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Felipe Bortolanza
felipe.bortolanza@diariogaucho.com.br
O primeiro a chegar à fila postou-se na frente da porta do Sine Municipal às 23h30min do domingo. Ainda não chovia. Mas o frio e o
vento à beira do Guaíba já indicavam o sofrimento de passar a noite à espera da ficha número 1 para candidatar-se a uma vaga de
emprego. A porta, afinal, só se abriria às 8h de ontem. A vontade de conseguir um trabalho com carteira assinada é grande e só se
equipara à vergonha por estar desempregado. Tanto que não quer falar com a reportagem, muito menos tirar foto.
Atrás dele, centenas começam mais uma semana na fila por emprego em Porto Alegre. Muitos com vergonha até de mostrar o rosto. É a
face mais cruel de uma situação que atinge 13,2 milhões de pessoas no país.
Em Porto Alegre, a estimativa é de 180 mil pessoas fora do mercado. Em média, hoje, no Brasil, um trabalhador passa 14 meses até se
reposicionar no mercado. Alguns desempregados, contudo, toparam contar um pouco de sua rotina. A partir de hoje, o Diário Gaúcho
pretende acompanhar a luta destes trabalhadores em busca de recolocação no mercado.
As manhãs das segundas-feiras são as mais concorridas na porta do Sine Municipal, um dos locais mais tradicionais de busca por
trabalho no Rio Grande do Sul. Por dia, a média é de cem novas ofertas de serviço. Só neste ano, 14.047 pessoas foram encaminhadas
para empregos.
O Sine (sigla de Sistema Nacional de Emprego, vinculado ao Ministério do Trabalho) atende gratuitamente quem procura e também
quem oferece vagas. Como adendo, em Porto Alegre, também ocorrem intermediação de mão de obra, emissão de Carteira de Trabalho
– Há ainda o serviço de orientação profissional. Um psicóloga e uma assistente social auxiliam quem está há muito tempo na busca. Às
vezes, é questão de tentar uma outra atividade – diz Leandro Balardin, diretor de Trabalho, Emprego e Renda da Secretaria de
/// Onde fica: esquina das avenidas Mauá com Sepúlveda, no Centro Histórico
/// O que levar: carteira de identidade, carteira de trabalho e comprovante de endereço. Na entrevista de cadastramento, também poderá
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O segundo na fila do Sine na manhã de ontem era Jonatas Rafael Duarte, 38 anos. Morador do bairro Sarandi, saiu de casa às 4h e,
uma hora depois, estava no Centro. Há dois meses, desde que perdeu o emprego, esta é a dura rotina do homem que busca vaga de
auxiliar de limpeza:
– Está difícil se virar sem renda fixa. Mas não posso relaxar. Estou tentando também algum trabalho como carga e descarga, o que
E boa parte do salário tem destinos certos. Separado, Jonatas tem sete filhos.
entregar currículos.
financeiramente.
Centenas de currículos
Gaúcho?
– Sim.
o sustento da casa.
– Já larguei currículo em mais de cem postos de gasolina. Falam sempre que preciso passar por seleção. Está difícil.
pessoalmente.
– Preciso trabalhar, ter uma profissão. Moro com meus pais e sonho em comprar uma casa – afirma Cristiano.
Bianca dos Santos, 29 anos, é mãe de dois filhos. Na manhã de ontem, precisou deixar a casa cedo na esperança de acabar um
tormento que a incomoda desde 2014. Ela mora na Ilha do Pavão, em Porto Alegre, e procura um emprego com carteira assinada na
– Estou sem renda fixa há três anos. É muito difícil. Tenho duas crianças para criar – lamenta Bianca.
Segundo ela, na maioria das vezes, antes mesmo de conseguir entregar o currículo nas empresas, ouve das empresas:
Confiante na mudança
Municipal.
A barreira da idade
explicação:
chamando a gurizada.
– Tenho um enteado em casa, preciso ajudar no sustento da casa – conclui o porteiro, que ontem estava acompanhado da esposa.
Flagrante do desalento
O Brasil vive um triste recorde. No trimestre encerrado em maio, a população fora da força de trabalho alcançou 65,413 milhões de
pessoas, ou seja, 475 mil indivíduos a mais nessa condição do que no trimestre anterior. Hoje, 12,7% da população brasileira não
trabalha com carteira assinada – percentual que vem oscilando entre 11,8% e 13,6% nos últimos 18 meses. Os dados foram divulgados
Além da crise financeira e da retração das ofertas de emprego, o número também pode ser reflexo do desalento, segundo avaliação do
IBGE. O fenômeno ocorre, por exemplo, quando as pessoas deixam de procurar emprego após uma série de frustrações.
E ontem, a reportagem flagrou um exemplo disso. Perto das 9h, a fila já havia se esgotado na parte externa do Sine Municipal da
Capital. Um casal se aproximou da porta e perguntou se tinha muita gente à espera de atendimento. Ao ouvir do porteiro que a sala
Especialistas calculam que cerca de 60% da população fora da força de trabalho mas com potencial para voltar ao mercado esteja em
situação de desalento.