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AGRONEGOCIO E AGRICULTURA FAMILIAR: modelos agrícolas de

desenvolvimento que se contrapõem

1
Conceição de Maria Sousa Batista Costa

RESUMO

O artigo intitulado “Agronegócio e Agricultura Familiar:


modelos agrícolas de desenvolvimento que se contrapõem”,
discute os modelos de desenvolvimento do agronegócio e da
agricultura familiar. Enquanto que no agronegócio as pessoas e
a natureza se transformam em mercadorias e se realiza a partir
da exploração do trabalho assalariado e do controle político do
mercado. Já a agricultura familiar faz o movimento contrário
quando constrói relação de equilíbrio com a natureza, fruto de
sua prática da policultura orgânica e a produção de alimentos
como requisito principal, visa a transformação da natureza.

PALAVRAS-CHAVE: Agronegócio. Agricultura Familiar.


Agricultura Camponesa. .

ABSTRACT: The article entitled " Agribusiness and Family


Agriculture: agricultural models of development that oppose",
discusses the development models of agribusiness and family
agriculture. While in agribusiness people and nature are
transformed into commodities and are carried out from the
exploitation of wage labor and the political control of the market,
family agriculture does the opposite movement when it builds
equilibrium relation with nature, fruit of its practice Of organic
polyculture, and food production as the main requirement, aims
at the transformation of nature

KEYWORDS: Agribusiness. Family farming. Peasant


Agriculture. .

1
Assistente Social. Doutoranda em Políticas Públicas. Universidade Federal do Piauí (UFPI).
ceica_batista28@yahoo.com.br
I. INTRODUÇÃO

O artigo intitulado “Agronegócio e Agricultura Familiar: modelos agrícolas


de desenvolvimento que se contrapõem”, é uma revisão de literatura que tem por
objetivo refletir os processos que envolvem cada modelo, buscando evidenciar o
debate que a temática tem provocado entre os estudiosos. A reflexão aqui
apresentada tem vinculação com o objeto de estudo da pesquisadora no doutorado,
Programa de Pós Graduação em Políticas Públicas da Universidade Federal do Piauí.
O referido artigo compreende-se de duas partes. A primeira discute o
modelo de desenvolvimento do agronegócio no qual as pessoas e a natureza se
transformam em mercadorias e se realiza a partir da exploração do trabalho
assalariado e do controle político do mercado. Possui uma lógica desigual,
contraditória, a mesma que institui as relações capitalistas de produção.
A segunda parte, reflete aspectos da agricultura familiar que tem como
características a relação de equilíbrio com a natureza, fruto de sua prática da
policultura orgânica e a produção de alimentos como requisito principal, visa a
transformação da natureza, primordialmente, como forma de sobrevivência e não
como forma mercadológica de produção de capital. Uma categoria sociopolítica do
meio rural que emergiu nos anos de 1990, resultado da luta dos movimentos sociais
no campo, especialmente o sindicalismo rural. Por fim, o estudo deixou evidenciado
que agronegócio e o campesinato constroem territórios distintos, com paisagens
distintas e antagônicas que pressupõe o conflito constante entre os mesmos
(CAMACHO, 2011)

II. AGRONEGÓGIO: BREVES CONSIDERAÇÕES

Para Fernandes; Molina (2004) o Agronegócio tem sua origem no sistema


de plantation, contexto da colonização brasileira, em que grandes propriedades
produziam para exportação. Desde os princípios do capitalismo em suas diferentes
fases, esse modelo, que foi chamado de desenvolvimento econômico da agropecuária
capitalista passa por modificações e adaptações, intensificando a exploração da terra
e do homem. Mas é na década de 1990 que a palavra Agronegócio começa a fazer
parte do vocabulário brasileiro, devendo-se com isso, a inserção mais intensa do Brasil
na lógica da globalização econômica.
Segundo Aguiar; Monteiro (2005) a década de 1950 constituiu o marco
referencial para o início da modernização da agricultura no Brasil, muito embora o
aumento da produtividade agrícola dever-se mais à incorporação de novas áreas do
que ao incremento tecnológico. Contudo, foi a partir da década de 1960, que a
agricultura brasileira efetivamente se inseriu no contexto do desenvolvimento do país.
No que se refere ao pacote tecnológico chamado de Revolução Verde, que
incluía o uso de máquinas, equipamentos, fertilizantes, agrotóxicos, sementes e
matrizes melhoradas, para o Brasil, a adoção desse pacote permitiu a implantação em
larga escala de sistemas monoculturais com emprego intensivo de uso de fertilizantes
e de agrotóxicos, além da abertura de um imenso mercado de máquinas, sementes e
insumos agrícolas (AGUIAR; MONTEIRO, 2005)

