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[PESQUISA] A introdução da Arte da

Renascença na Península Ibérica (actas


do simpósio internacional organizado pelo
Instituto de Historia da Arte da
Universidade de Coimbra entr 26 e 30 de
março de 1980)
segunda-feira, 12 de março de 2018
16:21
(pequeno prefácio
 
João de Ruão -Arquiteto, escultor, candeeiro e decorador (p.5)
 
Nasceu na França no início do século XVI, provavelmente na mesma cidade de que adotou o
nome
Rumou a Portugal em busca de riquezas e fortuna, pois as ricas encomendas aqui eram
abundantes
Sua atividade está atestada desde 1528, ano do seu trabalho na Igreja de Atalaia
Depois veio pra Coimbra e trabalhou até que a velhice lhe acometesse
Morre no dia 28 de Janeiro de 1580
Considerado uma das maiores glórias da Arte Portuguesa com seus 50 anos de trabalho.
Formou gerações de artistas
Tem obras em Coimbra, Cantanhede, Montemor-o-Velho, Atalaia, Tomar, Braga, Guarda,
Viseu, Oliveira de Azeméis e Penela
Não foi o primeiro a introduzir a arte da renascença em Portugal mas é a ele que cabe "a glória
de ter definitivamente divulgado e de na sua estética ter formado gerações de imaginários e
decoradores portugueses" (p.5)
 
 
 
Recordar João de Ruão - Pedro Dias (discurso de abertura do simpósio) (p.9-12)
 
João de Ruão vem a portugal nos finais da segunda década do séc. XVI com pouco mais de 20
anos
Nascido na normandia e lá instruido nas formulas da arte da primeira renascença italiana
Descrição de Portugal: "Reis pderosos, senhores dos comércios e das navegações; nores
guerreiros, corajosos e pios; prelados e abades letrados, e de pele tisnada pelo sol das praças
do Magreb. País rico, onde em todas as povoações se edificavam e reconstruíam templos, se
levantavam novos altares, se rasgavam emblemáticos portais em acção de graças, memorias
vivas de tormentas em passagens de tantos cabos sem nome, de sofridos tráficos de pimentas,
escravos e ouros." p.9
"João larga o lar paterna, a certeza de um futuro medíocre" p.9
Em narrativa apaixonada, o autor narra que João teria a esperança de levantar fama,
recomendações e dinheiro em Portugal para ir até a Itália e emparceirar com Miguel Ângelo.
Porém este nunca deixou a terra do Mondego
Chega em Coimbra em 1530, trazido por seu patrono (D. Jorge de Meneses) à Catanhede, onde
construíu a Capela de Varziela.
Antes, trabalhou para D. Jorge de Meneses, Senhor de Tancos, fanzendo decorações da sua
igreja de Atalaia do Ribatejo.
Em 1530 os frades de Santa Cruz lhe dão um chão para que este erga sua casa, junto à muralha
na Rua de São Nicolau, à Torre Velha dos Sinos. Doaram-no este terreno pois este era amigo e
servidor do moesteiro e por nele ter feito muitas e boas obras.
No documento desta doação declara-se casado com Isabel Pires
Isabel Pires: jovem filha do arquiteto mestre de carpintaria das obras régias, Pero Anes, que
tinha grandes encargos em Santa Cruz e no Paço Real
A sogra dele era irmã do arquiteto Marcos Pires que também tinha construções em Coimbra,
como parte das fábricas de Santa Cruz e do Paço.
Uma cunhada era casada com o pintor Cristovão de Figueiredo, e prima de Garcia Fernandes.
Também pertenciam a familia os pintores régios Jorge Afonso e Gregório Lopes.
É assim que ele entra no meio artístico nacional. O que certamente lhe proporcionou as
primeiras encomendas vultuosas.
Além disso: "Por outro lado, faltava na cidade um escultor de nível que se estabelecesse e
garantisse a produção escultórica necessária às obras que então se faziam, sobretudo no Paço,
em Celas e em Santa Cruz, que em 1527 vira iniciar novas reformas nos edifícios conventuais,
dirigidas pela mão firme e decidida de Frei Brás de Braga. Uma década depois foi a
transferência definitiva da Universidade, que provocou um sem número de construções, numa
cidade que em poucos anos duplicou o número dos seus habitantes." p.10
E os outros escultores? - Diogo Pires já estava no fim de sua atividade, Chantérène partira já,
"Hodart seria um meteoro brilhante demais para o firmamento português. Só Ruão ficou" p.10
Onde hoje é o colégio de santo agostinho foi o telheiro do artista junto a Diogo de Castilho, seu
sócio no Porto, em Góis e em Trofa do Vouga. Este por sua vez era irmão do arquiteto régio
João de Castilho.
Os filhos de Ruão: Jerónimo foi para Lisboa e tornou-se um arquiteto que serviu a rainha D.
Catarina. Maria casou-se com um livreiro Henrique de Colónia. João licenciou-se em direito e
foi professor na Universidade, Cosme ingressou num convento da cidade e cursou canones.
Simão foi arquiteto também mas abalou para india a serviço de portugal e de Deus. Helena
ficou solteira e acompanhou o pai até seus ultimos momentos.
Principais obras:
Para santa cruz decorou o coro-alto que Diogo de Castilho acabara em 1530, esculpiu três
imagens do Portal, levantou a obra do Jardim da Manga e na década de 40 gez o grupo da
Deposição que hoje se encontra no Museu Machado de Castro.
Para o bispo D. Jorge de Almeida contruíu pouco depois de chegar em coimbra a Porta
Especiosa. Mais tarde para outro prelado levantou a Capela do S. Sacramento (coroa a
segunda fase de atividade de Ruão). Fez para o convento de Celas muitas obras, sobretudo em
30. Fez retábulos do Convento de S. Domingos de Coimbra e o da Sé da Guarda na década de
50.
2 épocas fundamentais: "a primeira, até meados dos anos quarenta, seguindo a arte
quatrocentista italiana de raiz florentina, como os Justi a divulgaram em França; a segunda,
romanista, seguidora clara do novo maneirismo".
Principal formador dos artistas portugueses entre 1530 e 1580.
 
