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DOI: 10.

5902/2317175821910
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GESTÃO DE TURISMO DE EVENTOS: REFLEXÕES SOBRE OS


EVENTOS DA REGIÃO CENTRAL DO RIO GRANDE DO SUL/BRASIL

EVENTS TOURISM MANAGEMENT: REFLECTIONS ON THE EVENTS OF


THE CENTRAL REGION OF RIO GRANDE DO SUL/BRAZIL

Dalva Maria Righi Dotto1, Monica Elisa Dias Pons2,


José Martinho Rodrigues Remedi3 e Lilian Coradini Cerezer4
Recebido em: 20/04/2016
Aprovado em: 12/09/2016

RESUMO ABSTRACT

São recorrentes os estudos, os levantamentos e a There are recurring studies, surveys and plans
elaboração de planos para o turismo nas diferen- for tourism, in different public and private
tes instâncias do setor público e privado. No Rio sectors. In Rio Grande do Sul, the state De-
Grande do Sul, a Secretaria Estadual de Esporte, partment of Sport, Tourism and Leisure (SE-
Turismo e Lazer (SETEL) divide o estado em re- TEL) divides the state into regions to define
giões para definir com mais precisão as políticas more precisely the policies and organization
públicas e a organização do setor. Com ênfase no of the sector. With an emphasis on the theme
tema turismo de eventos e utilizando como recorte of events tourism and using as a geographical
geográfico a região central do Rio Grande do Sul, cut the Central region of Rio Grande do Sul,
por meio de uma pesquisa exploratória e qualita- this study was conducted through an explor-
tiva, objetivou-se sistematizar os eventos divul- atory research, with a qualitative research
gados pela SETEL, com análise por município e approach and aimed to systematize the events
região, e, mais especificamente, verificar os prin- disclosed by SETEL, with analysis by munic-
cipais aspectos referentes aos organizadores, aos ipality and region. More precisely, the study
tipos, à abrangência e à periodicidade dos eventos aimed to verify the main aspects concerning
e à categorização dos municípios realizada pelo the identification of the organizers, event
Ministério de Turismo. Os resultados da pesquisa types, scope, frequency and categorization of
demonstraram que são poucos os organizadores municipalities conducted by the Ministry of
de eventos que utilizam o website da SETEL para Tourism. The survey results showed that there
divulgar e atrair turistas, ferramenta essa que é are few event planners who use SETEL’s web-
disponibilizada gratuitamente pela Secretaria de site to publicize and attract tourists, despite
Turismo. Também se constatou que a maioria dos the fact that this tool is provided for free by
eventos tem periodicidade anual, ocorrendo, so- this Department. It was also evident that most
bretudo, no segundo semestre, e que as parcerias of the events are annual, that there is a higher
entre setor público e privado para a realização de concentration in the second semester of the
eventos ainda é incipiente na região estudada. year and those partnerships between pub-
Palavras-chave: gestão do turismo; turismo de lic and private sectors for the realization of
eventos; regionalização do turismo. events is still incipient in the region studied.
Keywords: tourism management; events tour-
ism; tourism regionalization.

1 Doutora em Desenvolvimento Regional. Graduada em Administração. Docente Adjunta da UDESSM/UFSM. Coordenadora do Curso de Administração
da UDESSM/UFSM. E-mail: dalvadotto@gmail.com
2 Doutora em Comunicação Social. Docente Adjunta da UDESSM/UFSM. E-mail: monica@ufsm.com
3 Doutor em História; Docente Adjunto da UFSM. E-mail: jose.remedi@gmail.com
4 Graduanda em Administração - UDESSM/UFSM. E-mail: liliancerezer@hotmail.com

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Dalva Maria Righi Dotto, Monica Elisa Dias Pons,
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1 Introdução Pode-se dizer que a importância


