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Piano III

2012
Prof. Ms. Marçal Fernando Castellão

Objetivos:

 Refletir sobre o papel da notação musical no estudo e performance da música para


piano.

 Realizar uma pequena contextualização histórica sobre a evolução da notação musical.

 Discutir sobre representação e relevância da escrita musical para a interpretação.

Introdução:

Acredita-se que a origem da música remete aos primórdios da humanidade,


muito antes da civilização grega. Ibrahim Chaim, importante historiador, em seu
livro sobre história da música alega que culturas antiqüíssimas como os
egípcios, hebreus e os povos orientais “...possuíam uma arte musical
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relativamente desenvolvida” (p.7). Ele ainda alega que “alguns desses povos
possuíam algum tipo de escrita musical como atestam traços indecifráveis de
notações musicais encontradas em materiais arqueológicos” (p. 8).

Na verdade, muitos autores concordam que a música sempre esteve presente


nos primórdios das civilizações estando quase sempre relacionada à alguma
manifestação religiosa, festiva ou de batalha. Existem muitas razões para se
acreditar que a principal forma de transmissão dessa produção musical
primitiva era via oral, contudo, com o passar das eras, foi necessário a
utilização de outras formas de transmissão e registro da produção musical.

A evolução da notação musical.

A notação musical, de um modo simplista, é constituída por um conjunto de


sinais gráficos que determinam os sons e seus diversos fatores. Pela
perspectiva histórica, vemos que a notação musical é posterior ao fenômeno
sonoro, ou seja, ela aparece depois de uma cultura musical mais ou menos
estruturada. De qualquer forma, a escrita musical “evoluiu” juntamente com a
evolução da música executada, foi se transformando à medida que essa
música se tornava mais complexa necessitando de outros recursos de escrita.

Uma das primeiras notações musicais era a neumática, ela possuía esse
nome porque se utilizavam os neumas: espécie de sinais que não indicavam
nem a altura exata e nem a duração do som limitando-se em apenas indicar o
momento de elevação e declinação de uma nota ou grupo de notas entoadas
no cantochão. Dessa forma, a notação se estabelece de forma bastante
imprecisa impedindo o registro fiel do fenômeno sonoro.

Exemplo 1: escrita nemática:

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ZAMPRONHA, 2000 p.22

Platzer, em seu livro Compêndio de Música, afirma que “o aumento da precisão


da notação musical segue a ordem: altura, duração, intensidade e timbre”
(PLATZER,ano, p.8) . Em concordancia com Platzer, Zampronha afirma que
“no decorrer dos séculos, a notação teria se transformado no sentido de
produzir um registro cada vez mais preciso e detalhado da informação musical.
Gradativamente notas, durações, dinâmicas, formas de ataque, timbres,
andamento, caráter expressivo e outras tantas informações passaram a ser
especificadas, sempre na direção de se obter maior precisão no registro”
(ZAMPRONHA, 2000 p. 13). Esse mesmo autor ainda complementa que o
surgimento de uma notação se relaciona com uma necessidade musical,
assim, código escrito nasce quando o anterior não atende mais as
necessidades musicais.
Sobre esse pensamento, passou-se a grafar as alturas dos cantos gregorianos
do século IX, assim, a notação passou a ser como no exemplo abaixo:

Exemplo 2: notação canto gregoriano.

PLATZER, 2006, p. 9

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Notemos que em ambos os exemplos, a música está vinculada a um texto, na


primeira notação não é necessário grafar as alturas porque o texto é mais
entoado que cantado, já na segunda notação, é necessário grafas as alturas
pois os contornos melódicos são mais delineados.
A próxima notação já exibe de forma bastante rudimentar, marcações de
duração. Essa notação ainda carente de precisão musical denomina-se
tablatura e “é um sistema vigente no século XIV. Nesse sistema, letras,
algarismos e outros sinais são utilizados em um diagrama com função de
nortear o executante na produção de uma nota ou acorde em seu instrumento.
Outras indicações extras servem para mostrar a duração das notas”.
CASTELLÃO, 2009 p. 7)

Exemplo 3: Tablatura.

ZAMPRONHA, 2000 p.56

As linhas representam as cordas do alaúde, os números representam as casas


em que as respectivas cordas devem ser pressionadas. As hastes de colcheia
e semicolcheia já são referências à duração do som, contudo, o compasso
continua inexistente.

A notação tradicional passa a fazer parte do universo musical a partir do século


17 e vigora até os dias de hoje, ela é composta por uma gama muito mais rica
que as notações anteriores, nesse tipo de notação, os parâmetros do som
podem ser registrados com um nível alto de precisão (com exceção do timbre).
Veremos mais sobre essa notação no próximo tópico.

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Exemplo 4: Notação tradicional para piano.

Por ultimo, apresentaremos a notação contemporânea, existem vários tipos de


notação de música do século XX que em geral, se apresentam sob uma forma
mais gráfica e trazem mais indicações sobre o modo de execução. A notação
moderna geralmente consegue registrar mais precisamente o timbre com todas
as suas nuances .

Exemplo 5: notação moderna

ZAMPRONHA, 2000 p.57

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Algumas considerações sobre a notação tradicional.

Antes de discutirmos sobre a notação tradicional, vamos pensar um pouco a


seu respeito. Como você a define, para que serve, e qual a importância que a
partitura tem para você.

