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XIII REUNIÃO DE ANTROPOLOGIA DO MERCOSUL – UFRGS, Porto Alegre, 22-

25 julho, 2019l

GT 36 – CRISTIANISMO NOVOSS RUMOS

Coordenadores: Eduardo Dullo (UFRGS), Carly Machado (UFRRJ) Manoela


Carpenedo (University of Kent)

EVANGÉLICOS NO PODER: MORAL CONSERVADORA OU


NEOCRISTANDADE?

Marcelo Camurça (UFJF)

(Versão provisória, citação na condição de consulta ao autor mcamurca@terra.com.br)

Introdução

“Deus acima de tudo” foi o slogan da campanha vitoriosa para a presidência da


república em 2018, que teve como ato inaugural na casa do candidato eleito de extrema
direita, o ex-militar Jair Bolsonaro, uma fervorosa oração proferida pelo ex-senador e
cantor gospel Magno Malta.

Em um país onde a religião sempre esteve presente na esfera pública, embora


modulada pelo modo “naturalizado” com que o Catolicismo a disseminava no tecido
social, assistimos de um modo crescente uma forma ostensiva de presença religiosa
pública, a partir dos evangélicos.

Tudo isto, depois de duas décadas da promulgação de nossa última Constituição


(em 1988 pós ditadura militar) aonde conquistas da laicidade como: direitos de
minorias, respeito à diversidade étnica, sexual e de gênero, autonomia do conhecimento
científico pareciam consolidadas. Esta nova conjuntura da religião no espaço público
brasileiro interpela as ciências sociais da religião a uma reflexão.

O campo teórico que influenciou a reflexão nativa para compreender nossos


processos de secularização e laicidade veio de uma matriz européia/norte americana,
aonde formulações buscavam tratar de forma compreensiva e não normativa a presença
pública da religião, numa superação de uma teoria da secularização estreita que
colocava a religião como fadada a privatização ou com perda de influência na sociedade
e no Estado.
O esforço deste meu texto será em diálogo crítico com essa literatura, tentar um
entendimento da nossa realidade, onde religiões majoritárias (cristãs) atualmente forçam
no limite uma influência político-social no Estado e esfera pública.

Por isso busco uma teoria adequada a essa nossa singularidade marcada pelo
expansionismo religioso, considerando as hipóteses, ou de estarmos caindo em novas
formas de “teocracia”, “fundamentalismos”, “neo-cristandade”, como acusam muitos
segmentos laicos e laicistas; ou deste fenômeno ser expressão de uma modernidade
conservadora e autoritária, aonde as religiões jogam um papel crucial

I - Teorias da secularização e da laicidade a partir da Europa

Numa reflexão pós-secular proveniente da Europa e dos EUA, há uma


perspectiva de avaliar como positiva a presença pública da religião, como forma de
rever a rigidez da teoria weberiana da secularização que explicou por muitos anos esta
realidade.

Chantal Mouffe dentro de sua formulação de “democracia agonística”, vê a


presença religiosa como uma, dentre outras, expressões da diversidade de identificações
coletivas da ação política a influenciar na elaboração de um modelo geral de cidadania e
de laicidade. A contribuição específica da religião se inscreve na ordem do simbólico,
das paixões, valores e crenças, fazendo parte, segundo Mouffe, das motivações que
engendram a participação política e cidadã. No entanto, para ela, as formas religiosas de
identificações coletivas, devem participar da arena pública respeitando os “limites
constitucionais” da democracia liberal, que seriam a separação entre igreja e Estado. Se
a presença religiosa no público questionar a base da ordem constitucional, estaria em
risco a própria democracia em favor de formas teocráticas de governança (2006: 15-27).

Jürgen Habermas, também é favor da mais livre manifestação religiosa na


sociedade, inclusive com a ostentação de símbolos religiosos em seu seio. Apenas no
caso de introdução das demandas religiosas, marcadas por um discurso simbólico, no
âmbito dos corpos políticos, parlamentares, jurídicos e admnistrativos seria necessário a
aplicação de um filtro institucional capaz de traduzir a linguagem religiosa (comunitária
e experiencial) no idioma das deliberações formais destas esferas. Esta preocupação do
filósofo em colocar um anteparo na ação pública religiosa, vem devido à proliferação de
um discurso teológico-autoritário-político, que este identifica no pensamento de Carl
Schmitt e que aparece como alternativa a um quadro de despolitização que emergiu
numa ambiência pós-moderna. (2011: 15-53)

Também de caráter pós secular, a reflexão de José Casanova visa se contrapor a


uma concepção de secularização, entendida enquanto diferenciação entre religião e
esferas seculares (política, economia e ciência), como um processo universal, aplicável
em todos os contextos (2006:07-22). De acordo com esta noção de secularização, o
processo de diferenciação gera a emancipação das esferas seculares em relação à
religião, como condição única e necessária para a modernidade e a democracia. No
entanto, para Casanova, isto reflete apenas o caso europeu e enquanto uma experiência
particular não pode servir como referência para abordagem geral da relação entre
religião, secularização e modernidade (2006: 08-11).