Prováveis origens da Arte de João de Ruão - Antonio Nogueira Gonçalves (13-22)
 
Introdução em Coimbra da arte da renascença está ligada a três nomes Nicolau Chanterene,
Hodarte e João de Ruão.
Embora os três tenham passado pela cidade, só Ruão ficou, estabelecendo oficina e formando
discipulos. Morre em 28/01/1580
Esteve em constante diálogo com o renascentismo italiano, acompanhando seu
desenvolvimento, como observado nas duas fases das obras do artista
A qualidade da pedra do centro coimbrão fez daqui um polo fornecedor das imagens de vulto
e dos túmulos dos grandes, especialmente a região acima do Tejo. Isto porque o calcário
branco, a contrastar com o granito nortenho, é mais brando, mais fácil de trabalhar permitindo
todas as delicadezas. Pedra de Ançã.
O nível economico da cidade não era elevado, permitia atividade contínua a uma só oficina de
mestre de categoria (quem permitia? A demanda ou a lei? Perguntar para professora). Assim,
não favorecia a permanencia de outros mestres de mesmo nível: os dois retiraram-se, ficou
Ruão. Era permitido porém oficinas de artistas secundários, fornecedores de entidades
modestas.
 
PROBLEMAS EM SE ESTUDAR JOÃO DE RUÃO: não se tem certeza se o escultor veio, de fato, da
cidade de Ruão na França. Alguns pesquisadores do inívio do século XX foram até a cidade
pesquisar, mas nada foi concluido ou registrado em fontes para pesquisa. Outro problema é a
cronologia de sua obra: atribuem a ele tanto obras de sua oficina quanto das de seus
fornecedores menores, misturando-as indiscriminadamente. Também atribiu-se a ele obras
executadas depois de sua morte, ou mesmo retirando-lhe a autoria de obras de grande nível.
Porém o Instituto de H. A. da UC está renovando estas pesquisas e pretende lançar luz nas
lacunas e resolver os embaraços da historiografia anterior.
 
Para uma vertente da historiografia, notadamente para os artistas que formavam a Escola
Livre das Artes e do Desenho (fundada e dirigida pelo prof Antonio Augusto Gonçalves), o
discurso sobre a obra de Ruão não ia além de considerar suas obras como ecos da arte
quatrocentista italiana, e não ia além disso. Atribuiam a isso a expansão das gravuras italianas
e dos desenhos avulsos que circulavam.
 
O autor analisa duas hipóteses difundidas na historiografia da arte portuguesa sobre os
precendentes de ruão na França. A primeira, que teria sofrido influência da 2ª geração de
artistas da família Betti (Justo de Juste, João Juste e filho do Antonio), de San-Martino de
Mensola. A partir da análise de obras dos irmãos, como o Tumulo de Luis XII e Ana da Bretanha
e o Tumulo de Thomas James na catedral de Dol, conclui-se que de fato há uma estética
ressonante entre a obra desta geração quatrocentista e o trabalho de Ruão. Contudo, "para o
nosso Mestre Ruão há a recordar também o que foi dito da sua arte delicada, de relevos
esbatidos mas conservando a nitidez de perfis e a relação de planos, um estilo a evocar a
gentileza das obras do meado de quatrocentos, as de Desidério e de Mino.
Estas considerações levam-nos a concluir que a educação dos Justos foi feita pelos artistas
florentinos do meado do século XV, não prorpiamente pelos grandes mestres mas pelos
continuadores que mantiveram o estilo; foi esta a arte que levaram para França e em que
continuaram, posto que viessem aí a evoluir, mas dando relativamente à Itália um aspecto de
atraso artístico do momento, o que os estudiosos franceses tem feito notar.
Atraso mais acentuado, como é lógico, manifesta a arte de Ruão com a sua obra do fim do
decénio de 20 e na de 30.
E não admira que notando-se o parentesco com a arte toscana do meado de quatrocentos não
se pudesse fazer dele um italiano que dali pudesse ter vindo
E este prolongamento da arte florentina do meado de quatrocentos nos Justo, explica-se pela
sua saída de Itália antes que a evolução para a de quinhentos se acentuasse; e em Ruão por ter
recebido no aprendizado só a primeira fase dos Justos." p.19

