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INTRODUÇÃO E EPIDEMIOLOGIA
A dor torácica é uma causa frequente de recurso ao serviço de urgência, representando cerca de 0,25-0,30%.
É atualmente a principal causa de envio à consulta de Cardiologia Pediátrica (6 a 12%) de crianças mais velhas
e adolescentes.
Em idade pediátrica, ao contrário dos adultos, as causas são geralmente benignas, com etiologias diversas e
raramente de causa cardíaca. É um motivo de preocupação da criança e da família pela sua associação a
doença grave, geralmente cardíaca.
A sua prevalência é igual em ambos os sexos. Afeta todas as idades, com uma média de idade de 12-13 anos.
Nas crianças mais pequenas é mais provável estarmos perante uma dor de etiologia orgânica
Nos adolescentes a dor de origem psicogénica e idiopática são mais frequentes
A dor torácica revela um carácter crónico em 45 a 69% dos casos
80% resolve "com o tempo".
ETIOLOGIA
Existem muitas patologias associadas a dor torácica, sendo fundamental distinguir a causas cardíacas das não
cardíacas, e as causas traumáticas das não traumáticas.
Idiopática
É a causa mais frequente de dor torácica (21-45%), com uma resolução total até 3 anos em 80% dos
casos. É caracterizada por uma dor sem agravamento progressivo, descrita como aguda, de curta
duração, que surge com ou sem o exercício físico. Fraca relação com atividade. Tem um caracter
recorrente, podendo durar semanas a meses.
Exame objetivo normal. Dor não reprodutível.
Tratamento: Tranquilizar os pais e a criança; Informar sobre a evolução; Acompanhar até à resolução
da dor.
Músculo-esquelética
É uma causa frequente de dor torácica (15-31%), associada à pratica de desporto, traumatismos, uso
de mochilas pesadas. é devido a traumatismo ou sobrecarga de músculos, ligamentos e articulações.
É fundamental obter a historia detalhada da atividade física e do contexto temporal.
No exame objetivo é possível reproduzir a dor através da palpação/ contração da área afetada.
A costocondrite consiste na inflamação de uma articulação costo-condral, esternoclavicular ou
esternocostal. Pode durar meses e é habitualmente unilateral, localizando-se tipicamente entre
a 4a e 6a articulação costo-condral esquerda, sem tumefação evidente. A dor surge em repouso
ou com o exercício, sendo agravada pela respiração profunda. A dor é reprodutível pela
palpação local. O tratamento consiste em repouso e AINE´S mas resolve-se espontaneamente.
O síndrome de Tietze é uma forma rara de costocondrite, que cursa com tumefação evidente da
articulação envolvida. Tipicamente afeta a 2a articulação costo-condral ou esternoclavicular
direita, sendo uma dor intermitente, moderada e bem localizada, podendo durar meses a anos.
O síndrome da dor precordial (Texidor´s twinge) é uma dor tipicamente breve, de inicio súbito e
penetrante, localizada no bordo esternal esquerdo e que agrava com a inspiração profunda. Tem
um caracter recorrente e a sua frequência é muito variável. Não é uma dor reprodutível à
observação, apresentando um exame objetivo normal. Resolve espontaneamente, sendo
fundamental tranquilizar a família e a criança.
Respiratória
É uma causa frequente (2-11%) em crianças com idade inferior a 12 anos.
Geralmente é acompanhada por outros sinais e sintomas, de acordo com a patologia subjacente:
Febre, taquipneia, fervores - Pneumonia
Dispneia, sibilos - Asma
Início súbito, SDR, timpanismo - Pneumotórax
Pneumotórax: dor torácica de inicio súbito que agrava com a inspiração. Ao EO observa-se
diminuição da expansão torácica, diminuição do MV, hiperressonância à percussão e diminuição das
vibrações vocais do lado afetado. Pode estar presente taquipneia, cianose e dispneia.