dos eventos no turismo está na própria
A proliferação de megaeventos em origem da atividade, que foi criada pelo
escala mundial colocou em evidência o fato de existirem deslocamentos moti-
fenômeno dos eventos como objeto de re- vados por eventos. Na atualidade, há um
flexão para diferentes áreas acadêmicas. crescimento do turismo de eventos em
Atualmente, as pesquisas sobre as caracte- níveis globais. O fenômeno dos eventos
rísticas, as dificuldades e as potencialida- vem aumentando em número, em diver-
des dos eventos em suas múltiplas escalas sidade e em popularidade, variando em
vão do planejamento e da administração escala dos megaeventos aos pequenos
aos aspectos históricos e culturais, pas- festivais comunitários (SMALL, 2007).
sando pela análise de impactos sociais e Os poderes públicos, em seus
ambientais e, é claro, tendo se tornado um diversos níveis, organizam eventos: os
segmento especializado do setor turístico. estados nacionais, para públicos estran-
Dessa forma, os eventos são um dos mo- geiros como forma de promoção e divul-
tivadores mais importantes do turismo e, gação de seus países, e os governadores
também, um relevante impulsionador da e os dirigentes municipais, para divulgar
elaboração e comercialização de pacotes suas comunidades e seus atrativos lo-
turísticos baseados em destinos. É farta cais como possíveis destinos turísticos,
a literatura que documenta a atividade e tendendo a vincular os eventos com
os impactos dos eventos planejados – em pautas da política econômica, social e,
especial, dos megaeventos – e a disputa às vezes, em segundo plano, artística e
por eventos sazonais, tais como as Olim- cultural. Nesse contexto, os eventos são
píadas, a Copa do Mundo de Futebol e uma forma utilizada pelas empresas de
os Festivais de Música, entre cidades e marketing para fazer a promoção de seus
países (HORNE e MANZENREITER, produtos em certas ocasiões, como, por
2006; DaCOSTA, 2008; BAHL, 2004; exemplo, em comemorações de empre-
BARBOSA e SCAVARDA, 2015). No sas, feiras de negócios, eventos esporti-
entanto, como afirma Getz, vos e espetáculos artísticos.
Tendo isso em vista, este estudo
foi apenas algumas décadas atrás, se concentra na região central do Rio
que “o turismo de eventos” se esta- Grande do Sul, utilizando como refe-
beleceu, tanto na indústria do turismo rência a divisão por regiões realizada
como na comunidade de pesquisa, de pela Secretaria Estadual de Esporte,
modo que o crescimento subsequente
Turismo e Lazer (SETEL) no Plano de
deste setor só pode ser descrito como
espetacular (GETZ, 2008, p. 403, gri- Desenvolvimento do Turismo do Rio
fo do autor, tradução nossa). Grande do Sul - 2012-2015, a fim de
sistematizar e analisar, por município e
O turismo de eventos, entre as de- região, o turismo de eventos, conside-
mais possibilidades da atividade turística, rando os eventos divulgados no web-
tem se destacado cada vez mais por pos- site da SETEL em 2015. As análises
sibilitar alterações significativas no local contemplam aspectos referentes aos
de sua destinação. Os organizadores dos organizadores, aos tipos, à abrangência
eventos elencam estímulos ao desenvol- e à periodicidade dos eventos, além da
vimento social e econômico e à geração categorização dos municípios realizada
de renda e de empregos. Instituiu-se, por pelo Ministério de Turismo, que resulta
exemplo, o termo “legado” associado às da soma das variáveis de desempenho
campanhas de marketing para as comu- econômico relativo às atividades de tu-
nidades receptoras dos eventos, referin- rismo, constante no Mapa do Turismo
do-se às melhorias para a população das Brasileiro.
cidades que recebem megaeventos.

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2 Turismo de eventos: noções gerais os consumidores em potencial, assim,


e tipologias de uma perspectiva de marketing, o
produto deve ser comparado com
A ideia de eventos em geral está segmentos cuidadosamente definidos
associada à perspectiva de festejar, (GETZ, 2001, p. 425, grifo do autor).
comemorar, celebrar algo ou alguém,
acontecimento que busca atrair a aten- Dessa forma, em diversas socie-
ção e despertar o interesse de determi- dades, o turismo de eventos apresenta-
nado público-alvo sobre uma ação es- se como uma promissora atividade para
pecífica. Por muito tempo, os eventos alavancar o crescimento econômico e
foram entendidos como atividades me- social das comunidades nas quais se
ramente práticas, no entanto, configu- realiza. No entendimento de Marujo,
ram-se com uma tarefa complexa e que
o planejamento e organização de
envolve muitas responsabilidades. Nas eventos surgem como uma “arma”
últimas décadas, o conceito de eventos para combater a chamada sazona-
e seus desdobramentos em torno das lidade turística de muitos destinos.
etapas de planejamento, organização, De fato, os efeitos da sazonalidade
execução, avaliação e pós-evento têm do turismo podem ser minimizados
proporcionado discussões profícuas no através da promoção e realização de
meio acadêmico. eventos, uma vez que podem atrair
Partindo-se dessa realidade ine- turistas nos períodos do ano em que a
gável do desenvolvimento de eventos procura é normalmente baixa (2014,
na área do turismo pelo mundo intei- p. 26, grifo do autor).
ro, podemos verificar, também, que os
eventos se caracterizam pela necessi- A autora afirma, ainda, que os
dade de divulgar e de destacar alguma eventos funcionam como verdadeiros
ação pontual relacionada a determinada instrumentos de promoção de uma re-
temática. Para Andrade, gião como destino turístico, ressaltando
que devem ser bem planejados e divul-
o evento organizado, como atividade gados para gerarem uma imagem positi-
econômica, igual a qualquer outra, va e promoverem o destino em questão.
precisa ser dimensionado, avalian- O turismo de eventos apresenta-se como
do-se o nível atual de mercado e uma oportunidade para um município,
projetando-se a possibilidade de sua uma região ou um país em função das
realização, nunca esquecendo os ca- potencialidades de desenvolvimento
racteres subjetivos impregnados na social, econômico e cultural, entre ou-
sociedade em que se pretende realizar tros. Além disso, dinâmica do turismo
o evento (ANDRADE, 2007, p. 116). de eventos pode desencadear mudanças
na rotina de determinada localidade,
A atividade de eventos configura- na medida em que essa movimentação
se cada vez mais como um instrumento estimula o ramo da gastronomia, da
de promoção de destinos turísticos. hospedagem, do transporte e de demais
Do ponto de vista do consumidor, ou
setores que interligam uma localidade.
da audiência, um evento especial é a O turista de eventos, muitas vezes, mes-
oportunidade para o lazer, para uma cla interesses profissionais e de lazer
experiência social ou cultural fora da (congressos, convenções, seminários e
rotina diária. Do ponto de vista do or- feiras), tornando-se um consumidor em
ganizador, um evento especial é um potencial e que pode, em um futuro pró-
acontecimento único e não frequente, ximo, retornar com a família e os ami-
fora do padrão normal das atividades. gos, divulgando mais um destino turís-
O que é “especial” para o organizador tico. Daí a importância de bem planejar
pode não ter nenhum interesse para

