Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Parte 4 - Série para Quarentena
Parte 4 - Série para Quarentena
Depois que Irene terminou o banho, numa água quase morna, saiu para o pátio. Teve
de virar dois corredores e passar por algumas portas abertas e alguns quartos cheios. Apesar
do tamanho do hospital, o número de pessoas ali era incontável. Haviam encarregado uma
senhora, que quase não enxergava, e um de seus netos para o recenseamento. O número que
ela escreveu no papel, quando terminou, tinha quatro dígitos e começava com dois.
amizade com o garoto do quarto doze. Era um menino bonito e forte. Tinha os olhos
Chegou e sentou-se numa daquelas muretas que há em todo pátio de hospital. O clima
estava seco e gelado. Era meado de março quando foram obrigados a se isolarem naquele
lugar feio e monótono. Irene não tinha muitas opções para se divertir. Gostava de ficar só e
contar estrelas. Era daquelas meninas pensativas e sonhadoras. Porém enquanto o sol
permanecia, ora queimando, ora escondido, ela cumpria com seus afazeres designados por
mamãe. Quando terminava, passava a escrever, ou dirigia-se ao pátio para esperar alguma
Sua vida mudou muito desde então. Sua família não era de riquezas, seus pais eram
pais normais. O pai, militar, a mãe, enfermeira. Viviam uma vida ordinária, mas agora só lhe
restava auxiliar a mãe, com os feridos ou enfermos, e escrever em seu diário, que geralmente
#
Almeida / Pietro / 2
Nesse dia, enquanto estava naquela mureta desconfortável, chegou-lhe uma menina,
alta, mesma idade, com o rosto a fazê-la de piada, enchendo-a de espinhas e cravos. Chegou e
disse:
— Oi!
— Santos. E você?
— Legal! Minha mãe nasceu lá. Eu vim de Paranaguá — seu olhar vagou um pouco
pelo nada e depois se repôs. — Nem dá para reconhecer a cidade depois desse último ano —
sou italiana. Estávamos em Florença até ano retrasado, mas a coisa piorou e a gente fugiu
para cá.
— Fugiram? Nossa! — A menina fez uma careta de surpresa. Houve silêncio. — Mas
O menino do quarto doze passou pelo corredor em frente ao pátio e roubou a atenção
de Irene. Bem, decerto que ele era muito bonito, até demais para um homem, digo eu. Mas
e observava o garoto sumir corredor adentro. — Dizem que por lá não sobrou muito trabalho,
— De vista. Minha mãe trabalhou para a família Grande por um tempo. Eles vieram
com a gente — ela suspirou. — Eles tinham uma livraria em Paranaguá. São pessoas
estranhas. Diferente de você — ela sorriu e se levantou. — Você parece legal — a menina
Irene ficou dispersa alguns minutos em pensamentos que não tive acesso, mas depois
se lembrou de que nem sequer perguntou o nome da nova conhecida. ”Ela parece legal…
Irene ouviu mamãe chamar pelo corredor, então seguiu por ele. Quando chegou até
— Preciso de você para me ajudar com um curativo — dizia enquanto trocava suas
luvas. — A dona do cento e vinte está com infecção. Vou ter que limpar a ferida e refazer o