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Produção, v. XX, n. X, xxx./xxx. xxxx, p.

xx-xx
doi: XX.XXXX/XXXXX-XXXXXXXXXXXXXXXXX

Características estruturais, relacionais e gerenciais


na cadeia de suprimentos de um condomínio
industrial na indústria automobilística

Sílvio Roberto Ignácio Piresa,*, Mário Sacomano Netob


a,
*sripires@unimep.br, UNIMEP, Brasil
b
msacomano@unimep.br, UNIMEP, Brasil

Resumo
Nas últimas décadas, a contribuição da indústria automobilística tem sido muito representativa em termos de
inovações na gestão da cadeia de suprimentos, tais como aquelas contempladas nos modelos de consórcio
modular e de condomínio industrial. Este artigo apresenta os resultados de uma pesquisa envolvendo diferentes
configurações na estrutura de relacionamento entre uma montadora de automóveis e alguns de seus fornecedores,
em uma cadeia de suprimentos da indústria automobilística que utiliza o modelo de condomínio industrial.
O propósito principal foi verificar, empiricamente, algumas das implicações que a configuração da cadeia de
suprimentos exerce sobre elementos importantes na sua gestão, tais como: tipos de relacionamentos, processos
logísticos, planejamento de produtos, gestão da produção e medição de desempenho. Os resultados corroboram
que a configuração da cadeia é fator determinante na forma como se conduz o relacionamento da montadora com
seus fornecedores, influenciando, significativamente, os elementos considerados na análise.
Palavras-chave
Gestão da cadeia de suprimentos. Estrutura e relações na cadeia de suprimentos. Condomínio industrial. Indústria
automobilística.

1. Introdução
No último século, a indústria automobilística a IA tem presenciado uma competição em escala
(IA) se desenvolveu, cresceu e tornou-se a mais global e com mercados altamente competitivos.
representativa do mundo sob vários aspectos, Em âmbito geral, tem sido desafiada a enfrentar
especialmente o econômico. Por seu pioneirismo questões como forte pressão por redução de
e nível de competitividade, também ocupa lugar preços, redução dos prazos de entrega, melhor
destacado na vanguarda das inovações tecnoló- qualidade, melhor atendimento ao cliente e por
gicas e gerenciais, o que a leva a ser sempre um produtos “ecologicamente corretos” e com menor
referencial para o mundo industrial como um consumo de energia (PIRES, 2004).
todo. Voltando a atenção para o Brasil, os números
mostram que o país recebeu algo em torno de US$
Por outro lado, nos últimos anos, a gestão da
30 bilhões de investimentos no setor durante a
cadeia de suprimentos (Supply Chain Management
década de 1990 (PIRES, 2004). Parte desses inves-
– SCM ) transformou-se em uma nova fronteira,
timentos foi aplicada na atualização tecnológica
explorada pelas empresas industriais na busca
de plantas já existentes, mas a parte maior foi
incessante de maior competitividade. direcionada à construção de novas e inovadoras
Em termos de SCM, a contribuição do setor plantas. Isso proporcionou ao país uma atua-
automotivo tem sido particularmente notável, ou lização sem precedentes no setor, bem como a
seja, o setor tem sido o precursor de importantes possibilidade de ter em seu território algumas das
iniciativas e inovações introduzidas na indús- plantas mais modernas do mundo, especialmente
tria em todo o mundo. Entretanto, como uma em termos de processos logísticos e SCM. Hoje em
indústria considerada madura, nos últimos anos dia, praticamente todas as grandes montadoras
*UNIMEP, Piracicaba, SP, Brasil
Recebido 01/10/2007; Aceito 05/02/2010
Pires, S. R. I. et al.
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automobilísticas do mundo possuem instala- empresas desde a fonte inicial de matéria-prima


