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Informativo 654-STJ
Márcio André Lopes Cavalcante
ÍNDICE
DIREITO CIVIL
LOCAÇÃO DE IMÓVEIS URBANOS
• O arbitramento do aluguel provisório na ação revisional faz nascer a obrigação do locatário de pagar esse novo
valor e, se não o fizer, tais quantias já poderão ser incluídas na execução que pedia o pagamento de aluguéis
atrasados.
INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA
• Termo inicial dos juros de mora incidentes sobre a restituição das parcelas pagas em caso de resolução judicial do
contrato por iniciativa do promitente comprador de forma diversa da cláusula penal convencionada.
ALIMENTOS
• No acordo ficou ajustado que o devedor pagaria a pensão durante certo tempo; passado esse período, o indivíduo,
por mera liberalidade, continuou pagando; isso não significa, contudo, que ele passou a ter o dever de pagar para
sempre a pensão.
• A genitora do menor alimentando pode prosseguir, em nome próprio, com a execução de alimentos, a fim de receber
os valores referentes aos débitos alimentares vencidos, mesmo após a transferência da titularidade da guarda da
criança para o pai executado?
TESTAMENTO
• O indivíduo que recebeu um imóvel gravado com cláusula de inalienabilidade pode transferir esse imóvel por meio
de testamento, considerando que a cláusula de inalienabilidade vitalícia dura apenas enquanto o beneficiário estiver
vivo.
DIREITO DO CONSUMIDOR
PLANO DE SAÚDE
• Ainda que a iniciativa pelo descredenciamento tenha partido da clínica médica, o plano de saúde tem o dever de
comunicar esse fato aos consumidores e à ANS com 30 dias de antecedência e o dever de substituir a entidade
conveniada por outra equivalente.
COMPRA DE IMÓVEIS
• Termo inicial dos juros de mora incidentes sobre a restituição das parcelas pagas em caso de resolução judicial do
contrato por iniciativa do promitente comprador de forma diversa da cláusula penal convencionada.
DIREITO EMPRESARIAL
MARCA
• Mesmo que exista autorização para que um nome civil seja registrado como marca, para que esse nome seja
registrado como nova marca não abrangida pela primeira, será necessária nova autorização do titular.
RECUPERAÇÃO JUDICIAL
• Não é necessário que o contrato de compra e venda com reserva de domínio tenha sido registrado no cartório para
que ele fique excluído da recuperação judicial, conforme previsto no § 3º do art. 49 da Lei nº 11.101/2005
AGRAVO DE INSTRUMENTO
• Cabe agravo de instrumento contra a decisão interlocutória que acolhe ou afasta a arguição de impossibilidade
jurídica do pedido (mérito do processo – art. 1.015, II, do CPC/2015).
RECURSO ESPECIAL
• Não deve ser conhecido o recurso especial tirado de agravo de instrumento quando sobrevém sentença de extinção
do processo sem resolução de mérito que não foi objeto de apelação.
EXECUÇÃO FISCAL
• Na execução fiscal não cabe a retenção de passaporte ou a suspensão da CNH como forma de compelir o executado
a pagar o débito.
DIREITO TRIBUTÁRIO
IPI
• O valor pago a título de IPI por ocasião da aquisição de brindes que serão inseridos em produtos industrializados
não gera direito de creditamento de IPI.
DIREITO CIVIL
Art. 19. Não havendo acordo, o locador ou locatário, após três anos de vigência do contrato ou do
acordo anteriormente realizado, poderão pedir revisão judicial do aluguel, a fim de ajustá-lo ao
preço de mercado.
A empresa começou a ter dificuldades de fluxo de caixa e atrasou 3 meses de aluguel (junho, julho e agosto
de 2018).
Em razão disso, no começo de setembro, João ingressou com execução pedindo o pagamento dessa
quantia.
Também em setembro, o juiz concedeu liminar na ação revisional, fixando, provisoriamente, o valor do
aluguel em R$ 12 mil.
Diante desse fato, em dezembro de 2018, João peticionou na execução requerendo que a empresa
executada, além de quitar os meses de junho, julho e agosto, pagasse também os aluguéis que venceram
no curso do processo e que a empresa também não honrou (setembro, outubro, novembro e dezembro).
O locador pediu que o juiz já cobrasse a empresa com base no novo valor do aluguel (R$ 12 mil).
A empresa argumentou que, como a decisão fixando os aluguéis é provisória, não se pode dizer que se
trate de obrigação líquida, certa e exigível. Afirmou, ainda, que eventuais diferenças constatadas no valor
dos aluguéis devem ser cobradas na própria ação revisional e são exigíveis somente a partir do trânsito
em julgado da decisão que fixou o novo aluguel.
O pedido de João (exequente) pode ser acolhido mesmo sendo ainda a fixação de um valor provisório?
É possível incluir na execução dos aluguéis as parcelas que vencerem no curso do processo, com base no
valor da locação que foi fixado em ação revisional?
SIM.
Na execução de contrato locatício, é possível a inclusão dos aluguéis vencidos no curso do processo com
base em valor fixado provisoriamente em anterior ação revisional.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.714.393-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/08/2019 (Info 654).
A Lei nº 8.245/91, ao tratar sobre a ação revisional, preconiza que, se o juiz fixar aluguel provisório, ele
será devido desde a citação (art. 68, II).
Assim, o valor do aluguel fixado pelo juiz na ação revisional – seja o provisório ou o definitivo – é um
crédito líquido, certo e exigível do locador, desde a citação na ação revisional.
Desse modo, o arbitramento do aluguel provisório em R$ 12 mil fez nascer a obrigação da
empresa/locatária de pagá-lo no vencimento, a partir da citação, e, por conseguinte, o direito do locador
de exigi-lo, tão logo constatada eventual mora.
Diante desse contexto, não prospera o argumento da empresa de que as quantias cobradas com base na
fixação provisória não eram líquidas, certas e exigíveis.
E se, depois de pagar os aluguéis com base em R$ 12 mil, o valor fixado na ação revisional, ao final, for
inferior (ex: R$ 10 mil). A locatária pagou o valor provisoriamente fixado em R$ 12 mil e, ao final,
chegou-se à conclusão que o valor correto dos aluguéis deveria ser R$ 10 mil. O que fazer, neste caso?
A fixação do aluguel definitivo em quantia inferior à do aluguel provisório (ex: R$ 10 mil) fará nascer, neste
segundo momento, o direito de a locatória pedir a repetição do indébito relativamente às parcelas pagas
depois da citação, ou à compensação da diferença com os aluguéis vincendos.
Conforme explica Sylvio Capanema de Souza:
“Existe unanimidade, entretanto, quanto ao cabimento de ação de execução, para que o locador
reclame o pagamento do aluguel provisório.
Se o aluguel definitivo for superior ao provisório, como ocorre quase sempre, o locatário pagará
as diferenças apuradas e corrigidas, ao final da ação, e nos mesmos autos.
Se for inferior, poderá o locatário reclamar, em ação própria, de repetição de indébito, a devolução
das diferenças pagas a maior, também corrigidas, podendo ainda haver a compensação com as
parcelas vincendas, se assim ajustarem as partes.
Se o pedido for julgado improcedente, também se valerá o locatário dos mesmos mecanismos,
para recuperar o que pagou indevidamente.” (A Lei do Inquilinato comentada. 10ª ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2017, p. 384)
A parte final do art. 69 da Lei nº 8.245/91 exige que ocorra o trânsito em julgado para que se possa
cobrar o valor fixado na ação revisional?
NÃO. O art. 69 da Lei nº 8.245/91 prevê o seguinte:
Art. 69. O aluguel fixado na sentença retroage à citação, e as diferenças devidas durante a ação de
revisão, descontados os alugueres provisórios satisfeitos, serão pagas corrigidas, exigíveis a partir
do trânsito em julgado da decisão que fixar o novo aluguel.
Não se pode dar uma interpretação a esse dispositivo para prejudicar o direito do locador de receber,
desde logo, os aluguéis que lhe são devidos, condicionando o seu exercício ao trânsito em julgado da ação
revisional. Duas são as razões para isso:
1) Em primeiro lugar, porque, nos termos do art. 58 da Lei nº 8.245/91, o recurso de apelação interposto
contra a sentença proferida na ação revisional de aluguel deve ser recebido apenas no efeito devolutivo.