A segunda hipótese é a de que João de Ruão teria participado com esculturas da constução do
Les tombeaux de la cathedrale de Rouen, porque segundo documentos da época uma artista
de nome Jehan de Rouen havia contribuido come esculturas melhores. Esta hipótese é
refutada pela idade de João, visto que o mesmo Jehan de Ruen já havia participado da
construção da capela da Assunção da cidade em 1510-1511, tornando a cronologia de Ruão
impossível se estes fossem a mesma pessoa. "Se atribuirmos ao nosso João de Ruão o mesmo
número de anos em 1580, quando faleceu, teria vindo à luz em 1498, o que tornava impossível
que em 1510-11 já tivesse categoria a llhe ser possível executar a obra indicada" p.22
"Estes dados têm o suficiente grau de probabilidade a poder vir-se à afirmação de que este
Jehan de Rouen, que fazia parte da campanha de Pierre des Aubeaux em Ruão e Gisors era
mais velho que nosso João de Ruão e distinto dele, tratando-se de um dos numerosos casos
de homonimia do tempo, que igualente entre nós causam o desespero dos investigadores"
p.22
 
"Afastada a probabilidade de Jehan de Rouen do túmulo dos cardeais ser o nosso Mestre João
de Ruão, de maior credibilidade é o parentesco de estilo com o dos Justos, e claro se torna o
caminho seguido pelo estilo delicado, digamos, amoroso, dos seguidores florentinos dos
mestres do meado de quatrocentos, educando os Justos e, por sua vez, estes transmitindo-o
ao nosso Ruão. Caminhos largos, com rodeios, como frequentemente se deparara não só na
história da Arte." p.22
 
 
 
 
[PESQUISA] O Maneirismo e o Estatuto
Social dos Pintores Portugueses - Vitor
Serrão
segunda-feira, 12 de março de 2018
17:57
 
Prefácio (p. 9-18)
 
Entre a segunda metade do século XVI e o primeiro terço do século XVII há um movimento de
classe entre os pintores portugueses que, embora assumisse formas heterogéneas no seu
programa reivindicativo, se traduz num notório ascenso do estatuto social do artista através da
luta contra a rígida estrutura corporativa a que estavam subordinados e pelo reconhecimento
da nobreza e liberalidade da sua profissão.
 
A partir da documentação disponível o autor afirma que foi com o maneirismo que o produtor
de imagens conseguiu evoluir desde sua situação de servil artesão até à de artista
independente, individualizado como criador e com alguma importância no tecido social (p.9)
isso em portugal
 
Esta ascensão não se deve a qualidades internas do ofício artístico, mas a um real movimento
de luta: "ora através de pleitos com as autoridades, pelos quais os pintores procuravam
desligar-se das obrigações inerentes à Bandeira mesteral (onde, na qualidade de mecânicos, os
membros da classe estavam indistintamente agrupados); ora através de reivindicações
pontuais de privilégios e de regalias; ora ainda em pleitos com a clientela, ou com os
examinadores das suas obras, exigindo melhores preços pelo seu trabalho; através de
estruturas de associativismo e de protecção à classe (caso das Irmandades de São Lucas);
através, enfim, de demandas requerendo o regime de Arte Liberal para a arte da Pintura e o
estatuto de Nobreza para os seus cultores." p.9
-novo estatuto de classe para o produtor de imagens
 
Ascensão do estato de "oficial mecânico", que laborava à sombra das corporações dos ofícios -
dentro de um regime mesteral que radica na Idade Média, e nele nivelado aos pintores de
têpera, de estofado e de dourado, os simples artífices de pintura -, ao importante estrato de
artista individualizado, isento dos tributos e obrigações mesterais, e equiparado emsmo, por
vezes, à carreira da nobreza.
 
Essa conquista de classe tem a ver com as profundas modificações operadas na sociedade
protuguesa do seculo XVI, notadamente o ascenso do capitalismo monopolista e ao poder
concentracionário das grandes Companhias constituídas no rescaldo dos Descobrimentos, que
agudizaram confrontos de classe e lutas entre estratos de uma mesma classe - temos nesse
momento em portugal os mesmo ingredientes, uma conjuntura sócio-economica e cultura
semelhante à que originara na italia do século XV a ascensão social dos artistas. Esta guinada
social foi acompanhada de uma ideologia vasta sobre a "liberalidade" da produção artística
que envolveu humanistas, como Alberti e Leonardo.
 
Referencias para checar: Anthony Blunt (1940), Arnold Hauser (1951) e Frederick Antal (1948).
 
Devido a peninsula iberica ser o bastião da contra-reforma papal, as estruturas laborais e da
organização corporati a encontravam-se solidificadas, o que desencadeou o movimento
apenas tardiamente, com o maneirismo e não com o renascimento.
 
