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A segunda hipótese é a de que João de Ruão teria participado com esculturas da constução do
Les tombeaux de la cathedrale de Rouen, porque segundo documentos da época uma artista
de nome Jehan de Rouen havia contribuido come esculturas melhores. Esta hipótese é
refutada pela idade de João, visto que o mesmo Jehan de Ruen já havia participado da
construção da capela da Assunção da cidade em 1510-1511, tornando a cronologia de Ruão
impossível se estes fossem a mesma pessoa. "Se atribuirmos ao nosso João de Ruão o mesmo
número de anos em 1580, quando faleceu, teria vindo à luz em 1498, o que tornava impossível
que em 1510-11 já tivesse categoria a llhe ser possível executar a obra indicada" p.22
"Estes dados têm o suficiente grau de probabilidade a poder vir-se à afirmação de que este
Jehan de Rouen, que fazia parte da campanha de Pierre des Aubeaux em Ruão e Gisors era
mais velho que nosso João de Ruão e distinto dele, tratando-se de um dos numerosos casos
de homonimia do tempo, que igualente entre nós causam o desespero dos investigadores"
p.22
"Afastada a probabilidade de Jehan de Rouen do túmulo dos cardeais ser o nosso Mestre João
de Ruão, de maior credibilidade é o parentesco de estilo com o dos Justos, e claro se torna o
caminho seguido pelo estilo delicado, digamos, amoroso, dos seguidores florentinos dos
mestres do meado de quatrocentos, educando os Justos e, por sua vez, estes transmitindo-o
ao nosso Ruão. Caminhos largos, com rodeios, como frequentemente se deparara não só na
história da Arte." p.22
[PESQUISA] O Maneirismo e o Estatuto
Social dos Pintores Portugueses - Vitor
Serrão
segunda-feira, 12 de março de 2018
17:57
Prefácio (p. 9-18)
Entre a segunda metade do século XVI e o primeiro terço do século XVII há um movimento de
classe entre os pintores portugueses que, embora assumisse formas heterogéneas no seu
programa reivindicativo, se traduz num notório ascenso do estatuto social do artista através da
luta contra a rígida estrutura corporativa a que estavam subordinados e pelo reconhecimento
da nobreza e liberalidade da sua profissão.
A partir da documentação disponível o autor afirma que foi com o maneirismo que o produtor
de imagens conseguiu evoluir desde sua situação de servil artesão até à de artista
independente, individualizado como criador e com alguma importância no tecido social (p.9)
isso em portugal
Esta ascensão não se deve a qualidades internas do ofício artístico, mas a um real movimento
de luta: "ora através de pleitos com as autoridades, pelos quais os pintores procuravam
desligar-se das obrigações inerentes à Bandeira mesteral (onde, na qualidade de mecânicos, os
membros da classe estavam indistintamente agrupados); ora através de reivindicações
pontuais de privilégios e de regalias; ora ainda em pleitos com a clientela, ou com os
examinadores das suas obras, exigindo melhores preços pelo seu trabalho; através de
estruturas de associativismo e de protecção à classe (caso das Irmandades de São Lucas);
através, enfim, de demandas requerendo o regime de Arte Liberal para a arte da Pintura e o
estatuto de Nobreza para os seus cultores." p.9
-novo estatuto de classe para o produtor de imagens
Ascensão do estato de "oficial mecânico", que laborava à sombra das corporações dos ofícios -
dentro de um regime mesteral que radica na Idade Média, e nele nivelado aos pintores de
têpera, de estofado e de dourado, os simples artífices de pintura -, ao importante estrato de
artista individualizado, isento dos tributos e obrigações mesterais, e equiparado emsmo, por
vezes, à carreira da nobreza.