Casanova coloca a relação entre religião e esferas seculares como de


diferenciação, mas também de fusão. E se vista desta forma, no caso dos EUA, o
processo de modernidade/democracia veio impulsionado pela religião e na contra ela.
Se o processo histórico-social de secularização europeu não foi válido enquanto modelo
para os EUA, uma referência de sociedade moderna ocidental, quanto mais para países e
civilizações com modos culturais e experiências sociais muito distintas de relacionar
religião e o secular (2006:12). Tendo como inspiração Toqueville, Casanova afirma que
os temas e recursos religiosos, as interações entre religião/secular foram centrais para a
constituição de políticas democráticas e da sociedade civil, mesmo na Europa secular.
Contudo Casanova, não descarta a possibilidade de religiões majoritárias exercerem
uma tirania e monopólio de poder em determinadas sociedades. Mas diz em seguida,
que os expedientes de defesa e proteção institucional das democracias devem ser os
princípios legais, sem necessidade de nenhuma regra adicional secularista na legislação
(2006: 20-22).

O que quero demonstrar, é que estes autores têm uma visão crítica da teoria da
secularização (como estreita e reducionista) e procuram ver potencialidades no
reconhecimento pelo Estado e pela sociedade do papel público das religiões. No
entanto, existe também uma preocupação em TODOS eles em estabelecer salvaguardas
para a conduta pública das religiões (como o respeito a democracia, à Constituição e às
mediações sociais e científicas conquistas da nossa modernidade)
Segundo Emerson Giumbelli, os centros/países que se credibilizaram como
referências no estudo da laicidade, o foram porque abrigavam “casos clássicos e
modelares” em termos históricos e sociológicos da implantação do modelo. Ou também
por serem lugares onde a noção de laicidade passou a contemplar “pautas socialmente
controversas” em evidência, como polêmicas em torno da exibição de símbolos
religiosos no espaço público ou com respeito à irrupção de partidos políticos religiosos,
islâmicos. (2013: 45,46).

O Brasil, a despeito dos avanços teóricos no exame do papel da religião no


espaço público, a partir dos anos 2000, atualmente, devido ao nível acelerado de
controvérsias envolvendo o expansionismo religioso cristão na esfera pública, já requer
um nível mais sofisticado de interpretações e estudos sobre a laicidade. Por isso hoje,
mais que nunca, faz-se necessário uma teoria mais abrangente sobre regulação do
religioso no país, frente às intensas e radicais transformações no caráter público das
religiões. É o que proponho com essa pequena contribuição, enquanto um esboço

II – O caso das questões contemporâneas sobre o papel das religiões na esfera pública e
a questão da laicidade no Brasil

Não vou me deter numa análise da história do papel da religião na sociedade


brasileira, no Estado e na esfera pública. Tampouco fazer um painel mais detalhado
sobre o recente ascenso dos evangélicos na política a partir dos anos 1980. A isto me
dediquei em textos anteriores (Camurça, 2017: 57-71; Camurça, 2018: 293-303)

Gostaria de centrar minha reflexão no tempo recente dos últimos 20 anos, a


partir dos anos 2000, em que o main stream público/político aceitou e legitimou a
presença quase naturalizada dos evangélicos em seu seio. Presença marcada por suas
“bancadas” e “frentes parlamentares”; suas “marchas por Jesus” legítimas passeatas nas
principais metrópoles do país; seus louvores, bênçãos com imposição de mãos a
lideranças políticas, performances de cultos, leitura de versículos da Bíblia e aposição
da mesma nos plenários das casas legislativas e do Congresso Nacional. Toda essa
imagética e ritualística funcionando como forma de apoiar suas proposições para a
aprovação de leis, sobretudo de conteúdo moral (sexual) e de estilos de vida.

Para tal, proponho uma tipologia de três etapas, a dos dois últimos governos
Dilma (2011 -2016), Temer (2016-2018) e do atual, Bolsonaro (2019)
II a- Período do Governo Dilma

No final do 2º governo Lula em 2010, houve uma reação forte da Igreja Católica
através da Conferência dos Bispos do Brasil às medidas anunciadas no Plano Nacional
dos Direitos Humanos deste governo. Em nota a Conferência dos Bispos protestou
contra a descriminalização do aborto, a regulamentação do casamento homossexual, à
adoção de crianças por casais gays e considerou “intolerável” a proposta de vetar a
ostentação de símbolos religiosos em repartições públicas. Como resposta à pressão, o
presidente recebeu uma Comissão da entidade e assegurou a retirada destas proposições
do Plano, particularmente a que se referia a descriminalização do aborto e a proibição
de símbolos religiosos em prédios públicos, o que aconteceu, de fato (Mariano e Oro,
2010:25).