Com efeito, a questão da terra, no caso do Brasil, foi marcada, na década


de 1970, pela expansão das empresas capitalistas (do setor bancário, industrial e
comercial) no campo e pelo processo de expropriação e concentração da propriedade
e do capital (MARTINS, 1995). Esse contexto trouxe como consequência a
transformação radical da agricultura, integrando-a à dinâmica do processo industrial de
produção propiciada, principalmente, pelo crédito subsidiado, de sorte que “os maiores
proprietários, em terras melhores, tiveram acesso a crédito, subsídios, pesquisa,
tecnologia e assistência técnica, a fim de produzir para o mercado externo ou para a
agroindústria” (MARTINE, 1991, p. 10). Em contrapartida, os produtores menos
capitalizados ficaram à margem, pois as condições a que estavam submetidos não
lhes asseguravam a participação no mercado.

O agronegócio, na realidade brasileira, na última década, tem se


destacado com a expansão da produção agropecuária e o aumento das exportações
de commodities e tem como características principais o uso intensivo de tecnologias,
as pesquisas científicas inovadoras e as políticas oficiais de financiamento. Contudo,
segundo Fernandes (2008) o processo de construção da sua imagem esconde seu
caráter concentrador, predador, expropriatório e excludente para dar importância
somente ao caráter produtivista. Ampliando a reflexão, Carvalho (2013, p.31-32)
afirma:

As opções empresariais consideradas pelo agronegócio como


promissoras para ampliar a acumulação capitalista pela via da
espoliação são as estratégias burguesas da concentração da
terra, da produção agropecuária e florestal em larga escala, do
monocultivo e da busca de um produtivismo insano que lhes
induz ao uso intensivo de agrotóxicos, de hormônios, de
herbicidas e de sementes hídricas, transgênicas, além de
exercitarem hodiernamente o desprezo sociocultural pelos
povos do campo e a desterritorialização dos camponeses. E
tudo isso numa tendência consentida do agrário brasileiro.

Camacho (2012) complementa as ideias de Carvalho (2013) quando menciona


a monocultura como uma realidade muito própria do agronegócio, a qual fragiliza a
biodiversidade, contribuindo para o aumento de pragas, por conta da homogeneização
do ecossistema, e ainda traz riscos a segurança alimentar, uma vez que sua produção
se destina para o mercado externa. Além disso, tem como marca o uso de agrotóxicos
que acabam poluindo o solo e a água, provocando a destruição da biodiversidade
brasileira.

Nesse modelo de desenvolvimento as pessoas e a natureza se tornam


mercadorias. Assim, enquanto que os empresários do agronegócio concentram renda
e riqueza através do lucro, os povos laboriosos do campo – agricultores familiares,
ribeirinhos, extrativistas, quilombolas, dentre outros - têm como centro das suas
racionalidades e emoções a reprodução social de suas famílias e desfrutam uma
relação amorosa com a natureza (CARVALHO, 2013).

Um aspecto que se pode destacar nessa reflexão é a dimensão ideológica


presente no modelo de desenvolvimento do agronegócio apresentado por Fernandes;
Molina (2004). Tal dimensão tem a perspectiva de combinação e de oposição,
dependendo da conveniência. A combinação é realizada como se a agricultura
capitalista e a camponesa mesma natureza. Enquanto a agricultura capitalista se
realiza a partir da exploração do trabalho assalariado e do controle político do
mercado, a agricultura camponesa ou familiar é intensamente explorada por meio da
renda capitalizada da terra, ficando somente com uma pequena parte da riqueza que
produz, sendo a maior parte apropriada pelas empresas que atuam no mercado.
A perspectiva da oposição ocorre por meio da fragmentação da agricultura
camponesa em pequenos agricultores empobrecidos (camponeses) e capitalizados
(agricultores familiares), considerados atrasados e modernos respectivamente. Daí é
que o empobrecimento e a capitalização dos camponeses não aparecem como
resultados da desigualdade gerada pela renda capitalizada da terra, mas como
diferentes tipos de organização do trabalho.
Destacam-se ainda os autores, o esforço que o agronegócio faz para
convencer a todos de que é responsável pela totalidade da produção da agropecuária.
A grande mídia, no geral, propaga os resultados das safras, creditando toda a
produção na conta do agronegócio. O agronegócio, estrategicamente, se apropria de
todos os resultados da produção agrícola e da pecuária com se fosse o único produtor
do país e ainda disputa a maior quantidade de recursos públicos.
Outro aspecto que se destaca é a perspectiva de território que segundo
Fernandes (2013) o capital e o campesinato possuem territórios distintos. São
totalidades diferenciadas, onde são produzidas diferentes relações sociais, promovem
modelos divergentes de desenvolvimento. Assim expressa o autor:

