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Diretora-Presidente da ABRAFIN
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PARECER: Nº 58/2017
ASSUNTO: PARECER TÉCNICO
EMENTA: PARECER TÉCNICO-CIENTÍFICO SOBRE A INTEGRAÇÃO
SENSORIAL
INTERESSADO: Conselho Regional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional da Nona
Região - CREFITO-9
1. RELATÓRIO
O presente documento versa sobre a solicitação do Senhor Presidente do CREFITO-9,
Dr. Elias Nasrala Neto, solicitando à ABRAFIN emissão de parecer técnico sobre o
Método Integração Sensorial, tendo como objetivo esclarecer a atribuição legal, a
formação e as competências dos profissionais certificados para a sua prática.
2. FUNDAMENTAÇÃO TÉCNICO-CIENTÍFICA
2.1. INTRODUÇÃO
Primeiramente é necessário deixar claro a semântica de algumas nomenclaturas:
existem intervenções baseadas em integração sensorial e o método de intervenção por
integração sensorial de Ayres® (BLANCHE et al., 2016, WILLARD et al., 2002).
A integração sensorial é a habilidade de integrar informações provenientes de
diferentes sistemas sensoriais, a qual é uma propriedade característica do cérebro.
Pode ser definida como a integração de todas as informações sensoriais, incluindo a
informação tátil, proprioceptiva, visual, vestibular e auditiva, a qual ocorre em
diversas regiões do córtex cerebral, e que contribui para o controle do movimento
voluntário, da cognição e das emoções (SHUMMAY-COOK; WOOLLACOTT,
2010).
Diferenças na responsividade sensorial decorrem de uma má modulação (i.e.,
capacidade de regular e organizar a intensidade e a natureza das repostas) dos
estímulos sensoriais provenientes do ambiente. Mudanças na discriminação sensorial
e na percepção podem levar a déficits na estabilidade postural, no controle visuo-
motor e também no planejamento motor (DUNN, 2014, SHUMMAY-COOK;
WOOLLACOTT, 2010).
IMPORTANTE: As alterações no processo de integração das aferências uni e
multimodais afetam as funções do corpo, as atividades, bem como a participação em
tarefas significativas do dia-a-dia (SHUMMAY-COOK; WOOLLACOTT, 2010).
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algo (por exemplo, o professor de matemática utiliza brincadeiras para ensinar contas
às crianças, o dentista vai usar recursos como brincadeiras com o objetivo de tratar o
dente de uma criança; o Fisioterapeuta Neurofuncional que quer ganhar amplitude de
movimento do membro superior vai usar de brincadeiras para fazer com que a criança
use seu membro superior, etc.).
Porém a ocupação do brincar, ou seja, a atividade funcional brincar, considerando o
brincar como objetivo terapêutico dentro da saúde ocupacional da criança (isto é,
tratar o brincar), este sim, é ato exclusivo da Terapia Ocupacional, porque esse é o
escopo terapêutico da Terapia Ocupacional - a saúde ocupacional (WILLARD et
al., 2002).
A diferença entre os dois “brincar” é que o primeiro é um “recurso terapêutico /
recurso educativo” e o segundo um “objetivo terapêutico”, sendo então evidente que
no primeiro o profissional apenas usa de brincadeiras para atingir um objetivo X ou
Y, e no segundo o objetivo terapêutico é o próprio brincar, ou seja, é fazer com que a
criança brinque e exerça a sua principal atividade ocupacional, dependendo da idade,
que é brincar.
Dito isso, esse parecer vai ter como foco o método ASI®, visto que é ilógico pensar
em atribuições, formação e competências sobre a abordagem ou intervenção baseada
na integração sensorial, um fenômeno neurofisiológico usado por várias áreas para
diferentes fins.