No 1º governo Dilma, de novo, assistiu-se uma enorme pressão de Bispos


Católicos conservadores e dos principais líderes evangélicos contra qualquer legislação
que viesse legalizar o aborto, considerado como “cultura da morte”, por estes. Também
foi objeto de grande controvérsia o projeto de lei do Partido dos Trabalhadores que
visava criminalizar o ato de homofobia. Questionado pelos evangélicos como uma
medida que iria restringir a liberdade religiosa e de expressão dos setores da população
cristãos que se opõem a esta conduta sexual. Inúmeras lideranças políticas evangélicas,
como os deputados Eduardo Cunha, Manoel Ferreira e senadores, como Marcelo
Crivella e Magno Malta condicionaram seu apoio ao governo, ao endosso destas
medidas pela presidente Dilma (Mariano e Oro, 2010: 29). Interessante notar que
depois, todos eles, foram ativos personagens do seu impeachment. O resultado deste
imbróglio, foi que a presidente Dilma, admitiu rever no seu Plano de Direitos Humanos,
a legislação que trata do aborto e de outros temas que diziam respeito à família e a
chamada “ livre expressão religiosa no pais” (Mariano e Oro, 2010: 30).

Nesta conjuntura, então, os parlamentares evangélicos obstaculizaram a inclusão


de novos conteúdos voltados para a diversidade no formato geral da legislação de
garantias cidadãs, como direitos dos LGBTs, direitos reprodutivos, lei da permissão do
aborto. A resultante desse processo é que a noção de cidadania deixou de ser mais
alargada, mas se manteve nos marcos dos direitos humanos expressos na Constituição
de 1988. A legislação que assegurava os princípios da cidadania não sofreu retrocessos,
contudo deixou de avançar para incorporação de novos direitos voltado para novos
atores sociais.

II b- Período Temer

O governo Temer foi produto de um “golpe branco, institucional” quando a


pretexto considerar como “crime de responsabilidade” a organização orçamento do
governo da presidente Dilma, ela sofreu um processo de impeachment. Os partidos de
Centro e de centro direita que formavam a coalisão do governo do PT, tendo Michel
Temer na vice presidência se uniram aos liberais do PSDB e de direita do DEM,
isolando e derrotando a centro esquerda do PT e aliados e chegando ao poder. A
chamada bancada evangélica, que como vimos antes apoiava o governo Dilma em troca
de concessões deste, se envolveu na sua totalidade no projeto da destituição da
presidente, e abençoou através de seus pastores e bispos parlamentares o governo
Temer1.

No Congresso Nacional, representados em uma bancada de 84 parlamentares, os


evangélicos conseguiram propor uma lei, o Estatuto do Nascituro, que considera ilegal
todo tipo de aborto (atualmente é permitido em risco de vida e em caso de estupro), que
espera encaminhamento para votação em plenário. Além disso, exigiram do governo
Temer, com sucesso, a supressão no texto da “base nacional curricular” do Ministério
da Educação da noção “identidade de gênero e orientação sexual”. Segue em tramitação
na Câmara, a proposta de lei para a elaboração de um “Estatuto da Família” em que está
assegurado seu “caráter monogâmico de homem-mulher”.

A atuação pública destas lideranças evangélicas e católicos tradicionais está


embasada numa concepção muito própria: uma reivindicação de laicidade compatível
com os dogmas religiosos, sintetizado no slogan “O Brasil é um país laico, mas não
ateu”. Dentro desta concepção, desenvolveram uma articulação híbrida entre política
laica na forma e dogma religioso no conteúdo. De um lado, uma participação política
republicana como referência formal: atuam em partidos, formam bancadas, fazem

1
Disponível em https://www.otempo.com.br/pol%C3%ADtica/pastores-recebem-temer-para-
reuni%C3%A3o-e-prometem-orar-pelo-presidente-1.1851320 Acesso em 24/05/2019
lobby, participam de comissões parlamentares, organizam marchas, manifestações,
estabelecem alianças entre si – os cristãos - e com atores políticos conservadores.
Todavia esta forma de procedimento político-republicano visa preencher as políticas de
Estado com conteúdos dogmático-religiosos.

Por esse estilo de “jogar o jogo” dentro das regras da política, considero não
apropriado a formulação de “fundamentalismo” ou “teocracia” para dar conta da
atuação pública dos evangélicos- Eles tem se movido na política através de um “forte
pragmatismo” (Burity, 2018:40). Estiveram nos anos que se seguiram ao fim da
ditadura, apoiando todos os governos, de centro, direita e esquerda. E este traço
pragmático visando responder suas necessidades imediatistas de acordo com as
conjunturas político-sociais de cada época, levou a que a liderança destas igrejas
promovesse a prática da aliança com outras forças políticas. Promoveram sempre uma
“adesão sem reservas à lógica das coalizões típica do presidencialismo brasileiro”. E
quando integraram a coalizão conservadora que chegou ao poder em 2016 via
impeachment da presidente Dilma Roussef, o fizeram na condição de “mais um
componente do conservadorismo político em vigor, coadjuvante,” (Burity, 2018:47).