ções fabris no país. Entretanto, o aumento da até o ponto de consumo do produto acabado.
oferta e da capacidade produtiva para algo em Por sua vez, a gestão da cadeia de supri-
torno de 3,2 milhões de veículos por ano não foi mentos (Supply Chain Management – SCM) pode
acompanhado pela demanda. De 2004 a 2006, ser definida como um novo modelo gerencial que
o volume de produção ficou em torno de 2,35 busca obter sinergias através da integração dos
milhões de veículos, o que ainda representa processos de negócios-chave ao longo da cadeia
significativa ociosidade média do setor (PIRES; de suprimentos. O objetivo principal da SCM é
CARDOZA, 2007). No momento há de se consi- atender o consumidor final e outros stakehol-
derar que algumas montadoras instaladas no país ders da forma mais eficaz e eficiente possível, ou
vêm trabalhando a “plena carga” em função do seja, com produtos e/ou serviços de maior valor
aumento da demanda do mercado doméstico percebido pelo cliente final e obtido através do
desde medos de 2007. menor custo possível. Complementarmente, a
Entretanto, um problema do mercado brasi- SCM também pode ser considerada uma área
leiro atual é que, embora o país produza alguns contemporânea no contexto da gestão empre-
dos automóveis mais baratos do mundo, o produto sarial e que abrange interesses de diversas áreas
ainda é relativamente caro para a grande maioria tradicionais das empresas industriais. Assim, pode
dos brasileiros – principalmente em decorrência ser considerada como um ponto de convergência
do montante de impostos incluídos no preço do na expansão de outras áreas tradicionais no
produto. Isso levou o país a um grande foco na ambiente empresarial, em especial nas atribuições
produção do chamado carro popular e gerou uma da gestão de operações, da logística, de compras
situação um pouco controversa, que é a especia- e de marketing (PIRES, 2004).
lização da produção em produtos de menor valor
agregado. Todavia, isso já está sendo gradativa-
mente amenizado com a diminuição relativa das 2.1. Estrutura e relacionamento na cadeia
vantagens legais (menor tributação) alocadas pelo de suprimentos
governo brasileiro a essa classe de veículo e com
o desenvolvimento, no país, de produtos como o A estrutura e o relacionamento são dimen-
Meriva (General Motors), EcoSport (Ford) e Fox sões importantes para o entendimento da cadeia
(Volkswagen). de suprimento e sua dinâmica. Diversos estudos
No geral, praticamente todas as montadoras recentes apontam que a posição ocupada pelas
que fizeram investimentos no país nos últimos empresas na estrutura e a forma como estabe-
anos exageraram no dimensionamento do poten- lecem relacionamentos na cadeia afetam o desem-
cial de compra do mercado nacional. Por outro penho (ROWLEY; BEHRENS; KRACKHARDT, 2000;
lado, esses novos investimentos trouxeram ao GNYAWALI; MADHAVAN, 2001; GRANOVETER,
país diversas inovações na SCM, principalmente 2007).
as contidas nos modelos de consórcio modular Do ponto de vista estrutural, as cadeias
e de condomínios industriais. Isso posicionou o podem ser densas ou difusas. Uma cadeia com
país na vanguarda do setor em termos de inova- estrutura densa ocorre quando mais empresas,
ções na SCM e criou uma emergente demanda de uma determinada cadeia, estão ligadas umas
de pesquisa sobre diversos aspectos dessas novas às outras (LAZZARINI, 2008), propiciando uma
configurações produtivas. estrutura com muitas relações e maior divisão do
Este artigo busca verificar, através de um trabalho.
estudo de caso envolvendo um condomínio Do ponto de vista relacional, as empresas
industrial, algumas das implicações da configu- podem ter relações “fortes” ou “fracas”, isto é,
ração da cadeia de suprimentos em elementos com muita ou pouca cooperação e integração
importantes da sua gestão, tais como: tipos de entre elas. Por esse fato, vários estudos sobre
relacionamentos, processos logísticos, plane- cadeias de suprimentos têm incorporado vari-
jamento de produtos, gestão da produção e a áveis estruturais e relacionais (BORGATTI e LI,
medição de desempenho. 2009; CHOI e KIM, 2008; PETERSEN et al., 2008;
TERPEND et al., 2008; SACOMANO NETO e
2. Gestão da cadeia de suprimentos TRUZZI, 2004). Um ponto essencial para análise
de uma cadeia é compreender como as empresas
Em termos gerais, uma cadeia de suprimentos devem posicionar-se estruturalmente e como
(Supply Chain – SC ) compreende os processos devem estabelecer relações com os outros elos da
envolvendo fornecedores-clientes ligando cadeia.
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2.1.1. Estrutura da cadeia de suprimentos criado mais nenhum valor adicional e o produto e/
ou serviço chega ao seu cliente final.
Conforme mencionado por Alves Filho et al. Complementando, e��������������������������
sses autores também consi-
(2004), a estrutura da cadeia diz respeito aos deram que, em uma cadeia de suprimentos, existem
papéis das empresas ou unidades produtivas, e quatro tipos de conexões entre elos que podem
como o trabalho e processos são divididos e reali- ser: gerenciadas, monitoradas, não gerenciadas
zados entre as empresas. No sentido de compre- e indiretas. As conexões gerenciadas são aquelas
ender a estrutura das cadeias, Lambert, Cooper e que ocorrem quando a empresa focal integra os
Pagh (1998) identificam três dimensões estrutu- processos com clientes e fornecedores através da
rais de uma cadeia de suprimentos: colaboração. As monitoradas surgem quando uma
• Estrutura horizontal ­– Definida pelo número de empresa focal monitora e auditora os processos da
níveis da SC para produção de um produto ou cadeia de suprimentos. As conexões não geren-
serviço; ciadas ocorrem quando a empresa focal não moni-
• Estrutura vertical – Definida pelo número de tora os processos na SC. E as indiretas são aquelas
empresas em cada nível da SC; e que influenciam indiretamente a empresa focal.
• Posição da empresa foco _ Definida pela posição Ainda com relação à nomenclatura, Slack
horizontal da empresa foco ao longo da SC. (1991) também apresenta uma classificação das
Conforme mencionado por Lazzarini (2008), é cadeias de suprimentos bastante útil em deter-
possível exercer laços de cooperação na cadeia, minadas análises e situações. O autor divide uma
tanto no sentido horizontal como no vertical de cadeia de suprimentos em três níveis: cadeia total,
sua estrutura. cadeia imediata e cadeia interna. Assim, a interna
Então, posicionar bem a empresa na cadeia é é aquela composta pelos fluxos de informações
primordial para obtenção de vantagens competitivas. e de materiais entre departamentos, células ou
Lambert, Cooper e Pagh (1998) também sugerem setores de operações internos à própria empresa. A
a classificação dos membros de uma cadeia de imediata é formada pelos fornecedores e clientes
suprimentos em primários e de apoio. Os membros imediatos de uma empresa, enquanto a total é a
primários são representados por aquelas empresas cadeia de suprimentos na sua totalidade.
ou unidades de negócios que executam atividades
(operacionais ou gerenciais), e agregam valor ao longo 2.1.2. Relações na cadeia de suprimentos
da SC de um determinado produto e/ou serviço. Por
sua vez, os membros de apoio são aquelas empresas Quando se discorre sobre as relações na
ou unidades de negócios que fornecem recursos, cadeia de suprimentos está implícita a análise da
conhecimento, etc., suportam os membros primários intensidade do relacionamento entre pares ou do
da SC, mas não participam diretamente do processo conjunto de empresas. Essas relações podem variar
de agregação de valor. Assim, uma empresa pode, na intensidade, sendo fortes e fracas (ROWLEY;
simultaneamente, realizar atividades primárias em BEHRENS; KRACKHARDT, 2000; GNYAWALI;
um processo de negócio na SC e de apoio em outro MADHAVAN, 2001; GRANOVETER, 2007).
processo, bem como pode executar esses papéis em Por esse fato, um elemento muito importante
cadeias de suprimentos distintas. Essa classificação no contexto da SCM é o que diz respeito aos
também é útil para se definir os limites horizontais tipos de relacionamentos praticados pelos elos
de uma SC. Assim, a origem de uma SC é o ponto em da cadeia. Nesse sentido, Lambert, Emmelhainz,
que não existem mais fornecedores primários, mas Gardner (1996) apresentam uma interessante
apenas de apoio. Já o seu término é o ponto de proposta de classificação, a qual pode ser resu-
consumo, ou seja, o ponto a partir do qual não será mida na Figura 1 .

Parceria

Arm's Tipo Tipo Tipo Joint Integração


lenght 1 2 3 ventures vertical

Formalização do relacionamento
Investimentos em ativos
Figura 1. Relacionamentos na cadeia de suprimentos (baseado em Lambert, Emmelhainz, Gardner (1996)
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Em termos de formalização do relacionamento e entregas sequenciadas (just-in-sequence), o