O espirito da Bizarria caracterizou o maneirismo português - perfil anti-renasscentista e
anticlassicista, em bsca por efeitos caprichosos e ambíguos, elevando o orgulho do produtor
de imagens como criador e levando-o a desdenhar do pintor-artesão. Maneirismo burguês e
cortesão.
 
"O Maneirismom burguês e cortesão foi, particularmente no caso português, na sua feição
evoluída, um movimento unitario de larga extensão: polarizado por um estrato aristocrático
refinado,o por um claro omnipotente, as também por uma burguesia média, ascendente e
poderosa, que se cultivava e, a seu modo, olhava além das fronteiras. É natural que as
encomentas aumentem, que o gosto se modernize, que os produtores de imagens se refinem
e procurem a individualidade, dissociando-se do seu estatuto secular de mesterais". p.11
 
O amplo edifício dinamizado em sequencia da revolução burguesa de 1383-1385 se manteve
inflexivel em portugal até pelo menos 1572, quando há o primeiro documento que denota
sintomas de mudanças na sitação: em 1572 há a reformulação dos regimentos dos oficiais
mecânicos da cidade d eLisboa, por Duarte Nunes de Leão. É neste documento que, pela
primeira vez (e apesar de preservar toda a legislação medieval prévia) se firma uma diferença
de classe entre os pintores de óleo, de tempera e fresco, e de dourado e estofado. Seguem-se
então diversos pedidos individuais de artistas de dispensa de encargos para com a Bandeira de
Sâo Jorge e no mesmo ritmo que a classe dos pintores de óleo ascendia as demais que ficavam
pra trás se organizavam e lutavam ou pela revogação dos privilégios destes ou pela partilha
dos mesmos.
 
Essa movimentação denota o fim do mundo medieval e o início da era moderna. "Estas e
outras movimentações dos pintores pressupõem o fim de um mundo medieval que se
desmembra implacavelmente, sob os impulsos de uma Idade Moderna nascente a que o ciclo
do Maneirismo vinha emprestar (estética e ideologicamente) o tom e as referências de
individualismo triunfante." p.13
 
"A defesa da Pintura como arte liberal, utilizada preferencialmente no combate às tributações
mesterais, e subjacente a todas as movimentações da classe, aufere de um carácter prático, de
ordem eminentemente socio-economica e laboral. Para além do maior ou menor refinamento
teorizador assumido na argumentação dos artistas [...] o problema essencial que move os
produtores de imagens a autonomizarem-se como classe reside sobretudo nas pesadas
condições laborais e vínculos corporativos que atrofiam o artista, nivelado com o simples
artesão mecânico" p.14
 
Tal fato gera a revolta dos artesões mecanicos contra seus antigos companheiros de bandeira
e contra as autoridades que lhes negavam idênticas isenções e regalias.
 
Depois de meio século de lutas no XVI em favor de tais regalias, o Barroco Português no século
XVII vai representar uma regeressão de tais conquistas, ao contrário do que aconteceu na
Espanha ou na Itália. Neste período a classe se desorganiza e sofre um refluxo em suas
conquistas, restando bastiões em defesa da liberalidade da pintura mais na poesia e na música
do que entre artistas propriamente ditos. Contudo, o livro tratará especificamente sobre o
período da ascensão.
 
Referencia: A pintura maneirista em Portugual (1982) do mesmo autor. Esta foi aprofundada
em dissertaçao de mestrado, que é o livro que leio em questão.
 
"Os factos sociais, de facto, conduzem ao natural desenvolvimento de hábitos, de mecanismos
visuais e de intenções que se reflectem na produção em geral e nas obras de arte em
particular, quer na perspectiva do cliente equanto elemento de classe, como na do produtor
de imagens enquanto representante dessa ou de uma outra classe. Esta concepção dialéctica
do facto artistico impõe da parte do historiador de arte assim informado toda uma vasta série
de pressupostos e de referências analíticas que, se dificultam sobremaneira a pesquisa
(entendida em termos científicos), permitem iluminar melhor o seu objecto, conferindo um
outro fascínio e uma outra opracionalidade ao trabalho empreendido.
Nesta perspectiva de pesquisa metodológica por que nos orientamos, a renovada consciência
de classe dos pintores de óleo portugueses do período em análise, que conduziu ao
afrouxamento dos laçoes mesterais e à nobilitação da sua arte enquanto "liberal" - base de um
processo emancipador sem par no curso da História da Arte portuguesa - adquire uma outra
luz. As chaves para sua leitura serão encontradas na ideologia maneirista que informou essas
lutas, sob os auspícios caprichosos da "idea" - que a análise de obras particulares permite
definir -, e na ideologia emergente da nova situação sócio-economica gerada sob o refluxo do
processo dos Descobrimentos e o ascenso de formas capitalistas de produção - que a análise
globalizadora da sociedade vem clarificar.
E será com as devidas atenções nesta realidade complexa que a produção pictural coeva, a
ideologia tridentina que a suporta e o novo estatuto social do artista deverão ser revistos"
p.17-18