Sob o argumento de que representam a mentalidade da quase totalidade dos


brasileiros (92,6% dos cidadãos são crentes em Deus), 64,6% católicos e 22,2%
evangélicos, logo 86,8% de cristãos (Camurça, 2013:63-87), os líderes das igrejas
cristãs reivindicam um papel na definição nas políticas públicas (educação, saúde,
ciência) a partir de suas concepções religiosas. Desta forma, se contrapõe a setores
laicos (técnicos, cientistas, juristas, gestores públicos, educadores e os movimentos
sociais e identitários organizados – feministas, LGBTs, movimentos sociais, etc.) com
seus projetos baseados em pesquisas, estudos a partir de critérios científicos e
acadêmicos.

II c - Período Bolsonaro

Anunciando em entrevista, o que seria sua política com relação a laicidade do


Estado, em sintonia com o discurso hegemonista dos evangélicos fundamentado na
representatividade cristã na sociedade brasileira, o candidato de extrema direita
Bolsonaro, declarou: “Deus acima de tudo. Não tem essa historinha de Estado laico não!
O Estado é cristão e a minoria que for contra, que se mude. As minorias tem que se
curvar às maiorias”
As principais igrejas evangélico-pentecostais manifestaram uma adesão eleitoral
quase que em uníssono na campanha de Bolsonaro2 através de suas principais
lideranças: Assembléias de Deus do Pastor José Wellington, a Igreja Universal do Reino
de Deus do bispo Macedo, a Igreja Mundial do Poder de Deus de Valdomiro Santiago,
as Convenções Batistas, etc; da mesma forma, se alinharam à Bolsonaro católicos
conservadores. Por conseguinte, esta maioria cristã conseguiu espaço no seu governo e
uma interlocução especial através de sua bancada no Congresso Nacional.

Três esferas governamentais refletem mais nitidamente a influência religiosa nas


políticas públicas: as Relações Exteriores, os Direitos Humanos e a Educação.
Proponho-me em seguida, de traçar um breve painel desta situação.

II c-a – Ministério das Relações Exteriores

Em encontro com pastores, Bolsonaro afirma que no seu governo, o Brasil


passou a votar na ONU segundo a Bíblia, baseado no versículo João 8:32, “a verdade
vos libertará”3

Bolsonaro nomeou para o cargo de chanceler, Ernesto Araújo, um obscuro e


inexperiente diplomata, nacionalista e anti-globalista, admirador de Donald Trump e
adversário radical do que nomeia o “marxismo ocidental”. No seu blog defendeu a idéia
de que "somente um Deus poderia ainda salvar o Ocidente, um Deus operando pela
nação - inclusive e talvez principalmente a nação [norte]americana"4, No seu discurso
de posse cita o versículo 8 do evangelho de João em grego e a Ave Maria traduzida na

2
Em eleições anteriores os evangélicos e católicos cindiram-se entre candidatos presidenciais, como naquela de
2010 quando importantes expressões do meio evangélico apoiaram a candidatura Dilma Roussef do PT, como
Manoel Ferreira presidente da Convenção Nacional das Assembléias de Deus e deputado federal (PP/RJ), o bispo e
Senador Marcelo Crivella da IURD (PRB/RJ), o senador Magno Malta (PR/ES), o deputado Eduardo Cunha (PMDB/RJ)
e Robson Rodovalho da igreja Sara Nossa Terra (PP/DF) além do católico Gabriel Chalita candidato ao governo de SP
pelo PMDB. Apoiaram a candidatura José Serra do PSDB, o pastor Silas Malafaia da Assembléia de Deus Vitória em
Cristo, o pastor Paschoal Piragine da Igreja Batista em Curitiba, os bispos católicos D. Aldo Pagotto arcebispo da
Paraíba, D. Luiz Gonzaga Bergonzini, bispo de Guarulhos, bispos da Regional Sul da CNBB, o padre José Augusto da
TV Canção Nova (MARIANO; ORO, 2009, p. 11-38)
3
Disponível em https://www.brasil247.com/pt/247/brasil/389938/Bolsonaro-diz-que-Brasil-agora-segue-a-
b%C3%ADblia-antes-de-votar-na-ONU.htm Acesso em 25/05/2019

4
Disponível em https://brasil.elpais.com/brasil/2018/11/14/politica/1542224082_262753.html Acesso em
25/05/2019
língua indígena tupi pelo padre Anchieta5 Sua atuação no comando da política exterior
do Brasil será pautada pelo combate as "pautas abortistas e anticristãs em foros
multilaterais”6

Como conseqüência destas concepções, na Conferência da UNU da Comissão


sobre a situação da Mulher, realizada em março de 2019 em New York, a diplomacia
brasileira criticou o documento sobre o acesso universal a serviço de saúde reprodutiva
e sexual, com o argumento de que estava dando margem para “a promoção do aborto”7.

