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Adolescência - Prevenção 2 PDF
Adolescência - Prevenção 2 PDF
Abstract:The present work discusses the insertion of the psychologist in preventive works on the abuse of
alcohol and other drugs. Brazilian epidemiological data on drug consumption are analyzed and alcohol
abuse is characterized as a serious problem of public health in our country. It is shows that, as in other
population segments, university students’ alcohol and other drugs abuse requires the development of
specific preventive actions. A workshop to reduce the harms associated to alcohol abuse in university
students is described and the fundamental basis of harm reduction strategies are stressed. Finally, the work
Hilda Regina
emphasizes the importance of the psychologist’s insertion in this area and the imperative need of technically
Ferreira Dalla Déa capacitating psychologists, not only with respect to clinical practice, but also to develop preventive actions.
Key Words: Psychologist, prevention, alcoholism.
Professora titular do
Depto. de Psicologia
do Desenvolvimento e
coordenadora do
Aprimoramento Clínico
Institucional O
Psicólogo e a
Prevenção ao Abuso
de Álcool e Outras
Drogas (PUC-SP).
Psicólogo(a), (as)
aprimorando(a), (as).
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A Inserção do Psicólogo no Trabalho de Prevenção ao Abuso de Álcool e Outras Drogas
utilizaram bebidas alcoólicas até embriagar-se. No sobre a sua descriminalização e seu uso
último levantamento (1997), 11% da população terapêutico fez com que os jovens passassem a
pesquisada relatou ter brigado e 19,5% faltado à relatar mais freqüentemente seu uso, que sempre
escola depois de beber. Quando comparado a foi elevado.
drogas como maconha, cocaína, heroína ou
tabaco, o álcool é a substância cujo uso crônico Nos quatro levantamentos realizados, os ansiolíticos
leva a maior risco orgânico, entendendo-se como e os anfetamínicos (moderadores do apetite)
risco não só a probabilidade de ocorrência de sempre apareceram entre as drogas mais
problemas, mas também a sua gravidade (Masur & consumidas pelos estudantes, com uma utilização
Carlini, 1989). Os principais danos orgânicos nitidamente maior no sexo feminino. Em algumas
associados ao uso crônico de álcool são gastrite capitais, há tendência para o aumento do uso
(em geral, é o problema que aparece mais cedo), freqüente e do uso pesado de ambos os tipos de
aumento da pressão arterial, pancreatite, drogas. Por se tratar de substâncias que
4
miocardite, hepatite e cirrose alcoólica, distúrbios reconhecidamente induzem a dependência , seu
neurológicos graves, alterações da memória e lesões uso sem controle médico é potencialmente
no sistema nervoso central. perigoso. Além disso, muitos casos de anorexia
nervosa iniciam-se após a utilização de
Entretanto, ao contrário dos efeitos orgânicos anfetamínicos em regimes conduzidos
decorrentes do uso crônico de cocaína ou mesmo incorretamente.
do tabaco, os danos associados ao álcool levam
um tempo mais longo para aparecer, da ordem de O uso de cocaína vem-se popularizando entre os
cinco a dez anos. Por isso, raramente encontramos estudantes - das dez capitais estudadas, apenas no
jovens alcoolistas, embora o aumento de consumo Rio de Janeiro e em Recife não se observou
de álcool que vem ocorrendo nas faixas etárias tendência de aumento do uso na vida. O uso
mais baixas possa modificar essa situação. freqüente cresceu em oito capitais (inclusive em
São Paulo). Da mesma forma, o uso pesado
O uso inicial de tabaco também é bastante apresentou aumento em quase todas as capitais.
precoce, sendo que, aos 10-12 anos de idade, Por outro lado, o uso de “crack” aparece muito
cerca de 12% já experimentaram essa substância. raramente - as baixas porcentagens para uso de
Há tendência de aumento no uso freqüente e no “crack” entre os estudantes possivelmente
uso pesado em quatro das dez cidades estudadas. significam que, como a dependência do “crack” é
sempre muito severa, aqueles que começam a
Os inalantes são substâncias presentes em produtos usar essa droga perdem rapidamente o vínculo
industrializados como esmalte, cola de sapateiro, com a escola.
corretivos de tinta, fluidos de isqueiro, lança-
perfume, entre outros. Em todos os levantamentos Mesquita, Bucaretchi, Castel e Andrade(1995), em
realizados, os inalantes só foram superados pelo seu estudo sobre o uso de substâncias psicoativas
álcool e pelo tabaco. Freqüentemente associado a por estudantes da Faculdade de Medicina da USP,
.