Só isso já cairia por terra o argumento de que seria necessário aguardar o trânsito em julgado. Ora, se a
sentença fixou um valor e a apelação não tem efeito suspensivo, já seria possível a execução provisória.
2) Em segundo lugar, porque as diferenças às quais alude a parte final do art. 69 dizem respeito ao quanto
o valor do aluguel provisório, cobrado antecipadamente, é maior ou menor que o valor do aluguel
definitivamente arbitrado, resultando essa operação matemática de subtração em um crédito para o
locador, se este for maior que aquele, ou para o locatário, na hipótese contrária.
Em outras palavras, quando o art. 69 fala em “exigíveis a partir do trânsito em julgado”, ele está se
referindo ao crédito resultante da diferença entre o que foi efetivamente pago pelo locatário e o que
realmente era devido por ele. É isso que somente pode ser exigido depois do trânsito em julgado. O valor
fixado provisoriamente na ação revisional não precisa aguardar o trânsito em julgado.
INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA
Termo inicial dos juros de mora incidentes sobre a restituição das parcelas pagas em caso de
resolução judicial do contrato por iniciativa do promitente comprador de forma diversa da
cláusula penal convencionada
ALIMENTOS
No acordo ficou ajustado que o devedor pagaria a pensão durante certo tempo; passado esse
período, o indivíduo, por mera liberalidade, continuou pagando; isso não significa, contudo, que
ele passou a ter o dever de pagar para sempre a pensão
Obrigação alimentar extinta, mas mantida por longo período de tempo por mera liberalidade
do alimentante, não pode ser perpetuada com fundamento no instituto da surrectio.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.789.667-RJ, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Rel. Acd. Min. Ricardo Villas
Bôas Cueva, julgado em 13/08/2019 (Info 654).
Alimentos
Pode-se dizer que, neste caso, foram fixados, alimentos transitórios.
Alimentos transitórios são aqueles fixados por um prazo determinado, após o qual cessa a obrigação de
alimentar, mesmo que ainda exista necessidade do alimentando e possibilidade do alimentante.
Assim, os alimentos transitórios não obedecem à regra do rebus sic stantibus, sendo estabelecidos em
razão de uma causa temporária e específica. Terminado o prazo fixado, cessa a obrigação de alimentar,
mesmo que a situação das partes envolvidas permaneça a mesma.
Surrectio
A surrectio (erwirkung) significa que...
- a parte passou a cumprir, na prática, uma obrigação que não estava prevista no acordo
- e, em razão de essa conduta ter se repetido ao longo do tempo,
- pode-se considerar que a parte assumiu essa nova obrigação,
- surgindo, assim, um novo dever contratual para ela não originalmente previsto no contrato.
O pedido de Maria foi aceito pelo STJ? O fato de João, por mera liberalidade, ter continuado pagando a
pensão alimentícia faz com que surja para ele o dever de arcar com essa obrigação por prazo
indeterminado?
NÃO.
A boa intenção de João perante a ex-mulher não pode ser interpretada em seu desfavor.
Informativo 654-STJ (13/09/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 5
Informativo
comentado
A espontânea solidariedade de João, que resolveu pagar durante todos esses anos a pensão, está
relacionada com motivos de ordem pessoal e íntima, e que, portanto, refogem do papel do Judiciário, que
deve se imiscuir sempre com cautela, intervindo o mínimo possível na seara familiar.
Assim, não se pode dizer que houve exercício anormal ou irregular de direito.
A liberalidade de pagar a pensão durante esses anos não gerou direito subjetivo na ex-mulher,
considerando que a própria beneficiária já tinha ciência de que ela não tinha esse direito e que o ex-marido
pagava mesmo sem que o acordo o obrigasse.
Entender em sentido diverso desencorajaria a solidariedade entre ex-cônjuges que já não fazem parte do
mesmo núcleo familiar, o que não é razoável no âmbito do Direito de Família.
Assim, não há falar em ilicitude na conduta do ex-cônjuge, por inexistência de previsibilidade de
pagamento eterno dos alimentos, especialmente porque ausente relação obrigacional.
A boa-fé não pode, nesse momento, ser-lhe prejudicial. Portanto, a teoria do abuso de direito não se aplica
no caso concreto, em que a assistência foi humanitária e, perceptivelmente, provisória.
O dever de prestar alimentos entre ex-cônjuges ou companheiros é regra excepcional que desafia
interpretação restritiva.
No caso, a ex-esposa fez dos alimentos percebidos voluntariamente um modo de subsistência por escolha
própria.
A fixação de alimentos depende do preenchimento de uma série de requisitos e não pode decorrer apenas
do decurso do tempo.
A idade avançada ou a fragilidade circunstancial de saúde, fatos inexistentes quando da separação, não
podem ser imputados ao ex-cônjuge, pois houve tempo hábil para se restabelecer após o divórcio, já que
separada faticamente há quase duas décadas.
Por fim, vale ressaltar que não há título executivo judicial ou extrajudicial apto a ensejar a cobrança dos
alimentos, pois, desde que ultrapassado o prazo de 24 meses a obrigação findou, ficando exonerado o
alimentante do pagamento a partir de então. Como é cediço, a execução desamparada em título judicial
ou extrajudicial é nula.
Em suma:
Obrigação alimentar extinta, mas mantida por longo período de tempo por mera liberalidade do
alimentante, não pode ser perpetuada com fundamento no instituto da surrectio.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.789.667-RJ, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Rel. Acd. Min. Ricardo Villas Bôas
Cueva, julgado em 13/08/2019 (Info 654).
ALIMENTOS
A genitora do menor alimentando pode prosseguir, em nome próprio, com a execução de
alimentos, a fim de receber os valores referentes aos débitos alimentares vencidos, mesmo após
a transferência da titularidade da guarda da criança para o pai executado?
Importante!!!
Atualize o Info 590-STJ
A mãe tem legitimidade para prosseguir na execução de pensão alimentícia proposta à época
em que era guardiã do filho menor, ainda que depois disso a guarda tenha sido transferida ao
pai executado?
4ª Turma do STJ: SIM.
A genitora que, ao tempo em que exercia a guarda judicial do filho, representou-o em ação de
execução de débitos alimentares possui legitimidade para prosseguir no processo executivo
com intuito de ser ressarcida, ainda que, no curso da cobrança judicial, a guarda tenha sido
transferida ao genitor (executado).
STJ. 4ª Turma. REsp 1.410.815-SC, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 9/8/2016 (Info 590).
A mãe tem legitimidade para prosseguir na execução de pensão alimentícia proposta à época em que
era guardiã do filho menor, ainda que depois disso a guarda tenha sido transferida ao pai executado?
4ª Turma do STJ: SIM 3ª Turma do STJ: NÃO
A genitora que, ao tempo em que exercia a guarda A genitora do alimentando não pode prosseguir na
judicial do filho, representou-o em ação de execução de alimentos, em nome próprio, a fim de
execução de débitos alimentares possui perceber os valores referentes aos débitos
legitimidade para prosseguir no processo alimentares vencidos, após a transferência da
executivo com intuito de ser ressarcida, ainda que, titularidade da guarda do menor ao executado.
no curso da cobrança judicial, a guarda tenha sido
transferida ao genitor (executado).
STJ. 4ª Turma. REsp 1.410.815-SC, Rel. Min. Marco Não se pode falar em sub-rogação no caso,
Buzzi, julgado em 9/8/2016 (Info 590). considerando que o direito aos alimentos possui
caráter personalíssimo.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.771.258-SP, Rel. Min. Marco
Aurélio Bellizze, julgado em 06/08/2019 (Info 654).
Vale ressaltar que agora constará na execução a mãe como sendo a exequente. Isso porque a 4ª Turma
do STJ entendeu que há, neste caso, sub-rogação.
A mãe, como arcou com a dívida que era do pai da criança, sub-rogou-se no direito de cobrar o pai como
se fosse o filho.
O CPC/2015 permite que o sub-rogado que não receber o crédito do devedor possa prosseguir na
execução já iniciada pelo credor originário. Veja:
Art. 857 (...)