O ministro Araújo na formatura dos novos diplomatas, no seu discurso faz


referência ao Evangelho, Atos dos Apóstolos, mencionando a “pedra angular” que
representa a figura de Cristo na edificação da igreja, numa comparação com Bolsonaro
como a pedra angular na edificação do novo Brasil8

O ministério veiculou a proposta de mudar a embaixada do Brasil de Tel Aviv


para Jerusalém, acompanhando a política dos EUA sob Trump. Medida que teve todo
apoio do setor evangélico no Congresso Nacional sob a argumentação de que o
fortalecimento de Israel e de Jerusalém é importante para o cumprimento da profecia da
segunda volta de Cristo e do Armagedon neste lugar. Após sofrer resistência dos
militares devido suas preocupações com a segurança e a defesa do país e do Ministério
da Agricultura e do Comércio, devido às implicações que isto teria nos negócios com os

5
Disponível em https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2019/01/principais-referencias-feitas-no-discurso-do-
chanceler-ernesto-araujo.shtml Acesso em 25/05/2019

6
Disponível emhttps://oglobo.globo.com/mundo/chanceler-de-bolsonaro-diz-que-combatera-

pautas-abortistas-anticristas-na-onu-23262433 Acesso em 25/05/2019

7
Disponível em https://www1.folha.uol.com.br/equilibrioesaude/2019/03/para-evitar-promocao-do-aborto-brasil-
critica-mencao-a-saude-reprodutiva-da-mulher-em-documento-da-onu.shtml Acesso em 25/05/19

8
Disponível em https://g1.globo.com/politica/noticia/2019/05/03/ministro-compara-bolsonaro-
a-jesus-ao-chamar-presidente-de-pedra-angular-do-novo-brasil.ghtml Acesso em 25/05/19
países árabes, houve um recuo. Na prática, na visita de Bolsonaro a Israel foi acertada
apenas a abertura de um escritório de negócios do governo brasileiro na cidade9.

O ministério do exterior também concedeu o passaporte diplomático ao Bispo


Macedo da IURD e a sua esposa sob a alegação de que este estaria praticando um
trabalho relevante com as comunidades de brasileiros no exterior. Esta medida foi
cancelada pelo despacho de um juiz federal da 11ª vara do Rio de Janeiro, que
considerou improcedente a concessão, pois a função que o bispo desempenha no
exterior é de assistência aos fiéis da sua igreja particular. Não se constituindo, pois,
atividade de representação diplomática do país10

II c-b - Ministério dos Direitos Humanos

Para o Ministério dos Direitos Humanos foi nomeada a pregadora da igreja


Batista da Lagoinha, Damares Alves. Suas escolhas para compor as secretarias deste
Ministério revelam a intenção deste passar a ser um nicho de ações religiosas
conservadoras visando atingir os segmentos sociais da sociedade civil: mulheres,
minorias étnicas, juventude e família. As declarações da ministra-evangélica revelam
de forma chocante como neste governo, o conservadorismo religioso capturou setores
do Estado para fazer valer suas concepções: “é a igreja evangélica e não a política que
vai mudar a nação”11; ou que a igreja evangélica perdeu espaço quando deixou a teoria
da evolução entrar nas escolas”12,

9
Disponível em https://oglobo.globo.com/mundo/deputados-evangelicos-nao-se-satisfazem-
com-escritorio-insistem-em-transferencia-de-embaixada-para-jerusalem-23564898 Acesso em
25/05/19

10
Disponível em https://exame.abril.com.br/brasil/bolsonaro-concede-passaporte-diplomatico-a-edir-macedo-e-
esposa/ https://www1.folha.uol.com.br/poder/2019/04/justica-federal-anula-concessao-de-passaporte-
diplomatico-para-edir macedo.shtml Acesso em 25/05/19

11
Disponível http://m.leiaja.com/politica/2018/12/07/futura-ministra-coleciona-declaracoes-polemicas/. Acesso
em 25/05/19

12
Disponível https://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2019/01/09/ministra-damares-se-
envolve-em-nova-polemica-a-teoria-da-evolucao.ghtml. Acesso em 25/05/19
Em audiência pública na Comissão de Defesa dos direitos das mulheres no
Congresso Nacional, a ministra dos DH, afirmou: “a mulher deve ser submissa ao
homem no casamento” concepções que explicitam uma teologia do
Deutoronômio/Levítico13

Estas concepções já parecem redundar na elaboração de alguns projetos de lei.