e de investimento em ativos, pode-se, então, ir controle estatístico do processo (CEP), a auto-
desde o mero relacionamento comercial (arm’s mação da inspeção de qualidade no final da
lenght) até o caso extremo da integração vertical. linha, a automação de embalagem e montagem
Já as joint ventures envolvem o investimento e de pallets, o sistema informatizado de controle de
a posse de ativos comuns às duas empresas, o estoque e de produção, o sistema de informação
que leva, geralmente, à criação de uma terceira integrado com os clientes, entre outros aspectos.
empresa. Lambert, Emmelhainz, Gardner (1996) No geral, todos os aspectos relativos à gestão
também subdividem as parcerias em três tipos, da cadeia de suprimentos são relevantes para o
resumidas por Pires (2004) da seguinte forma: entendimento da configuração da estrutura de
• Tipo 1: As empresas envolvidas se reconhecem relacionamento da montadora com seus forne-
mutuamente como parceiras e, dentro de deter- cedores, principalmente ao utilizar o modelo de
minados limites, coordenam, conjuntamente, condomínio industrial.
o planejamento e atividades. Geralmente são
parcerias de curto prazo e envolvem uma divisão
ou área funcional dentro de cada empresa; 2.2. Novas configurações na cadeia de
• Tipo 2: As empresas envolvidas avançam da
suprimentos na indústria automobilística
coordenação de atividades para a integração A implementação de novas configurações na
de atividades. Embora sem essa pretensão,
cadeia de suprimentos, em particular no setor
geralmente acabam tendo uma longa duração
automobilístico, é fenômeno relativamente recente
e envolvem várias divisões em cada uma das
empresas participantes;
e tem emergido nos últimos quinze anos. Durante
esse período, algumas novas configurações têm
• Tipo 3: As empresas compartilham um signifi- sido adotadas, especialmente nos chamados países
cante nível de integração operacional, cada uma em industrialização, caso do Brasil. Isso se justi-
vê a outra como uma extensão dela própria, e
fica em função da estabilização de produção e
mantêm uma longa duração.
venda de veículos nos mercados da chamada
Conforme citado por Alves Filho et al. (2004), tríade (Estados Unidos, Japão e Europa), conforme
a busca por relacionamentos estáveis ocorre em apontam Humphrey, Lecler e Salerno (2000). Como
função da impossibilidade de uma única empresa novos conceitos há, ainda, alguma controvérsia
exercer controle sobre todo o fluxo produtivo, desde sobre o tema, especialmente no mundo acadê-
a fonte de matéria-prima até o ponto de consumo mico e abrangendo questões como terminologia
final. Assim, para que haja vantagem competitiva e classificação dessas novas configurações. Mesmo
em determinadas cadeias, é necessário que os rela- assim, pode-se considerar que alguns termos já se
cionamentos de longo prazo sejam pautados por encontram relativamente bem estabelecidos, espe-
cooperação e parceria, e não pela competição. cialmente no mundo industrial. Nesse sentido, este
De uma forma objetiva, pode-se considerar que trabalho tem um interesse especial no chamado
as parcerias na SCM visam, sobretudo, viabilizar a condomínio industrial. Antes, porém, faz-se neces-
obtenção de alguns benefícios característicos da sário rever o conceito de consórcio modular.
integração vertical sem o pagamento do ônus pela
posse dos ativos (VOLLMANN; CORDON, 1998). 2.2.1. Consórcio modular
Não existe uma fórmula única para definir o tipo
de relacionamento adequado para cada situação, O conceito de consórcio é considerado um
ou seja, faz-se necessário analisar caso a caso. dos mais inovadores experimentos na SCM, na
Outros elementos centrais para o aprimora- indústria automobilística, conduzido nos últimos
mento da cadeia de suprimentos envolvem as anos. A grande referência no tema é a fábrica de
práticas de gestão da cadeia de suprimentos e caminhões e chassis de ônibus da Volkswagen, que
logística, mensuração de desempenho e planeja- funciona desde novembro de 1996 em Resende.
mento do produto e da produção. Por exemplo, Em termos gerais, o consórcio modular pode
as práticas relativas ao planejamento do produto ser considerado um caso radical de outsourcing
e da produção envolvem o desdobramento em que os fornecedores-chave (chamados de
da função qualidade (QFD – Quality Function “sistemistas”) assumem a montagem prévia do
Deployment), o projeto auxiliado por compu- módulo sob sua responsabilidade, e sua posterior
tador (CAD – Computer Aided Design), a redução montagem diretamente na linha de montagem
de refugos, de custos, de tempo de preparação final da montadora, os investimentos em equi-
de máquinas (setups) e tempos produtivos (lead pamentos e ferramentas e a gestão (mesmo que
times), a implantação de sistemas just-in-time parcial) da cadeia de suprimentos do módulo. Por
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sua vez, a montadora providencia a planta e a linha Isso garante aos sistemistas maior flexibilidade e
de montagem final, executa a coordenação desta menor dependência da montadora de que no caso
e o teste final dos veículos (COLLINS BECHLER; do consórcio modular.
PIRES, 1997; PIRES, 1998). Assim, os condomínios industriais passaram
De forma resumida, modularidade pode ser a ser uma interessante alternativa em termos de
entendida como uma maneira de construir um inovação na SCM para a indústria automobilística,
produto ou processo complexo através de subsis- porém com uma aplicação um pouco mais contida
temas menores, que podem ser projetados inde- e não tão radical como é o caso do consórcio
pendentemente e, ainda assim, operarem juntos modular. Cabe notar, também, que, embora um
como um todo (BALDWIN; CLARK, 2000). objetivo básico da SCM seja integrar os processos
No estudo de caso conduzido neste trabalho de negócios ao longo da cadeia de suprimentos,
e relatado posteriormente, não se entrou no essas novas configurações ainda estão restritas à
mérito da discussão se o que se está tratando é chamada cadeia de suprimentos imediata.
um sistema ou um módulo. Para não se desviar
de seu objetivo básico, optou-se por utilizar o 3. Estudo de caso
temo genérico “sistema/módulo”.
Os estudos de caso permitem a investigação
2.2.2. Condomínio industrial de fenômenos contemporâneos dentro de seu
contexto real, particularmente, quando os limites
Algumas novas fábricas de montadoras de auto- entre eles não estão definidos de modo claro. Por
móveis foram instaladas e outras existentes foram isso são recomendados para abordar os temas e
reformuladas no Brasil depois da implementação situações em que o pesquisador simplesmente
do consórcio modular em Resende. Praticamente observa os fatos, procura entendê-los, sistematizá-
todas essas novas plantas trabalham com o conceito los e analisá-los (YIN, 2001; VOSS; TSIKRIKTSIS;
rotulado de condomínio industrial, o qual difere do FROHLICH, 2002). Também, segundo Gil (1996), os
consórcio modular em pelo menos dois importantes estudos de caso oferecem as seguintes vantagens:
aspectos (PIRES; CARDOZA, 2007): (1) motivam novos descobrimentos (dependendo
Um pequeno conjunto de fornecedores diretos de quão flexíveis são em termos de planejamento
da montadora, chamados de sistemistas, está e condução); (2) colocam a ênfase na totalidade
instalado majoritariamente dentro dos muros que de variáveis do fenômeno observável (multiplici-
delimitam sua planta e participa da divisão dos dade de dimensões) e (3) seus procedimentos são
custos de infraestrutura da planta. Esses forne- simples.
cedores abastecem a montadora, geralmente com Neste trabalho, um estudo de caso foi condu-
sistemas em uma base de just-in-sequence, dire- zido com o propósito de se verificar algumas das
tamente ao lado da linha de montagem, mas não implicações que a configuração da cadeia de supri-
participam da linha de montagem final do veículo, mentos exerce sobre elementos importantes na
a qual permanece a cargo da montadora. sua gestão, tais como: tipos de relacionamentos,
Para melhor viabilizar o negócio em termos de processos logísticos, planejamento de produtos,
escala, na maioria dos casos, a montadora não exige gestão da produção e medição de desempenho.
necessariamente que os recursos dos sistemistas O estudo foi realizado em uma cadeia de supri-
sejam dedicados somente ao seu abastecimento. mentos tomada como referência (empresa focal),

Condomínio

Fornecedor Fornecedor Montadora


Distribuidores
D B (OEM)

Fornecedor Fornecedor
C A

Figura 2. Escopo da cadeia de suprimentos estudada.