enquanto o agronegócio organiza seu território para produção


de mercadorias, o grupo de camponeses organiza seu
território, primeiro, para sua existência, precisando desenvolver
todas as dimensões da vida. Esta diferença se expressa na
paisagem e pode ser observada nas distintas formas de
organização dos dois territórios. A paisagem do território do
agronegócio é homogênea, enquanto a paisagem do território
camponês é heterogênea. A composição uniforme e
geométrica da monocultura se caracteriza pela pouca presença
de pessoas no território, porque sua área está ocupada por
mercadoria, que predomina na paisagem. A mercadoria é a
expressão do território do agronegócio. A diversidade dos
elementos que compõem a paisagem do território camponês é
caracterizada pela grande presença de pessoas no território,
porque é neste e deste espaço que constroem suas
existências, produzindo alimentos. Homens, mulheres, jovens,
meninos e meninas, moradias, produção de mercadorias,
culturas e infraestrutura social, entre outros, são os
componentes da paisagem dos territórios camponeses
(FERNANDES, 2008, p. 285-286).
De acordo com a reflexão apresentada ficam evidenciadas como os dois
espaços constroem realidades bastantes adversas. Dando continuidade a reflexão de
Fernandes (2008), o autor menciona que a globalização trouxe a hegemonia das
políticas neoliberais e esta provocou a emergência do conceito de território em duas
direções. A primeira toma como referência o Paradigma do Capitalismo Agrário (PCA)
em que o significado de Território é utilizado muito próximo ao conceito de espaço ou
de região e as análises sobre as contradições e as conflitualidades estão ausentes.
Nesse caso, as empresas do agronegócio se territorializam por meio da monocultura
para exportação. A segunda é denominada de Paradigma da Questão Agrária (PQA)
em que o ponto de partida do Território é a soberania, explicitada pela resistência à
desterritorialização que acontecem por meio das políticas de desenvolvimento. A partir
daí, mantém o controle pelos empreendimentos principalmente pelas tecnologias e
pelo mercado. O capital administra o processo de desterritorialização dos camponeses
e também a sua reterritorialização com a mercantilização das políticas públicas, como
por exemplo, a reforma agrária.
No âmbito da territorialização do campesinato, Fernandes (2008) destaca
que a expansão dos territórios tem como fator importante a luta pela terra e as
políticas de reforma agrária. No entanto, o capital tem o poder de se territorializar mais
rápido que o campesinato por causa das desigualdades geradas pelo modo de
produção capitalista, que expropria o campesinato de seus territórios.

III. AGRICULTURA FAMILIAR: UMA CATEGORIA RECONHECIDA E LEGITIMADA


HISTORICAMENTE

Para compreender a agricultura familiar no contexto atual tomou-se como


referência inicial estudos que refletem a categoria camponês. Assim, Carvalho (2016)
menciona que o conceito de camponês ocupou um lugar de destaque nas ciências
sociais brasileiras nos anos de 1950, ao mesmo tempo em que se afirma como
identidade política em nível nacional. É nesse contexto que emergem as Ligas
Camponesas quando a grande concentração de terras e a extrema desigualdade
social se tornam mais evidentes com as mudanças verificadas nas relações de
trabalho e aparecem como fundamentos da questão agrária brasileira.
Maestri (2016) compreende como unidade produtiva camponesa o núcleo
de pessoas que se dedicam a uma produção agrícola e artesanal autônoma que conta
de maneira essencial com a força e a divisão familiar do trabalho. Produz, por um lado,
para a satisfação das necessidades familiares de subsistência e, por outro lado,
mercantiliza parte da produção para comprar outros produtos, como também
serviços, etc.
Para Görgen (2016) na agricultura camponesa o trabalho é familiar, não
assalariado, tem uma produção diversificada, combinando a produção animal com a
vegetal e faz agricultura e criação de animais o ano todo. Tem os laços de família
como fortes componentes do modo de existir e da cultura camponesa. Nesse contexto,
diz o autor:

A diversidade cria identidades locais e ambientais. Liga


territórios, práticas sociais, ambientes e cultura. Cimenta
identidades culturais que se transformam em trincheiras de
resistência. Produz sujeitos políticos coletivos que lutam por
direitos, por tradições, por sobrevivência e por perspectivas de
futuro sem destruição de sua própria história e seus meios de
vida. Levanta o desafio do diálogo, do respeito e da construção
da unidade política entre varias culturas e identidades
camponesas para a luta comum pelo direito à existência e pelo
direito à construção do futuro (GÖRGEN, 2016, p. 103).

Para Wanderley (2014) o campesinato brasileiro assume dupla conotação.


A primeira que corresponde as formas mais tradicionais da agricultura, realizadas em
pequena escala, dispondo de parcos recursos produtivos, pouco integrado ao mercado
e à vida urbana e frequentemente identificado à incivilidade e ao atraso econômico e
social. A segunda é o forte conteúdo político que a palavra “camponês” carrega por
conta da associação ao movimento camponês que emergiu historicamente no Brasil
nos anos de 1950 e que foi duramente perseguidos nos anos dos governos militares
Ianni (2016) no texto intitulado “A utopia camponesa” na sua reflexão
denomina os camponeses de pequenos produtores, de sitiantes, de posseiros, de
colonos, se organizam em prol da luta pela terra, e além de quererem a posse e uso
da terra e certa apropriação do seu trabalho, representa um modo de organizar a vida,
uma cultura, uma visão da realidade, representa uma comunidade. Para o autor essas
características fazem do campesinato uma força relevante que aponta e reaponta
continuamente outra forma de organizar a vida. Dando continuidade a reflexão do
autor, este afirma:
Há na comunidade camponesa ou nas formas camponesas de
viver e trabalhar uma sugestão ou uma metáfora do que
poderia ser o modo futuro de organizar a sociedade. E eu vejo
nisso uma das forças, senão a força do movimento camponês.
Eu vejo nisso a utopia camponesa, a importância do
campesinato como história (IANNI, 2016, p.65).

Nessa perspectiva, Ianni (2016) conduz seu entendimento mencionando


que a luta do campesinato pela terra e pela posse da terra e pelo uso da terra e o
produto do seu trabalho a seu modo constitui um obstáculo ao desenvolvimento da
ordem burguesa. Assim, a luta do campesinato para o autor tem uma conotação
revolucionária e aponta duas razões: a primeira pela resistência do camponês à
proletarização no campo e na cidade, à subordinação real do trabalho ao capital. A
segunda, é que a luta pela terra impede ou dificulta a monopolização da terra pelo
capital, a sua transformação em propriedade mercantil, o desenvolvimento extensivo
do capitalismo na agricultura.
Para o autor o caráter revolucionário atribuído aos camponeses “está na
afirmação e reafirmação da comunidade, da comunidade como totalidade social,
política, econômica e cultural. A sua radicalidade está na desesperada defesa das
suas condições de vida e trabalho” (IANNI, 2016, p.68).
Em se tratando da Agricultura Familiar esta passou a ser uma categoria
sociopolítica do meio rural que emergiu nos anos de 1990, resultado da luta dos
movimentos sociais no campo, especialmente o sindicalismo rural. Na época, teve
destaque o 1º Grito da Terra Brasil, manifestação de trabalhadores do campo, ocorrido
em 1994, em Brasília (DF) que teve como bandeiras de luta a reforma agraria, o
crédito agrícola, a preservação ambiental, os direitos sociais e trabalhistas, a
previdência social e a saúde (NIEDERLE; FIALHO; CONTERATO, 2014) No que se
refere ao reconhecimento dessa categoria sociopolítica no país Picolotto (2014)
menciona que tem ocorrido de três formas distintas, mas que se complementam entre
si. Assim afirma:

A primeira diz respeito ao aumento de sua importância política


e dos atores que se constituíram como seus representantes
(com a formação da Federação dos Trabalhadores na
Agricultura Familiar (FETRAF) como organização específica de
agricultores familiares e, de outro lado, com a reorientação
política da Confederação Nacional dos Trabalhadores na
Agricultura (CONTAG), que a partir de meados dos anos 1990,
passou a fazer uso da categoria agricultor familiar. A segunda
se refere ao reconhecimento institucional propiciado pela
definição de espaços no Estado, criação de políticas públicas e
pela Lei da Agricultura Familiar. E a terceira advém do trabalho
de reversão das valorações negativas que eram atribuídas a
este modelo de agricultura, tais como: atrasada, ineficiente e
inadequada (PICOLOTTO, 2014, p.2).