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e gerir os eventos para que os impactos uma concentração ou reunião formal


sejam mais positivos que negativos. e solene de pessoas e/ou entidades
Cada evento possui uma espe- realizada em data e local especial,
cificidade, sendo importante, para que com o objetivo de celebrar aconteci-
o processo de organização transcorra mentos importantes e significativos
e estabelecer contatos de natureza
de forma harmoniosa, que os objetivos comercial, cultural, esportiva, social,
propostos estejam claros, pois estes re- familiar religiosa, etc.
presentam o eixo norteador da execução
de todas as atividades a serem realizadas Tornou-se cada vez mais percep-
– um evento sem objetivos claros pode tível que os eventos são catalizadores de
significar esforço humano, tempo e re- mudanças nas comunidades envolvidas,
cursos desperdiçados. No setor de turis- impulsionando avanços nos transportes,
mo, existem diferentes formas de atrair nas comunicações, na hotelaria, na gas-
os consumidores, de acordo com as mo- tronomia e no comércio de bens e ser-
tivações impulsionadoras, no processo viços da região. Devido ao crescimento
de decisão para a aquisição de produtos da relevância, dinâmica e diversificação
turísticos. Segundo Montejano (2001), e ao impacto econômico no desenvol-
as principais motivações dos turistas são vimento social, foram definidas tipolo-
a necessidade de repouso, diversão, lazer gias de eventos. Nesse contexto, Getz
e interação com novas culturas. (2008) propõe uma tipologia das prin-
Nesse contexto, o turismo de cipais categorias de eventos, com base,
eventos, considerado por Meirelles principalmente, em sua forma, isto é,
(1999) como uma forma de reunião, é nas diferenças óbvias em seu propósito
definido mais detalhadamente por Za- e programa (Quadro 1).
nella (2004, p. 69) como
Quadro 1 - Tipologia do turismo de eventos
CULTURAIS
NEGÓCIOS E COMÉRCIO ESPORTES E
COMPETIÇÕES
- Festivais
- Reuniões
- Carnaval
- Convenções - Amadores/Profissionais
- Comemorações
- Feiras - Espectadores/Participantes
- Eventos religiosos
- Exposições
POLÍTICOS E ESTATAIS EDUCACIONAIS E
CIENTÍFICOS RECREACIONAIS
- Reuniões de cúpula
- Eventos políticos - Conferências - Esporte e jogos por
- Ocasiões especiais - Seminários diversão
- Visitas de VIPs - Oficinas
- Treinamento
ARTES E PARTICULARES/
ENTRETENIMENTO PRIVADOS

- Concertos - Casamentos
- Espetáculos - Festas
- Cerimônias de premiação - Reuniões sociais
Fonte: adaptado de Getz (2008, p. 404, tradução nossa).

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Ainda segundo Getz, nejamento e a sua profissional execução.


Para Kotler e Armstrong (2003), eventos
alguns [eventos] são para celebra- devem ser entendidos como ocorrências
ção pública (esta categoria inclui os que são planejadas e que objetivam trans-
chamados “festivais comunitários”, mitir mensagens para públicos-alvo. Des-
que normalmente contêm uma gran-
sa forma, shows, exibições e excursões,
de variedade em sua programação e
visam fomentar o orgulho e a coesão por exemplo, devem ser compreendidos
cívica), enquanto outros estão previs- como canais de comunicação não pessoal.
tos para fins de concorrência, diver- Diversas áreas, dentre as quais
timento, entretenimento, negócios ou administração, economia, geografia e
socialização. Muitas vezes, eles exi- antropologia, têm estudado a atividade
gem instalações para fins especiais, e turística nos diferentes aspectos da socie-
os gestores dessas instalações (como dade. Estas pesquisas, segundo Barreto,
centros de convenções e arenas es-
portivas) visam tipos específicos de permitem relativizar a influência do
eventos (2008, p. 405, grifo do autor, fenômeno em relação à dos meios
tradução nossa). de comunicação (no caso da questão
cultural) e em relação a outras indús-
Outra classificação dos eventos trias (no caso da poluição ambiental),
é apresentada por Matias (2010), com sem contar que evidenciam o impor-
base nas áreas de interesse envolvidas: tante papel que o turismo vem tendo
Artístico, Científico, Cultural, Cívico, na recuperação do patrimônio históri-
Desportivo, Folclórico, Lazer, Promo- co, dos museus, da cultura popular e
das tradições (2004, p. 85).
cional, Religioso e Turístico.
A partir das duas classificações
apresentadas, entre outras existentes, po- É perceptível que o turismo de
de-se ver a amplitude do fenômeno do eventos exerce papel relevante nos
turismo de eventos e da necessidade de campos econômico, cultural e social.
tratá-lo como um complexo e multiface- No entanto, não se deve idealizar o fato
tado objeto de investigação acadêmica. de que todas as influências sejam posi-
tivas (Quadro 2). Afinal, no turismo os
2.1 Gestão e impactos do turismo de eventos impactos “[...] referem-se à gama de
modificações ou sequência de eventos
Um aspecto importante para a rea- provocados pelo processo de desenvol-
lização de eventos é o seu adequado pla- vimento turístico nas localidades recep-
toras” (RUSCHMANN, 2000, p. 34).

