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2.8.

Caboclo das Sete Encruzilhadas


Para podermos compreender a elevação deste espírito,
reproduziremos a seguir, na íntegra, o capítulo XXIII do livro “O
Espiritismo, a Magia e as Sete Linhas de Umbanda” do escritor Leal de
Souza.

Leal de Souza era um pesquisador muito sério do Espiritismo e


também muito ligado à Tenda Nossa Senhora da Piedade e ao Caboclo
das Sete Encruzilhadas.

Se alguma vez tenho estado em contato consciente com algum espírito


de luz, esse espírito é, sem dúvida, aquele que se apresenta sob o
aspecto agreste e o nome bárbaro de Caboclo das Sete Encruzilhadas.

Sentindo-o ao nosso lado, pelo bem estar espiritual que nos envolve,
pressentimos a grandeza infinita de Deus e, guiados pela sua proteção,
recebemos e suportamos os sofrimentos com uma serenidade quase
ingênua, comparável ao enlevo das crianças, nas estampas sacras,
contemplando, da beira do abismo, sob as asas de um anjo, as estrelas
no céu.

O Caboclo das Sete Encruzilhadas pertence à falange de Ogum, e, sob


a irradiação da Virgem Maria, desempenha uma missão ordenada por
Jesus. O seu ponto emblemático representa uma flecha atravessando
um coração, de baixo para cima. A flecha significa direção, o coração,
sentimento, e o conjunto, orientação dos sentimentos para o alto, para
Deus.

Estava este espírito no espaço, no ponto de intersecção de sete


caminhos, chorando sem saber o rumo a tomar, quando lhe apareceu,
na sua inefável doçura, Jesus, que mostrando-lhe uma região da Terra,
as tragédias da dor e os dramas da paixão humana, indicou-lhe o
caminho a seguir, como missionário de consolo e redenção. Em
lembrança desse incomparável minuto de sua eternidade e para se
colocar no nível dos trabalhadores mais humildes, o mensageiro de
Cristo tirou seu nome do número dos caminhos que o desorientavam,
ficou sendo o Caboclo das Sete Encruzilhadas.

Iniciou, assim, a sua cruzada, vencendo, na ordem material, obstáculos


que se renovam quando vencidos e dos quais o maior é a qualidade das
pedras com que se deve construir o novo templo. Entre a humildade e
a doçura extremas, a sua piedade se derrama sobre quantos o

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procuram e, não poucas vezes, corre pela face do médium as lágrimas
que expressam a sua tristeza, diante dessas provas inevitáveis das
quais as criaturas não podem fugir.

A sua sabedoria se avizinha da onisciência. O seu profundíssimo


conhecimento da Bíblia e das obras dos doutores da igreja autorizam
a suposição de que ele, em alguma encarnação, tenha sido sacerdote,
porém a medicina não lhe é mais estranha do que a teologia.

Acidentalmente, o seu saber se revela. Uma ocasião para justificar uma


falta por esquecimento de um de seus auxiliares humanos, explicou,
minucioso, o processo de renovação das células cerebrais, descreveu
os instrumentos que servem para observá-las e contou numerosos
casos de fenômenos que os atingiram e como foram tratados na
Grande Guerra escrita em 1914. Também, para fazer os seus discípulos
compreenderem o mecanismo dos sentimentos, se assim posso
expressar-me, explicou a teoria das vibrações e a dos fluidos e, numa
ascensão gradativa, na mais singela das linguagens, ensinou a homens
de cultura desigual as transcendentes leis astronômicas. De outra feita,
respondendo a consulta de um espírita que é capitalista em São Paulo
e representa interesses europeus, produziu um estudo admirável da
situação financeira para a França, pela quebra do padrão ouro na
Inglaterra.

A linguagem do Caboclo das Sete Encruzilhadas varia, de acordo com


a mentalidade de seu auditório. Ora chã, ora simples, sem nenhum
atavio, ora fulgurante nos arrojos da alta eloquência, nunca desce
tanto, que se abastarde, nem se eleva demais, que se torne inacessível.
A sua paciência de mestre é, como sua tolerância de chefe, ilimitada.
Leva anos a repetir, em todos os tons, por meio de parábolas, de
narrativas, o mesmo conselho, a mesma lição, até que o discípulo
depois de tê-lo compreendido comece a praticá-lo.