1. O Maneirismo, crise do pós-renascimento europeu e a emancipação dos pintores de óleo


(p. 21-46)
 
1.1 O conceito de maneirismo como estilo e como ideologia
 
O maneirismo foi dado como crise generalizada do pós renacimento europeu em sua
manifestação cultural, e só em nosso século tomou a atenção dos pesquisadores para além de
preconceitos
Antes era considerado uma corrente de cíclica repetição formal, sem significação própria, o
vácuo entre o renascimento e o barroco. (Riegl e Wolfflin). O maneirismo só será devidamente
visto enquanto situação estética autonoma em sua dimensõa global a partir de Max Dvorak
(1922), o primeiro a individualizar o conceito e realizar um balanço espiritual e artístico. O
autor considera sua leitura em muitos aspectos ainda hoje correta.
 
Definição do autor: Corrente cultural autonoma, e primeiro estilo internacional da Idade
Moderna, o Maneirismo assinala, porventura, a mais radical ruptura que a História de Arte já
experimentou, ao assumir-se em processo de rebelião deliberada contra as estruturas
humanísticas que o Alto Renascimento havia organizado, e ao acentuar - pela primeira vez-
uma consciente desarticulação do código clássico legado pelos mestres renascentistas. Nessa
perspectiva explanou a sua necessidade como estilo, e as suas respostas como ideologia
cultural" p.21-22
 
Para Anrold Hauser, Wolfflin não compreendera o Maneirismo pois não havia passado por
uma época onde eclodia um choque identico ao que representou eclodir o maneirismo na
toscana em principios do XVI "só uma época que tivesse experimentado a tensão entre a
forma e o conteúdo, entre a beleza e a expressão, como seu próprio problema vital, diz
Hauser, podia prestar justiça ao Maneirismo e verigicar a verdadeira natureza da sua
individualidade em contraste tanto com o Renascimento como com o Barroco." p.22
 
O naturalismo barroco triunfa sob o Maneirismo e vai dominar a arte europeia pelo menos até
o século XIX, ridicularizando os ornamentos e maneiristas como excessos e sua produção
como uma cópia imperfeita dos grandes mestres.
 
-Defesa exacerbada dos valores classistas na H.A. leva a essa subalterização do maneirismo.
 
Paralelo entre o antinaturalismo maneirista com o das vertentes modernas do Surrealismo, do
Dadaísmo, da Arte Abstrata e do expressionismo moderno. "na sua atitude radical face a uma
arte academizante e tradicionalista, concebida em termos não atreitos a assimilar
determinados valores estéticos - fora do seu rígigo ambito classicista -, e na série de
motivações que estão na base das sas respostas, revestiram-se igualmente de uma
espiritualidade e de um cunho antinaturalista que tem paralelo, a quatro séculos de distância,
nos vetores do Maneirismo. Há em comum um quadro ideológico e cultural informado por
dúvidas indissolúveis, por uma angústia existencial, pela agitada tensão e a extrema
ambiguidade dos tempos vividos, que se afirma em situações concretas da realidade
contemporanea em tempo de crise, e é essa afinidade ideológica (que no terreno artístico se
traduziu, dualmente, por uma ficção, através de respostas ousadas e pessimistas) que vai
possibilitar um entendimento pleno e consequente recuperação global dos valores
maneiristas." p. 23-24
 
CONTEXTO SOCIAL DO SÉCULO XVI: "Período marcado por agudíssimas convulsões sócio-
políticas, por constantes pilhagens e rivalidades fratricidas a abrirem chagas no tecido social,
por acontecimentos de uma violência indiscriminada que atinge extensas zonas do espaço
europeu (de que o saque de Roma em 1527 pelas tropas de Carlos V, e a matança de S.
Barthélémy na Paris de 1572, constituem exemplo significativo...) o século XVI é igualmente
cenário da mais grave crise religiosa verificada no seio da cristandade, com origem na rebelião
luterana contra o poderio hegemonio e omnipotente do papado, que provocou o movimento
da Reforma e, por antítese, a Contra-Reforma católica e o Concílio de Trento (1545-1563). O
século XVI é, ainda, o momento em que desabrocha e se impõe um novo regime economico, o
capitalismo monopolista, caracteriado no ascenso da actividade mercantilista alargada, na
economia de livre concorrência, na vontade imperialista de dominação financeira, etc., que
origina importantes convulsões sociais, lutas reivindicativas de classes e um desmedido
desenvolvimento industrial para além dos quadros corporativos urbanos. A ampliação do
volume de trocas, por todo o espaço europeu, engrena uma crescente circulação monetária e
a subsequente intensificação do trabalho mineiro [...]; nesta conjuntura se onstituem as
poderosas casa financeiras e cambiais, como a dos Wlser e a dos Fugger, com as suas redes
bancárias e monopolistas, e a sua decisiva intervenção, através do empréstimo, junto do
poder concentracionário da realeza (o Imperio de Carlos V assentou as suas estruturas de
estado no capital dos Fugger e nas minas de prata, assim como o Império português dependeu
da pimenta e do ouro da Mina). Estas novas formas de mobilização e de concentração do
poder monetário, e o paralelo incremento da produção agrícola por parte dos grandes
senhores feudais na Europa além-Pirenéus, provocavam uma radical desestabilização no
quadro sócio-economico continental, com a inerente carestia de preços, a falencia dos que
dependiam dos foros e dos serviços da terra, as dissenções laborais, as bancarrotas, e as
numerosas insurreições populares (como a revolta dos camponeses almeãers em 1525)."
p.25-26
 