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uma grande montadora de automóveis (OEM – Alemanha, EUA e Coreia, desenvolvendo compo-
Original Equipment Manufacturer), dois de seus nentes para acesso aos carros e sistemas de imobi-
fornecedores de primeira camada (empresas A lização tipo entrada passiva. Nesses sistemas são
e B) e dois fornecedores de segunda camada utilizados sistemas eletrônicos ou de rádio frequ-
(empresas C e D). O fornecedor A é um “siste- ência para ativar ou desativar as portas, sem a
mista” instalado dentro do condomínio industrial necessidade de chaves (Remote Keyless Entry).
construído pela montadora. Por sua vez os forne- Entretanto, no Brasil, esse sistema ainda não
cedores B, C e D estão instalados fora dos limites está difundido em função dos elevados custos de
do condomínio, conforme ilustra a Figura 2. produção. A planta está instalada no interior do
estado de São Paulo e fornece fechaduras mecâ-
Devido, principalmente, à contemporanei-
nicas e eletrônicas diretamente à montadora em
dade do tema (e da cadeia de suprimentos estu-
questão.
dada) e à viabilidade de execução da pesquisa,
em termos metodológicos optou-se por uma Fornecedor C – O fornecedor C também
abordagem de caráter exploratório, realizada pertence a um grupo alemão, que atua no
através de entrevistas baseadas em um questio- segmento automobilístico, na manufatura de
nário semiestruturado desenvolvido para tal (YIN, tubos e na engenharia mecânica. No ramo auto-
2001). As entrevistas foram conduzidas junto aos motivo, a empresa desenvolve e produz sistemas
e módulos completos, componentes para a carro-
executivos responsáveis pelas áreas de Logística,
ceria, chassis e motores. A empresa se instalou no
Compras e Produção nas empresas estudadas e
Brasil em 1999 em função de um follow sour-
foram sempre seguidas de uma visita in loco às
cing estabelecido com duas montadoras. Para
principais operações produtivas e logísticas da
a montadora aqui estudada, esse fornecedor
planta.
abastece os componentes para o eixo traseiro, a
bandeja de suspensão e o para-choque traseiro.
3.1. A montadora estudada Fornecedor D – O fornecedor D é uma
empresa nacional que fornece peças estampadas
A empresa montadora (OEM) foi uma das e ferramentas de corte e repuxo ao fornecedor B.
pioneiras na instalação de uma fábrica para a A empresa foi fundada em 1983 no interior do
montagem de automóveis no país. Seguindo uma estado de São Paulo e, no final de 2004, empre-
decisão corporativa, no início desta década a gava 20 pessoas. Fornece também para outras
referida fábrica foi reformulada para se tornar um empresas que, em sua grande maioria, são forne-
condomínio industrial. Ela passou a contar com cedores da indústria automobilística.
onze fornecedores-chave (sistemistas) instalados
no terreno de sua planta e a produzir um novo
modelo mundial de automóvel desenvolvido pela 3.3. Dados levantados
matriz na Europa.
O condomínio industrial estudado é composto
por onze empresas que abastecem a montadora
3.2. Os fornecedores de autopeças de forma sequenciada e em intervalos geralmente
de uma a duas horas. Estão instalados no condo-
Conforme já relatado, foram estudados quatro mínio os fornecedores de: (1) chicotes elétricos,
fornecedores da montadora, os quais são sucinta- (2) tanques de combustível, (3) para-choques
mente descritos a seguir: traseiros, (4) escapamentos, (5) rodas e pneus, (6)
Fornecedor A – O fornecedor A é um siste- eixos dianteiros e traseiros, (7) bancos, (8) pedais
mista, instalado dentro da planta da montadora. de acionamento, (9) para-choques dianteiros, (10)
A empresa pertence a um grupo alemão que atua agregado de portas e (11) instrumentos de painel
no ramo automobilístico, fornece peças e sistemas e revestimentos de porta. Todos os sistemas
para carroceria, chassis e motores (sistemas power- (ou módulos) produzidos pelos fornecedores
train). No Brasil, o grupo tem 22 subsidiárias e são transportados e sequenciados, conforme o
emprega em torno de 9.000 funcionários. Esse programa mestre de produção (master production
fornecedor abastece a montadora com os eixos scheduling) diário da montadora.
traseiro e dianteiro, suspensão dianteira, quadro No início das negociações, para se imple-
auxiliar e radiador. mentar o condomínio industrial, a montadora
Fornecedor B – O fornecedor B pertence a solicitou aos potenciais fornecedores sistemistas
um grupo alemão, desenvolve e produz fecha- dois orçamentos: um com instalações fora e outro
duras mecânicas e eletrônicas para a indústria com as mesmas dentro da planta da montadora.
automotiva. Mais de 200 designers trabalham na Assim, um estudo das necessidades foi feito
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pelos fornecedores e apresentado à montadora. tem que entregar os sistemas/módulos à monta-