4 Estado psíquico e algumas populações marginalizadas, como meninos em verificaram que o álcool é a droga mais usada,
vezes físico resultante da situação de rua, o uso de inalantes tem sido muitas com taxas de prevalência de uso na vida de 82%,
interação entre um organismo vezes compreendido como uma resposta a uso no ano, 76% e uso no mês, 69%. De maneira
vivo e uma substância,
caracterizado por modificações
condições de vida extremamente precárias. geral, o álcool é a droga que mais conta com a
de comportamento e outras Entretanto, como salientam Dalla-Déa, Almeida, aprovação dos alunos, tanto em relação à
reações, que sempre incluem um Silveira e Toledo (1999), o uso dessas substâncias experimentação quanto ao uso regular.
impulso a utilizar a substância por jovens de classe média indica que esse
de modo contínuo ou periódico,
com a finalidade de fenômeno não se restringe à influência de fatores Andrade, Bassit, Kerr-Corrêa, Tonhon, Boscovitz,
experimentar seus efeitos como a fome, a miséria e a marginalização, mas Cabral, Rassi, Potério, Marcondes, Oliveira, Dualibi
psíquicos e, algumas vezes, de também é influenciado por pressões de grupo e e Fukushima (1997) avaliaram o consumo de
evitar o desconforto da privação
(Organisation Mondiale de la
por aspectos da subjetividade do usuário e de seus drogas em 5225 alunos de nove escolas de
Santé, 1969). conflitos, tanto individuais quanto familiares. Medicina do Estado de São Paulo. Os resultados
confirmam os achados do trabalho anterior - a
5 Dalla-Déa, H.R .F, Souza, No último dos quatro levantamentos (Galduróz, droga mais usada foi o álcool, seguida pelo tabaco,
R.M. Entre a Cervejinha e o
Alcoolismo – o Espaço para a Noto e Carlini 1997), a maconha mostrou uma solventes, maconha, tranqüilizantes e cocaína. Não
Prevenção ao Abuso de Álcool nos tendência de aumento do uso na vida. O uso foram encontradas diferenças entre os estudantes
Campi Universitários. freqüente e o uso pesado também cresceram da capital e do interior.
Manuscrito não publicado.
significativamente. Os autores sugerem que esses
resultados podem ser interpretados de duas Um estudo preliminar sobre o uso de bebidas
maneiras: ou o uso dessa substância realmente alcoólicas por estudantes de Psicologia da PUC-
5
aumentou, ou a mudança de atitude da sociedade SP e suas atitudes em relação ao álcool obteve
110 frente à maconha, possibilitando os atuais debates resultados semelhantes, porém mais elevados do
A Inserção do Psicólogo no Trabalho de Prevenção ao Abuso de Álcool e Outras Drogas
A Prevenção ao Uso Abusivo de Alcohol Screening and Intervention for College Students),
Álcool que obteve como resultado uma redução significativa
dos problemas associados ao uso de álcool e dos
O uso abusivo de álcool não começa na sintomas de dependência ao álcool. Estudos
universidade, mas representa a continuidade e, por longitudinais mostraram que essa redução se manteve
vezes, o agravamento de um padrão de uso mesmo após cinco anos da participação no programa.
estabelecido anteriormente. A grande maioria dos
jovens abandona o hábito de beber pesadamente
Esse programa leva em consideração aspectos do
e supera os problemas relacionados ao álcool sem
assistência ou tratamento, porém, enquanto isso desenvolvimento, aspectos motivacionais e elementos
não acontece, eles são vulneráveis a uma miríade de informação. É um programa de redução de danos,
de conseqüências perigosas. Por isso, um objetivo portanto, seu objetivo primário não é a abstinência
importante dos programas de prevenção deve ser ou a diminuição do uso de bebidas alcoólicas, mas a
ajudar os jovens a atravessar mais seguramente essa redução dos comportamentos de risco e dos danos
janela de risco. produzidos pelo álcool.
