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Marcelo F .

Aquino

Do Cosmos a o Homem:
Gênese e D e s t i n o d a F i l o s o f i a

Aristóteles r e g i s t r a n a s u a Metafísica q u e " T a l e s , o f u n d a d o r d a


F i l o s o f i a , d i z s e r a água o princípio d a n a t u r e z a " . ^ O p r o b l e m a q u e
será t e m a t i z a d o n a p r e s e n t e reflexão, g i r a e x a t a m e n t e e m t o r n o d a
possível compreensão dialética d e s t a afirmação d o E s t a g i r i t a .

U m a t a l colocação d o p r o b l e m a d a autocompreensão filosófica d o


h o m e m , parte d o pressuposto q u e o p r i m e i r o p r o b l e m a d a filosofia
t e n h a s i d o o cosmológico. A n o s s a p r i m e i r a t a r e f a será a d e e x a m i -
n a r e m q u e m e d i d a tal p r o b l e m a se encontra, realmente, n a s origens
d o p e n s a m e n t o filosófico.

C o m a publicação d a h o j e clássica o b r a d e W e m e r J a e g e r , "Paidéia


— a formação d o H o m e m g r e g o " , ^ e m a i s r e c e n t e m e n t e d o p e n e -
t r a n t e e s t u d o d e B r t m o S n e l l , " A d e s c o b e r t a d o espírito", ^ a i n v e s -
tigação a c e r c a d o s primórdios d a f i l o s o f i a g r e g a e s p r a i o u - s e além d o s
l i m i t e s e s t r i t a m e n t e filosóficos. U m d o s f r u t o s m a i s s i g n i f i c a t i v o s

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do exame levado a catoo p o r J a e g e r f o i o d ef a z e r compreender o
papel decisivo que a poesia t e v e n a f o r m a ç ã o d o espírito helênico.
Graças a e s s e e s t u d o p o d e m o s a f i r m a r c o m segurança q u e o s d o i s
grandes poetas épicos d o s t e m p o s heróicos d a Grécia a n t i g a , Ho-
m e r o e Hesíodo, d e s e m p e n h a r a m o papel d everdadeiros plasma-
dores o u — c o m a s p a l a v r a s d e Platão — d e e d u c a d o r e s d o povo
grego.

Ora, aí e n c o n t r a m o s tuna discrepância i n i c i a l n o q u e d i z respeito


à afirmação d e Aristóteles. S e aceitarmos retroceder a nossa aná-
lise para o s chamados tempos heróicos d o m u n d o grego, que é
o q u e d efato já e s t a m o s fazendo, então não p o d e r e m o s afirmar
assim s e m mais que o primeiro problema filosófico t e n h a sido o
cosmológico. C o m efeito, s e houve \ u n período, onde dominou
u m a acentuada antropomorfização d arealidade, t a l período terá
sido o supramencionEido período d o s t e m p o s heróicos.

Esta antropomorfização, que chamaremos d e imediata, e que é


u m saber imediato d oh o m e m , fez-se presente e mt o d a s a s esfe-
ras d avida d o espírito g r e g o . Basta olharmos, p o r exemplo, a
própria experiência r e l i g i o s a d ogrego para compreendermos que
sob o n o m e d eZ e u s , Hermes, Atenas v e m refletida e projetada a
situação e x i s t e n c i a l - c o n c r e t a d oh o m e m grego, c o m o sseus vícios,
suas paixões, suas aspirações e seus limites. F o i outro grego,
Xenófones, q u e m compreendeu este caráter i m e d i a t o antropomór-
fico dos deuses gregos: " T u d o aos deuses atribuíram H o m e r o e
Hesíodo, t u d o quanto entre o sh o m e n s merece repulsa e censura:
roubo, adultério e f r a u d e mútua".*

Olhando d u m ponto d evista sistemático, q u e é o que nos inte-


ressa, tal i)erspectiva antropocêntrica d afilosofia grega primor-
dial não c h e g o u a s eelevar a o nível d u m a reflexão crítica explí-
cita sobre a realidade, que tomasse c o m o ponto d e p a r t i d a o pró-
prio homem. O que designamos anteriormente p o r "antropomor-
fização i m e d i a t a — saber imediato d oh o m e m " v e m a s e r a iden-
tidade inicial entre o h o m e m e o saber. Martin Heidegger, reto-
m a n d o u m a expressão j á u s a d a p o r Heráclito, c h a m a tal h o m e m
de " a n é r philósophos", ^ o h o m e m que vive pré-criticamente n u m a
identidade original c o m o saber.