§ 2º A sub-rogação não impede o sub-rogado, se não receber o crédito do executado, de
prosseguir na execução, nos mesmos autos, penhorando outros bens.
Por fim, deve-se ressaltar que, no processo de execução, a mãe não poderá pedir a prisão civil do devedor.
A 4ª Turma do STJ entendeu que, como houve a alteração da guarda e a execução atualmente está
correndo no interesse da mãe, não é mais possível pedir a prisão civil do devedor, razão pela qual o
prosseguimento do feito deve seguir o rito previsto no art. 913 do CPC/2015.
• afrontar a finalidade precípua dos alimentos, que têm por objetivo conferir àquele que os recebe a
própria subsistência, como corolário do princípio da dignidade humana.
Em conformidade com o direito civil constitucional — que preconiza uma releitura dos institutos
reguladores das relações jurídicas privadas, a serem interpretados segundo a Constituição Federal, com
esteio, basicamente, nos princípios da proteção da dignidade da pessoa humana, da solidariedade social
e da isonomia material —, o direito aos alimentos deve ser concebido como um direito da personalidade
do indivíduo.
Trata-se, pois, de direito subjetivo inerente à condição de pessoa humana, imprescindível ao seu
desenvolvimento, à sua integridade física, psíquica e intelectual e, mesmo, à sua subsistência.
Os alimentos, concebidos como direito da personalidade, integram o patrimônio moral do alimentando, e
não o seu patrimônio econômico, ainda que possam ser apreciáveis economicamente.
Por se tratar de um direito da personalidade, o direito aos alimentos assume nítido viés personalíssimo,
pois se destina a assegurar a subsistência da pessoa do alimentando, unicamente, em todos os seus
aspectos (integridade física, psíquica e intelectual), como corolário dos princípios da dignidade da pessoa
humana e da solidariedade que deve permear as relações familiares, a partir das específicas
particularidades da pessoa do credor de alimentos e do alimentante.
Como esse direito apresenta esse viés personalíssimo e se destina a assegurar a existência do alimentando
(e de ninguém mais), não se pode admitir que ele possa ser transmitido a terceiros, seja por negócio
jurídico, seja por qualquer outro fato jurídico. Isso é previsto no art. 1.707 do Código Civil:
Art. 1.707. Pode o credor não exercer, porém lhe é vedado renunciar o direito a alimentos, sendo
o respectivo crédito insuscetível de cessão, compensação ou penhora.
Nessa linha de entendimento, é de se concluir que, uma vez extinta a obrigação alimentar pela exoneração
do alimentante, como no caso concreto, a genitora não possui legitimidade para prosseguir na execução
de alimentos (vencidos), em nome próprio, pois não há que se falar em sub-rogação, diante do caráter
personalíssimo do direito discutido.
Para a 3ª Turma, se a mãe entende que foi prejudicada e que o pai se beneficiou com a extinção da
obrigação alimentar, ela deverá propor uma nova demanda (uma ação de enriquecimento sem causa), em
nome próprio, contra o pai da criança, pedindo o ressarcimento pelos gastos despendidos no cuidado do
alimentando que eram da obrigação do alimentante. Essa garantia de reembolso daquele que arca sozinho
com as despesas do alimentando tem previsão no art. 871 do Código Civil:
Art. 871. Quando alguém, na ausência do indivíduo obrigado a alimentos, por ele os prestar a quem
se devem, poder-lhes-á reaver do devedor a importância, ainda que este não ratifique o ato.
Dessa maneira, para o propósito perseguido, isto é, de evitar que o alimentante, a despeito de
inadimplente, se beneficie com a extinção da obrigação alimentar, o que poderia acarretar
enriquecimento sem causa, a genitora poderá, por meio de ação própria, obter o ressarcimento dos gastos
despendidos no cuidado do alimentando, durante o período de inadimplência do obrigado, nos termos
do que preconiza o art. 871 do Código Civil.
TESTAMENTO
O indivíduo que recebeu um imóvel gravado com cláusula de inalienabilidade pode transferir
esse imóvel por meio de testamento, considerando que a cláusula de inalienabilidade vitalícia
dura apenas enquanto o beneficiário estiver vivo
Cláusula de inalienabilidade
É uma restrição imposta ao beneficiário, de forma que ele fica impedido de dispor da coisa, não podendo
transferi-lo a terceiros, seja a título gratuito ou oneroso.
Essa restrição pode ser imposta por tempo determinado (ex: 5 anos) ou de forma vitalícia.
Cláusula de impenhorabilidade
Consiste na proibição de constrição judicial do bem gravado para pagamento de débitos do
herdeiro/beneficiário.
Cláusula de incomunicabilidade
Proíbe que o bem seja transferido para a fração ideal do cônjuge (companheiro) em caso de casamento
ou união estável.
Em outras palavras, se uma pessoa possui um imóvel com cláusula de incomunicabilidade, mesmo que se
case com regime de comunhão de bens, esse imóvel não participará da comunhão dos bens do casal.
A tese dos herdeiros de Henrique foi acolhida pelo STJ? É nulo o testamento que dispôs sobre bens
gravados com cláusula de inalienabilidade, incomunicabilidade e impenhorabilidade?
NÃO.
Portanto, o proprietário não pode vendê-lo, permutá-lo ou doá-lo.” (MALUF, Carlos Alberto Dabus.
Cláusulas de Inalienabilidade, Incomunicabilidade e Impenhorabilidade. 4ª ed., São Paulo: RT, 4ª ed. 2006,
p. 49).
Desse modo, com o falecimento do beneficiário, acaba a eficácia da cláusula de incomunicabilidade. Ela
deixa de produzir efeitos.
O STJ afirma que “a cláusula de incomunicabilidade imposta a um bem não se relaciona com a vocação
hereditária”. Em outras palavras, o que se quer dizer é que a cláusula de incomunicabilidade não interfere
nas regras do Código Civil sobre a sucessão causa mortis.
Assim, se o indivíduo recebeu, por doação ou testamento, algum bem imóvel com cláusula de
incomunicabilidade, quando este morrer, o seu herdeiro ou o legatário irá receber normalmente o bem.
Em suma:
As cláusulas de inalienabilidade, incomunicabilidade e impenhorabilidade não tornam nulo o
testamento, que dispõe sobre transmissão causa mortis do bem gravado.
STJ. 4ª Turma. REsp 1.641.549-RJ, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 13/08/2019 (Info 654).
DIREITO DO CONSUMIDOR
PLANO DE SAÚDE
Ainda que a iniciativa pelo descredenciamento tenha partido da clínica médica, o plano de
saúde tem o dever de comunicar esse fato aos consumidores e à ANS com 30 dias de
antecedência e o dever de substituir a entidade conveniada por outra equivalente
Contestação
A Unimed contestou a demanda alegando que esse art. 17 acima transcrito não pode ser aplicado no caso
concreto porque foi a Clínica Oncológica de Campinas que rescindiu o contrato e pediu o
descredenciamento.
Logo, não foi o plano de saúde quem optou por substituir a entidade hospitalar, tendo sido uma decisão
dela, motivo pelo qual não se aplicaria o art. 17 da Lei nº 9.656/98.
Logo, a solução para esse caso deve abranger não apenas a análise da Lei nº 9.656/98, mas também do CDC.
Assim, ambos os instrumentos normativos incidem conjuntamente, sobretudo porque esses contratos, de
longa duração, lidam com bens sensíveis, como a manutenção da vida, ou seja, visam ajudar o usuário a
suportar riscos futuros envolvendo a sua higidez física e mental, assegurando o devido tratamento médico.
O art. 17 fala em “entidade hospitalar” e, no caso concreto, o descredenciamento foi de uma “clínica”.
Mesmo assim, deve ser aplicado esse art. 17?
SIM. O art. 17 da Lei nº 9.656/98 autoriza que o plano de saúde substitua qualquer entidade hospitalar
credenciada, desde que o faça por outro equivalente e comunique, com 30 dias de antecedência, aos
consumidores e à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
A despeito de o art. 17 falar apenas em “entidade hospitalar”, esse termo, à luz dos princípios
consumeristas, deve ser entendido como gênero, englobando também clínicas médicas, laboratórios,
médicos e demais serviços conveniados.