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Quadro 2 - Exemplos de impactos do turismo


Subsistemas Impactos Positivos Impactos Negativos
- Alertar a consciência para o patri- - Poluição
mônio natural existente - Sobrecarga dos espaços, equipa-
Ambiente
mentos e serviços urbanos (exem-
Natural
plos: parques, praias e serviços de
saúde)
- Intercâmbio cultural e conhecimen- - Sobrecarga populacional
to de etnias e crenças diferentes - Segregação social
- Partilha de valores - Perda da identidade das popula-
- Aumento da tolerância entre popu- ções locais
lações - Destruição de estruturas sociais
Ambiente
- Valorização do que é genuíno de - Congestionamento das atrações
Sociocultural
cada cultura e patrimônio turísticas (exemplos: transportes e
- Aumento do orgulho pela região e infraestruturas)
cultura local - Intensificação dos problemas de
segurança pública (drogas, furtos
e roubos)
- Aumento de postos de trabalho
- Aumento do rendimento de famílias
- Aumento das trocas comerciais com
Ambiente o exterior
Econômico - Aumento das receitas fiscais
- Melhoria de infraestruturas
- Desenvolvimento de outros setores
da economia
Fonte: adaptado de Cardoso (2013, p. 23).

É indispensável que todo planeja- Afinal, como afirmam Allen


mento de evento leve em consideração a e colaboradores,
aplicação de metodologias de avaliação e
prevenção de impactos nas comunidades O homem é um animal social e as
envolvidas. Esse é um trabalho que ul- celebrações exercem um papel-cha-
trapassa a organização do evento e deve ve no bem-estar da estrutura social.
envolver de múltiplas formas diferentes Os eventos podem engendrar coesão,
agentes governamentais, privados e co- confiança e autoestima social. Eis a
munitários. A administração pública deve fonte do seu poder e da sua influência
licenciar e fazer cumprir as exigências le- política, e a razão pela qual os even-
tos sempre irão refletir e interagir
gais, os empreendedores devem minimi- com as suas circunstâncias políticas e
zar ao máximo seus impactos negativos, meio ambiente (2003, p. 17).
cumprir as leis e respeitar a cultura, e a
comunidade deve fiscalizar e participar É um ponto comum nos trabalhos
das discussões exigindo seus direitos. que tematizam o turismo de eventos ve-
Com integração e participação rificar os impactos econômicos positivos
dos diferentes agentes envolvidos, tem- e a alavancagem do desenvolvimento
se a possibilidade de que o turismo de local. No entanto, cada vez mais, sur-
eventos seja propiciador de desenvolvi- gem novos indicadores que mostram as
mento local e regional. Mas, também, consequências socioculturais negativas,
“é importante reconhecer que os even- assim como os efeitos danosos ao am-
tos contêm valores que ultrapassam os biente – estes aspectos exigem maiores
simples impactos econômicos positi- pesquisas (GETZ, 2008). Muito embora
vos” (MARUJO, 2015, p. 10). pareça óbvio que os eventos turísticos

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provocam impactos positivos e negati- relacionados à categorização dos mu-


vos em várias esferas das comunidades nicípios brasileiros quanto ao quesito
nas quais se desenvolvem, sempre é im- atividade turística, a fim de estabelecer
portante ressaltar que os organizadores uma comparação entre os municípios da
de eventos devem ter a preocupação de região em relação ao Rio Grande do Sul
identificar e gerir esses impactos, que as e ao Brasil. Dos websites SETEL e SE-
autoridades devem regrar e fiscalizar es- TUR, os dados coletados referentes aos
sas atividades e que as populações atin- eventos divulgados e realizados no ano
gidas devem ser consultadas. de 2015 foram utilizados para realizar
a comparação entre os municípios da
3 Procedimentos metodológicos região, contemplando as seguintes va-
riáveis: abrangência do evento (micror-
Para estudar a dinâmica de rea- regional, regional, estadual, nacional e
lização de eventos, optou-se por uma internacional); tipo de evento (feiras e
abordagem qualitativa (MALHOTRA, exposições, religioso, gastronômico,
2011), de natureza descritiva, por meio rodeio, carnaval e esportivo); e entida-
de técnica de levantamento de dados se- de organizadora do evento (Prefeitura,
cundários. Mattar (1996) destaca que a Associações, Instituições privadas, Ins-
pesquisa descritiva tem a função de des- tituições religiosas e Instituições públi-
crever características de grupos e verifi- cas). Também foram comparados dados
car a existência de relações entre as va- referentes à quantidade de eventos di-
riáveis, podendo ser aplicada à pesquisa vulgados no website da SETEL, ao pe-
documental, de estudo de campo, de ríodo de ocorrência e à periodicidade da
levantamento, entre outras. Neste estu- realização desses eventos.
do, foi realizada uma investigação, por
meio de um levantamento de dados nos 4 Resultados e discussões
websites oficiais do Ministério do Turis-
mo e da SETEL. Como recorte geográ- 4.1 A regionalização do turismo no Rio
fico, o estudo utilizou como referência a Grande do Sul
divisão em regiões turísticas da referida
Secretaria de Estado, concentrando-se A delimitação de regiões é deter-
na região denominada central. minada segundo os fins a que se propõe.
Nos referidos websites, os dados Nesta perspectiva, a regionalização turís-
utilizados neste estudo são disponibi- tica do Rio Grande do Sul, presente no
lizados por município e de forma dis- Plano de Desenvolvimento do Turismo
persa. Inclusive, embora a denomina- do Rio Grande do Sul - 2012-2015, foi
ção da Secretaria Estadual responsável elaborada pela SETEL, com o objetivo de
pelo setor de turismo no Rio Grande do empoderamento destas importantes
Sul já tenha sido alterada de Secretaria instâncias de governança [...] essas
Estadual de Turismo (SETUR) para Se- instâncias devem promover o de-
cretaria Estadual de Turismo, Esporte e senvolvimento do turismo local, fo-
Lazer (SETEL), desde o início de 2015, mentando a criação de colegiados
ainda são mantidos e atualizados dois municipais de turismo com represen-
websites oficiais (SETUR, 2016; SE- tantes do poder público, privado e da
sociedade civil organizada, e se arti-
TEL, 2016). culando com outras instâncias de go-
A proposta deste estudo de siste- vernança e atores envolvidos com o
matizar os dados foi realizada por meio desenvolvimento do turismo em sua
da organização de informações no in- região (2012).
tuito de possibilitar uma análise com-
parativa. Nessa perspectiva, do Minis- Como política pública no setor
tério do Turismo foram extraídos dados de turismo, o estado foi dividido em 11