A ministra Damares defende um projeto que assegure ajuda financeira à mulher


vítima de estupro que decidir manter a gravidez. O que setores feministas, dos
movimentos da sociedade civil e da esquerda apelidaram de “bolsa estupro”14. Também,
ela está encaminhando um projeto de lei que institui o ensino domiciliar, que dá a
alternativa aos pais no que diz respeito a responsabilidade pela educação formal dos
filhos, podendo os retirar da escola formal. Reivindicação proveniente de grupos
religiosos cristãos15

II c-c - Ministério da Educação

Indicada para o 2º posto no Ministério da Educação, mas demitida em poucos


dias, a pastora evangélica Iolene Lima, afirmou que na sua gestão “a geografia, a
história e a matemática vão ser vistas sob a ótica de Deus, numa cosmovisão bíblica”16

II c –d - Bancada religiosa evangélica no Congresso Nacional

Está na ordem do dia uma série de


13
Disponível em https://g1.globo.com/politica/noticia/2019/04/16/damares-diz-que-em-sua-
concepcao-crista-mulher-deve-ser-submissa-ao-homem-no-casamento.ghtml Acesso em 25/05/19

14
Disponível em https://extra.globo.com/noticias/saude-e-ciencia/futura-ministra-quer-aprovacao-de-projeto-
que-preve-bolsa-para-vitima-de-estupro-que-desistir-de-aborto-23296928.html Acesso em 25/05/19

15
Disponível em https://www.cartacapital.com.br/politica/o-ensino-domiciliar-e-um-apelo-da-familia-brasileira-
diz-damares/ Acesso em 25/05/19

16
Disponível em https://www.cartacapital.com.br/politica/indicada-por-velez-como-numero-2-do-mec-iolene-
lima-e-demitida Acesso em 25/05/19
projetos de lei formulados por evangélicos, seja no Congresso através de sua
bancada, seja através da máquina estatal onde estão inseridos. São eles, legislação anti-
drogas, Estatuto da Família que restringe a idéia de família a homem/mulher; o envio
das crianças para creches religiosas financiadas pelo Estado em detrimento da escola
pública, Estatuto do Nascituro que sustenta que o “feto tem direito a vida‟ e visa proibir
o aborto em quaisquer circunstância, a “Escola sem partido”, uma legislação que visa
coibir nas escolas conteúdos pedagógicos, rotuladas por eles, como: “ideologia de
gênero” e “doutrinação de esquerda”.

A presença evangélico-pentecostal no governo Bolsonaro parece mudar a


qualidade de sua intervenção pública. De uma resistência eficaz a agenda progressista
dos direitos reprodutivos, das minorias e da diversidade, marca de sua atuação no
governo Dilma Roussef, passaram a uma ofensiva de proposições de políticas públicas
extremamente conservadoras de inspiração dogmática religiosa.

No entanto, o que tem contrabalançado dentro do próprio governo Bolsonaro, o


ímpeto evangélico para o estabelecimento de um regime confessional é a atuação de
militares, da burocracia dos ministérios e principalmente dos setores do „mercado” que
querem priorizar uma agenda econômica neo-liberal a qualquer outra iniciativa política.
Por isso vêem como inconvenientes ações políticas no campo da moral que possam tirar
o foco da implementação de uma política econômica de cortes, ajustes e retirada de
benefícios sociais conquistados da Era Lula.

Neste sentido, dentro do leque de forças que compõe o governo de extrema


direita no poder, o bloco religioso é apenas um dos componentes, e sem dúvida, não o
mais importante, a ponto de impor uma alteração no perfil do Estado como de cunho
teocrático-político. Embora se possa afirmar, que eles se encontram em postos
estratégicos do governo para empreender uma confessionalização da cultura e do
conhecimento. Mas neste particular, contam com uma aguerrida oposição de amplos
setores da sociedade civil, dos centros produtores de ciência, dos partidos de esquerda e
também, em alguma medida, dos setores do próprio governo mencionados acima.

Conclusão

Philippe Portier constatou para a Europa ocidental, um processo de


“desconfessionalização” em países de uma religião hegemônica. Isto, devido ao
crescimento de outras religiões, através das migrações, caso do Islã ou do aumento do
indiferentismo religioso (2011: 20)

No Brasil a queda tendencial e progressiva do catolicismo (que do século XIX


até os 70 anos do século XX manteve taxas de mais de 95% da população), chegando
aos anos 2010 a 64% da população, se explicaria através de um crescente processo de
secularização/laicidade e modernidade, de um lado e de uma diversificação do campo
religioso, de outro.

Os dados sobre o declínio do catolicismo se comparados com outros dados


trazidos pelo recenseamento (diminuição da natalidade, aumento de casamentos sem
legalização, aumento da escolaridade), apontam para uma modernização de hábitos e
crescimento do individualismo subjetivista (Antoniazzi, 2002:87). O crescimento
contínuo dos evangélicos, chegando a 22,2% da população, com 42 milhões de adeptos,
aliado ao crescimento dos sem religião com 8%, cerca de 15 milhões de pessoas,
somados aos 3,1% de espíritas, os 2,7% de outras religiões e os 0,3%, sugeria contornos
de uma pluralidade, liberdade de escolha religiosa, ou por nenhuma religião (Camurça
2010: 63-67).

Mas relativizando as tendências apontadas, como geradoras de diversidade


religiosa, o que ocorreu foi do ponto de vista político e de reivindicação de um lugar
público, a constituição de um novo monopólio cristão composto por líderes de igrejas
evangélicas extremamente pró-ativos junto com segmentos tradicionais da Igreja
católica – Renovação carismática, Opus Dei, Novas Comunidades, etc.