O enfoque de redução de danos, difundido em
nosso país a partir da epidemia de AIDS, vem sendo Os principais pressupostos que nortearam o
ampliado para outros comportamentos de risco, desenvolvimento do BASICS são sintetizados a seguir:
como abuso de álcool e outras drogas. A redução
de danos lida, de modo efetivo, com indivíduos ● alguns momentos do desenvolvimento contribuem
que têm algum tipo de comportamento de risco, e para o beber em excesso, como, por exemplo, o
opta pela saúde e pela responsabilidade pessoal,
início de uma nova fase na vida escolar e o
ao invés da doença e da punição. Pode ser
aplicada a toda a população que se distribui ao afastamento da família.
longo de uma escala contínua de risco – de baixo
a moderado e alto. ● fatores que mantêm o comportamento de beber
excessivamente nos jovens são diferentes dos que
A redução de danos configurou-se, nos Países Baixos, mantêm esse comportamento nos adultos.
como uma política definida “de baixo para acima”,
baseada na defesa do dependente. Não surgiu através ● Fatores pessoais (como mitos sobre o álcool) e
de políticas autoritárias, formuladas pelos órgãos fatores sociais (pressão do grupo, convivência com
oficiais. Para o uso e a dependência de drogas, o amigos que bebem muito) contribuem para o uso
modelo de redução de danos representa uma excessivo de bebidas alcoólicas e devem ser levados
alternativa de saúde pública para os modelos moral/ em conta no delineamento de ações preventivas.
criminal e de doença. Assume o fato de que muitas
pessoas usam drogas e promove acesso a serviços ● metas definidas pelos próprios jovens em relação
de baixa exigência. Sua idéia central é encontrar o ao seu comportamento de beber são mais efetivas
do que os objetivos estabelecidos ou cobrados pelos
indivíduo onde ele está, e não onde ele deveria
outros.
estar (Marlatt, 1999). Por isso, embora reconheça a
abstinência como resultado ideal, a redução de
● A redução dos riscos associados ao uso abusivo
danos aceita alternativas que possam reduzir os
de álcool é, em si mesma, um objetivo válido para
danos associados ao uso de drogas.
uma intervenção preventiva.
Embora possam reconhecer que seu padrão de
uso de álcool leva a certos perigos ou riscos, os “Bebidas alcoólicas – vamos
jovens que bebem excessivamente podem ser destilar essa idéia?”
incapazes de reduzir seu consumo e controlar esses
riscos. Para isso, precisam desenvolver estratégias e A partir dos pressupostos acima, desenvolvemos a
habilidades para neutralizar as pressões que os oficina “Bebidas alcoólicas – vamos destilar essa
motivam a beber. Programas que os auxiliem a idéia?” como parte das atividades do
desenvolver essas estratégias e habilidades podem Aprimoramento Clínico Institucional “O Psicólogo
modificar significativamente seu comportamento e a Prevenção ao Abuso de Álcool e Outras Drogas”,
de beber de alto risco. da Clínica Psicológica Ana Maria Poppovic, da
Faculdade de Psicologia da PUC-SP.
Dimeff, Baer, Kivlahan & Marlatt (1998)
desenvolveram, na Universidade de Washington, Seu objetivo é reduzir os riscos associados ao uso
112 Seattle, um programa de triagem e intervenção excessivo de bebidas alcoólicas pelos estudantes
breve para bebedores de alto risco (BASICS - Brief que acabaram de ingressar na universidade, de
A Inserção do Psicólogo no Trabalho de Prevenção ao Abuso de Álcool e Outras Drogas
No último encontro, essas questões conceituais conhecer melhor os efeitos do álcool sobre seu
foram discutidas e esclarecidas, e alguns organismo e os riscos que seu uso abusivo pode
participantes já relataram modificações em seu acarretar. Envolve-se também na reflexão sobre sua
comportamento de beber em função da própria forma de lidar com as bebidas alcoólicas e
participação na oficina. O trabalho como um a possibilidade de modificá-la, de modo a reduzir
todo foi avaliado de forma muito positiva pelos os riscos sociais e pessoais do uso abusivo de álcool.
participantes. O trabalho mostrou ainda que, para estudantes da
área de Psicologia, essa atividade remete a uma
reflexão relativa ao seu futuro papel como
profissionais da área de saúde no trato com essa
questão.
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