Quadro de anarquia e indefinição - ainda mais agravada pela ameaça turca. A crise religiosa
cria um vácuo na espiritualidade, o protesto de lutero contra a venda de indulgencias fora
aprovado tanto pelas massas populares exploradas, os salariados e os artífices revoltados
contra a complexa maquina senhorial que os oprimia, quanto pela realeza alemã, desejosa de
se emancipar da tutela papal.
Falencia das certezas dogmáticas se debatendo num permanente conflito interior. Crise dos
valores renascistas de ordem equilibrio, normatividade, conciliação entre omem e natureza,
confiança humanistica na razão, tudo isto estava sendo posto em cheque e revisto.
 
"Esta crise do Renascimento, na feliz designação de Arnold Hauser (1965) e André Chastel
(1968), expressa-se fundamentalmente por uma concepção pessimista do homem e da vida,
um conflito permanente (e não resolúvel) entre a ordem divina e a ordem humana, e
desenvolve-se no plano ideológico através de uma nova visão do universo - o que deixava de
ser concebido na visão aristotélico-ptolomaica de harmonia e de ordem, que os trabalhos
científicos de Copérnico entretanto faziam ruir sem sofismas. Desfeito o mito do homem
como centro do universo, este aparece no século XVI visionado numa perspectiva incoerente e
caótica, labirintica, plena de contradições, como reflexo de um ser humano descente e
impuro, em constante conflito com os outros e consigo próprio, e é esta visão pessimista que
vai ganhar expressão nos vários ramos artísticos, com os temas grotescos e dramáticos, com
uma decidida tendencia para o fantástico e para a sensualidade [...] mas sempre com uma
subjacente e desesperada espiritualidade." p.27
 
Definição: "O Maneirismo foi portanto em termos ideológicos e culturais uma corrente
irracionalista que, mercê da crise generalizada do Cinquecento, ganhou foros de estilo
internacional dominante em grande parcela do seu século, projectando as suas soluções
estéticas de vanguarda no duplo sentido antinaturalista e anticlássico." p.28
 
Difunde-se o conceito de idea, infundida directamente por Deus no espirito do criador, como
o fato da beleza ideal transmitida pela obra de arte. Obra de arte como coisa mental, conceito
amplamente difundido por tratadistas do maneirismo, como Vasari, Zuccaro, Lomazzo e
tantos mais. "O artista, no acto de criação, olhava para o interior de si prórpio e procurava na
idea, iluminado por Deus, a fonte de inspiração estética" p.28 conceito vai vingar tanto entre a
aristocracia e a burguesia, entre protestantes e católicos, por isso diz-se que foi um estilo
internacional (o primeiro depois do gótico a se manifestar ideologicamente em toda a europa,
embora com respostas heterogeneas).
 
Aspectos ideológicos mais claramente sintomaticos no homem maneirista: a melancolia
exacerbada. Reflete sua profunda insatisfação, instabilidade afetiva, acentuado espirtualismo,
nas suas neurores e traumas. Reveladora de uma mentalidad eme crise.
 
"Os grandes aristas do Maneirismo são homens atormentados por toda uma realidade que
lhes é adversa, que os envolve e atrofia, contra a qual se rebelam assumindo um
comportamento depressivo, lunático, neurótico, senão marginalizado" p.29-30
 
"Esse comportamento nevrótico, depressivo, dos mestres maneiristas acnetua a decidida
tendência do Maneirismo para o subjectivismo individualist,a concepção plena de
espiritualismo e intimismo, de fervor místico e de vontade de afirmação humana, na qual o
mundo objectivo (tão caro ao século XV) se dissolve em proveito de uma subjectividade que
põe em realce o vaor do indivíduo criador de arte, na plena posse das suas potencialidades de
produtor,da sua sensibilidade e imaginação, do seu poder de revolta e de emancipação." p.31
 
"No estádio actual dos conhecimentos adquiridos, podemos definir pois o Maneirismo como a
tendencia artística e cultural dimanada de Itália e dominante na Europa do século XVI, que se
caracterizou pela desintegração formal dos principos harmonicos do classicismo, assumida nos
seus programas teorizadores, através de uma reunião ambígua de formas antagónicas
(oriundas do espiritualismo medieval, do naturalismo renascentista, dos principios reformistas
e tridentinos, etc., etc.), que lhe conferem um perfil autonomo e perfeitamente reconhecível
por características próprias.
Nesse plano desenvolveu portanto a sua necessidade cultural, e explanou as suas propostas,
numa multiplicidade de direções e numa série de soluções, ambiguas e heterogeneas, que
tem como denominador comum a sua atitude de modernidade anticlássic,a antiacademica e
antinaturalista." p.31
 