O fornecedor A conseguiu reduzir 15% do custo dora em um prazo de 1,5 hora. Existem várias
de seus componentes para a montadora, por razões que explicam a escolha do fornecedor
estar dentro do condomínio. O custo logístico A para participar do condomínio. O gerente
e o aumento da sinergia entre o fornecedor e industrial do fornecedor A destaca o know-how
a montadora foram apontados como principais como um aspecto importante. Há, também, uma
motivos da redução de custos. Outros benefícios parceria tecnológica entre o grupo pertencente
atribuídos foram advindos do compartilhamento ao fornecedor A e à montadora na Alemanha
de infraestrutura básica como energia elétrica, para fabricar sistemas/módulos similares aos do
água, restaurantes, prédios, segurança patrimo- Brasil. A tecnologia que o fornecedor A emprega
nial etc. “O ganho maior foi nas operações logís- no Brasil é oriunda de um conhecimento gerado
ticas, pois se estivéssemos fora do condomínio na Alemanha, conjuntamente com a montadora
teríamos que produzir, transportar para o cami- pesquisada. Assim, as relações entre o fornecedor
nhão, descarregar, sequenciar as peças e entregar A e a montadora apresentam grande nível de
para a montadora, o que geraria mais custos”, colaboração, alinhamento de objetivos e inte-
afirmou o gerente geral do fornecedor A. Esse gração de processos.
mesmo representante da empresa ainda destacou Por sua vez, o fornecedor B, embora não faça
a relação ganha-ganha com a montadora, ressal- parte do condomínio, apresenta pontos interes-
tando que “a integração, redução de custos e os santes no relacionamento da montadora. Suas
facilitadores coletivos” são as principais razões de entregas para a montadora são feitas na forma
estar no condomínio. sequenciada, através de um sistema milk run
A seguir, os dados levantados estão agrupados gerenciado pela montadora e por um operador
em termos de processos logísticos, planejamento logístico, o qual entrega, descarrega, armazena,
de produtos, gestão da produção e medição de lança entradas e saídas, abastece e sequencia as
desempenho. peças para a linha de produção da montadora. A
comunicação do fornecedor B com a montadora
3.3.1. Processos logísticos é feita, principalmente, via EDI, quando se trocam
informações a respeito do programa mestre de
As principais inovações logísticas presentes produção, tipo de peça, volumes, datas e avisos
no condomínio envolvem, principalmente, a utili- de embarque. Semanalmente, um profissional
zação de: conceito de modularização de produtos do fornecedor B realiza uma visita de rotina à
e processos, entregas no padrão just-in-sequence, montadora e se inteira de eventuais novidades.
uso do sistema kanban, troca eletrônica de dados Segundo o fornecedor B, os contatos informais
(EDI), prática de cross-docking, uso intensivo do são muito relevantes no relacionamento com a
trabalho de um operador logístico, e uso inten- empresa cliente.
sivo de diversos painéis (com informação sobre o A montadora compra do fornecedor C
andamento da produção) espalhados pelo chão componentes que são entregues diretamente ao
de fábrica. fornecedor A, instalado na planta da montadora.
O fornecedor A atende a montadora na forma Fatores como redução de impostos, otimização
de entrega sequenciada. Assim que uma carro- da gestão da demanda e alto poder de barganha
ceria sai do setor de pintura da montadora, é da montadora explicam, em parte, a razão de
enviada uma informação (via EDI) convertida em comprar diretamente do fornecedor C. A troca de
uma etiqueta que é posicionada no início da linha informações do fornecedor C com a montadora
de produção dos onze fornecedores sistemistas. A também é feita majoritariamente via EDI. O forne-
etiqueta contém o número do veículo, o número cedor C recebe, semanalmente, uma mensagem
sequencial de montagem e o modelo do sistema/ via EDI constando um programa de produção
módulo que deverá ser montado. No caso do com horizonte de três meses e congelado (frozen)
fornecedor A, após receber a informação via EDI, em seis semanas. O pedido é recebido e analisado
ele copia a etiqueta e inicia a produção. Na linha em função da sua capacidade de produção e do
de produção é sinalizado aos operários, através de que está estipulado no contrato com a monta-
um sistema (painel luminoso), quais são as peças dora. Não havendo nenhum problema, o forne-
necessárias para a montagem daquele sistema/ cedor C envia uma confirmação para a montadora
módulo. No final da linha, fixa-se a etiqueta da via EDI. Quando a matéria-prima sai do forne-
montadora e sequenciam-se as peças que são cedor, também é enviado um aviso eletrônico de
enviadas para a linha de produção da montadora embarque ao sistema de controle da montadora,
através do operador logístico. O fornecedor A o qual é utilizado para fazer a confirmação da
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coleta para o dia seguinte e no gerenciamento do montagem, trabalha com os sistemas milk run e
sistema milk run. kanban com a maioria dos fornecedores externos.
No caso do fornecedor D, a montadora não O sistema kanban é usado, principalmente, para
tem qualquer relação direta com ele. Todos os peças grandes e de alto valor. Um operador logís-
contatos são intermediados pelo fornecedor B. Os tico é o responsável pela operacionalização desse
pedidos são enviados via email ou fax pelo forne- sistema de abastecimento. Segundo a montadora,
cedor B ao fornecedor D. Nos pedidos, todas as os sistemas milk run e kanban reduzem seus
informações das peças contêm o código do mate- custos logísticos e de estocagem, além de dimi-
rial, quantidade e datas de entrega. O fornecedor nuírem o número de caminhões circulando dentro
D recebe o programa de produção com horizonte da fábrica. Também, o EDI está sendo implantado
de até três meses, pois existem componentes que com alguns fornecedores (caso dos fornecedores
demandam maior tempo para se produzir, como B e C) e, com outros fornecedores, utiliza-se o
os laminados, que recebem tratamento superficial. web EDI (como no caso do fornecedor D). No
Seus produtos são enviados semanalmente para o geral, considera-se que para pequenos fornece-
fornecedor B através de transporte próprio. dores o EDI tradicional ainda é uma ferramenta
que exige investimentos elevados.
3.3.2. Planejamento do produto e gestão da Na linha de montagem da carroceria, a
produção produção é interrompida se for detectada qualquer
não conformidade, mesmo imperceptível ao olho
Dois importantes processos realizados pela humano. O controle dimensional é realizado por
montadora no contexto do condomínio são: um sistema que afere, em tempo real, as medidas
planejamento do produto e gestão da produção. da carroceria. Também, um tailored blank permite
Como é comum, as atividades de engenharia que se produzam diferentes partes do veículo a
do produto iniciam-se com o desenvolvimento de partir de uma única chapa totalmente plana, mas
um novo produto ou com a implementação de com espessuras diferentes. As partes são juntadas
alterações no projeto de um já existente. Nessa com solda a laser nas extremidades, e a estam-
fase, há diversas reuniões de equipes para discutir pagem da peça é realizada após a emenda. No
o novo design ou as mudanças do projeto do sistema anterior, as peças eram estampadas antes
veículo, como: tipo de peças, aspectos financeiros, da emenda e tinham as extremidades sobrepostas
desenvolvimento de ferramentas e qualificação para a solda. A principal desvantagem do método
dos fornecedores. Na etapa seguinte, é feito o antigo era o risco de corrosão nos pontos de
desenvolvimento do produto propriamente dito, emenda, além do aumento do peso do veículo.
em conjunto com os fornecedores-chave (ESI – O trabalho desta etapa também engloba o plane-
Early Supplier Involvement), categoria em que se jamento da operação de abastecimento propria-
incluem os sistemistas. mente dito da linha de montagem final, o que
Na etapa de planejamento da produção, envolve questões referentes à embalagem, ergo-
a montadora praticamente seleciona todos os nomia do posto de trabalho, meios de transporte
fornecedores e define os programas de produção e controle do fluxo de material. Embora a planta
(MPS) a médio e longo prazo. Os fornecedores, possua 22 armazéns para garantir a disponibi-
geralmente, têm uma visibilidade de seis meses lização do material no momento da montagem
do MPS, feita através dos chamados releases final, a montadora procura, sempre que possível,
(geralmente via EDI) da montadora. Em média, fazer uso da prática de cross-docking.
o período de congelamento do MPS é de duas
semanas, o que sempre causa certa apreensão 3.3.3. Medição de desempenho na cadeia de
aos fornecedores e trabalha-se com horizontes suprimentos
de produção mensal, semanal e diária. Toda a
etapa de produção é gerenciada por um sistema Praticamente não foi encontrada uma siste-
de uso corporativo rotulado de FIS (Factory mática única para tratar da medição de desem-
Information System), que armazena e coordena penho da cadeia de suprimentos nas empresas
os pedidos das concessionárias e depois deter- estudadas. A própria montadora tem um sistema
mina os modelos e as versões a serem produzidas. interno, que inclui diversas medidas referentes
Esse sistema também envia os pedidos de peças à gestão da cadeia de suprimentos. Pode-se
aos fornecedores para o abastecimento da linha observar que as empresas estudadas têm, em
de montagem final. diversos níveis, sistemas internos de medidas de
A montadora conta com cerca de 400 fornece- desempenho que, de certa forma, desdobram-se e
dores externos. Para o abastecimento da linha de acabam tendo reflexos especialmente na chamada
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cadeia imediata. Isso fica mais evidente no caso • Qualidade – Abrange o sistema de garantia de
da montadora. qualidade do processo produtivo, considerando
Nos últimos anos, a montadora tem medido o controle dos processos internos, os meios utili-
seu desempenho através de um sistema deno- zados para o controle, aferição de ferramental,
sistema de manutenção etc.
minado, internamente, de KPI (Key Performance
Indicators), que abrange todas as principais áreas Para os novos projetos, o setor de Compras
internas da empresa. Os indicadores partem de indica os fornecedores aptos para o fornecimento,
objetivos corporativos e são desdobrados e desa- com base em aspectos técnicos e comerciais, porém
gregados para todas as áreas da empresa, abran- no processo de escolha dos fornecedores busca-se
gendo diretorias, departamentos e funções indivi- sempre o melhor (menor) preço. Geralmente, três
duais. As metas e resultados do desempenho são fornecedores são pré-selecionados e a proposta é
sinalizados por cores (verde, amarelo e vermelho) submetida para as outras áreas, as quais podem
e apresentam limites de controle bem definidos. aprovar ou vetar o fornecedor.
Em termos organizacionais, a área financeira é A montadora também dispõe de um sistema
quem consolida, gerencia e divulga esses números de avaliação de fornecedores feito de forma multi-
para toda a empresa. funcional entre as áreas de logística, engenharia,
No geral, pode-se constatar que, mesmo qualidade, finanças e comercial. Os fóruns de
informalmente, algumas medidas de desempenho definição de fornecedores também são feitos de
da montadora se desdobram até os fornecedores. forma multifuncional. Na prática, esses sistemas
funcionam como sistemas de medição de desem-
Um dos indicadores que mostram isso bem na
penho dos fornecedores.
área de logística é o crippled, o qual mede a
quantidade de veículos considerados montados, Por sua vez, estes dispõem de sistemas de
mas com algum componente faltante. A monta- medição de desempenho interno, que também
dora considera esse o típico indicador que ajuda a se desdobram externamente. O fornecedor A
medir falhas de toda a cadeia de suprimentos. Ela tem diversos indicadores de desempenho, como:
também discute os potenciais reflexos dos seus volume de vendas físicas, reclamações do cliente,
KPI com os fornecedores. No caso dos sistemistas falhas de campo, parada de linha do cliente,
são feitas reuniões diárias nas quais são decididas tempo médio de falhas, controle de desperdício
e refugo, material bloqueado pelos fornecedores,
potenciais ações preventivas e corretivas para
auditoria do produto e controle de manutenção.
se atingir as metas estipuladas. A área de logís-
Os indicadores diretamente relacionados à cadeia
tica da montadora usa 10 categorias de indica-
de suprimentos da montadora são reclamações
dores: (1) porcentagem de produção perdida, (2)
do cliente, parada de linha do cliente e qualidade.
conformidade da lista de materiais (bill of mate-
Entretanto, o fornecedor A nunca teve nenhum
rial), (3) volumes de rejeitos, (4) crippled (número
demérito no desempenho desses indicadores e
de unidades faltantes/veículos incompletos), (5)
considera que possui um sistema de medição de
nível de inventários, (6) entregas de peças de
desempenho interno mais rigoroso do que aquele
reposição, (7) overtime (pagamento de pessoal
utilizado pela montadora para medir o desem-
direto ou mensalista), (8) custo logístico (compra
penho de seus fornecedores. Por sua condição
de insumos), (9) overhead (custos fixos das opera-
de sistemista, o que a montadora mais controla
ções) e (10) volume e fidelidade do inventário.
da empresa A é a eventual parada de linha de
Cabe lembrar que esse é um quadro especí- montagem final causada por ele, bem como o
fico para a área de logística. Cada área funcional nível de qualidade desse fornecedor.
da empresa tem essa mesma cobertura através Ressalta-se que a montadora somente paga
do sistema, ou seja, cada gerente ou funcionário aos sistemistas quando o veículo atinge um
tem sua folha de KPI com metas claramente ponto em que é considerado montado (quando
definidas. são auferidos vários itens de sua montagem), e
Por outro lado, os fornecedores são avaliados desde que não haja nenhum problema de não
constantemente por pelo menos três grandes conformidade detectado.
critérios de desempenho: Os indicadores de desempenho do nível estra-
• Logística – Engloba aspectos operacionais tégico do fornecedor B, chamados de scorecards,
(embalagem, tipo de entrega, inovações, novos são discutidos e monitorados em reuniões mensais
sistemas) e, principalmente, sua fidelidade de entre departamentos e diretoria. Os scorecards
atendimento ao programa mestre de produção; também devem ser reportados para a matriz
• Engenharia – Contempla seu potencial de desen- da empresa B na Alemanha a cada intervalo de
volvimento e o conhecimento técnico; e tempo de seis meses. Os scorecards utilizados são:
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desempenho das entregas, número de defeitos, não fossem os sistemistas, a montadora talvez não
relacionamento com o cliente, faturamento, tivesse de gerenciar 25.000 itens e sim 40.000.
custo da mão de obra, volume de vendas, giro de Assim, o sistemista assume uma responsabilidade
inventários, percentual de compras sobre o fatu- bem maior no relacionamento com a montadora,
ramento e custo da não conformidade. Os indica- em especial no tocante ao desenvolvimento de
dores de desempenho relacionados aos aspectos produtos, processos, gestão da qualidade e logís-
operacionais da logística e produção podem ser tica. Por outro lado, ele também tem aumentada a
sintetizados em: qualidade, pontualidade das possibilidade de desenvolver novas competências
entregas, precisão dos pedidos, flexibilidade e agregação de valor a seus produtos e serviços.
no atendimento, percentual de defeitos, perda Na cadeia de suprimentos estudada, o elo com
de matéria-prima e eficiência dos recursos (uso maior agregação de valor (o fornecedor sistemista
efetivo comparativamente à sua disponibilidade). A) é exatamente o que apresenta mais inova-
Esses indicadores geram informações que medem ções na gestão da cadeia de suprimentos, maior
o desempenho das respectivas áreas de logís-
volume de entregas e melhor desempenho geral.
tica, produção, qualidade e finanças. Entretanto,
É necessário considerar que os itens fornecidos
a empresa B afirma que a montadora controla,
pelo fornecedor A para a montadora são sistemas
prioritariamente, a qualidade e o desempenho das
de alto valor agregado e estão ligados a quesitos
entregas, em termos de pontualidade e flexibili-
de segurança dos veículos. Desenvolvimento de
dade no atendimento, custo do transporte, quali-
produtos, processos, produção e abastecimento
dade da embalagem, e nível de atendimento dos
são feitos de forma integrada entre o fornecedor
pedidos (precisão em termos de mix e volume).
A e a montadora. Em geral, os sistemistas têm que
Da mesma forma, o fornecedor C é avaliado,
apresentar elevados níveis de desempenho, pois
semestralmente, pela montadora em termos de
se deixarem a linha de montagem da montadora
qualidade e desempenho das entregas. A área de
parar, a conta a pagar será muito alta. Por isso,
engenharia do produto já fora avaliada no início
o fornecedor A investiu muito em manutenção
do projeto. A cada semestre, a montadora envia
preventiva, reuniões diárias e implementação de
um relatório informando à empresa C sua posição
no ranking de desempenho dos fornecedores. diversas medidas de desempenho para garantir
As principais questões avaliadas dizem respeito melhor fornecimento para a montadora.
ao atendimento do programa de produção, em A parceria estabelecida entre o fornecedor A e
termos de prazo, custo e qualidade. a montadora mostra como o sistemista ocupa uma
A empresa D tem um relacionamento direto posição relativamente privilegiada na estrutura da
apenas com o fornecedor B. A qualidade e o cadeia de suprimentos do setor automotivo. No
desempenho das entregas são os dois principais condomínio industrial, a utilização de sistemistas
critérios avaliados pela empresa cliente. e um conjunto seleto de fornecedores confere a
contínua estratégia de consolidação da estrutura
da cadeia de fornecedores do setor automotivo.
4. Análise dos dados Essa consolidação gera cadeias densas e coesas,
Em geral, os dados levantados ressaltam que, com elevada integração de funções. O resultado
com a implantação do condomínio industrial, dessa pesquisa está de acordo com Uzzi (1997) e
houve significativa mudança no relacionamento Lazzarini (2008) ao destacarem a elevada troca
da montadora com os fornecedores de autopeças, de informações refinadas e integração de funções
principalmente com os chamados sistemistas, para presentes nas cadeias densas e coesas.
os quais houve maior transferência de atribuições A empresa A considera que “a integração,
por parte da montadora. Isso requereu dos siste- redução de custos e os facilitadores coletivos”
mistas maior disposição em aceitar os métodos são as principais razões de estar no condomínio.
de trabalho, de comunicação e procedimentos Com isso, o fornecedor A tem acesso privilegiado
advindos da montadora. Essa característica torna a recursos, infraestrutura, informações e sistemas
o sistema mais interativo do que impositivo e está que outros fornecedores tradicionais da monta-
em concordância com o relatado anteriormente dora não têm, conferindo uma posição privile-
por trabalhos de Pires (1998) e Morris, Donnelly giada na estrutura e na forma de como estabe-
e Donnelly (2004). lecer os relacionamentos na cadeia. Conforme
Os ganhos advindos da simplificação do denominado por Uzzi (1997), Granovetter (2007)
sistema de abastecimento (inbound) também e Lazzarini (2008), o acesso a recursos e infor-
foram apontados pelos entrevistados da empresa mações privilegiadas é característica central das
montadora. Um de seus gerentes lembrou que, se cadeias densas e coesas.
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Sob a perspectiva da montadora, os siste- dos dados levantados e das análises executadas
mistas significam, sobretudo, uma opção em se no estudo de caso.
trabalhar com um conjunto pequeno de fornece- No quadro observa-se que a posição do
dores-chave em uma relação de exclusividade. A fornecedor na estrutura da cadeia e os tipos de
montadora considera ser muito mais fácil medir relações influenciam no grau de monitoramento
as questões de desempenho com os sistemistas, e na forma de coordenação dos fornecedores. O
pois “eles causam infinitamente menos problemas fornecedor A tem grande importância estratégica
e estão juntos na mesma planta”. Um gerente da e abastece a montadora com sistemas de custos
montadora ressalta que “às vezes, é muito mais relativamente altos e com grande especificidade.
trabalhoso cuidar do parafuso do porta-luvas do Há, de fato, grande interdependência entre o
que do sistemista”. fornecedor A e a montadora, o que gera estru-
Analisando-se os dados levantados sob a turas de controle formais e informais na relação
perspectiva dos tipos de conexões apresentados entre ambos. Assim, o relacionamento entre a
por Lambert, Cooper, Pagh (1998), tem-se que montadora e o fornecedor A apresenta diferenças
as relações entre o fornecedor A e a montadora significativas em comparação aos outros fornece-
apresentam um alto grau de gerenciamento e de dores no que diz respeito a processos logísticos,
monitoramento. Conforme relatado pelo forne- planejamento do produto, gestão da produção e
cedor A, diariamente representantes de sua linha medição de desempenho. O fornecedor A apre-
de produção vão até a linha da montadora para senta elevado grau de monitoramento e controle
saber se há algum problema, o que denota um por parte da montadora, apesar da maior inte-
nível de comunicação muito grande. gração entre ambos. Entretanto, conforme já
Pode-se considerar que as relações da monta- ressaltado antes, a montadora considera que os
dora com o fornecedor B e C têm uma certa fornecedores sistemistas são mais fáceis de moni-
similariedade no tocante ao grau de parceria e torar que os fornecedores tradicionais devido à
de monitoramento. Por sua vez, o fornecedor D é sua proximidade física, confiança e maior infor-
somente monitorado pelo fornecedor B e não pela malidade das relações.
montadora. Isso evidencia que o gerenciamento e Por sua vez, os processos logísticos são clara-
o monitoramento tendem a existir e/ou a ser mais mente influenciados pela posição geográfica
intensos quanto maior for a participação do custo dos fornecedores. O fornecedor A está insta-
do item, sendo fornecido no produto final. lado dentro do condomínio, criando um grande
Considerando-se os tipos de relacionamentos potencial de integração com os processos logís-
na cadeia de suprimentos classificados por ticos internos da montadora. Ele executa entregas
Lambert, Emmelhainz, Gardner (1996), tem-se integradas, sequenciadas e em curtos prazos. Os
que a relação entre a montadora: fornecedores B e C têm um sistema similar entre
• Com o fornecedor D apresenta características si, trabalham com EDI e usam o sistema milk
típicas de relações comerciais tradicionais do run gerenciado pela montadora. Entretanto, o
tipo arm’s lenght; fornecedor C tem maior frequência de entregas
• Com o fornecedor B pode ser considerada, em de forma não sequenciada. O fornecedor D apre-
certo momento, uma parceria Tipo 1 (restrita ao senta um sistema logístico mais simplificado,
escopo do desenvolvimento do ferramental) e entrega semanalmente para o fornecedor B e usa
posteriormente volta a um relacionamento arm’s um sistema de transporte próprio.
lenght tradicional; No planejamento do produto, o fornecedor A
• Com o fornecedor C pode ser vista como uma trabalha em conjunto (codesign) desde o início
parceria do Tipo 2, em que há certa integração, do projeto com a montadora. Os fornecedores B e
coordenação de atividades e relações de maior C apenas seguem as especificações da montadora
prazo; e e o fornecedor D segue as especificações repas-
• Com o fornecedor A (sistemista) pode ser uma sadas pelo fornecedor B.
parceria do Tipo 3, com algum investimento A gestão da produção do fornecedor A é
conjunto nas instalações do fornecedor e signi- realizada de forma integrada com a montadora,
ficante alto nível de integração operacional, com visibilidade on-line do seu MPS. Já os forne-
conforme já descrito. cedores B e C têm uma visibilidade de até três
No geral, ficam claros a importância estraté- meses do MPS. Isso proporciona melhor gestão
gica e o custo relativo do item na definição do da demanda e menores custos logísticos tanto
tipo de relacionamento, sendo conduzido pela para a montadora como para os fornecedores. O
montadora. O Quadro 1 apresenta uma síntese fornecedor D também colhe os benefícios do seu
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Quadro 1. Síntese dos parâmetros analisados – relativamente à empresa focal (montadora).


