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Capítulo 3.

Portugal, Estado-Membro Da União Europeia


1. As Finanças Públicas da União Europeia: breve nota em relação à atividade
financeira da União Europeia

Hoje as Finanças portuguesas não se compreendem sem falarmos da União Europeia. Embora não
tenhamos na CRP nada que nos fale de critérios de convergência, hoje estes fazem parte integrante
do nosso Direito Constitucional.

A União Europeia tem as suas próprias instituições e os próprios gastos. Uma parte significativa dos
seus gastos tem a ver com a sua própria estrutura. Mas estas não são as únicas despesas da UE, têm
também despesas com os EM — para que tenham um desenvolvimento harmonioso no seu conjunto
mas também uma parte de despesas que têm a ver com ajudas a países que não são membros da UE.

Dentro das despesas do desenvolvimento harmonioso:


• Agricultura e pesca
• Coesão social
• Programas Erasmus

As despesas sempre que são aliviadas de um lado aumentam de outro. Começaram a aliviar as
despesas da agricultura e pesca. A agricultura e coesão corresponde a 40% da despesa (é a maior
despesa da UE).

Ajudas a países que não são membros da UE:


• Auxilio a reformas aos nossos países vizinhos para que estes se tornem mais democráticos
• Ajudas para investimentos estruturais em candidatos à União Europeia
• Auxilio que se dá aos Estados para que consigam pôr em prática aquilo que é o acervo
comunitário

Receitas da União:
Vinham dos direitos aduaneiros, dos direitos de importação sobre produtos agrícolas e do imposto
que havia sobre o açúcar.
*Todas as receitas cobradas na RA menos os direitos aduaneiros (que revertem a favor da UE), revertem a favor das
RA.

Estes recursos rapidamente se tornaram insuficientes, foram adoptados mais recursos: IVA (imposto
sobre o valor acrescentado), rendimento nacional bruto dos Estados-Membros (esta receita
corresponde a 3/4 do rendimento da UE).

Nós não pagamos um imposto directamente à União Europeia. Acontece que nós pagamos na
mesma mas quem faz a transferência são os Estados, daí que não saibamos exatamente quanto é
transferido em cada ano pelos Estados, qual a parte do nosso rendimento que reverte a favor da UE,
o que deixa a UE um pouco livre para decidir acerca das suas despesas.

A União Europeia tem um orçamento que é equilibrado — saldo nulo — o que se quer é que o
orçamento tenha receitas suficientes a cobrir as despesas. É obrigada a ter saldo nulo. O Orçamento
é muito reduzido, correspondendo mais ou menos a 1% do PIB dos países da UE. Isto tem
problemas: faz com que quando há alguma crise o Orçamento da UE não é suficiente para satisfazer
os problemas.
Quem faz o Orçamento é a Comissão. O Parlamento e Conselho aprovam o orçamento. Quem
executa é a Comissão. Pode executar ou de forma centralizada (realiza ela própria a despesa) ou de
forma partilhada (entrega dinheiro aos EM ou outros países e eles fazem uma micro-gestão dos
custos, atribuem as verbas, etc).

Quem faz o controlo orçamental: É feito de duas formas:


1) Ou pelas entidades da União Europeia
2) Ou pelas entidades nacionais: se a União Europeia dá a cada um dos Estados dinheiro, então faz
sentido que o controlo seja feita internamento

Artigo 317º TFUE - Os EM estão obrigados a colaborar com as instituições e fazer o controlo
dessas verbas.

Controlos Comunitários:
Parlamento Europeu aprova todos os anos a conta, mas o primeiro controlo comunitário começa na
Comissão. Os comissários verificam a execução orçamental que foi feita por cada um dos EM,
pedem relatórios, verificam se as contas são fiáveis ou não. Em última análise é a Comissão que
assume inteiramente a responsabilidade política pela execução orçamental.

Tribunal de Contas Europeu:


Não é um tribunal, é apenas uma câmara de auditoria que faz auditorias não só a Comissão mas a
qualquer órgão ou Estado que tenha dinheiros comunitários.

A Assembleia da República faz o controlo em Portugal e o Tribunal de Contas que tem competência
para fiscalizar a aplicação dos recursos financeiros da UE e a própria AP. Quando são instituídos
órgãos administrativos para fazerem micro-gestão, então há controlo.

2. O direito da União Europeia que se impõe na ordem jurídico-financeira


portuguesa

Os critérios de convergência são quatro:


• Situação das finanças públicas estável
• Taxa de cambio
• Taxa de juros

Hoje em dia o critério que nos interessa é o da situação estável das finanças públicas:
- Défice orçamental inferior a 3% do PIB e dívida pública inferior a 60% do PIB.

Esta consideração dos critérios de convergência veio combater a lógica da despesa publica tal como
a conhecíamos até a década de 90. A ideia geral destes critérios de convergência: assenta numa
disciplina orçamental. Os critérios de convergência quando foram discutidos não foram consensuais
porque as criticas ao Keynesianismo assentam nas ideias neo-liberais do pensamento política.
Corresponde a uma maioria de direito que se formou na europa nessa altura.
Muitos partidos de esquerda sugeriam critérios de convergência com factores sociais. No final dos
anos 90, por exigência do ministro francês da altura, o tratado de Amsterdão passou a ter um
capítulo sobre o emprego.
Em Portugal a aceitação destes critérios é esquizofrenia: por um lado temos uma CRP social e uma
lógica de despesa que nos manda reduzir a todo o custo.

Os critérios obrigam no fundo a que os Estados prossigam políticas que eram um pouco diferentes
das que eram prosseguidas nos anos 90. Em relação a estas medidas ainda não se estabeleceram
consensos.