1 . M e t . 983 b 2 0 — 9 8 3 b 2 1 .
2. J a e g e r , W . Paidéia — D i e F o r m u n g d e s g r i e c h i s c h e n Menschen,
d e G r u y t e r . B e r l l n 1936; tradução p o r t u g u e s a : Paidéia — A formação d o
H o m e m g r e g o , H e r d e r , São P a u l o .
3. S n e l l , B . " D i e E n t d e c k u n g d e s Geístes. S t u d i e n z u r E n t s t e h u n g
d e s europâischen D e n k e n s b e i d e n G r i e c h e n " . H a m b u r g 1955.
4. DIels-Kranz B . 11.
5. H e i d e g g e r , M . " Q u e é i s t o a F i l o s o f i a ? " , pág. 2 6 , tradução p o r t u -
g u e s a d e E m i l d o S t e i n , D u a s C i d a d e s , São P a u l o 1 9 7 1 .

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II

A ruptura que a emergência d o s a b e r crítico e f e t u o u nesta identi-


dade imediata d os a b e r c o m o próprio h o m e m , tornou viável u m a
revolução n o espírito g r e g o , que será a p r i m e i r a revolução sofrida
pelo espírito o c i d e n t a l , e que negou determinadamente a compre-
ensão antropomórfica até então predominante.

Voltemos mais u m a vez para o nosso ponto d ep a r t i d a , que jus-


tifica parcialmente o título d e s t a n o s s a reflexão. N a afirmação de
Aristóteles está s u b e n t e n d i d o que o início d a F i l o s o f i a s e e n c o n t r a
no m o m e n t o e m que o h o m e m s e v o l t a p a r a o (.Kósmos). O h o m e m
grego que, por u m movimento d o espírito, s e e l e v a a o nível d a
reflexão crítica explícita, p r o c u r a então s a b e r a origem (.arque)
da natureza iphysls). A assim chamada filosofia pré-socrática
nada mais é que a t e n t a t i v a d e resolução d o p r o b l e m a (.qual é a
a r q u e d an a t u r e z a ) . A resposta dada pode ter variado: para Tales
a água, p a r a Anaxímenes t i m apeiron indeterminado, para Herá-
clito o Noús q u e é fogo p a r a Pitágoras a u n i d a d e numérica, para
Demócrlto o á t o m o . M a s o que nos interessa é poder constatar
que para todos a resposta v e m dada a p a r t i r d o "Kósmos".

Por m noutro movimento d o espírito, e s t a p e r g u n t a inicial que o


grego s efez pela origem da natureza, s eradicaliza, ou melhor, s e
universaliza c o m o pergunta pelo ser enquanto t a l : ( o que é o ser)?
E é esta a pergunta que ocupará f u n d a m e n t a l m e n t e a atividade
especulativa d e Aristóteles. N a Metafísica e s c r e v e Aristóteles que
"há u m a ciência q u e contempla o ente enquanto ente e o que lhe
corresponde d e seu".« O pensamento metafísico o c i d e n t a l a partir
d e tíhtão tentará e n c o n t r a r o seu conceito ^ n a busca desta ciência
do ser enquanto tal.

A esta altura d an o s s a reflexão, p o d e m o s perguntar-nos pela ati-


tude concreta que o h o m e m assume perante esta ordem d e pro-
blemas que a natureza a ele põe e q u e encontrou o seu conceito
como pergunta pelo (tó ón). U m a das possibilidades de encontrar
a resposta seria a leitura d aseguinte passagem d e Aristóteles:
"... os homens começam e começaram s e m p r e a filosofar movi-
dos pela admiração. N o princípio a d m i r a d o s ante o s fenômenos
surpreendentes mais comuns; logo avançando pouco a pouco e
colocando-se problemas maiores, c o m o a s mudanças d a l u a e o
que diz respeito a o s o l , às e s t r e l a s e à geração d o i m i v e r s o . Po-

6. M e t . ( g a m m a ) 1003 a 2 0 — 1003 a 2 1 .
7. S e m p r e que nos referimos a otermo conceito, temos presente a
p a l a v r a alemã Begriff n a acepção q u e o t e r m o r e c e b e e m H e g e l . Ver
Phénoménologie d e VEsprit, n o t a 3 2 à página 1 9 , T o m e I d a tradução
f r a n c e s a d e H y p p o l i t e , J . A u b i e r , P a r i s 1939.