Empresa A Empresa B Empresa C Empresa D
Monitorada
Tipo de Altamente monitorada
Monitorada Monitorada informalmente pelo
conexão e gerenciada
fornecedor B
Parceria tipo 3 com
Parceria do tipo 1 Parceria do tipo 2,
Tipo de algum investimento
(temporária) e depois com monitoramento e Arm’s length
relacionamento conjunto e alto nível de
arm’s length integração de atividades
integração operacional
Nenhum contato com a
Usando EDI, Usando EDI, mas
Usando EDI e entregas montadora, apenas com
Processos entregas integradas, entregando na empresa
sequenciadas e usando a empresa B. Entregas
logísticos sequenciadas e em A, e usando o milk run
milk run da montadora semanais, utilizando
curtos prazos e ciclos da montadora
transporte próprio
Atendendo às Montadora e
Não participa do
especificações definidas fornecedor A definem o
Atuando como desenvolvimento.
Planejamento pela montadora, projeto inicial. Atende
codesigner Atende às
do produto exceto no caso do às especificações
(praticando ESI) especificações do
desenvolvimento de da montadora e do
fornecedor B
ferramental fornecedor A
Visibilidade, on-line,
Recebe semanalmente, Recebe, semanalmente
do MPS da montadora
da montadora, o MPS da montadora, o MPS
em um horizonte de 6 Visualização de 3 meses
Gestão da com horizonte de 3 com horizonte de 3
meses, congelamento do MPS da montadora
produção meses (previsão) e meses (previsão) e
de 3 semanas e (previsão) via web-EDI
pedido firme (congelado) pedido firme (congelado)
atendimento em uma
de um mês e meio de um mês e meio
base just-in-sequence
Sistema formal, Sistema formal, Sistema formal,
Monitorado
Medição de estruturado, integrado estruturado e estruturado e
informalmente pelo
desempenho e monitorado pela monitorado pela monitorado pela
fornecedor B
montadora montadora montadora