2.2. CONCEITO
O método ASI® é uma teoria sobre a relação entre a organização neural e o
comportamento (MAILLOUX; MILLER-KUHANECK, 2014). O método sofreu
evoluções até a morte da sua criadora Dra. Ayres em 1988. Os primeiros trabalhos de
Ayres foram influenciados por Rood e Bobath, ambas fisioterapeutas, que analisaram
a relação entre os estímulos sensitivos e as respostas motoras no tratamento das
disfunções neurológicas. Mais tarde os trabalhos de Ayres foram influenciados por
Piaget que estudava o desenvolvimento motor e cognitivo (WILLARD et al., 2002,
MAILLOUX; MILLER-KUHANECK, 2014).
Segundo Ayres, a integração sensorial é um processo neurológico que organiza as
sensações do corpo e do ambiente, possibilitando que o corpo seja usado de forma
eficiente na execução de todas as ações, desde a mais simples a mais complexa. O
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sucesso da interação com o ambiente faz com que as crianças desenvolvam respostas
adaptativas, que é uma das ideias centrais desse método (WILLARD et al., 2002).
Para Ayres, quando os estímulos sensoriais são feitos de forma passiva, estes não são
suficientes para promover uma melhor integração sensorial e aprendizagem. Embora
na maioria das crianças a integração sensorial seja atingida naturalmente por meio do
brincar e da interação com o ambiente, em algumas crianças as sensações não chegam
ao cérebro da forma esperada e, portanto, não geram as respostas adaptativas
adequadas (Ex. ao invés de relaxar com o embalo e abraço dos pais, o bebê pode ficar
tenso), como se o cérebro não tivesse aprendido a usar adequadamente as sensações
do próprio corpo ou do ambiente (WILLARD et al., 2002).
Na interpretação de Ayres e no seu método, aprendizagem e comportamento são
aspectos visíveis da integração sensorial, consequentemente, problemas de
aprendizagem e comportamento seriam resultantes de uma má integração das
sensações. Nesse contexto, o método ASI propõe modificar o ambiente, aumentando a
entrada da informação sensorial de forma controlada e no planejamento da resposta
adaptativa adequada (WILLARD et al., 2002).
O método ASI® tem três postulados básicos:
1. A integração sensorial, especialmente vestibular, tátil e proprioceptiva, é
fundamental para um indivíduo ser capaz de interagir com o ambiente;
2. A integração sensorial fornece a base para o aprendizado e a regulação
emocional;
3. Experiências sensoriais fornecidas dentro do contexto de atividades
significativas e com respostas adaptativas ao meio ambiente, vão fortalecer a
integração sensorial e consequentemente a aprendizagem.
Os pressupostos que fundamentam esses princípios são: alimentação sensorial,
plasticidade do sistema nervoso central (SNC), sequência do desenvolvimento,
organização hierárquica do SNC, convergência das modalidades sensoriais, resposta
adaptativa e empenho individual (WILLARD et al., 2002).
Os transtornos de integração sensorial podem ser divididos em três grupos:
1. Transtorno de modulação sensorial: o problema é no limiar das sensações.
2. Transtornos motores com base sensorial: podem ser do tipo dispraxia, em que
as atividades motoras novas não podem ser aprendidas, e os transtornos
posturais, nos quais as crianças têm dificuldade para manter o controle do
próprio corpo para exercer as atividades em determinado ambiente.
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2.3. APLICAÇÃO
A aplicação do método ASI® ainda é pouco documentada em livros textos e artigos
científicos. Apesar disso, entende-se que é uma abordagem de tratamento
individualizada, realizada por profissionais treinados, em um ambiente próprio
(BLANCHE et al., 2016).
Existem diferentes formas de aplicar o método, porém, originalmente, a ASI® deve:
1. Proporcionar estímulos sensoriais ricos e variados;
2. Oferecer desafios na medida certa (nada difícil demais);
3. Contar com a colaboração do paciente para escolha e planejamento da
atividade, proporcionando auto-organização (o paciente deve planejar cada
atividade);
4. Proporcionar um ambiente lúdico para criança e agradável para o adulto;
5. Maximizar o sucesso do paciente e garantir a sua segurança física.
A montagem dos equipamentos utilizados no método ASI demanda um grande espaço
físico e tem custo variado conforme a quantidade de equipamentos (WATLING;
HAUER, 2015). Em alguns ambientes de atendimento com o método ASI®,
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2.6. REFERÊNCIAS
BLANCHE, E. I. et al. Effectiveness of a sensory-enriched early intervention group
program for children with developmental disabilities. American Journal of
Occupational Therapy, v. 70, n. 5, p. 7005220010p1-8, Set.-Out. 2016.