Assim, o usuário de plano de saúde tem o direito de ser informado acerca da modificação da rede
conveniada, ou seja, do rol de credenciados, pois somente com a transparência poderá buscar o
atendimento e o tratamento que melhor lhe satisfaz, segundo as possibilidades oferecidas.
Nesse sentido:
(...) O termo 'entidade hospitalar' inscrito no art. 17, § 1º, da Lei nº 9.656/1998, à luz dos princípios
consumeristas, deve ser entendido como gênero, a englobar também clínicas médicas, laboratórios,
médicos e demais serviços conveniados. De fato, o usuário de plano de saúde tem o direito de ser
informado acerca da modificação da rede conveniada (rol de credenciados), pois somente com a
transparência poderá buscar o atendimento e o tratamento que melhor lhe satisfaz, segundo as
possibilidades oferecidas.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.349.385/PR, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 16/12/2014.
Requisitos para que o plano de saúde possa alterar a lista de entidades conveniadas
A operadora de plano de saúde só poderá validamente alterar a lista de conveniados, ou seja, só poderá
fazer o descredenciamento de estabelecimentos hospitalares, clínicas médicas, laboratórios, médicos e
outros serviços, se cumprir dois requisitos legais:
a) deverá substituir a entidade conveniada que saiu por outra equivalente, de forma a manter a qualidade
dos serviços contratados inicialmente; e
b) deverá comunicar os consumidores e à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) com 30 dias de
antecedência.
O descumprimento desse dever de comunicação por parte do plano de saúde pode gerar indenização
por danos morais?
SIM. O descumprimento do dever de informação (descredenciamento da clínica médica de oncologia sem
prévia comunicação) somado à situação traumática e aflitiva suportada pelo consumidor (interrupção
repentina do tratamento quimioterápico com reflexos no estado de saúde), capaz de comprometer a sua
integridade psíquica, ultrapassa o mero dissabor, sendo evidente o dano moral, que deverá ser
compensado pela operadora de plano de saúde.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.349.385/PR, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 16/12/2014.
Em suma:
Ainda que a iniciativa pelo descredenciamento tenha partido de clínica médica, subsiste a obrigação de
a operadora de plano de saúde promover a comunicação desse evento aos consumidores e à ANS com
30 (trinta) dias de antecedência bem como de substituir a entidade conveniada por outra equivalente,
de forma a manter a qualidade dos serviços contratados inicialmente.
STJ. 1ª Turma. REsp 1.561.445-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 13/08/2019 (Info 654).
INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA
Termo inicial dos juros de mora incidentes sobre a restituição das parcelas pagas em caso de
resolução judicial do contrato por iniciativa do promitente comprador de forma diversa da
cláusula penal convencionada
Os pedidos de João estão de acordo com a jurisprudência do STJ (anterior à Lei nº 13.786/2018)?
SIM.
Súmula 543-STJ: Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel
submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas
pelo promitente comprador - integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente
vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento.
É abusiva a cláusula de distrato, fixada no contrato de promessa de compra e venda imobiliária, que
estabeleça a possibilidade de a construtora vendedora promover a retenção integral ou a devolução
ínfima do valor das parcelas adimplidas pelo consumidor distratante.
Vale ressaltar, no entanto, que a jurisprudência entende que é justo e razoável que o vendedor retenha
parte das prestações pagas pelo consumidor como forma de indenizá-lo pelos prejuízos suportados,
notadamente as despesas administrativas realizadas com a divulgação, comercialização e corretagem,
além do pagamento de tributos e taxas incidentes sobre o imóvel, e a eventual utilização do bem pelo
comprador.
A jurisprudência normalmente considera razoável a retenção, pelo promitente vendedor, de um
percentual que varia de 10% a 20% dos valores já pagos, devendo o restante ser devolvido ao promitente
comprador.
STJ. 4ª Turma. REsp 1.132.943-PE, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 27/8/2013 (Info 530).
Os valores que a construtora terá que devolver, por força da decisão judicial, devem ser acrescidos de
juros de mora? Se sim, qual é o termo inicial?
Antes de responder a esta pergunta, é importante que relembremos em que consistem os juros de mora.
Os juros moratórios são pagos pelo devedor como forma de indenizar o credor quando ocorre um atraso
no cumprimento da obrigação. É como se fosse uma sanção (punição) pela mora (inadimplemento
culposo) na devolução do capital.
E a correção monetária?
A correção monetária das parcelas pagas, para efeitos de restituição, incide a partir de cada desembolso
(STJ. 4ª Turma. REsp 1305780/RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe 17/4/2013).
Em outras palavras, os índices de correção monetária deverão incidir a partir de cada parcela paga.
Lei nº 13786/2018
Em 28/12/2018, entrou em vigor a Lei nº 13.786/2018, que dispõe sobre a resolução do contrato por
inadimplemento do adquirente de unidade imobiliária.
A Lei nº 13.786/2018 acrescentou o art. 67-A na Lei nº 4.591/64 prevendo as consequências jurídicas para
o caso de resolução do contrato por inadimplemento do adquirente. Com essa lei foi previsto um
percentual máximo das parcelas pagas que a incorporadora poderá reter a título de pena convencional:
Assim, para os contratos celebrados (assinados) após a Lei nº 13.786/2018 não se aplica o entendimento
do STJ acima exposto. Isso porque, com a Lei nº 13.786/2018, passou a existir no ordenamento jurídico
regras para o percentual de restituição dos valores pagos. Logo, a sentença que determina a restituição,
para contratos celebrados após a Lei nº 13.786/2018, não é uma sentença constitutiva, mas sim
declaratória de nulidade de cláusula contratual e condenatória ao pagamento de valor.
Diferenciando:
• contratos celebrados até 27/12/2018: em caso de ser pleiteada a resolução do contrato por iniciativa do
promitente comprador de forma diversa da cláusula penal convencionada, os juros de mora incidem a
partir do trânsito em julgado da decisão;
• contratos celebrados a partir de 28/12/2018: em caso de ser pleiteada a resolução do contrato por
iniciativa do promitente comprador de forma diversa da cláusula penal convencionada, os juros de mora
incidem a partir da citação válida, nos termos dos arts. 397 e 405 do Código Civil.
Em suma:
Nos compromissos de compra e venda de unidades imobiliárias anteriores à Lei nº 13.786/2018, em que
é pleiteada a resolução do contrato por iniciativa do promitente comprador de forma diversa da cláusula
penal convencionada, os juros de mora incidem a partir do trânsito em julgado da decisão.
STJ. 2ª Seção. REsp 1.740.911-DF, Rel. Min. Moura Ribeiro, Rel. Acd. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em
14/08/2019 (recurso repetitivo – Tema 1002) (Info 654).
DIREITO EMPRESARIAL
MARCA
Mesmo que exista autorização para que um nome civil seja registrado como marca, para que
esse nome seja registrado como nova marca não abrangida pela primeira, será necessária nova
autorização do titular
Cada novo registro de signo distintivo como marca, ainda que de mesma titularidade, deve
atender todos os requisitos de registrabilidade, inclusive quanto à autorização do titular do
nome civil eventualmente utilizado.
Caso concreto: Hospital Albert Einstein, mesmo tendo autorização para utilizar o nome civil
“Albert Einstein” no hospital, só pode registrar uma nova marca denominada “Unidade
Diagnóstica Einstein Jardins” se tiver nova autorização específica do detentor dos direitos
autorais e de imagem do falecido físico alemão.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.715.806-RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 20/08/2019 (Info 654).
Essa discussão chegou até o STJ. Qual das duas teses foi acolhida pelo STJ: a do Hospital ou da
Universidade?
Da Universidade. O registro da marca “Unidade Diagnóstica Einstein Jardins” foi anulado no INPI.
Vejamos alguns aspectos jurídicos desse interessante caso.
Ampliação da autorização dada pelo filho do físico ultrapassa os limites de proteção do nome civil
O filho de Albert Einstein conferiu a autorização para a utilização deste nome civil na fundação de um
hospital.
Não houve, por outro lado, qualquer autorização para a marca “Unidade Diagnóstica Einstein Jardins”.
Assim, a nova marca que o Hospital pretende registrar desborda dos limites da proteção do nome civil,
atingindo o núcleo intangível do direito ao nome e à imagem vinculados à pessoa natural.