acesso ao MPS do fornecedor B, realizado através tem o maior nível de parceria com a montadora.
de web-EDI. Nesse caso, os aspectos estruturais da cadeia
Sobre a medição de desempenho, conforme (ou quais papéis a empresa assume na cadeia)
já relatado, os sistemas utilizados pelos fornece- influenciam na forma de relacionamento entre as
dores acabam sendo influenciados, em maior ou empresas.
menor grau, pelo desdobramento do sistema da O tipo de relacionamento na cadeia de supri-
montadora. mentos é um ponto importante da pesquisa. Os
Os resultados da pesquisa auxiliam no enten- resultados revelam que as parcerias com elevado
dimento de certos frameworks conceituais apre- grau de comprometimento estão relacionadas
sentados ao longo do texto. Um ponto central é com a agregação de valor no produto final.
a dimensão estrutural da cadeia de suprimentos Esse aspecto está de acordo com os resultados
(LAMBERT; EMMELHAINZ; GARDNER, 1996). da pesquisa de Mchung, Humphrey e Mclvor
O caso apresentado revela a importância do (2003), os quais mencionam que a cooperação
entendimento das características e dinâmica da será mais intensa quanto maior for a participação
cadeia, isto é, quem são os atores centrais, qual do custo do componente fornecido no produto
é a divisão de trabalhos na cadeia, quais são os final. Esse grau de comprometimento na parceria
insumos e componentes de maior dependência, é evidente no condomínio industrial, principal-
com qual empresa devo cooperar e/ou competir mente nos fornecedores sistemistas em que estão
e quais práticas cooperativas podem ser estabele- presentes as conexões gerenciadas (LAMBERT;
cidas. A análise estrutural da cadeia implica rela- EMMELHAINZ; GARDNER, 1996).
tiva mudança de postura gerencial das áreas de Essa característica estrutural e relacional da
compras, vendas, distribuição e marketing e de cadeia de suprimentos do condomínio indus-
estratégias das empresas. Na estrutura da cadeia, trial reflete no projeto conjunto (codesign) dos
a empresa mais bem posicionada em termos de veículos, gestão de demanda e estoques, redução
valor agregado no produto, a empresa A também de prazos e ciclos de produção.
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As características mais “sofisticadas” de Por sua vez, as limitações da pesquisa envolvem