Embolia pulmonar: caracteriza-se por dor pleurítica, taquipneia, tosse, taquicardia e dispneia de
início súbito.
Síndrome torácico agudo: complicação de doentes com drepanocitose, caracterizado por infiltrado
pulmonar a envolver pelo menos um segmento pulmonar. O quadro clínico pode incluir febre,
taquipneia, sibilância e tosse.
Psicogénica
Frequente em adolescentes (0-30%), muito associada a depressão.
Podem apresentar o quadro clássico, com hiperventilação e ansiedade visível. Cefaleias e dor
abdominal recorrente são sintomas típicos acompanhantes, além de sensação de dispneia e
taquicardia. Averiguar a presença de outros sintomas como insónia, diminuição do apetite ou
alterações de comportamento.
Causas frequentes são os ataques de pânico e a síndrome de hiperventilação.
História familiar de depressão ou somatização.
Tratamento: abordagem calma; estabelecer uma relação de confiança; referenciar à Pedopsiquiatria.
Gastrointestinal
Pouco frequente (2-8%).
Na história clínica averiguar relação com refeições (e determinados alimentos), posição (decúbito/
ortostatismo), horário, além de sinais e sintomas acompanhantes (pirose, regurgitação,
hipersensibilidade epigástrica).
As causas mais frequentes são Esofagite por refluxo gastro-esofágico e Corpo estranho esofágico.
Refluxo gastro-esofágico: a dor torácica é escrita como um aperto ou queimadura de localização
subesternal e que por vezes irradia para as costas. Ocorre após as refeições, podendo acordar a
criança à noite e agrava com o stress emocional.
Corpo estranho esofágico: dor torácica retroesternal associada a disfagia, sialorreia e, mais
raramente, dificuldade respiratória (estridor ou sibilos).
Cardíaca
É uma causa rara de dor torácica (1-6%) mas mais preocupante. Causas:
Lesões congénitas: Estenose aórtica, Miocardiopatia hipertrófica, Prolapso da válvula mitral,
ALCAPA, Estenose pulmonar severa
Causas adquiridas: miocardite, endocardite, pericardite, enfarte agudo do miocárdio, doença de
Kawasaki, consumo de cocaína
Arritmias: taquicardia supraventricular e ventricular.
No exame objetivo procurar sinais específicos, como: sopros, galope, desdobramento do 2º som,
hepatomegália, sinais de choque e/ou de baixo débito.
Miocardite: quadro clínico caracterizado por dor torácica, taquicardia e palpitações; por vezes
também apresentam dispneia de esforço e mau estado geral. Ao EO apresenta diminuição dos
sons cardíacos e ritmo de galope. A radiografia tórax revela cardiomegália e o ECG apresenta
diminuição dos potenciais, depressão do segmento ST e inversão da onda T.
Pericardite: quadro clínico caracterizado por dor torácica intensa do tipo facada, por vezes
irradia para o ombro esquerdo, que agrava com a inspiração profunda e o decúbito, e melhora
com a posição sentada. Ao EO revela atrito pericárdico intermitente, sobretudo no bordo
esternal esquerdo e ao suster a respiração, e pulso paradoxal (se derrame associado). A
radiografia tórax pode ser normal, e o ECG revela elevação do segmento ST e diminuição global
dos QRS em caso de derrame associado.
Traumática
É uma causa frequente em crianças mais velhas. Causas mais frequentes:
Contusão de partes moles
Fratura de costela
Mais raras mas mais graves são o pneumomediastino, pneumotórax de tensão, tamponamento
cardíaco e hemotórax.
Outras causas possíveis são
HISTÓRIA CLÍNICA
História clínica
Intensidade
Limita a atividade física? Acorda à noite? Causa absentismo escolar?
Quando
Início? Frequência? Duração? Surgiu em que contexto?
Natureza/ Tipo de dor
Aperto? Picada? Queimadura? Facada? Dor muda?