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regiões (Figura 1) e 23 microrregiões: Terras – Rota das Terras (22 municí-


(a) Grande Porto Alegre – Porto Ale- pios); (f) Yucumã – Rota do Yucumã
gre e Delta do Jacuí (oito municípios); (33 municípios); (g) Missões – Rota
Vale do Rio dos Sinos (12 municípios); do Rio Uruguai (20 municípios) e Rota
(b) Serra Gaúcha – Hortênsias (cinco Missões (26 municípios); (h) Central –
municípios), Vale do Paranhana (seis Central (35 municípios); (i) Vales – Vale
municípios), Uva e Vinho (33 municí- do Rio Pardo (22 municípios), Vale do
pios), Campos de Cima da Serra (oito Taquari (38 municípios) e Vale do Caí
municípios) e Rota das Araucárias (20 (20 municípios); (j) Costa Doce – Sul
municípios); (c) Litoral Norte Gaú- (14 municípios), Centro-Sul (14 muni-
cho – Litoral Norte Gaúcho (23 muni- cípios), Campanha (sete municípios) e
cípios); (d) Hidrominerais – Cultura e Fronteira Gaúcha (nove municípios); e
Tradição (12 municípios), Rota Águas (l) Pampa Gaúcho – Campanha (sete
e Pedras (23 municípios) e Termas e municípios) e Fronteira Gaúcha (nove
Lagos (16 municípios); (e) Rota das municípios) (SETUR/RS, 2015).

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Figura 1 - Mapa das regiões turísticas do estado do Rio Grande do Sul

Fonte: RIO GRANDE DO SUL (2012, p. 31).

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4.2 Características da região central do sadores, e a Rota Santos Caminhos da Fé


Rio Grande do Sul no quesito turismo (que inclui cinco municípios da região
central e municípios da região das Mis-
A região central (delimitada no sões) (SETEL/RS, 2015).
item 16 da Figura 1) concentra 35 mu- Ressalta-se que o Mapa do Turis-
nicípios, 652.277 habitantes, 9,3 bilhões mo Brasileiro prevê cinco categorias, de
do Produto Interno Bruto (PIB), 94 lo- A até E, que são o resultado da soma das
cais de hospedagem, 35 agências de via- variáveis de desempenho econômico,
gem e operadoras e 599 estabelecimen- considerando o número de estabeleci-
tos de alimentos e bebidas (A&B). Os mentos formais cuja atividade principal
municípios que pertencem a essa região é hospedagem; o número de empregos
são Agudo, Cacequi, Cachoeira do Sul, formais no setor de hospedagem; a esti-
Capão do Cipó, Cerro Branco, Diler- mativa de turistas a partir do Estudo de
mando de Aguiar, Dona Francisca, Faxi- Demanda Doméstica; e a estimativa de
nal do Soturno, Formigueiro, Itaara, Ivo- turistas a partir do Estudo de Demanda
rá, Jaguari, Jari, Júlio de Castilho, Mata, Internacional. Essa categorização clas-
Nova Esperança do Sul, Nova Palma, sificou os 3.345 municípios do Mapa
Novo Cabrais, Paraíso do Sul, Pinhal do Turismo Brasileiro, a fim de auxiliar
Grande, Quevedos, Restinga Seca, Santa na implementação de políticas públicas
Maria, Santiago, São Francisco de Assis, mais eficientes, distinguindo as pecu-
São João do Polêsine, São Martinho da liaridades e especificidades de cada
Serra, São Pedro do Sul, São Sepé, São região, para uma melhor compreensão
Vicente do Sul, Silveira Martins, Toropi, do envolvimento de cada município no
Tupanciretã, Unistalda e Vila Nova do processo de desenvolvimento regional
Sul (SETUR/RS, 2015). do turismo (BRASIL, 2015).
Os principais destaques da região Considerando a categorização
central, no setor de turismo, são a gas- dos municípios do Mapa do Turismo
tronomia italiana na Quarta Colônia, os Brasileiro, realizada pelo Ministério do
sítios zoobotânicos e paleontológicos e Turismo, pode-se perceber que, na re-
o turismo religioso. O polo econômico, gião central do Rio Grande do Sul, não
cultural, tecnológico, acadêmico e logís- há municípios enquadrados na catego-
tico da região encontra-se no município ria A. O município de Santa Maria foi
de Santa Maria, e as principais atrações incluído na categoria B, o município de
são a Rota Turística e Gastronômica Cachoeira do Sul, na categoria C, e a
Santa Maria-Silveira Martins, os antigos maioria dos municípios enquadra-se na
fósseis de dinossauros, que atraem inte- categoria D, com alguns incluídos na E
resse de grupos de visitantes e de pesqui- (Quadro 3) (BRASIL, 2015).