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rém, o q u e s ec o l o c a u m problema ou s ea d m i r a , r e c o n h e c e a sua
ignorância ( . . . ) D esorte que, filosofaram para sair da ignorân-
cia, é claro que buscavam o saber e m busca d o conhecimento".»

A dificuldade d u m a leitura desta passagem da Metafísica consiste


e m detectar c o m exatidão o s e l e m e n t o s que a compõem. Antes
de tudo, temos o fato inelutável d e q u e o h o m e m começa a filo-
sofar movido pela admiração; ademais, d eque s e admira pelos
fenômenos d o Kósmos; finalmente, d eque tal admiração s e t r a -
duz como busca d osaber, pois que o h o m e m s ereconhece igno-
rante. A partir destas considerações e s t a m o s capacitados a com-
preender o significado que a compreensão d a filosofia, n u m a
forma d e pensar que pensa a diferença e n t r e o s u j e i t o e o objeto
do seu saber, teve para o desenvolvimento d a lógica d o i ) e n s a -
mento ocidental.

Ao tentarmos sucintamente trazer a o conceito a problemática


aqui subjacente, deparamo-nos c o m a dupla constituição d o p e n -
samento d e Aristóteles. A primeira é a relevância q u e o objeto
t e m para o sujeito. A segunda é a verificação d e q u e , e m toda
essa marcha d o espírito n a b u s c a d as u a autocompreensão, che-
gamos a om o m e n t o da diferença e n t r e o h o m e m e o saber. Isto
é, p a r t i n d o d aidentidade imediata e original d oh o m e m com o
saber, chegamos à s u a negação d e t e r m i n a d a que é a compreensão
da Filosofia como a m o r pelo saber, e não m a i s como posse d o
saber. S equisermos antecipar para onde marcha toda a proble-
mática filosófica e n q u a n t o tentativa d e resolução d e s t e dualismo,
devemos recorrer a Hegel: " Averdadeira figura, n aqual a Ver-
dade existe, pode ser somente o sistema científico d a mesma.
Colaborar para que a Filosofia s eaproxime da forma da ciência,
colaborar c o m o e s c o p o , d eq u e e l a p o s s a abandonar seu n o m e d e
a m o r pelo saber e ser saber real, é a isto que m ep r o p o n h o " . °
E m outras palavras, Hegel propõe-se p e n s a r a identidade entre a
Filosofia e o Saber, querendo encontrar a verdade assim mani-
festada n o c o n c e i t o . 10

8. M e t . A , 982 b 12 — 982 b 2 1 .
9. "Die W a h r e Gestalt, I n Weleher d i eWahrheit existiert, k a n n
allein das wissenschaftliche S y s t e m derselben sein. Daran mitzuarbeiten,
dass die Philosophie der F o r m der Wissenschaft n a h e r k o m m e , — d e m
Z i e l e , i h r e n N a m e n d e r L i e b e z u m W i s s e n a b l e g e n z u kõnnen u n d w i r -
kliches Wissen zu sein, — ist es, w a s ich m i r vorgesetz". Hegel, G .W . I .
Phãnomenologíe d e s G e i s t e s , e d . H o f f m e i s t e r 6 pág. 12, q u e é a q u e
citaremos daqui por diante.
10. Hegel diz textualmente " I n d e m die w a h r e Gestalt der Wahrheit
In diese Wissenschaftlichkeit gesetzt wird, — oder w a s dasselbe ist,
indem die Wahrheit behauptet wird, a n d e m Begriffe allein das E l e m e n t
ihrer E x i s t e n z z uh a b e n " . i d e m .