A sua sensibilidade ou perceptibilidade é rápida, surpreende. Resolvi,


certa vez, explicar os dez mandamentos da lei de Deus para meus
companheiros e, à tarde, quando me lembrei da reunião da noite,
procurei, concentrando-me, comunicar-me com o missionário de Jesus,
pedindo-lhe uma sugestão, uma ideia, pois não sabia como discorrer
sobre o mandamento primeiro. Ao chegar à tenda, encontrei o seu
médium, que viera apressadamente das Neves, do município de São
Gonçalo, por uma ordem recebida à última hora, e o Caboclo das Sete
Encruzilhadas, baixando em nossa reunião, discorreu

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espontaneamente sobre aquele mandamento. Concluindo disse-me:
Agora, nas outras reuniões, podeis explicar aos outros como é o vosso
desejo.

E esse caso se repetiu: - Havia a necessidade de falar sobre as Sete


Linhas de Umbanda e, incerto sobre a de Xangô, implorei
mentalmente, o auxílio desse espírito, e, de novo, o seu médium, por
ordem de última hora, compareceu à nossa reunião, na qual o grande
guia esclareceu, numa locução transparente, as nossas dúvidas sobre
essa linha.

A primeira vez em que os videntes o vislumbraram, no início de sua


missão, ele se apresentou como um homem de meia idade, a pele
bronzeada, vestindo uma túnica branca, atravessada por uma faixa
que brilhava, em letras de luz, a palavra “CARITAS”. Depois, e por muito
tempo, só se mostrava como caboclo, utilizando tanga de plumas e
demais atributos dos pajés silvícolas. Passou, mais tarde, a ser visível
na alvura de sua túnica primitiva, mas há anos acreditamos que só em
algumas circunstâncias se reveste de forma corpórea, pois os videntes
não o vêem, e quando a nossa sensibilidade e outros guias assinalam
a sua presença, fulge no ar uma vibração azul e uma claridade dessa
cor paira no ambiente.

Para dar desempenho à sua missão na Terra, o Caboclo das Sete


Encruzilhadas fundou quatro tendas em Niterói e nesta cidade, e,
outras fora das duas capitais, todas da Linha Branca da Umbanda e
Demanda.

2.9. O legado de Pai Zélio


Não poderíamos iniciar este tópico sem as célebres palavras de W. W.
da Matta e Silva:

“Zélio de Moraes foi um médium exemplar e com o Caboclo das Sete


Encruzilhadas se conjugaram em uma brilhante missão. Foram
vanguardeiros ostensivos que plantaram as primeiras sementes de
reação e do protesto doutrinário, contra as práticas fetichistas das
matanças e dos sacrifícios às divindades...”

O Caboclo das Sete Encruzilhadas, muitas vezes chamado “O Chefe”


por seus adeptos, nunca permitiu que seu médium recebesse qualquer
remuneração pelos trabalhos espirituais realizados. Zélio nunca
exerceu a mediunidade como profissão, trabalhando para sustentar a

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família e, diversas vezes, contribuía para a manutenção das tendas
fundadas pelo Caboclo.

Em 1967, após 59 anos de atividade junto à Tenda nossa Senhora da


Piedade, Zélio decidiu passar a direção dos trabalhos para suas filhas
Zélia e Zilméia, e passou a viver em Boca do Mato, no município de
Cachoeiras de Macacu, a 160 quilômetros do Rio de Janeiro, com sua
esposa Dona Isabel.

Nesse recanto privilegiado da Natureza continuou a atender os


necessitados do corpo e da alma, na Cabana de Pai Antônio.

O radialista, escritor e presidente da Federação Umbandista do


Grande ABC, Ronaldo Linares, foi seu amigo por muitos anos e
registrou a última mensagem do Caboclo das Sete Encruzilhadas
através de seu médium:

“Meus irmãos: sejam humildes. Tragam o amor no coração para que


sua mediunidade possa receber espíritos superiores, sempre afinados
com as virtudes que Jesus pregou na Terra, para que os necessitados
possam encontrar socorro nas nossas casas de caridade. Aceitem meu
voto de paz, saúde e felicidade, com humildade, amor e carinho”.

Depois de 66 anos de mediunidade, Zélio desencarnou em um sábado,


dia 3 de setembro de 1975. Deixando como legado uma religião que
socorre a todos, sem distinção, mesmo desencarnados. E é nossa
responsabilidade levar adiante a bandeira de Oxalá que ele nos
entregou, de forma que possamos ser o exemplo e a prova da glória e
da grandeza da Umbanda.

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