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Quadro 3 - Categorização dos municípios da região central do Rio Grande do Sul – 2015
Categori-
Categorização
Municípios Municípios zação dos
dos municípios
municípios
1. Agudo D 19. Paraíso do Sul E
2. Cacequi D 20. Pinhal Grande E
3. Cachoeira do Sul C 21. Quevedos E
4. Capão do Cipó D 22. Restinga Seca D
5. Cerro Branco E 23. Santa Maria B
6. Dilermando de Aguiar D 24. Santiago C
7. Dona Francisca E 25. São Francisco de Assis D
8. Faxinal do Soturno D 26. São João do Polêsine D
9. Formigueiro D 27. São Martinho da Serra E
10. Itaara E 28. São Pedro do Sul D
11. Ivorá D 29. São Sepé D
12. Jaguari D 30. São Vicente do Sul D
13. Jari E 31. Silveira Martins D
14. Júlio de Castilhos D 32. Toropi E
15. Mata D 33. Tupanciretã D
16. Nova Esperança do Sul D 34. Unistalda E
17. Nova Palma D 35. Vila Nova do Sul D
18. Novo Cabrais E
Fonte: adaptado de Brasil (2015).

Em análise comparativa entre a A, B e C. Com base nesse mapeamento,


região central do Rio Grande do Sul, o é possível afirmar que os municípios da
estado do Rio Grande do Sul e o Brasil, região central possuem menos repre-
percebe-se que a região central desse sentatividade de atividade turística, no
estado concentra, proporcionalmente, quesito desempenho econômico, do que
mais municípios na categoria E, apre- a média apresentada no Brasil e no Rio
sentando índices menores nas categorias Grande do Sul (Quadro 4).
Quadro 4 - Classificação, por categoria, dos municípios do Brasil, do Rio Grande do Sul e da
região central – 2015
Categoria Brasil RS Região central
N.º municí- % N.º municípios % N.º municípios %
pios
A 51 1,52 3 0,64 0 0
B 167 4,99 13 2,78 1 2,9
C 04 15,1 39 8,35 2 5,7
D 1841 55,04 227 48,6 21 60,0
E 782 23,38 185 39,6 11 31,4
Total 3345 100 467 100 35 100
Fonte: adaptado de Brasil (2015).

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Dalva Maria Righi Dotto, Monica Elisa Dias Pons,
136 José Martinho Rodrigues Remedi e Lilian Coradini Cerezer

4.3 O turismo de eventos na região cen- alcançar consumidores geograficamen-


tral do Rio Grande do Sul te distantes, a qualquer hora, seja por
meio de vitrines virtuais, panfletos inte-
Quando um consumidor pretende rativos, boletins on-line ou prestação de
realizar alguma atividade que envolve a serviços (BOONE, 2006).
escolha de um produto turístico, inicia a Segundo Tomikawa (2009, p. 64),
coleta de informações, no intuito de ava-
liar as alternativas existentes. Essa busca hoje, a internet possibilita ao turista
de informações é parte do processo de acesso a informações amplas sobre
decisão de compra do consumidor, que seu objeto de turismo. Dessa forma,
compreende os estágios de (a) pré-com- suas ações são cada vez mais dire-
cionadas pela quantidade e qualidade
pra, com as etapas de estímulo, cons-
das informações prestadas, sejam pe-
cientização do problema, busca de infor- las operadoras de turismo ou órgãos
mações e avaliação das alternativas; (b) governamentais responsáveis pelo
consumo; e (c) pós-compra (KOTLER e desenvolvimento turístico de uma
KEPLER, 2012; HOFFMANN e BAT- região.
SON, 2006; BOONE e KURTZ, 2009).
Como o sucesso de um evento Além dos websites administrados
pressupõe a atração de pessoas para usu- pelos municípios, a SETEL disponibi-
fruir da programação, a comunicação liza uma ferramenta importante para a
entre o organizador e o consumidor é comunicação de eventos em sua pági-
requisito relevante para atingir os objeti- na na internet, onde os organizadores
vos dos proponentes e dos turistas. A co- podem, gratuitamente, apresentar os
municação “visa informar, persuadir ou eventos de forma detalhada ao seu pú-
lembrar os clientes sobre um serviço que blico-alvo (SETUR/RS, 2015; SETEL/
está sendo oferecido”, e, portanto, “não RS, 2015).
se pode esperar que os clientes usem Para este estudo, foram conside-
um serviço que desconhecem” (HOF- rados os eventos que ocorreram na re-
FMANN e BATSON, 2006, p. 215). gião central do Rio Grande do Sul em
Utilizada de forma mais intensa 2015, cadastrados para divulgação no
atualmente, a comunicação via internet website da SETEL. Ressalta-se que a
reflete a mudança do comportamento iniciativa de cadastramento dos eventos
do consumidor, que busca informações é dos organizadores, de modo que os
com praticidade e rapidez (TORRES, eventos que constam no referido web-
2010). Nesse contexto, o uso das mídias site não representam a totalidade dos
interativas eletrônicas possibilita atingir eventos realizados na região estudada
uma grande audiência e é uma forma de (SETUR/RS, 2015; SETEL/RS, 2015).