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Voltemos mais u m a vez a atenção para Aristóteles, esperando
concluir esta etapa d a reflexão, n E m Aristóteles d e E s t a g i r a a
fórmula s e r c o m o s e rvisa definir a ontologia mediante a defini-
ção d o s e u o b j e t o . P o r conseguinte, o passo q u e Aristóteles dá é
o d es ep e r g u n t a r o que é o ser? S u a resposta é: " o s e r s ed i z
e m vários s e n t i d o s , a i n d a q u e e m o r d e m a u m a só c o i s a e a tuna
certa natureza única, e não u n i v o c a m e n t e " , ^ 2 o q u e i m p l i c a para
o filósofo q u e d o s e r não s e dá definição unívoca. Ora, recordan-
do-nos q u e s e r não t e m s i g n i f i c a d o nominal, m a s q u e significa a
composição e a divisão, a afirmação e a negação, e q u e , p o r t a n t o ,
s e m o s termos componentes a proposição " s e r " nada significa,
podemos entender q u e " o s e r s e d i z e m vários s e n t i d o s " , porém
e m relação a u m a única n a t u r e z a . Logo, a relação à única natu-
reza resolve o problema d a equivocidade d a linguagem, conquanto
na pluralidade d e significados e significações seja introduzível
u m a imidade sistemática a mais termos. Podemos examinar o
exemplo q u e Aristóteles n o s proporciona n a Metafísica. Sadio
diz-se d ediferentes coisas: d oanimal, d acomida, d o remédio e
da urina. M a s , além d i s s o , d i z também a d i v e r s a relação destes
termos a u m só q u e é a saúde. O r a — e c o m i s t o concluímos a
reflexão e m t o r n o d af o r m a cosmocêntrica d e p e n s a r — todo o
problema d aontologia aristotélica s e constituirá a p a r t i r d a t e n -
t a t i v a d e d e f i n i r q u a i s são n a r e a l i d a d e o s s i g n i f i c a d o s e o s m o d o s
de significação d os e r .

III

Na marcha metódica d a n o s s a reflexão, o p a s s o q u e agora s en o s


impõe, é o d e t e n t a r m o s efetuar a passagem desta forma onto-
lógica d e p e n s a r para a forma transcendental d e pensar. E m
outras palavras, tentaremos reatualizar o movimento q u e circula
entre o sdiversos níveis q u e f o r m a m a estrutura complexa, q u e
é a chamada Metafísica O c i d e n t a l , movimento q u e é s u a própria
Lógica imanente.

O pólo d o n o s s o interesse é K a n t q u e afirma claramente: "Deno-


mino transcendental todo conhecimento q u e e mgeral s e ocupa
não t a n t o c o m objetos, quanto c o m o nosso m o d o d e conheci-
mento d e objetos, n amedida e mq u e ele deve s e r possível a
priori. U m sistema d e tais conceitos denominar-se-ia filosofia
transcendental",

11. V e r a magnífica o b r a d e A u b e n q u e , F . L e problème d e Vêtre


c h e z A r i s t o t e . P a r i s , 1962.
12. M e t . ( g a m m a ) 1003 a 3 3 .
13. M e t . E , 1026 a 33.
14. " I c h n e n n e a l i e E r k e n n t n i s t r a n s z e n d e n t a l , d i e s i c h n i c h t s o w o h l
m i t G e g e n s t a n d e n , s o n d e m m i t u n s e r e r E r k e n n t n i s a r t v o n Gegenstánden,

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Se n a s páginas a n t e r i o r e s falávamos d u m a revolução " e p o c a l " n o
pensar q u e marcou a elevação d a instância pré-crítica a o nível d o
pensar crítico explícito, p o d e m o s agora falar d u m a outra revolu-
ção " e p o c a l " n o pensar, q u e desloca d oobjeto o centro d o s inte-
resses epistemológicos para encontrá-lo n o próprio sujeito q u e
conhece. K a n t m e s m o denominou este s e u procedimento d e
"revolução copemicana".

A pergunta pelo m o d o d onosso conhecimento d o s objetos, q u e


K a n t s e f a z n a Crítica d a Razão Pura, s eespecifica ulteriormente
c o m o pergunta pelas "condições d e p o s s i b i l i d a d e " d a experiência
(B.XL), d a aparição ( E r s c h e i n u n g ) (B39), d o o b j e t o como apari-
ção ( B 1 2 2 ) , d oc o n h e c i m e n t o d oobjeto (B188). Já a q u i devemos
confrontar K a n t c o m u m aprimeira observação crítica. O filósofo
de Koenigsberg afirma taxativamente — " q u e não p o d e m o s fazer
das condições especiais d a sensibilidade, condições d e possibili-
dade d a coisa, m a s s ó d a s u a aparição".

Já o próprio vocabulário d e K a n t c o m palavras tais como expe-


riência, aparição, c o n h e c i m e n t o d o objeto, mostra q u e a investi-
gação d o a u t o r d a Crítica d a Razão P u r a não g i r a m a i s e m t o m o
do ón, c o m o acontecia e m Aristóteles, e s i m e m t o m o d a s suas
condições subjetivas. E m outras palavras: K a n t cinde a reali-
dade e m realidade fenomenal e realidade numenal.