Essa conquista de classe tem a ver com as profundas modificações operadas na sociedade
protuguesa do seculo XVI, notadamente o ascenso do capitalismo monopolista e ao poder
concentracionário das grandes Companhias constituídas no rescaldo dos Descobrimentos, que
agudizaram confrontos de classe e lutas entre estratos de uma mesma classe - temos nesse
momento em portugal os mesmo ingredientes, uma conjuntura sócio-economica e cultura
semelhante à que originara na italia do século XV a ascensão social dos artistas. Esta guinada
social foi acompanhada de uma ideologia vasta sobre a "liberalidade" da produção artística
que envolveu humanistas, como Alberti e Leonardo.
Referencias para checar: Anthony Blunt (1940), Arnold Hauser (1951) e Frederick Antal (1948).
Devido a peninsula iberica ser o bastião da contra-reforma papal, as estruturas laborais e da
organização corporati a encontravam-se solidificadas, o que desencadeou o movimento
apenas tardiamente, com o maneirismo e não com o renascimento.
O espirito da Bizarria caracterizou o maneirismo português - perfil anti-renasscentista e
anticlassicista, em bsca por efeitos caprichosos e ambíguos, elevando o orgulho do produtor
de imagens como criador e levando-o a desdenhar do pintor-artesão. Maneirismo burguês e
cortesão.
"O Maneirismom burguês e cortesão foi, particularmente no caso português, na sua feição
evoluída, um movimento unitario de larga extensão: polarizado por um estrato aristocrático
refinado,o por um claro omnipotente, as também por uma burguesia média, ascendente e
poderosa, que se cultivava e, a seu modo, olhava além das fronteiras. É natural que as
encomentas aumentem, que o gosto se modernize, que os produtores de imagens se refinem
e procurem a individualidade, dissociando-se do seu estatuto secular de mesterais". p.11
O amplo edifício dinamizado em sequencia da revolução burguesa de 1383-1385 se manteve
inflexivel em portugal até pelo menos 1572, quando há o primeiro documento que denota
sintomas de mudanças na sitação: em 1572 há a reformulação dos regimentos dos oficiais
mecânicos da cidade d eLisboa, por Duarte Nunes de Leão. É neste documento que, pela
primeira vez (e apesar de preservar toda a legislação medieval prévia) se firma uma diferença
de classe entre os pintores de óleo, de tempera e fresco, e de dourado e estofado. Seguem-se
então diversos pedidos individuais de artistas de dispensa de encargos para com a Bandeira de
Sâo Jorge e no mesmo ritmo que a classe dos pintores de óleo ascendia as demais que ficavam
pra trás se organizavam e lutavam ou pela revogação dos privilégios destes ou pela partilha
dos mesmos.
Essa movimentação denota o fim do mundo medieval e o início da era moderna. "Estas e
outras movimentações dos pintores pressupõem o fim de um mundo medieval que se
desmembra implacavelmente, sob os impulsos de uma Idade Moderna nascente a que o ciclo
do Maneirismo vinha emprestar (estética e ideologicamente) o tom e as referências de
individualismo triunfante." p.13
"A defesa da Pintura como arte liberal, utilizada preferencialmente no combate às tributações
mesterais, e subjacente a todas as movimentações da classe, aufere de um carácter prático, de
ordem eminentemente socio-economica e laboral. Para além do maior ou menor refinamento
teorizador assumido na argumentação dos artistas [...] o problema essencial que move os
produtores de imagens a autonomizarem-se como classe reside sobretudo nas pesadas
condições laborais e vínculos corporativos que atrofiam o artista, nivelado com o simples
artesão mecânico" p.14
Tal fato gera a revolta dos artesões mecanicos contra seus antigos companheiros de bandeira
e contra as autoridades que lhes negavam idênticas isenções e regalias.
Depois de meio século de lutas no XVI em favor de tais regalias, o Barroco Português no século
XVII vai representar uma regeressão de tais conquistas, ao contrário do que aconteceu na
Espanha ou na Itália. Neste período a classe se desorganiza e sofre um refluxo em suas
conquistas, restando bastiões em defesa da liberalidade da pintura mais na poesia e na música
do que entre artistas propriamente ditos. Contudo, o livro tratará especificamente sobre o
período da ascensão.