E isto com implicações concretas para nosso regime de laicidade, pois estes
defendem uma concepção de laicidade que crítica o monopólio de uma religião, mas
oferece como alternativa uma presença equilibrada e compartilhada entre as religiões
majoritárias, (evangélicos e católicos) no Estado, na política e nas instituições.

O sociólogo mexicano, Roberto Blancarte já chamava a atenção para um


entendimento corrente de laicidade na América Latina como sendo o de uma “pluri-
confessionalidade”, ou seja, um outorgamento dos privilégios históricos conferidos â
Igreja Católica a outras igrejas como capacidade de representação e mobilização política
(2011: 24), leia-se, as igrejas evangélico-pentecostais.
A despeito de não podermos conceitualmente atribuir a presença pública
religiosa (evangélico/católica conservadora) nas esferas do poder, uma característica de
“teocracia”, “cristandade” ou mesmo “fundamentalista”, é fato que eles conquistaram
certas áreas do poder para sua política de confessionalização do espaço público (Burity,
2018:47). Estas estão concentradas no atual governo no Ministério dos Direitos
Humanos, no das Relações Exteriores e no da Educação.

Parece ser uma escolha deliberada por lugares chave onde possam travar sua
“guerra cultural” no sentido que lhe apôs James Hunter contra o que chamam a
hegemonia do “marxismo cultural” na sociedade brasileira: estilos de vida, moral
sexual, meio ambiente, conhecimento e saber (Hunter, 1991; Silveira 2015:11-45).

Pelas características que tem tomado, a ofensiva pública das religiões cristãs na
esfera pública brasileira, considero que só com um “tour de force” podemos encaixá-las
na noção de “religião pública”, tal como formulou Casanova. No caso, não se pode
constatar nem uma permeabilidade destas em relação aos setores laicos da sociedade,
tampouco um processo de auto-secularização que as faz participarem da sociedade civil
enquanto um ator dentre outros, como sugeriu Casanova para o caso das “religiões
públicas”.

No Brasil, a presença pública dos setores mais representativos das religiões


cristãs, está marcada pelo núcleo duro dos seus dogmas verotestamentários, o que
imprime nos seus projetos políticos públicos uma marca extremamente conservadora.
Lembro aqui da crítica de Cristi a idéia “casanoviana” de uma vocação democrática que
faz Igreja Católica atuar privilegiadamente na sociedade civil. Quando se trata de
assegurar a manutenção de seus conteúdos religiosos na legislação, ela, Igreja Católica,
não hesita em se articular com as esferas de poder estatal (Cristi, 2001:161 apud
Montero 2018: 33).

Por outro lado, expressiva parcela de bispos da CNBB, e de segmentos


evangélicos minoritários defendem a ênfase numa agenda de cunho social em
detrimento daquela que se centra na moral, defendida pelos conservadores; assim como
pugna pelo reconhecimento e o respeito a pluralidade religiosa. Da mesma forma,
setores ditos progressistas da CNBB tem atuado na conjuntura respeitando às mediações
políticas e científicas. Tal é o caso do Sínodo do Amazonas, onde os bispos da região
estão em sintonia com as correntes mais avançadas do ambientalismo. No entanto, aqui
se assiste no inverso, um desregramento na laicidade brasileira, quando um governo,
contrariando a idéia laica de que o Estado não deve intervir na dinâmica religiosa - mas
garantir sua liberdade de crença - termina por querer ter assento neste fórum particular e
se queixa ao Vaticano exigindo este direito.(Carta Capital)

Por tudo o que expus, no que se refere à regulação do religioso e ao regime de


laicidade no Brasil dos últimos anos, podemos marcar dois períodos com situações
homólogas, simétricas, mas inversas:

De 2000 a 2014 uma tenaz resistência conservadora movida pelos evangélicos e


católicos tradicionalistas impede mais avanços na legislação e nas políticas públicas em
relação aos direitos das mulheres, dos LGBTs, das minorias em geral. As concessões
feitas pelos governos do PT a estes aliados e base de sustentação no congresso, se
justifica pela prioridade ao seu projeto socio-econômico do “estado de bem estar social”

Atualmente, a partir de 2018, os segmentos religiosos evangélicos obtiveram


uma parcela do poder no governo Bolsonaro e desejam não mais obstruir políticas
públicas laicas, mas propor políticas de confessionalização do Estado. O que lhes
constrange mais uma vez, são as prioridades econômicas, agora de corte neo-liberal, de
ajustes, cortes e privatizações.

Se antes o que permitia suas iniciativas morais conservadoras na esfera pública,


de frear avanços nos direitos humanos e das minorias, era a primazia econômica
distributiva; hoje o que impede o livre curso de sua ofensiva de confessionalização é de
novo a importância maior da economia neo liberal na escala das prioridades do governo.