O direito brasileiro não admite a cessão de uso de nome civil de forma ampla. Essa cessão deverá sempre
estar adstrita à finalidade definida no ato do consentimento.
Não se pode pressupor que, àquela época, décadas atrás, o filho do cientista já teria autorizado essa nova
utilização do nome civil do físico.
Em suma:
Cada novo registro de signo distintivo como marca, ainda que de mesma titularidade, deve atender
todos os requisitos de registrabilidade, inclusive quanto à autorização do titular do nome civil
eventualmente utilizado.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.715.806-RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 20/08/2019 (Info 654).
RECUPERAÇÃO JUDICIAL
Não é necessário que o contrato de compra e venda com reserva de domínio tenha sido
registrado no cartório para que ele fique excluído da recuperação judicial, conforme previsto no
§ 3º do art. 49 da Lei nº 11.101/2005
Os créditos concernentes a contrato de compra e venda com reserva de domínio não estão
sujeitos aos efeitos da recuperação judicial da compradora, independentemente de registro
da avença em cartório.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.725.609-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 20/08/2019 (Info 654).
Recuperação judicial
A recuperação judicial consiste em um processo judicial, no qual será construído e executado um plano
com o objetivo de recuperar a empresa que está em vias de efetivamente ir à falência. Logo, em vez de a
empresa ir à falência (o que é nocivo para a economia, para os donos da empresa, para os funcionários
etc.), tenta-se dar um novo fôlego para a sociedade empresária, renegociando as dívidas com os credores.
Na antiga Lei de Falências, esse processo era chamado de “concordata” (DL 7.661/45).
A Lei nº 11.101/2005 acabou com a “concordata” e criou um novo instituto, com finalidade semelhante,
chamado de recuperação judicial.
Assim, a recuperação judicial surgiu para substituir a antiga “concordata” e tem por objetivo viabilizar a
superação da situação de crise do devedor, a fim de permitir que a atividade empresária se mantenha e,
com isso, sejam preservados os empregos dos trabalhadores e os interesses dos credores.
Regra
Em regra, estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido de
recuperação judicial, ainda que não vencidos (art. 49, caput, da Lei nº 11.101/2005).
Ex: a empresa tem que pagar uma dívida com um fornecedor daqui a 9 meses; se o pedido de recuperação
foi feito hoje, esse crédito já será incluído nas regras da recuperação judicial, mesmo que ainda não tenha
chegado a data do vencimento.
Esse prazo em que haverá a pausa momentânea das ações e execuções é chamado de stay period e tem
por objetivo permitir que o devedor em crise consiga negociar, de forma conjunta com todos os credores
(plano de recuperação) e, ao mesmo tempo, preservar o patrimônio do empreendimento, que ficará livre,
por um determinado período de respiro, de eventuais constrições (ex: penhora) de bens necessários à
continuidade da atividade empresarial. Com isso, minimiza-se o risco de haver uma falência.
Exceções à regra:
A regra acima exposta (caput do art. 49) possui exceções que estão elencadas nos §§ 3º e 4º.
Dessa feita, nesses parágrafos estão previstos determinados créditos que NÃO se sujeitam aos efeitos da
recuperação judicial.
Veja o § 3º, que interessa para explicar o julgado:
§ 3º Tratando-se de credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis,
de arrendador mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos
contratos contenham cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações
imobiliárias, ou de proprietário em contrato de venda com reserva de domínio, seu crédito não se
submeterá aos efeitos da recuperação judicial e prevalecerão os direitos de propriedade sobre a
Segundo o art. 522 do Código Civil, a cláusula de reserva de domínio precisa ser registrada no domicílio
do comprador para valer contra terceiros. A serventia competente para esse registro é o RTD (Registro
de Títulos e Documentos). Diante disso, indaga-se: para que incida o § 3º do art. 49 da Lei nº
11.101/2005, também é necessário que o contrato de compra e venda com reserva de domínio tenha
sido registrado no cartório?
NÃO.
O registro do contrato não é requisito constitutivo do negócio jurídico (não é requisito constitutivo do
contrato de compra e venda com reserva de domínio). Isso porque o registro tem mera função
declaratória, conferindo ao pacto eficácia contra terceiros, conforme dispõem os arts. 129, da Lei de
Registros Públicos (Lei nº 6.015/73) e 522, parte final, do Código Civil.
Por outro lado, o § 3º do art. 49 da Lei nº 11.101/2005, em nenhum momento exige que o contrato de
compra e venda com reserva de domínio seja registrado no cartório para, só então, ter seu objeto
preservado dos efeitos da recuperação judicial da devedora.
Conforme já explicado, esse registro serve apenas e tão somente para fins de publicidade, ou seja, para
que a reserva de domínio seja oponível a terceiros que, por alguma circunstância, possam ser prejudicados
diretamente pela ausência de conhecimento da existência de tal cláusula. É o caso, por exemplo, daquela
pessoa que venha a adquirir, do comprador, o bem cujo domínio encontra-se reservado a outrem (o que
viria a caracterizar venda a non domino).
No caso da recuperação judicial, contudo, não há necessidade desse registro para fins de aplicação do §
3º do art. 49 da Lei nº 11.101/2005.
Em suma:
Os créditos concernentes a contrato de compra e venda com reserva de domínio não estão sujeitos aos
efeitos da recuperação judicial da compradora, independentemente de registro da avença em cartório.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.725.609-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 20/08/2019 (Info 654).
Importante!!!
Não é cabível ação rescisória contra decisão do Presidente do STJ proferida em Suspensão de
Liminar e de Sentença, mesmo que transitada em julgado.
STJ. Corte Especial. AR 5.857-MA, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 07/08/2019 (Info 654).
Suspensão de liminar
O pedido de suspensão é
- um instrumento processual (incidente processual)
- por meio do qual as pessoas jurídicas de direito público ou o Ministério Público
- requerem ao Presidente do Tribunal que for competente para o julgamento do recurso
- que suspenda a execução de uma decisão, sentença ou acórdão proferidos,
- sob o argumento de que esse provimento jurisdicional prolatado causa grave lesão à ordem, à saúde, à
segurança e à economia públicas.
Nomenclatura
Comumente, esse instituto é chamado de pedido de “suspensão de segurança”. Isso porque ele foi
previsto originalmente na lei apenas para suspender as decisões liminares ou sentenças proferidas em
mandados de segurança.
Ocorre que, com o tempo, foram editadas novas leis trazendo a possibilidade de suspensão para
praticamente toda e qualquer decisão judicial prolatada contra a Fazenda Pública.
Por essa razão, atualmente, além de “suspensão de segurança”, pode-se falar em “suspensão de liminar”,
“suspensão de sentença”, “suspensão de acórdão” etc. Alguns julgados também falam em “pedido de
contracautela”.
Previsão legal
Há cinco diferentes dispositivos legais prevendo pedido de suspensão:
• art. 12, § 1º da Lei nº 7.347/85 (suspensão de liminar em ACP);
• art. 4º da Lei nº 8.437/92 (suspensão de liminar ou sentença em ação cautelar, em ação popular ou em
ACP). É considerada pela doutrina como a previsão mais geral sobre o pedido de suspensão;
• art. 1º da Lei nº 9.494/97 (suspensão de tutela antecipada concedida contra a Fazenda Pública);
Lei nº 12.016/2009:
Art. 15. Quando, a requerimento de pessoa jurídica de direito público interessada ou do Ministério
Público e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas, o
presidente do tribunal ao qual couber o conhecimento do respectivo recurso suspender, em
decisão fundamentada, a execução da liminar e da sentença, dessa decisão caberá agravo, sem
efeito suspensivo, no prazo de 5 (cinco) dias, que será levado a julgamento na sessão seguinte à
sua interposição.
Lei nº 12.016/2009
Art. 15 (...) § 3º A interposição de agravo de instrumento contra liminar concedida nas ações
movidas contra o poder público e seus agentes não prejudica nem condiciona o julgamento do
pedido de suspensão a que se refere este artigo.
Legitimidade
Quem pode formular pedido de suspensão?
a) União, Estados, Distrito Federal e Municípios;
b) Autarquias e fundações;
c) Ministério Público;
d) Concessionárias de serviço público (desde que para tutelar o interesse público primário).