Agora é legítimo p e r g u n t a r m o s quais são p a r a K a n t t a i s condições


de possibilidade. N a Crítica d a Razão Pura ele a senumera n a
estética transcendental e n a Lógica transcendental, o u melhor
precisando: n a seção d a analítica transcendental.

As condições d e p o s s i b i l i d a d e d a experiência científica, i s t o é, d o


conhecimento d eo b j e t o s , q u e e m e r g e m n a estética transcendental,
são r e s p e c t i v a m e n t e o espaço e o tempo. Escreve K a n t : " E l e ( o
espaço) é c o n s i d e r a d o , portanto, c o m o condição d e p o s s i b i l i d a d e
da aparição, e n ã o c o m o u m a determineição d e l a dependente. É
u m a representação a p r i o r i , q u e necessariamente serve d e fimda-
mento a aparições e x t e r n a s " . i « E mais adiante: " O tempo é, por-
tanto, dado a priori. S ó n e l e é possível t o d a r e a l i d a d e d a aparição.

i n s o f e r n c U e s e a p r i o r i môglich s e i n s o U , überhaupt beschâftigt". K a n t , I .


K r i t i k d e r r e i n e n V e r n u n f t , Edição d a P h i l o s o p h i s c h e B i b l i o t h e k , pág. 5 5 •
B 25, q u e c i t a r e m o s d a q u i p o r d i a n t e .
15. " W e i l w i r d i e b e s o n d e r e n Bedingungen d e r Mõglichkeit d e r
S i n n l i c h k e i t n i c h t z u B e d i n g u n g e n d e r Mõglichkeit d e r S a c h e n , sondem
n u r i h r e r E r s c h e i n u n g m a c h e n k o n n e n " . K a n t , I . i d e m , pág. 7 1 B 4 3 .
16. " E r ( d e r R a u m ) w i r d a l s o a i s d i e B e d i n g u n g d e r Mõglichkeit
d e r E r s c h e i n u n g , u n d n i c h t a i s e i n e v o n i h n e n abhãngende B e s t i m m u n g
angesehen, u n d i s teine Vorstellung a priori, d i e notwendigerweise
âusser d e n E r s c h e i n u n g e n z u m G r u n d e l i e g t " . K a n t , I . i d e m , pág.
67 B 3 9 .

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Estas p o d e m cessar, m a s o tempo m e s m o ( c o m o a condição geral
da sua possibilidade) não p o d e ser supresso".^^

Na seção d a analítica transcendental p o d e m o s verificar que a s


categorias e a percepção t r a n s c e n d e n t a l são a l i assumidas c o m o
as condições d e possibilidade d a experiência científica. Citando
novamente o filósofo: " a s s i m são a s c a t e g o r i a s , condições d e p o s -
sibilidade d a experiência e , p o r t a n t o , valem a priori também d e
todos o sobjetos d a experiência",

Após e s t a caracterização sumaríssima d a f o r m a d epensar antro-


pocêntrica, a n a l i s a d a n asua expressão máxima, que é o pensa-
mento d eI m m a n u e l Kant, passemos a u m a consideração crítica,
que a situe no vasto horizonte da reflexão d o h o m e m ocidental.

Antes d emais nada, podemos dizer com absoluta segurança que


u m dos principais problemas suscitados por K a n t e por ele não
solucionados, é o d a "coisa-em-si". K a n t quis fundar u m a filo-
sofia crítica q u e c o m o tal pusesse a atividade d o sujeito como
base para toda fundamentação d e v e r d a d e e , p o r conseguinte, fun-
dasse a verdade na liberdade d os u j e i t o . E n t r e t a n t o , a os e referir
à " c o i s a r e m - s i " , o u s e j a , a o número, K a n t p ô s u m limite a tal liber-
dade e a tal atividade d o sujeito. Conseqüentemente, c r i o u - s e n a
f i l o s o f i a k a n t i s t a , i s t o é, n a forma antropocêntrica d e pensar, m n a
discrepância entre a s categorias d a razão, que são a p r i o r i e s e
referem à s u b j e t i v i d a d e , e a c o i s a - e m - s i , também e l a a p r i o r i , m a s
tendo caráter o b j e t i v o . C o m base nessa premissa, podemos, com-
preender c o m o s e evidencia n afilosofia kantiana imia oposição
entre subjetividade e objetividade. E s t a oposição s e manifestará
nas correntes sucessivas d op e n s a m e n t o , assumindo o caráter d e
divergência o u d e e s t r a n h a m e n t o recíproco e n t r e a atividade teo-
rética e prática d o h o m e m . É precisamente nesta perspectiva que
u m número s i g n i f i c a t i v o d e filósofos p o s t e r i o r e s assimiirá a t a r e f a
de reunificar estes dois aspectos, o teorético e o prático, recons-
truindo desse m o d o a unidade d a Razão.

