil
Institute da mesma universidade inglesa. É autor do livro “Brazil, um país do
presente - A imagem internacional do ‘país do futuro’” (Alameda Editorial) e do
livreto “Brazil Now” da consultoria internacional Hall and Partners, além de
outros quatro livros. Escreve regularmente para o UOL e para a Folha de
S.Paulo, e trabalhou repórter do G1, do "Valor Econômico" e da própria Folha,
além de ter sido editor-executivo do portal Terra e chefe de reportagem da rádio
CBN em São Paulo.

SOBRE O BLOG
O Brasil é citado mais de 200 vezes por dia na mídia internacional. Essas
reportagens e análises estrangeiras ajudam a formar o pensamento do resto do
mundo a respeito do país, que tem se tornado mais conhecido e se consolidado
como um ator global importante. Este blog busca compreender a imagem
internacional do Brasil e a importância da reputação global do país a partir o
monitoramento de tudo o que se fala sobre ele no resto do mundo, seja na
mídia, na academia ou mesmo e conversas na rua. Notícias, comentários,
análises, entrevistas e reportagens sobre o Brasil visto de fora.

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