Competência
Ex1: juiz concede liminar contra a Fazenda Pública, que formula pedido de suspensão para o Presidente do
TJ; este concede a suspensão; a parte autora agrava da decisão do Presidente para o Plenário, que reforma
a decisão do Presidente e restabelece a liminar concedida em primeira instância. Dessa decisão do Plenário,
a Fazenda Pública terá a possibilidade de formular novo pedido de suspensão para o STJ ou para o STF.
Ex2: juiz concede liminar contra a Fazenda Pública, que formula pedido de suspensão para o Presidente do
TJ; este não concede a suspensão; a Fazenda Pública agrava da decisão do Presidente para o Plenário, que
mantém a decisão do Presidente e a liminar concedida em primeira instância. Dessa decisão do Plenário, a
Fazenda Pública terá a possibilidade de formular novo pedido de suspensão para o STJ ou para o STF.
A doutrina afirma que se trata de um pedido de suspensão “por salto de instância”.
A Fazenda Pública apresentou agravo contra a decisão do Presidente para o Plenário do TJ, que manteve,
contudo, a decisão e a liminar concedida em primeira instância.
Contra esta decisão do Plenário do TJ, o Estado-membro apresentou novo pedido de suspensão, desta vez
dirigido ao Presidente do STJ.
O Ministro Presidente do STJ determinou a suspensão da execução da medida liminar deferida pelo Juízo
de 1º grau sob o fundamento de existência de grave lesão à ordem pública e à ordem econômica.
O autor não interpôs qualquer recurso contra esta decisão do Ministro Presidente do STJ, tendo ela
transitado em julgado.
Logo em seguida, João ajuizou ação rescisória contra a decisão do Presidente do STJ.
Um dos requisitos para a propositura da ação rescisória é a existência de coisa julgada, mais
especificamente, a existência de “decisão de mérito, transitada em julgado” (art. 966 do CPC/2015).
A decisão do Ministro Presidente do STJ não tornou indiscutível o objeto meritório da ação ordinária. Esta
decisão apontou apenas a ocorrência de grave lesão à ordem pública e à ordem econômica.
Com essa decisão do Ministro Presidente, os efeitos da decisão interlocutória do juízo de 1º grau foram
suspensos, mas não necessariamente de forma permanente.
Se a decisão de suspensão não é modificada, ela vigora, em tese, até o trânsito em julgado da decisão de
mérito na ação principal, conforme prevê o art. 4º, § 9º, da Lei nº 8.437/92:
Art. 4º (...)
§ 9º A suspensão deferida pelo Presidente do Tribunal vigorará até o trânsito em julgado da
decisão de mérito na ação principal.
Assim, o objeto na ação principal continua controvertido e não há decisão que tornou indiscutível e
imutável a lide. Apenas os efeitos da decisão interlocutória, de natureza provisória e satisfativa, estão
suspensos.
Desse modo, a decisão do Presidente do STJ – que se quer rescindir – não está fundamentada no art. 487
do CPC/2015, que trata das “sentenças” de mérito.
Apesar de ter transitado em julgado, a decisão do Presidente do STJ não formou coisa julgada material
nos termos dos arts. 502 e 503, do CPC/2015, eis que não teve natureza exauriente:
Art. 502. Denomina-se coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a
decisão de mérito não mais sujeita a recurso.
Art. 503. A decisão que julgar total ou parcialmente o mérito tem força de lei nos limites da
questão principal expressamente decidida.
Logo, a decisão do Ministro Presidente do STJ que determina a suspensão dos efeitos da antecipação de
tutela contra a Fazenda Pública, mesmo quando transitada em julgado, não se sujeita a ação rescisória.
Isso porque não faz coisa julgada material nem impede a rediscussão do objeto controvertido na ação
principal.
AGRAVO DE INSTRUMENTO
Cabe agravo de instrumento contra a decisão interlocutória que acolhe ou afasta a arguição de
impossibilidade jurídica do pedido (mérito do processo – art. 1.015, II, do CPC/2015)
Importante!!!
Cabe agravo de instrumento contra a decisão interlocutória que acolhe ou afasta a arguição de
impossibilidade jurídica do pedido.
Com o CPC/2015, a possibilidade jurídica do pedido deixou de ser uma condição da ação e
passou ser classificada como “questão de mérito”. Logo, se uma decisão interlocutória acolhe
ou rejeita a arguição de impossibilidade jurídica do pedido, trata-se de decisão que versa
sobre o mérito do processo, sendo cabível a interposição de agravo de instrumento, com fulcro
no art. 1.015, II, do CPC:
Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre:
II - mérito do processo.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.757.123-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/08/2019 (Info 654).
Pedro não se conformou e recorreu ao STJ, que apreciou o tema. Cabe agravo de instrumento neste caso?
SIM.
Justamente por isso, o CPC/2015 não fala em “possibilidade jurídica do pedido” em seu art. 485, VI (que
corresponde ao revogado art. 267, VI, do CPC/73):
CPC/2015 CPC/1973
Art. 485. O juiz não resolverá o mérito Art. 267. Extingue-se o processo, sem resolução de
quando: mérito:
(...) (...)
VI - verificar ausência de legitimidade ou de VI - quando não concorrer qualquer das condições da
interesse processual; ação, como a possibilidade jurídica, a legitimidade das
partes e o interesse processual;
Em suma, atualmente, após o CPC/2015, a “possibilidade jurídica do pedido” compõe uma “parcela do
mérito” que está sendo discutido no processo, suscetível de decomposição e que pode ser examinada em
separado dos demais fragmentos que o compõem, de modo que a decisão interlocutória que versar sobre
essa matéria, seja para acolher a alegação, seja também para afastá-la, poderá ser objeto de impugnação
imediata por agravo de instrumento, com base no art. 1.015, II, CPC/2015.
Cabe agravo de instrumento contra a decisão interlocutória que acolhe ou afasta a arguição de
impossibilidade jurídica do pedido.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.757.123-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/08/2019 (Info 654).
RECURSO ESPECIAL
Não deve ser conhecido o recurso especial tirado de agravo de instrumento quando sobrevém
sentença de extinção do processo sem resolução de mérito que não foi objeto de apelação
Não deve ser conhecido o recurso especial tirado de agravo de instrumento quando sobrevém
sentença de extinção do processo sem resolução de mérito que não foi objeto de apelação.
Ex: juiz determinou que os autores fizessem a emenda da petição inicial, sob pena de
indeferimento; os autores não concordaram e interpuseram agravo de instrumento, que não
foi conhecido pelo TJ; contra esta decisão, foi manejado recurso especial; antes que o recurso
especial fosse julgado, o juiz extinguiu o processo sem resolução do mérito indeferindo a
petição inicial pelo fato de não ter sido cumprida a diligência (emenda da petição inicial);
neste caso, os autores deveriam ter interposto apelação contra a sentença; como não
interpuseram, o recurso especial tirado do agravo de instrumento – e que ainda estava
pendente de julgamento – não será conhecido porque houve a formação de coisa julgada.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.750.079-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/08/2019 (Info 654).
As autoras não concordaram com a decisão e interpuseram agravo de instrumento dirigido ao Tribunal de
Justiça, invocando o art. 1.015, VII, do CPC/2015:
Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre:
(...)
VII - exclusão de litisconsorte;
Sentença
Como o agravo de instrumento não foi conhecido, o juiz decidiu seguir o processo e, tendo em vista que
as autoras não fizeram a emenda da petição inicial, conforme determinado, o magistrado proferiu
sentença indeferindo a petição inicial, nos termos do parágrafo único do art. 321 do CPC/2015:
Art. 321 (...)
Parágrafo único. Se o autor não cumprir a diligência, o juiz indeferirá a petição inicial.
Confiando apenas no recurso especial tirado do agravo de instrumento, as autoras não interpuseram
recurso (apelação) contra esta sentença.
Com a decisão do TJ de não conhecer do agravo, a decisão do magistrado de 1ª instância voltou a produzir
efeitos e caberia às autoras cumprir a determinação de emenda da petição inicial.
Como não fizeram e não havia mais motivos para o juiz manter o processo suspenso, ele agiu corretamente
ao prolatar a sentença.
Após a prolação da sentença, as autoras deveriam ter interposto recurso de apelação e, como não fizeram,
houve o trânsito em julgado.