parceria com a montadora são mais presentes na a não generalização dos resultados encontrados
relação com os fornecedores sistemistas, em que para toda cadeia de suprimentos ou para outros
há um elevado grau de confiança e comprometi- tipos. O estudo de caso tem limitações inerentes
mento entre os parceiros. relativas à coleta e análise dos dados da pesquisa.
Entretanto, os resultados encontrados permitem
refletir sobre as implicações da configuração da
5. Considerações finais
cadeia de suprimentos sobre os tipos de relacio-
Os resultados obtidos no estudo confirmam, namentos, processos logísticos, planejamento
sobretudo, que a configuração da cadeia de de produtos, gestão da produção e medição de
suprimentos é, realmente, fator determinante desempenho da cadeia.
na forma como se conduz o relacionamento da A pesquisa realizada contribui demonstrando
montadora com seus fornecedores, e influencia, como elos estratégicos da cadeia de suprimentos
significativamente, os elementos gerenciais que têm recebido maior investimento em inovações
aqui foram levantados e analisados. O estudo e monitoramento. As parcerias e a cooperação
também realça a importância hoje ocupada pela mostram-se como elementos importantes na
gestão da cadeia de suprimentos no âmbito da atual configuração e formatação das cadeias de
indústria automobilística, principalmente em suprimentos no setor estudado.
função do alto custo relativo dos materiais no Finalmente, vale ressaltar o fato positivo de
contexto do custo do produto e do crescente nível que a cadeia de suprimentos estudada apresen-
de outsourcing praticado pelas montadoras. Nesse tava uma configuração com quatro fornecedores
sentido, o condomínio industrial foi considerado situados em posições distintas, incluindo um
por todas as empresas estudadas como tendência sistemista, o que proporcionou um objeto de
no setor automotivo, representando uma interes- estudo bem contemporâneo e relevante para um
sante situação intermediaria entre o just-in-time
estudo exploratório.
tradicional e o caso extremo de outsourcing do
consórcio modular. Todas as empresas estudadas
consideram o condomínio um modelo produtivo Referências
altamente contemporâneo, que representa um
ALVES FILHO, A. G. et al. Pressupostos da gestão da
conjunto de novos desafios e também de opor-
cadeia de suprimentos: evidências de estudos sobre
tunidades na obtenção de novas competências e a indústria automobilística. Gestão e Produção, v. 11,
vantagens competitivas mais duradouras. n. 3, p. 275-288, 2004.
Por outro lado, é praticamente consensual na BORGATTI, S. P.; LI, X. On social network analysis in a
literatura, nessa área, a afirmação de que uma supply chain context. Journal of Supply Chain
efetiva gestão da cadeia de suprimentos somente Management, v. 45, n. 2, p. 5-22, 2009.
vai ocorrer se existir confiança mútua (trust) entre BALDWIN, C. Y.; CLARK, K. B. Design rules: the power of
as empresas que dela participam. Nesse aspecto, modularity. Cambridge: MIT Press, 2000.
há que se ressaltar a importância da questão CHOI, T. Y.; KIM, Y. Structural embeddedness and supplier
management: a network perspective. Journal of Supply
cultural (como o fato de se ter a mesma nacio-
Chain Management, v. 44, n. 4, p. 5-13, 2008.
nalidade) e a confiança derivada de experiências
COLLINS, R.; BECHLER, K.; PIRES, S. Outsourcing in the
conjuntas positivas, conforme verificado no caso
automotive industry: from JIT to Modular Consortia.
estudado. European Management Journal, v. 15, n. 5, p. 498‑508,
Pode-se também afirmar que, dentre os 1997.
fornecedores estudados, o sistemista (no condo- GIL, A. Como elaborar projetos de pesquisa. 3 ed. São
mínio industrial) é, ao mesmo tempo, a empresa Paulo: Editora Atlas, 1996.
que produz o componente (sistema) com maior GNYAWALI, D.; MADHAVAN, R. Cooperative networks and
valor agregado, possui relação mais estreita com competitive dynamics: a structural embeddedness
a montadora e maior responsabilidade (o que perspective. Academy of Management Review, v. 26,
n. 3, p. 431-445, 2001.
se reflete nos sistemas gerenciais), compensada
GRANOVETTER, M. Ação econômica e estrutura social:
pelo acesso a informações e recursos que os
o problema da imersão. RAE Eletrônica, v. 6, n. 1,
demais fornecedores não têm. Considerando-se p. 1-41, 2007.
o conjunto de fornecedores estudados, pode-se
HUMPHREY, J.; LECLER, Y.; SALERNO, M. S. Global
afirmar que as características estruturais, relacio- strategies and local realities: the auto industry in
nais e de gestão se combinam e respeitam em boa emerging markets. London: Macmillan, 2000.
medida os tipos de relacionamento propostos por LAMBERT, D. M.; COOPER, M. C.; PAGH, J. D. Supply chain
Lambert, Emmelhainz, Gardner (1996). management: implementation issues and research
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Structural, relational and managerial


characteristics in supply chain of a condominium
in the automotive industry
Abstract
In the last decades the contribution of the automotive industry has been very representative in terms of innovations
in supply chain management, such as those of the modular consortium and industrial condominium models. In
this context, this article presents the findings of a research involving distinct configurations in the relationship
structure of an automaker and some of its suppliers in an automotive industry supply chain which uses the
industrial condominium model. The main objective was to empirically ascertain some of the implications of the
supply chain configuration in important elements of its management, such as the types of relationships, logistic
processes, product planning, production management, and performance assessment. The findings confirm that
the supply chain configuration is a determining factor in how the automaker’s relationship with its suppliers is
conducted, significantly influencing the managerial elements considered in this analysis.
Keywords
Supply chain management. Industrial condominium. Automotive industry.

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