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GESTÃO DE TURISMO DE EVENTOS: REFLEXÕES SOBRE OS EVENTOS
DA REGIÃO CENTRAL DO RIO GRANDE DO SUL/BRASIL
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Quadro 5 - Eventos da região central do Rio Grande do Sul cadastrados no website da SETEL/
RS – 2015
Município Evento Ocorrência
Agudo 18ª Festa do Morango e da Cuca Outubro
Cachoeira do 2ª Fenafest Novembro
Sul
Faxinal do 12º Festival do Peixe e Feira do Peixe Março
Soturno 23ª Expofax, 11ª Expocolônia e 14ª Mostra do Gado Maio
Leiteiro
2ª Semana Cultural e Gastronômica e Semana Farrou- Setembro
pilha
10º Natal Encanto e Luz Dezembro
Júlio de Casti- 54ª Expojuc e 8ª Expoarte Outubro
lhos
Santa Maria 21ª Rodeio Internacional do Conesul Março
Carnaval de Santa Maria 2015 Março
42ª Feira do Livro de Santa Maria Abril
Pátio Rural Junho
5º Pátio Rural Julho
6º Pátio Rural de Santa Maria Setembro
48ª Expofeira Agropecuária de Santa Maria Setembro
19ª Mercocycle Outubro
Expoaer Outubro
Romaria Estadual Nossa Senhora Medianeira Novembro
23ª Tertúlia Musical Nativista Novembro
Natal do Coração 2015 Novembro
Santiago 27ª Copa Santiago Internacional de Futebol Juvenil Janeiro
9ª Muamba Regional Fevereiro
Carnaval Popular de Santiago Fevereiro
13ª Encenação da Paixão e Morte de Cristo Abril
13ª Fecoarti Outubro
São Pedro do 1ª Feira de São Pedro Abril
Sul
São João do Romaria ao Monumento Nossa Senhora da Salete Setembro
Polesine Natal Iluminado Dezembro
Missa de Aniversário de João Luiz Pozzobon Dezembro
São Vicente do 27ª Fecobat - Feira Estadual de Comércio da Batata Julho
Sul Doce
Fonte: elaborado pelos autores, a partir dos dados da SETUR/RS (2015) e da SETEL/RS
(2015).

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Dalva Maria Righi Dotto, Monica Elisa Dias Pons,
138 José Martinho Rodrigues Remedi e Lilian Coradini Cerezer

Constatou-se que, dos 35 muni- novembro, tendo, no segundo semes-


cípios que compõem a região, somente tre, ocorrido grande parte dos eventos
nove incluíram seus eventos no website (65%). Isso demonstra falta de planeja-
da Secretaria de Turismo. Santa Maria mento do setor de turismo de eventos,
destaca-se como o município que pos- pois a concentração acarreta sobreposi-
sui o maior número de eventos no re- ção de eventos em um mesmo período
ferido website (12). Na sequência, en- de tempo, o que dificulta a atração de
contra-se Santiago, com cinco; Faxinal turistas e pulveriza a demanda.
do Soturno com quatro, São João do Po- A periodicidade da quase totali-
lêsine com três e os demais municípios dade é anual, com exceção somente do
com somente um evento (Quadro 5). evento denominado Pátio Rural, que
Considerando a totalidade de eventos ocorre em Santa Maria. Este quesito
que aconteceram nos municípios estu- apresenta uma particularidade que pode
dados no período analisado, percebe-se ser utilizada pelos organizadores como
que a divulgação no website da SETEL uma oportunidade de proporcionar aos
é realizada somente por uma pequena turistas experiências singulares para a
parcela dos organizadores. demanda de outros produtos turísticos,
O período de ocorrência dos além do evento, tais como a natureza,
eventos analisados é mais concentra- a gastronomia, os aspectos culturais e
do nos meses de setembro, outubro e religiosos, entre outros.
Quadro 6 - Características dos eventos da região central do Rio Grande do Sul cadastrados na
SETEL/RS – 2015
Evento Organizador Tipo Abrangência
18ª Festa do Morango e da Prefeitura Municipal Gastronô- Estadual
Cuca mico
2ª Fenafest Feira Nacional do Arroz Feiras e Microrregional
exposições
12º Festival do Peixe e Feira Prefeitura Municipal Gastronô- Microrregional
do Peixe mico
23ª Expofax, 11ª Expocolônia Prefeitura Municipal Feiras e Microrregional
E 14ª Mostra do Gado Leiteiro exposições
2ª Semana Cultural e Gastro- Prefeitura Municipal Gastronômi- Microrregional
nômica e Semana Farroupilha co; Semana
Farroupilha
10º Natal Encanto E Luz João Luiz Pozzobon Religioso Microrregional
54ª Expojuc e 8ª Expoarte Associação Cultural do Feiras e Estadual
Comércio, Indústria e exposições
Atividade Agropecuária
e Expojuc
21ª Rodeio Internacional do Associação Tradicio- Rodeio Internacional
Conesul nalista Estância do crioulo
Minuano
Carnaval de Santa Maria Prefeitura Municipal Carnaval Microrregional
42ª Feira do Livro de Santa Prefeitura Municipal, Feiras e Microrregional
Maria Câmara do Livro, CES- exposições;
MA, UFSM, UNIFRA e Cultural
8ª Coordenadoria Regio-
nal de Educação
Pátio Rural Prefeitura Municipal Gastronô- Microrregional
mico