A ausência de impugnação à sentença proferida (ausência de recurso contra a sentença) gerou, portanto,
a formação de coisa julgada (ainda que meramente formal), sendo isso óbice intransponível ao
conhecimento do agravo de instrumento e de seu subsequente recurso especial.
Com o trânsito em julgado, não há mais processo e, portanto, não se pode mais examinar o recurso
especial que versava sobre uma decisão interlocutória desse processo.
Não se poderia defender a tese de que, enquanto o agravo de instrumento não for definitivamente
julgado (com a apreciação do RESP) não teria havido coisa julgada?
Não. Não se pode acolher essa argumentação. Isso porque admitir que o recurso de agravo de
instrumento, por si só, teria o condão de obstar a prolação da sentença ou a formação da coisa julgada
dela advinda apenas porque as questões vertidas na decisão interlocutória recorrida poderiam influenciar
no resultado da controvérsia ou porque as conclusões do Tribunal sobre a interlocutória deveriam ser
compatíveis com a sentença proferida, equivaleria a conferir a essa modalidade recursal um automático
efeito suspensivo sem previsão legal, fazendo com que o agravo tivesse um efeito obstativo expansivo
(por meio do qual a interposição do agravo de instrumento não impediria apenas a preclusão ou coisa
julgada sobre a decisão recorrida, mas também sobre as decisões subsequentes).
EXECUÇÃO FISCAL
Na execução fiscal não cabe a retenção de passaporte ou a suspensão da CNH
como forma de compelir o executado a pagar o débito
Importante!!!
Em execução fiscal não cabem medidas atípicas aflitivas pessoais, tais como a suspensão de
passaporte e da licença para dirigir.
STJ. 1ª Turma. HC 453.870-PR, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 25/06/2019 (Info 654).
O entendimento acima é diferente no caso da execução “comum”. O STJ possui julgados dizendo que, na
execução “comum”, é possível a adoção de meios executivos atípicos desde que, verificando-se a
existência de indícios de que o devedor possua patrimônio expropriável, tais medidas sejam adotadas
de modo subsidiário, por meio de decisão que contenha fundamentação adequada às especificidades da
hipótese concreta, com observância do contraditório substancial e do postulado da proporcionalidade
(STJ. 3ª Turma. REsp 1788950/MT, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 23/04/2019).
Enunciado 12 do FPPC. A aplicação das medidas atípicas sub-rogatórias e coercitivas é cabível em qualquer
obrigação no cumprimento de sentença ou execução de título executivo extrajudicial. Essas medidas,
contudo, serão aplicadas de forma subsidiária às medidas tipificadas, com observação do contraditório,
ainda que diferido, e por meio de decisão à luz do art. 489, § 1º, I e II.
Enunciado 396 do FPPC. As medidas do inciso IV do art. 139 podem ser determinadas de ofício, observado
o art. 8º.
Esse dispositivo representa a adoção, pelo CPC, de um modelo de atipicidade das medidas executivas. O
que isso quer dizer? As medidas que o juiz pode determinar para a execução dos comandos judiciais não
precisam estar expressamente previstas na lei, podendo o magistrado impor outras medidas que não
estão listadas no Código.
Tais medidas são permitidas também na EXECUÇÃO FISCAL? Imagine, por exemplo, que o Município
ingressou com execução fiscal contra Carlos. O executado não pagou nem foram localizados bens
penhoráveis. Diante disso, será possível, em tese, a determinação judicial de retenção do passaporte e
suspensão da CNH?
NÃO.
O Estado é considerado superprivilegiado em sua condição de credor.
Dispõe de varas comumente especializadas para condução de seus feitos, um corpo de Procuradores
altamente devotado a essas causas, e possui lei própria regedora do procedimento (Lei nº 6.830/80), com
inúmeros privilégios processuais.
Um exemplo desses privilégios é o fato de que o devedor, na execução fiscal, só pode apresentar embargos
à execução se oferecer garantia do juízo (art. 16, § 1º, da LEF), ao contrário do que ocorre na execução
“comum”.
Desse modo, o crédito fiscal é altamente blindado dos riscos de inadimplemento, por sua própria
conformação jusprocedimental.
Além disso, existem diversas outras garantias previstas pelo ordenamento jurídico em favor do crédito
tributário, como, por exemplo:
• o crédito tributário é privilegiado (art. 184 do CTN), podendo, se for o caso, atingir até mesmo bens
gravados como impenhoráveis, por serem considerados bem de família (art. 3º, IV da Lei nº 8.009/90);
• o crédito tributário tem altíssima preferência para satisfação em procedimento falimentar (art. 83, III da
Lei de Falências);
• os bens do devedor podem ser declarados indisponíveis para assegurar o adimplemento da dívida (art.
185-A do CTN).
Em razão de todos esses “privilégios” acima expostos, a 1ª Turma do STJ entendeu que haveria um excesso
se na execução fiscal fossem permitidas medidas atípicas aflitivas pessoais, como é o caso da apreensão
de passaporte e da suspensão da CNH.
Resumindo:
Em execução fiscal não cabem medidas atípicas aflitivas pessoais, tais como a suspensão de passaporte
e da licença para dirigir.
STJ. 1ª Turma. HC 453.870-PR, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 25/06/2019 (Info 654).
Duas fases
O procedimento da ação de prestação de contas (ação de exigir contas) tem como característica a
existência, em regra, de duas fases.
1ª fase: nela, o juiz irá decidir se existe ou não a obrigação de o réu prestar contas. Se o julgador decidir
que não, o processo encerra-se nesta fase. Contudo, se decidir que sim, será aberta uma segunda fase.
2ª fase: servirá para que o réu propriamente preste as contas pleiteadas pelo autor e para que o julgador
avalie se aquele o fez corretamente, reconhecendo a existência de saldo credor ou devedor.
Em suma, tem-se que a ação de prestação de contas ocorre em duas fases distintas e sucessivas – na
primeira, discute-se sobre o dever de prestar contas; na segunda, declarado o dever de prestar contas,
serão elas julgadas e apreciadas, se apresentadas (STJ. 3ª Turma. REsp 1.567.768/GO, DJe 30/10/2017).
“É preciso notar, porém, que não se está diante de dois processos distintos, tramitando simultaneamente
nos mesmos autos. O processo, em verdade, é único, embora dividido em duas fases distintas. Há, pois, o
ajuizamento de uma única demanda, contendo um único mérito. A análise deste, porém, é dividida em
dois momentos: o primeiro, dedicado à verificação da existência do direito de exigir a prestação de contas,
o segundo, dirigido à verificação das contas e do saldo eventualmente existente.” (CÂMARA, Alexandre
Freitas. Lições de Direito Processual Civil. São Paulo: Atlas, 21ª ed., 2014, p. 391).
O juiz considerou que o autor da ação tinha razão em exigir as contas e, então, proferiu uma decisão
determinando que o réu preste as contas no prazo de 15 dias, conforme determina o art. 550, § 5º do
CPC/2015:
Art. 550 (...)
§ 5º A decisão que julgar procedente o pedido condenará o réu a prestar as contas no prazo de 15
(quinze) dias, sob pena de não lhe ser lícito impugnar as que o autor apresentar.
A ré não recorreu contra a decisão e fez a prestação de contas no prazo determinado. Iniciou-se, portanto,
a segunda fase da ação de exigir contas.
A parte autora da ação terá agora o prazo de 15 dias para se manifestar sobre as contas apresentadas:
Art. 550. (...)
§ 2º Prestadas as contas, o autor terá 15 (quinze) dias para se manifestar, prosseguindo-se o
processo na forma do Capítulo X do Título I deste Livro.
Suponhamos que a empresa autora pediu ao juiz a produção de prova pericial contábil.
O juiz proferiu decisão interlocutória na qual: a) deferiu a produção da perícia; b) nomeou o perito; c)
concedeu prazo para as partes para a apresentação de documentos, formulação de quesitos e para a
nomeação de eventuais assistentes técnicos.
A empresa ré não concordou e interpôs agravo de instrumento contra essa decisão interlocutória
fundamentando o cabimento no parágrafo único do art. 1.015 do CPC/2015:
Art. 1.015 (...)