BROZZOLI, C. et al. Neglect and extinction: within and between sensory modalities.
Restorative Neurology and Neuroscience, v. 24, n. 4-6, p. 217–232, 2006.
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LATASH, M.L. et al. Motor control theories and their applications. Medicina
(Kaunas, Lithuania), v. 46, n. 6, p. 382-392, 2010.
PIAGET, J. “Piaget’s theory” in P. H. Mussen (series ed.) & W. Kessen (vol. ed.),
Handbook of child psychology (Vol. 1), New York: Wiley, p. 103–128, 1983.
STEIN, B.E., STANFORD, T.R.. Multisensory integration: current issues from the
perspective of the single neuron. Nature Reviews, Neuroscience, v. 9, n. 4, p. 255–
266, Abr. 2008.
STEIN, B.E. Neural mechanisms for synthesizing sensory information and producing
adaptive behaviors. Experimental Brain Research, v. 123, n. 1-2, p. 124–135, Nov.
1998.
SILVA, L.M.; SCHALOCK, M.; AYRES, R.; BUNSE, C.; BUDDEN, S. Qigong
massage treatment for sensory and self-regulation problems in young children with
autism: a randomized controlled trial. The American Journal of Occupational
Therapy, v. 63, n. 4, p. 423-432, Jul.-Ag. 2009.
THELEN, E.; SMITH, L. A Dynamic Systems Approach to the Development of
Cognition and Action. Cambridge, London - UK, 1994.
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3. INDICAÇÃO NORMATIVA
Em conformidade com as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN), vários
profissionais da saúde, como Fisioterapeutas (RES.CNE/CES Nº 4, 2002),
Fonoaudiólogos (RES.CNE/CES Nº 5, 2002) e Terapeutas Ocupacionais
(RES.CNE/CES Nº 6, 2002), têm em sua formação básica “conhecimentos
necessários para condução da integração sensorial” (DCN, 2002, Art.6º). No entanto,
a ABRAFIN reforça a importância da formação complementar para profissionais de
nível superior como forma de aprofundamento do conhecimento sobre as bases e
fundamentos e aprimoramento do uso de diferentes técnicas e recursos de avaliação e
tratamento com integração sensorial.
Sendo assim, a ABRAFIN entende que o Método ASI® não é um recurso exclusivo
da Terapia Ocupacional. O método pode ser utilizado pelo Terapeuta Ocupacional
para melhorar a participação da criança incluindo o brincar com os amigos, o
desempenho escolar e a participação e engajamento nas atividades familiares e
sociais. Pelo Fisioterapeuta Neurofuncional, o método ASI® pode ser utilizado como
um recurso complementar para a melhora da função do movimento e execução das
atividades, o que consequentemente inclui como estratégia fisioterapêutica a melhora
da sensibilidade somestésica e do planejamento motor, assim como a melhora do
equilíbrio, padrão de marcha, movimento de alcance, preensão e manipulação de
objetos. O que distingue de fato a utilização do Método ASI® por diferentes
profissionais é na verdade o objetivo terapêutico de cada um que deve estar dentro do
escopo de cada profissão.
4. CONCLUSÃO
De acordo com o exposto, fica claro que a integração sensorial é um fenômeno
neurofisiológico, amplamente estudado por diferentes profissionais da área da saúde,
assim como foi pela terapeuta ocupacional Anna Jean Ayres. Embora esse tema tenha
sido fonte de inspiração para desenvolver o método ASI®, nessa mesma época, não
apenas a Dra Ayres, mas vários outros profissionais se basearam nas descobertas de
Sherrington e outros cientistas para criar abordagens terapêuticas baseadas na
integração sensorial, incluindo o biólogo e psicólogo Jean Piaget (Construtivismo), as
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