Estratégias mais usadas no combate ao défice orçamental excessivo:


• Descer as despesas e aumentar receitas
• Privatizações
• Aumento das taxas moderadoras
Era possível pensar noutras estratégias sem ser estas? Estas contentam-se com aceitar a despesa
pública como realidade meramente contabilística.
• Promover o crescimento económico - o problema é como isso se faz. Há quem diga que se faz
por meio do abaixamento de impostos; ou aumento dos investimentos; estratégias de combate
ao desemprego para aumentar o crescimento económico.

Uma coisa é certa, é melhor ficar no euro do que sair do euro. Se Portugal saísse, haveria uma
desvalorização da moeda e o problema é que a nossa divida continuava em euro. Para recuperar
seria muito mais difícil.

Para contrabalançar esta rigidez dos critérios de convergência, a União Europeia começou a assumir
despesas de agricultura, de investigação, e de cooperação (humanitárias).

Para compreender hoje a limitação que nos trazem os critérios de convergência, temos que olhar
para o pacto de estabilidade e crescimento — conjunto de regulamentos em que há no fundo uma
ideia subjacente, um compromisso assumido pelos EM, da Comissão que se compromete a
acompanhar a situação orçamental, e do Conselho que toma decisões rápidas. Este pacto constituiu
fundos.

Em Portugal, o pacto de estabilidade e crescimento é desenvolvido pelo pacto orçamental. Para


países com divida superior a 60% do PIB, aplica-se uma percentagem de 5% que corresponde ao
desvio permitido em relação ao objetivo orçamental de qualquer coisa. Para países com dívida
inferior a 60% o desvio pode ser de 1%.

O pacto de estabilidade tem dois grandes conjuntos de normas: um que tem a ver com a aplicação
de mecanismos preventivos, e mecanismos sancionatórios. Nestes mecanismos preventivos obriga-
se os EM a anualmente apresentar programas de estabilidade em Abril e estão sujeitas a avaliação
previa por parte do Conselho e da Comissão.

O objetivo deste pacto é não ter dívida? Não. A ideia da UE não é que não tenhamos dívida, mas
que tenhamos dívida para a criação da nossa riqueza. Podemos ter dívida se criarmos mais riqueza.
O objetivo da UE é os EM façam uma trajectória que seja sustentável, que não ponha em causa as
gerações futuras, que não coloque os EM em situações de falta de liquidez imediata, os mecanismos
preventivos está pensados para que os Governos não se coloquem em situações difíceis.

Este pacto de estabilidade tem também mecanismos sancionatórios: Caso sejam ultrapassados os
valores, o Conselho declara défice excessivo, sendo que o EM tem de reduzir a divida 20% ao ano.
Para assegurar que reduz esta dívida tem de estabelece um programa orçamental que tem de ser
aprovado pelas instituições comunitárias, para corrigir de forma sustentável o défice. A ideia é
começar por um procedimento mais leve e vai se agravando à medida que os EM ou não cumprem
ou recusam colaborar com as instituições comunitárias. Estas fases vão desde tornar público o
processo, até ao pagamento de sanções.

A nossa CRP não tem previstos os limites nem ao endividamento nem à divida, mas estes limites
entraram na nossa ordem jurídica. Quem defende o primado da UE tem aí um bom argumento para
afirmar isto. A Professora não precisa do primado, basta dizer que entraram por estar na Lei de
Enquadramento Orçamental. É uma lei de valor reforçado, ou seja, não pode ser alterada pela lei
que ela subordina. Nos termos da CRP a LEO está referida e há até quem diga que corresponde a
uma exigência da CRP. No artigo 103º diz que o orçamento se faz de acordo com uma lei — LEO.
Por ser uma lei de exigência de orçamental, a violação da lei corresponde a uma
inconstitucionalidade indirecta. Embora os critérios de convergência não tenha sido recebidos na
nossa CRP, fazem parte do nosso ordenamento jurídico. Nunca poderíamos dizer que o nosso
ordenamento jurídico ignorou os critérios, porque estão na LEO que não é uma mera lei ordenaria, é
de valor reforçado.

A LEO tem valor reforçado, mas este valor não corresponde a nenhum procedimento agravado.
Pode ser alterada por maioria simples da AR, e isto é um problema porque se os critérios estão
nessa lei então podiam ser alterados a todo o momento por uma maioria simples que se formasse
contra esses critérios de convergência.

Não nos devemos ficar pela LEO. Ainda que não esteja no texto da CRP, esta matéria deve ser
encarada como materialmente constitucional: prova disto é a aprovação do pacto orçamental na
AR. Se não ratificássemos o pacto orçamental saiamos do euro. Logo, estas matérias financeiras
sairam do âmbito de decisão constitucional, não são matérias dos Estados, são matérias comuns da
UE. Temos um constitucionalismo multi-nível: Hoje a CRP não pode ser olhada ao novel dos
Estados, tem de ser olhada enquadrando os Estados na realidade internacional e comunitária em que
se integram. Esta é uma matéria em que os Estados perderam autonomia.

Consequências da recepção dos critérios de convergência:


• Recepção dos critérios faz com que o o direito orçamental seja cada vez mais marcado pela
disciplina financeira, sustentabilidade e eficiência. Isto traz associados deveres de
transparência orçamental (em França até se fala de um princípio da sinceridade orçamental,
que consiste em permitir ao Tribunal Constitucional e ao Tribunal de Contas verificar a
veracidade das previsões feitas pelo Governo no Orçamento).
• A AP é cada vez mais avaliada na sua performance, a eficiência tornasse cada vez mais um
critério de qualidade financeira.
• A despesa publica é encarada como uma matéria técnica, o foco é o da eficiência, e
racionalização.
• Despesa publica é cada vez menos uma matéria política.

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