Parágrafo único. Também caberá agravo de instrumento contra decisões interlocutórias
proferidas na fase de liquidação de sentença ou de cumprimento de sentença, no processo de
execução e no processo de inventário.
Conforme já explicado, a atividade jurisdicional que se desenvolve na segunda fase da ação de exigir
contas não é de liquidação ou de cumprimento de sentença, mas sim de cognição própria da fase de
conhecimento, em que há o acertamento da relação jurídica de direito material que vincula as partes.
Nesse sentido, a fase de cumprimento da sentença na ação de prestação de contas apenas se iniciará após
a prolação da sentença condenatória que porventura vier a ser proferida na segunda fase do referido
procedimento especial.
Nesse contexto, a decisão interlocutória que, na segunda fase da referida ação, deferiu a produção de
prova pericial contábil, nomeou perito e concedeu prazo para apresentação de documentos, formulação
de quesitos e nomeação de assistentes, não se submete ao regime recursal diferenciado que o legislador
estabeleceu para as fases de liquidação e cumprimento da sentença (art. 1.015, parágrafo único, do
CPC/2015). Ao contrário, submete-se ao regime recursal aplicável à fase de conhecimento, ou seja, incide
o caput e os incisos do art. 1.015.
Assim, como não existe previsão legal para a recorribilidade imediata da referida decisão interlocutória no
caput e nos incisos do art. 1.015 do CPC, não cabe agravo de instrumento nesta hipótese.
A legitimidade para a propositura da ação penal privada, em regra, é da vítima (ofendido). De quem
será, contudo, neste caso em que a vítima já havia morrido quando do cometimento da calúnia? De
quem é a legitimidade para ajuizar ação penal privada contra o querelado imputando-lhe o crime de
calúnia contra pessoa morta?
A legitimidade será do cônjuge, ascendente, descendente ou irmão, nos termos do § 1º do art. 24 do CPP:
Art. 24 (...)
§ 1º No caso de morte do ofendido ou quando declarado ausente por decisão judicial, o direito de
representação passará ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão.
No caso concreto, a querelante era companheira da falecida (e não cônjuge). O § 1º do art. 24 do CPP
não fala em “companheira”. Mesmo assim ela tem legitimidade?
SIM.
A companheira, em união estável homoafetiva reconhecida, goza do mesmo status de cônjuge para o
processo penal, possuindo legitimidade para ajuizar a ação penal privada.
STJ. Corte Especial. APn 912-RJ, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 07/08/2019 (Info 654).
A companheira, em união estável reconhecida, goza do mesmo status de cônjuge para o processo penal,
podendo figurar como legítima representante da falecida.
Vale ressaltar que a interpretação extensiva da norma processual penal tem autorização expressa do art.
3.º do CPP:
Art. 3º A lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o
suplemento dos princípios gerais de direito.
entre pessoas do mesmo sexo as mesmas regras e mesmas consequências da união estável
heteroafetiva'”. Não é legítimo desequiparar, para fins sucessórios, os cônjuges e os companheiros, isto
é, a família formada pelo casamento e a formada por união estável. Tal hierarquização entre entidades
familiares é incompatível com a Constituição de 1988. Assim sendo, o art. 1790 do Código Civil, ao revogar
as Leis nº 8.971/1994 e nº 9.278/1996 e discriminar a companheira (ou o companheiro), dando-lhe direitos
sucessórios bem inferiores aos conferidos à esposa (ou ao marido), entra em contraste com os princípios
da igualdade, da dignidade humana, da proporcionalidade como vedação à proteção deficiente e da
vedação do retrocesso” (STF. Plenário. RE 646721, Relator p/ Acórdão: Min. Roberto Barroso, julgado em
10/05/2017).
DIREITO TRIBUTÁRIO
IPI
O valor pago a título de IPI por ocasião da aquisição de brindes que serão inseridos em produtos
industrializados não gera direito de creditamento de IPI
IPI
IPI é a sigla para Imposto sobre Produtos Industrializados.
Trata-se de um tributo federal e que incide sobre a produção e a circulação de produtos industrializados.
O IPI foi instituído por meio da Lei nº 4.502/64.
Princípio da não-cumulatividade
O IPI é um imposto não cumulativo (art. 153, § 3º, II, da CF/88), o que significa que é possível compensar
o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores, ou seja, o valor pago na
operação imediatamente anterior pode ser abatido do mesmo imposto em operação posterior (art. 49 do
CTN).
"A cada aquisição tributada de insumo, o adquirente registra como crédito o valor do tributo incidente na
operação. Tal valor é um "direito" do contribuinte, consistente na possibilidade de recuperar o valor
incidente nas operações subsequentes (é o "IPI a recuperar").
A cada alienação tributada de produto, o alienante registra como débito o valor do tributo incidente na
operação. Tal valor é uma obrigação do contribuinte, consistente no dever de recolher o valor devido aos
cofres públicos federais ou compensá-los com os créditos obtidos nas operações anteriores (trata-se do
"IPI a recolher").
Periodicamente, faz-se uma comparação entre os débitos e créditos. Caso os débitos sejam superiores aos
créditos, o contribuinte deve recolher a diferença aos cofres públicos. Casos os créditos sejam maiores, a
diferença pode ser compensada posteriormente ou mesmo, cumpridos determinados requisitos, ser
objeto de ressarcimento." (ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário esquematizado. São Paulo: Método,
2016, p. 586).
Esta indústria poderá aproveitar esses R$ 10 mil que ela pagou a título de IPI como crédito junto à
Receita Federal?
SIM. Isso está previsto no art. 11 da Lei nº 9.779/99:
Art. 11. O saldo credor do Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI, acumulado em cada
trimestre-calendário, decorrente de aquisição de matéria-prima, produto intermediário e material
de embalagem, aplicados na industrialização, inclusive de produto isento ou tributado à alíquota
zero, que o contribuinte não puder compensar com o IPI devido na saída de outros produtos,
poderá ser utilizado de conformidade com o disposto nos arts. 73 e 74 da Lei nº 9.430, de 27 de
dezembro de 1996, observadas normas expedidas pela Secretaria da Receita Federal do Ministério
da Fazenda.
A Nestle poderá aproveitar esses R$ 20 mil que ela pagou a título de IPI como crédito junto à Receita
Federal, invocando o art. 11 da Lei nº 9.779/99?
NÃO.
O brinde é um produto perfeito e acabado, produzido em processo industrial próprio.
Não se pode dizer que o brinde, ao ser incluído no pacote de outro produto industrializado (um biscoito),
componha esse produto (biscoito).
Da mesma forma, não se pode dizer que o brinde se confunda com o material de embalagem.
Logo, como o brinde não compõe o produto nem é embalagem do produto, o valor gasto com a sua
aquisição não gera direito ao creditamento do art. 11 da Lei nº 9.779/99.
Não há como entender que uma régua possa integrar um recipiente destinado à armazenagem e à
proteção dos biscoitos. Trata-se de um item independente utilizado como estratégia de marketing para
estimular o público infanto-juvenil ao consumo, e, por óbvio, não integra o processo de industrialização
dos biscoitos, produto final.
Essa é a razão pela qual eventual IPI pago por ocasião da aquisição das réguas não gera direito de
creditamento pelo produtor do biscoito.
Em suma:
Os brindes, produtos perfeitos e acabados em processo industrial próprio, incluídos em outros produtos
industrializados, não geram direito ao creditamento de IPI.
STJ. 1ª Turma. REsp 1.682.920-SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 06/08/2019 (Info 654).
EXERCÍCIOS
12) A decisão interlocutória que, na segunda fase da ação de prestação de contas, defere a produção de
prova pericial contábil, nomeia perito e concede prazo para apresentação de documentos, formulação
de quesitos e nomeação de assistentes, não é imediatamente recorrível por agravo de instrumento. ( )
13) A companheira, em união estável homoafetiva reconhecida, goza do mesmo status de cônjuge para o
processo penal, possuindo legitimidade para ajuizar a ação penal privada. ( )
14) Os brindes, produtos perfeitos e acabados em processo industrial próprio, incluídos em outros produtos
industrializados, geram direito ao creditamento de IPI. ( )
Gabarito
1. C 2. E 3. C 4. C 5. C 6. E 7. C 8. E 9. E 10. E
11. C 12. C 13. C 14. E