No contexto do reconhecimento, o governo brasileiro, mais


especificamente o de Fernando Henrique Cardoso, criou o Programa Nacional de
Fortalecimento da Agricultura (PRONAF) em 1995, o Ministério do Desenvolvimento
Agrário (MDA) e a Secretaria da Agricultura Familiar (SAF) em 1999, e em 2006, foi
regulamentada a Lei da Agricultura Familiar que reconheceu a categoria social de
agricultor familiar, definiu sua estrutura conceitual e passou a balizar as políticas
públicas para este grupo social (SCHNEIDER; GRISA, 2015).
Para Wanderley (2014) a agricultura familiar ao ser absorvida pelo Estado,
através da instituição do PRONAF, ocorreu uma diluição do conteúdo histórico-politico
inspirado na palavra camponês, ao mesmo tempo, afirmava-se o reconhecimento da
condição de produtor agrícola e a valorização de suas particularidades. É uma
categoria que passou a ser valorizada tanto pelas instituições do Estado como pelos
próprios trabalhadores da agricultura familiar. Nesse contexto, afirma Carneiro (1997,
p.70):

eleger a agricultura familiar como protagonista da política


orientada para o desenvolvimento rural, apesar de todos os
impasses da ação pública, não deixa de ser um indicativo de
mudanças na orientação (ao menos no discurso) do atual
governo em relação à agricultura e aos próprios agricultores.

Historicamente, nas regiões brasileira, nos anos de 1990, tornou-se


crescente a organização de camponeses com vista a afirmação da autonomia dos
agricultores familiares, “considerando-os portadores de uma experiência camponesa,
que os torna capazes de assumir, sob outros moldes, o progresso da agricultura e do
meio rural brasileiro” (WANDERLEY, 2014, p.31). A autora afirma ainda que a
agricultor familiar não é um sujeito passivo, pelo contrário

ele constrói sua própria história nesse emaranhado campo de


forças que vem a ser a agricultura e o meio rural inseridos em
uma sociedade moderna. E o faz recorrendo à sua própria
experiência (camponesa) e procurando adaptar-se [...] às
novas “provocações” e desafios do desenvolvimento rural
(WANDERLEY, 2003, p.58)

A autora afirma ainda que a realidade do campo aponta para a existência


de produtores agrícolas, vinculados a famílias e grupos sociais que tomam como
referência o patrimônio familiar e constroem um modo de vida e uma forma de
trabalhar baseados nos laços familiares e de vizinhança. A presença dessas
características passa a considerar os camponeses nas suas múltiplas referências
identitárias, assumindo que os conceitos de campesinato e agricultura familiar podem
ser compreendidos como equivalentes.

IV. CONCLUSÃO

O agronegócio como modelo de desenvolvimento tem sido considerado


como símbolo da modernidade no campo, no entanto produz a exclusão social e
expropriação dos povos do campo decorrente da concentração de terra e de renda. Já
agricultura familiar ou camponesa possuem uma relação de equilíbrio com a natureza,
fruto de sua prática da policultura orgânica, e tem a produção de alimentos como
requisito principal, pois visam a transformação da natureza, primordialmente, como
forma de sobrevivência e não como forma mercadológica de produção de capital
(CAMACHO, 2011).
Na perspectiva da territorialização do campesinato a luta pela terra e as
políticas de reforma agrária tem como fator importante na expansão dos territórios.
Contudo, o capital tem o poder de se territorializar mais rápido que o campesinato por
causa das desigualdades geradas pelo modo de produção capitalista, que expropria o
campesinato de seus territórios.
A partir de meados da década de 1990, a Agricultura Familiar entra na
pauta política, quando o governo brasileiro instituiu legislação para a implementação
de política pública voltada para o segmento da agricultura familiar contribuindo para a
valorização do modelo de agricultura e as organizações sindicais no campo passam a
assumir como identidade política e como projeto de agricultura a ser construído no
país.

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