1.2 A situação maneirista em portugal
 
O renascimento, enquanto fenomeno cultural e ideológico especificamente italiano,
manifestou-e em portugal de forma difusa e filtrada. Isto porque o império ainda se
encontrava profundamente arraigado à formação gótica e medieval, tendo o renascimento
ecoado muito mais enquanto estilo em intervenções pontuais, que não seguiam
rigorosamente o debate renascentista que acontecia na italia. Seus melhores exemplares
encontram-se na escultura e na arquitetura, contudo estão especificamente localizadas (as
obras impulsionadas por mestres de raiz francesa, como Filipe Odarte, Nicolau de Chanterene
e João de Ruão, que localizaram-se mais em Coimbra e Évora).
 
Os tratados de arquitetura difundidos em Portugal, quando traduzidos para cá já vem
informados e revistos com valores maneiristas, sendo que, apenas em casos excepcionais o
arquiteto portugues entrou em contato com os ideais mais exemplares do renascimento,
lidando em geral apenas com seu momento já em crise.
 
Os arquitetos portugueses souberam adaptar os valores desarticulados da crise do
renascimento aos seus programas construtivos, em plena época de dominação contra-
reformista e, um pouco mais tarde, sob a égide da doutrinação poderosa da Companhia de
Jesus. A resposta estética portuguesa: soluções invoadoras na paisagem construtiva do país,
como a sobreposição das colunas toscanas e jónicas em escalas diversas, a desproproção
provocada entre as alturas dos alçados e o espaço que estes delimitam nos interiores, o
conflito rítmico resultante do jogo de volumes que ora recuam ora se salientam na massa
parietal, a outsada concepção espacial da nava, a sobriedade decorativa dos exteriores dentro
de um generalizado estilo chão, os conflitos entre arcarias e superficies planas alternando o
chamado motivo palladiano e outros etc.
 
Subverteram as regras clássicas que eles nunca tinham conhecido verdadeiramente em sua
pureza.
 
Pintores portugueses importantes: Gregório Lopes (O martírio de S. Sebastião)
O retabulo da igreja de S. Silvestre em Unhos).
A. Quintino
Igreja da Misericórdia de Abrantes (1548-50)
 
Viragem decisiva da pintura portuguesa para o maneirismo internacional é na metade do
seculo XVI. (sobre isso ver artigo A pintura maneirista em Portugal do mesmo autor). O
processo desenvolve no contexto em que artistas vão ser bolseiros régios na Italia ou que,
pelo fato de se incorporarem em embaixadas, puderam beber directamente nos modelos
italianos da maniera.
 
Pensador maneirista importante: Francisco de Holanda, esteve na Itália tbm.
Pintores Antonio Campelo e Gaspar dias
A circulação das pinturas de Antonio Campelo, por serem demasiado radicais para a cena
austera portuguesa, não circulam tanto e ele é renegado após voltar do período de estudos na
Itália. Realizou seu oficio na sombra de algum marchand que não temos conhecimento mas
que valorizava os valores italianizantes da época
 
Já Gaspar Dias ao retornar de sua bolsa na italia encontra um ambiente já mais afetivo à
produção maneirista.
 
Definição genérica: 4 grandes fases do ciclo maneirista pictural em portugal:
"Em termos muito genéricos, diremos que a uma primeira fase de Maneirismo experimental
representada pelo Mestre S. Quintino e pelos outros artistas de transição (de perfil
neerlandês), sucedeu uma segunda geração, de infiltração italianizante, constituída pela obra
de Campelo, Cristovão de Morais, de Lourenço de Salzedo, uma terceira época de apogeu do
estilo e consolidação italianizante correspondente ao ultimo quartel do século XVI (obras de
Fernão Gomes, Francisco Venegas, Diogo Teixeira), e uma ultima geração de decadencia,
informada por valores da Contra-Maniera romana e por sinais de academismo e de saturação.
Nesta derradeira geração, agudizada por conflitos de ideologia na pordução de imagens
devido à irrupção dos pirmeiros modelos proto-barocos e tenebristas, incluem-se todavia
mestres importantes,c como Amaro do Vale, Filipe Nunes, Simão Rogrigues e Domingos Vieira
Serrão, artistas a que aludiremos não-poucas vezes ao longo do presente estudo." p.42
 
Além da tradição italiana tbm foi importante a influencia flamenga, através dos artistas
flamengos que aqui trabalharam e da aquisição de retabulos.
 