C o m esta crítica, t a l v e z demasiado c l a r a , não s e n e g a que o pró-


prio K a n t notara a s ambigüidades e a a p o r i a subjacente a o seu
pensar. Foi n u m a tentativa d eabrir caminho para a jimção d e
sensação e intelecto que ele apelou para o chamado "esquematis-
m o transcendental".

17. "Die Zeit ist also a priori gegeben. I n i h rallein i s t alie


W i r k l i c h k e i t d e r E r s c h e i n u n g e n mõglich. D i e s e Kõnnen i n s g e s a m t w e g -
f a l l e n , a b e r s i e s e l b s t ( a i s d i e a l l g e m e i n e B e d i n g u n g i h r e r Mõglichkeit)
k a n n n i c h t a u f g e h o b t w e r d e n " . K a n t , I . i d e m , pág. 7 4 B 4 6 .
18. " S osind d i e K a t e g o r i e n B e d i n g u n g e n d e r Mõglichkeit d e r
E r f a h r u n g , u n d g e l t e n a l s o a p r i o r i a u c h v o n a l l e n Gegenstánden d e r
E r f a h r u n g " . K a n t , I . K . B . V . pág. 180 b B 1 6 1 .

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o Schematismus kantiano apresenta-se c o m o a figura sensível,
diferenciável n o espaço e n o t e m p o , e, contudo, por outro lado,
c o m o a permanência lógico-estrutural que fixa a s variações d o
sensível e m relações c o n s t a n t e s . Desse modo, n o"esquema" en-
contram a sua unidade o devir temporal e a multiplicidade espa-
cial c o m a sformas constantes d e representação d o m u n d o logi-
camente conexas. Através d e t a i s representações alcançamos o s
objetos verdadeiros, enquanto chegamos a conhecê-los cientifica-
mente. E m outras palavras, o "esquematismo" tenta evitar recon-
duzir tudo a oexterior, o uà "coisa-em-si", b e m c o m o reconduzir
tudo a ointerior, isto é, à e s p o n t a n e i d a d e d o pensamento.

O "esquematismo", e m última anáUse, é u m a primeira tentativa,


por parte d eK a n t , d es o l u c i o n a r o problema d aduaUdade esta-
belecida por ele entre subjetividade e objetividade, e m e s m o d e
harmonizar a liberdade c o m seus condicionamentos. Entretanto,
permanece e mK a n t uma, ambigüidade d e a t i t u d e que s e mani-
festa e m não q u e r e r fixar-se n e m n o princípio único d a c o i s a - e m -
-si, n e m n o princípio único d o e u criador. Por outro lado, o "es-
quematismo" já s i g n i f i c a n ohorizonte d o ahtropocentrismo kan-
tiano, a consciência d aimpossibilidade d e separar o sujeito d o
objeto.

I V

A tarefa que s e constitui, pois, para a Filosofia é pensar esta


identidade, que assumiu no desenvolvimento d es i m e s m a a figura
de sujeito e objeto contrapostos. O m e s m o dito e m outras pala-
vras, à Filosofia cabe o e l e v a r - s e d o nível d o p u r o conhecer para
o nível d o r e c o n h e c e r . Neste sentido, a afirmação d e H e g e l que
"O verdadeiro é o todo. O todo porém é a s u a essência q u e s e
completa pelo seu desenvolvimento", aponta u m caminho para
o filósofo, q u e , tendo penetrado nas formas d ep e n s a r que enfa-
tizar£im a u n i l a t e r a l i d a d e d u m a relação imediata, seja ela d o
objeto para o sujeito, o ud osujeito para o objeto, compreendeu
que é só n o pensar a reciprocidade interior das relações d o t o d o
no seu desenvolvimento que s e encontra o futuro d a própria
Razão!

19. " D a s w a h r e ist das Ganze. Das Ganze aber ist n u r das d u r c h seine
E n t w i c k l u n g s i c h v o l l e n d e n d e W e s e n " . H e g e l , G . P . W . P h . G . pág. 2 1 .

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