Localização
Onde? Irradiação?
Sintomas associados
Tonturas, síncope, sudorese, palpitações, náuseas (origem cardíaca)
Febre, taquipneia, tosse, dispneia (origem respiratória)
Vómitos, regurgitação, disfagia, pirose (origem gastrointestinal)
Queixas sintomáticas recorrentes, como cefaleias, dor abdominal ou dor nos membros
inferiores (origem psicogénica)
Antecedentes pessoais
Asma, cardiopatia congénita, endocardite infeciosa, arritmias, alterações da coagulação,
drepanocitose
Cirúrgicos (correção de CIA, CIV ou FOP com patch/ coil)
Antecedentes familiares
Asma
Drepanocitose
Alterações da coagulação (Fator V de Leiden, Deficiência de proteína C ou S)
Arritmias (síndrome de Brugada, síndrome QT longo)
Miocardiopatia, Morte súbita
EXAME OBJETIVO
Exame Objetivo
Impressão clínica da criança e inspeção
Bom estado geral? Gravemente doente? Trauma? Lesões ou deformações aparentes?
Temperatura
Padrão respiratório
FR, SpO2, SDR, Hiperventilação, Respiração superficial
Palpação
Dor local, vibrações vocais, percussão, enfisema subcutâneo
Fundamental palpar articulações costo-condrais e costelas
Auscultação
Sopros, galope, fervores, assimetrias do murmúrio vesicular
Circulação
TA (membros superiores e inferiores), FC, pulsos centrais e periféricos, TRC.
SINAIS DE ALARME
Patologias com risco de vida: embolia pulmonar, hipertensão pulmonar, síndrome torácico agudo.
EXAMES COMPLEMENTARES
Em caso de dor torácica não traumática, sem alterações no exame objetivo não é necessário a
realização de exames complementares.
Em caso de traumatismo leve ou moderado, com dor reprodutível por palpação ou percussão, sem
outras alterações no exame objetivo não é necessário a realização de exames complementares. Nestes
casos a realização de ECG 12 derivações e radiografia tórax devem ser realizados se:
● Suspeita de fratura de costela
● Suspeita de doença cardíaca
● Se a dor for intensa
● Se o mecanismo do traumatismo for de risco (acidente de viação, queda de altura)
● Existir grande angústia/ preocupação por parte da criança e família
Nos casos de traumatismo deve ser ainda realizado ecocardiograma em suspeita de contusão do
miocárdio ou tamponamento cardíaco.
QUANDO REFERENCIAR
A criança deve ser referenciada à consulta de Cardiologia Pediátrica se apresentar:
Antecedentes familiares de Morte súbita, Síndrome QT longo ou Miocardiopatia dilatada
Antecedentes pessoais de doença cardíaca
Dor desencadeada pelo exercício e/ou acompanhada de vertigens, síncope ou palpitações
Exames complementares de diagnóstico com alterações
Grande angústia/ preocupação por parte da criança e família
BIBLIOGRAFIA
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o Félix M. Dor torácica em pediatria: Psicossomático ou nem por isso?. www.spp.pt (acedido em Janeiro 2016)
ALGORITMO
+ -
Avaliar lesão cardíaca,
Sopro, Arritmia, Síncope, Polipneia, sibilos, fervores,
insuf. cardíaca, pericardite,
Dor com exercício/ esforço dor à inspiração, febre...
abuso de drogas...
+ -
Pneumonia
+
Derrame pleural
Radiografia tórax Dor à palpação
Pneumotórax
muscular
Fraturas
Tumor... - - +
Asma?
Vigiar / Aguardar Dor à palpação Dor muscular
esterno
- +
Trânsito EG + Costocondrite
Prova antiácidos Agrava em decúbito e/ou -
sintomas GI
+ - Avaliar ansiedade
- - +
RGE Radiografia tórax
Vigiar Psicogénica?
+ Pneumonia
Derrame pleural
Pleurisia...