"Se a ideologia da Contra-Reforma militante - que se consumou em Espanha e Portugal num
impenetrável e rígido bastião contra os ventos heréticos da Europa reformista - temperou os
nossos artistas, coartando-lhes a veia metafísica e sensual (que na arte maneirista europeia
nos legou autenticas obras primas), foi também o eforço da igreja católica um responsável
essencial para o desenvolvimento da arte da Pintura nesse período conturbado que foi a
segunda metade do século XVI: o surto construtivo foi extraordinário, mobilizou esforços e
réditos avultados, cobriu o espaço metropolitano e o espaço imperial, garantiu o sustento a
uma infinidade de artífices e de artistas, desde mestres de pedraria e de cantaria a
marceneiros e entalhadores, a douradores e a pintores, a azulejadores, a serralheiros, mestres
de ferragem, ourives, enxambadores, arquitectos... Surgem novas dioceses (Leiria, Portalegre,
Miranda do Douro), multiplicam-se as sedes paroquiais, os mosteiros, etc, etc. Também neste
ambito deve ser referenciada a subida do estatuo social dos artistas." p.43
 
10 FATORES DO CONTEXTO SOCIAL DA ÉPOCA:
 
"1) decadência dos velhos processos artesanais da actividade dos produtores de imagens e
processo de aristocratização dos artistas, à revelia da Bandeira mesteral (luta por um novo
estatuto social do artista);
1. Introdução dos novos parâmetros culturais definidores de uma renovação de
mentalidades (aspectos em que a literatura coeva é particularmente fértil);
2. Declínio brusco da estabilidade económica interna, ascenso do capitalismo
monopolista e das poderosas companhias concentracionárias, e crescimento de uma
classe média poderosa;
3. Ideologia dominante definida, imposta e controlada, com gradual aceitçaão
interna, pela Igreja contra-reformista e tridentina (tribunal do Santo Ofício, Index,
Constituições Sinodais dos Bispados, iconografia sacra);
4. Contradições intestinas resultantes do processo de expansão colonial, do
afluxo do trafego mercantil aos nossos mercados, do desenvolvimento das grandes
companhias (como a Companhia Portuguesa das Indias Ocidentais);
5. Retorcesso de uma economia predominantemente agrícola, e declínio dos
agregados rurais e da velha aristocracia provinciana, em proveito dos grandes centros
urbanos;
6. Ascenso da actividade dos impressores-livreiros, edição de livros agiológios,
prelecções morais, doutrina civil, relatos de viagens, etc. (Jorge Borges de Macedo,
1979(, e inusitada procura de livros por vastos sectores da população;
7. Reforço do poder estatal em torno de reis-fradescos imbuídos de lição contra-
reformista (d. João III) e impulsionadores de uma política expansionista (D. Sebastião);
8. Ascenso de lutas de classes, polarizadas pelo descontentamento (sobretudo
após 1580) e pela calamitosa situação sócio-economica, e ocorrência de levantamentos
de camponeses e artesãoes (entre 1585 e 1673 contam-se dezoit);
9. Confronto de ideologias na produção de imagens (revisão dos valores
renascentistas, consonância de influências díspares etc)." p.43-44

2.1 As corporações mesterais da idade média e o produtor de arte. Relações laborais e vínculos
de classe. (p. 49-81).
 
Até o seculo XVI em portugal o produtor de imagens foi sempre considerado um artíficie
Artificie - "um operario que exercia seu mester no seio de uma rígida estrutura artesanal das
corporações - dentro de uma tradição de trabaho assalariado que tem raízes profundas na
Idade Média." p.49
Corporações de ofícios: "organizações de classe que agrupavam os mesterais de determinado
grupo de artíficies, unidos por impulso de solidariedade e por razões de auxilio espiritual e
finaneiro, e que contribuíam para a regulamentação específica das relações laborais dentro do
mester. Orientadas para a defesa dos seus membros, assim inseridos dentro de uma estrutura
de classe devidamente estratificada, as corporações impunham aos mesterais o cumprimento
de normas rígidas de produção, normas essas que os chamados regimentos tratavam de
regular. Assim, casa profissão manual, ou ofício, aparece-nos organizada segundo normas
inflexíveis de exercício do emster, a cujo cumprimento ficavam subordinados todos quantos se
acolhiam no seio da corporção, desde o mestre ao mero aprendiz. O regimento estabelecia as
balizas reguladoras da actividade mesteral propriamente dita, a nível mecânico, definindo a
ascensão na escala hierárquica do mester (aprendiz, artífice, mestre), os vínculos e as normas
de produção, as relações laborais e o tipo de empreitadas, o preço dos produtos, as relações
de mercado, e as obrigações inerentes ao ofício relavitamente à sua corporação. O regimento
taxava ainda os salários, o preço das encomendas específicas, definia o âmbito das eleições
internas, e o tipo de contribuição dos mesterais para as festividades decorrentes no burgo ou
para as obras públicas em curso no município." p.49
Neste contexto o pintor de oleo escreveu desde sempre sua subsistencia neste quadro
artesanal como mero artífice, desenvolvendo atividade mecanica ambivalente, que ia desde
execuctar quadros avulsos e retábulos a encarnar e dourar imagens, varas e estandartes,
andores de procissão, caixas, arcos, colunas etc. Produção de imagens não era vista como
actividade artística, mas sim mera produção tecnica e manual.
 

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