Referencia: A pintura maneirista em Portugual (1982) do mesmo autor. Esta foi aprofundada
em dissertaçao de mestrado, que é o livro que leio em questão.
"Os factos sociais, de facto, conduzem ao natural desenvolvimento de hábitos, de mecanismos
visuais e de intenções que se reflectem na produção em geral e nas obras de arte em
particular, quer na perspectiva do cliente equanto elemento de classe, como na do produtor
de imagens enquanto representante dessa ou de uma outra classe. Esta concepção dialéctica
do facto artistico impõe da parte do historiador de arte assim informado toda uma vasta série
de pressupostos e de referências analíticas que, se dificultam sobremaneira a pesquisa
(entendida em termos científicos), permitem iluminar melhor o seu objecto, conferindo um
outro fascínio e uma outra opracionalidade ao trabalho empreendido.
Nesta perspectiva de pesquisa metodológica por que nos orientamos, a renovada consciência
de classe dos pintores de óleo portugueses do período em análise, que conduziu ao
afrouxamento dos laçoes mesterais e à nobilitação da sua arte enquanto "liberal" - base de um
processo emancipador sem par no curso da História da Arte portuguesa - adquire uma outra
luz. As chaves para sua leitura serão encontradas na ideologia maneirista que informou essas
lutas, sob os auspícios caprichosos da "idea" - que a análise de obras particulares permite
definir -, e na ideologia emergente da nova situação sócio-economica gerada sob o refluxo do
processo dos Descobrimentos e o ascenso de formas capitalistas de produção - que a análise
globalizadora da sociedade vem clarificar.
E será com as devidas atenções nesta realidade complexa que a produção pictural coeva, a
ideologia tridentina que a suporta e o novo estatuto social do artista deverão ser revistos"
p.17-18
2.1 As corporações mesterais da idade média e o produtor de arte. Relações laborais e vínculos
de classe. (p. 49-81).
Até o seculo XVI em portugal o produtor de imagens foi sempre considerado um artíficie
Artificie - "um operario que exercia seu mester no seio de uma rígida estrutura artesanal das
corporações - dentro de uma tradição de trabaho assalariado que tem raízes profundas na
Idade Média." p.49
Corporações de ofícios: "organizações de classe que agrupavam os mesterais de determinado
grupo de artíficies, unidos por impulso de solidariedade e por razões de auxilio espiritual e
finaneiro, e que contribuíam para a regulamentação específica das relações laborais dentro do
mester. Orientadas para a defesa dos seus membros, assim inseridos dentro de uma estrutura
de classe devidamente estratificada, as corporações impunham aos mesterais o cumprimento
de normas rígidas de produção, normas essas que os chamados regimentos tratavam de
regular. Assim, casa profissão manual, ou ofício, aparece-nos organizada segundo normas
inflexíveis de exercício do emster, a cujo cumprimento ficavam subordinados todos quantos se
acolhiam no seio da corporção, desde o mestre ao mero aprendiz. O regimento estabelecia as
balizas reguladoras da actividade mesteral propriamente dita, a nível mecânico, definindo a
ascensão na escala hierárquica do mester (aprendiz, artífice, mestre), os vínculos e as normas
de produção, as relações laborais e o tipo de empreitadas, o preço dos produtos, as relações
de mercado, e as obrigações inerentes ao ofício relavitamente à sua corporação. O regimento
taxava ainda os salários, o preço das encomendas específicas, definia o âmbito das eleições
internas, e o tipo de contribuição dos mesterais para as festividades decorrentes no burgo ou
para as obras públicas em curso no município." p.49
Neste contexto o pintor de oleo escreveu desde sempre sua subsistencia neste quadro
artesanal como mero artífice, desenvolvendo atividade mecanica ambivalente, que ia desde
execuctar quadros avulsos e retábulos a encarnar e dourar imagens, varas e estandartes,
andores de procissão, caixas, arcos, colunas etc. Produção de imagens não era vista como
actividade artística, mas sim mera produção tecnica e manual.