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Sob a perspectiva histórica, a notação musical sempre esteve associada às


necessidades musicais, é posterior e ao mesmo tempo subordinada à música
executada. As transformações na notação aconteceram para propiciar a melhor
precisão no registro dos parâmetros do som. Desse modo, a partitura pode ser
entendida como “um conjunto de sinais que indicam os sons e os diversos
fatores, como devem ser tocados, mas de uma forma que só pode ser
considerada como indicação aproximada” (TREIN, 1986 p. 10).

Sob esse ponto de vista, a função da partitura seria apenas a de tornar


possível o registro da música e de prescrição no sentido de fornecer ao
executante as informações sobre o modo de como a música deveria ser
tocada. A partitura também é vista como limitada na prescrição dessas
informações, algumas vezes até prejudicial no que diz respeito à própria
interpretação.

Muitos compositores têm uma visão negativa sobre a escrita musical.


“Stockhausen refere-se à partitura como mero registro que é por natureza

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imperfeito... Pierre Schaeffer qualifica a notação como tendenciosa e nefasta”


(ZAMPRONHA, 2000 p.37). E Arnold Schoenberg em seu livro Style and Idea
(1975), diz que a notação por ser anterior à música, deve se adaptar-se a ela
facilitando a performance.

Todas essas visões como podemos perceber, referem-se à escrita musical


como um código secundário, há, portanto, a separação evidente entre
música e escrita como se não tivesse um elo entre esses dois fenômenos.

A partitura é tão distante assim do fenômeno sonoro? Seria possível um


código se afastar tanto da sua realização? Será esse o motivo de existir
tantas performances diferentes da mesma música? O que você pensa a
respeito dessas diferentes visões sobre a partitura?

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Zampronha (2000) critica essa visão da partitura como código secundário, ele
qualifica essa visão como limitada e ingênua. Segundo o autor, à medida que a
partitura se transforma para se adequar às necessidades musicais, ela
possibilita a criação novos efeitos sonoro que por sua vez geram novas
notações, constituindo-se dessa forma, um ciclo entre forma sonora e forma
escrita. O autor ainda cita o exemplo da notação da idade média que para
possibilitar o registro das melodias, contribuiu para o surgimento da polifonia, o
mesmo acontece com a música dodecafônica que emergindo da notação
tradicional, necessitou de outras formas de notação que conseguiam se
relacionar melhor com essa nova linguagem musical.

Notação Fenômeno
Musical sonoro

Dessa forma, a notação pode ser vista como grande representante da evolução
da própria linguagem musical ao longo da história, ela é um sistema de
representação ligado ao fenômeno sonoro como podemos constatar pelo ciclo
que é formado pela relação entre notação e música. Notemos que essa visão
torna a partitura muito mais viva e dinâmica ao se preservar a inter-relação

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entre o fenômeno sonoro e a escrita, onde os elementos de um contribuem


para o desenvolvimento do outro.

A partir dessas duas abordagens sobre a notação musical, apresente com suas
palavras a diferença entre elas, e em seguida, apresente também uma
conclusão onde você pode se posicionar entre uma das duas ou apresentar
uma nova visão sobre a escrita musical.

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É importante formularmos um conceito sobre a partitura, pois a própria


interpretação depende de como a enxergamos. A partitura é o principal veículo,
para não dizer o único, de acesso ao repertório erudito, então, nossa relação
com ela (partitura) constitui a base para a interpretação, esse é o motivo pelo

qual considero o estudo da partitura como uma pré-interpretação.

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Se enxergarmos a partitura como um código limitado, como nos


embasaremos para construir nossa interpretação? Dependendo do
professor? Copiando performances de outras pessoas? Ou
tomando nossas decisões nos baseando somente na intuição? Por
outro lado, se não conseguimos extrair da partitura as informações necessárias
para a interpretação, a limitação não seria a forma com que lidamos

com ela? Vocês, alguma vez, já pensaram na quantidade de


informação que a partitura apresenta? Conseguimos absorver todas
ou pelo menos a maioria, ou ainda, lembrar dessas informações
quando tocamos?

Na verdade é que levamos muito pouco em consideração os signos que lemos


na partitura. Damos maior importância a certos signos como a posição das
notas e sua duração e negligenciamos outros dados que são igualmente
importantes.

Vimos que a partitura é um código de sinais, mas quais são esses sinais? Que
aspectos do som a partitura pretende representar e como essa representação
acontece de fato?

Nas próximas aulas, apresentaremos e analisaremos os signos presentes na


partitura conceituando-os e realizando as conexões entre signo e realização, o
que podemos chamar de processo de tradução, explicando de outro modo,
estaremos reforçando a habilidade de ler um signo e traduzi-lo sobre a forma
de som. Essa habilidade pode ser tanto aplicada em nossa performance quanto

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na pedagogia dando as devidas orientações ao iniciante para a leitura da


partitura.

Bibliografia consultada:

PLATZER, Frédéric; ALMEIDA, Laura Maria de. Compêndio de Música.


Lisboa: 70, 2006.

ZAMPRONHA, Edson S. Notação, representação e composição: um novo


paradigma da escritura musical. [São Paulo]: Annablume: FAPESP, 2000

LACERDA, Oswaldo. Regras de grafia musical. São Paulo: Irmãos Vitale,


1974

TREIN, Paul. A linguagem musical. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1986.

SCHOENBERG, Arnold; STEIN, Leonard. Style and idea. London: Faber, 1975

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