Estava para concluir este texto com as formulações explicitadas acima, no


entanto diante de um conjunto de medidas governamentais tomadas recentemente, para
além do tema da laicidade, gostaria de acrescentar (a partir destes dados, uma
formulação final)

1) No que tange a legislação sobre armamento, o governo apresenta um projeto que


isenta de punição proprietários rurais que atirarem em pretensos invasores de suas
terras. Com isso abrindo um precedente para a legalização de milícias privadas nos
latifúndios.
Baixou outro decreto que libera o porte de armas para caçadores, colecionadores,
parlamentares em logradouros públicos inclusive dentro de aviões.

2) No que diz respeito ao Meio Ambiente, o governo desistiu de sediar no Brasil a


Conferência do Clima da ONU 2009, sob a alegação do Chanceler de que o alerta em
relação as mudanças climáticas fariam parte de um “dogma marxista”.

O governo decretou uma lei que elimina o dispositivo jurídico que obrigava
manter reservas de mata nativa nas propriedades rurais do Agro negócio. Autorizou o
uso de 152 produtos agrotóxicos, muitos proibidos em outras partes do mundo.

No que diz respeito ao Ensino e a Ciência, o governo promoveu um corte de


30% das verbas públicas para as universidades e centros de pesquisa, inviabilizando a
médio prazo seu funcionamento. Incentiva para que seus correligionários filmem com
celulares as aulas de professores universitários e de liceus para divulgar sua imagem
como “doutrinadores de esquerda” num flagrante desrespeito a liberdade de cátedra e
autonomia do saber.

Mas, além dos dados que dizem respeito a segurança pública, ao meio ambiente
e a educação pública, novas informações sobre a questão da religião, somam-se as estas
acima, como contribuição a minha formulação final:

Na manifestação de apoio a Bolsonaro da avenida Paulista, o padre Carlos


Maria de Aguiar exorta os manifestantes dizendo que Bolsonaro “foi escolhido por
Deus” pois conseguiu sobreviver ao atentado perpetrado pelos inimigos da esquerda
comunista17.

Bolsonaro num culto na igreja evangélica Atitude, sobe ao palco com sua esposa
Michelle, onde recebem as bênçãos do pastor e da membresia. Agradece dizendo: “É
bom estar no meio de gente que tem Deus no coração”18

Bolsonaro esteve no ato de “Consagração do Brasil ao Imaculado Coração de


Maria”, no Centro D. Bosco em Brasília, convidado pelo deputado federal católico
mineiro Eros Biondini. Na oportunidade deixa-se fotografar com a freira cantora Kelly

17
Disponível em https://noticias.uol.com.br/política/ultimas-noticias/2019/05/26 Acesso em 27/05/19

18
Disponível em https://g1.globo.com.br/rio-de-janeiro/noticia/2019/05/26 Acesso em 27/05/19
Patrícia da RCC e com o tradicionalista bispo de Campos, D. Rifan. Em mensagem no
seu facebook, D. Rifan disse que foi convidado pela Frente Parlamentar Católica para o
ato. Contudo ele lamentou que o presidente não fez a consagração e quem referendou o
ato foi o porta voz do governo, ministro Floriano Peixoto. O fato também foi noticiado
no site evangélico, “gospel mais”, que registrou exultante, a partir da declaração oficial
da entidade católica que “o presidente não proclamou a fórmula da consagração, nem
assinou o documento da consagração”. Diz ainda o site, que Dom Rifan fez a
consagração, “para tentar minorar a frustração geral pelo ocorrido”19

Em culto da IURD em 19/06, o bispo Macedo orou para que Deus “remova”
todo aqueles que se unem para derrubar o presidente Bolsonaro, para “impedi-lo de
fazer um excelente governo”20.

Por fim, o próprio Bolsonaro compartilhou um vídeo nas suas redes sociais,
onde o pastor congolês Steve Kunda, no programa de TV evangélico do pastor Cássio
Miranda, faz a profecia, de que ele, Bolsonaro é “um enviado de Deus”21

Todo esse conjunto de informações nos leva a formulação de que, se a presença


pública das religiões cristãs conservadoras e tradicionalistas, não está determinando os
rumos econômicos e as decisões políticas cruciais do governo, ela está servindo através
de seu imaginário, ritualística e gramática de suporte para a legitimação da figura de
Bolsonaro enquanto encarnação de uma forma populista de poder.

E como já ocorreu em outros períodos da história do Brasil, quando a Igreja


Católica cumpriu este papel, durante o período varguista e quando do golpe de estado de
1964, a religião termina funcionando como fiadora moral deste novo regime

19
Disponível em https://noticias.gospelmais.com.br/bolsonaro-nao-consagra-brasil-nossa-senhora-114627.html

Acesso em 27/05/19

20
Disponível em https://veja.abril.com.br/politica/edir-macedo-pede-que-deus-remova-quem-se-opoe-a-bolsonaro/
Acesso em 27/05/19

21
Disponível em https://pleno.news/brasil/politica-nacional/bolsonaro-posta-video-em-que-pastor-diz-que-deus-
o-escolheu.html
autoritário no país, como tantos outros que pontuaram no passado a história da América
Latina.

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