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GESTÃO DE TURISMO DE EVENTOS: REFLEXÕES SOBRE OS EVENTOS
DA REGIÃO CENTRAL DO RIO GRANDE DO SUL/BRASIL
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Evento Organizador Tipo Abrangência


5º Pátio Rural Prefeitura Municipal Gastronô- Microrregional
mico
6º Pátio Rural de Santa Maria Prefeitura Municipal Gastronô- Microrregional
mico
48ª Expofeira Agropecuária de Associação Rural de Feiras e Estadual
Santa Maria Santa Maria exposições
19ª Mercocycle Gaudérios do Asfalto Esportivo Internacional
Expoaer Base Aérea de Santa Feiras e Microrregional
Maria exposições
Romaria Estadual Nossa Se- Arquidiocese de Santa Religioso Estadual
nhora Medianeira Maria
23ª Tertúlia Musical Nativista Prefeitura Municipal Gastronô- Microrregional
mico
Natal do Coração 2015 Prefeitura Municipal e Religioso Estadual
Câmara de Dirigentes
Lojistas
27ª Copa Santiago Internacio- Cruzeiro Esporte Clube Esportivo Internacional
nal De Futebol Juvenil de Santiago
9ª Muamba Regional Prefeitura Municipal Carnaval Microrregional
Carnaval Popular de Santiago Prefeitura Municipal Carnaval Microrregional
13ª Encenação da Paixão e Prefeitura Municipal Religioso Microrregional
Morte de Cristo
13ª Fecoarti Centro Empresarial de Feiras e Estadual
Santiago exposições
1ª Feira de São Pedro Prefeitura Municipal Feiras e Estadual
exposições
Romaria ao Monumento Nossa Paróquia São João Religioso Local
Senhora da Salete Batista
Natal Iluminado Prefeitura Municipal Religioso Local
Missa de Aniversário de João Polo João Luiz Pozzo- Religioso Microrregional
Luiz Pozzobon bon
27ª Fecobat - Feira Estadual de Prefeitura Municipal Feiras e Estadual
Comércio da Batata Doce exposições
Fonte: elaborado pelos autores a partir dos dados da SETUR/RS (2015) e da
SETEL/RS (2015).

SOCIAIS E HUMANAS, SANTA MARIA, v. 29, n. 02, mai/ago 2016, p. 125 - 142
Dalva Maria Righi Dotto, Monica Elisa Dias Pons,
140 José Martinho Rodrigues Remedi e Lilian Coradini Cerezer

Os eventos divulgados foram cate- com entidades de classe, e apresentando


gorizados pela tipologia de atrações: nove abrangência microrregional. Os resulta-
(32%) foram cadastrados como feiras dos indicam uma carência de diversida-
e exposições, sete (24%) como eventos de na tipologia dos eventos realizados,
gastronômicos, sete (24%) como eventos que, segundo Getz (2008), podem ter
religiosos, três (10%) como atividades re- uma grande variedade de propósitos e
lacionadas ao carnaval, dois (7%) como de programação e, consequentemente,
eventos esportivos e um (3%) como atra- contribuir na atração de uma quantidade
ções referentes à cultura gaúcha (rodeio maior de turistas para a região.
crioulo). Classificados como de abran- Na pesquisa realizada com o in-
gência internacional estão os seguintes tuito de verificar quais eventos da re-
eventos: 27ª Copa Santiago Internacional gião central estão sendo divulgados no
de Futebol Juvenil, no município de San- website da SETEL, constatou-se uma
tiago, 21ª Rodeio Internacional do Cone- subutilização dessa importante ferra-
sul e 19ª Mercocycle, ambos em Santa menta gratuita de divulgação e atração
Maria. Dentre os demais eventos, oito são de turistas por parte dos organizadores
estaduais, 16 são microrregionais e dois de eventos e, principalmente, das Prefei-
são locais (Quadro 6). turas Municipais da região analisada. A
Quanto à organização, verificou- baixa utilização do website foi percebida
se que a maioria dos eventos é realiza- com base em dois aspectos: (a) a maioria
da pelas Prefeituras Municipais (53%). das Prefeituras Municipais (74%) e dos
Alguns são realizados em parceria entre organizadores privados da região não ca-
o poder público e as entidades priva- dastram os eventos que organizam; e (b)
das (7%), e 40% são organizados por as Prefeituras que cadastram divulgam
instituições privadas, tais como: Paró- somente alguns eventos realizados.
quia São João Batista de São João do Considerando um processo eficaz
Polêsine, Arquidiocese de Santa Maria, de marketing turístico e a relevância do
Associação Tradicionalista Estância do uso da internet na atualidade para di-
Minuano de Santa Maria, Base Aérea de vulgação de produtos e serviços, parti-
Santa Maria, Associação Rural de Santa cularmente no segmento de turismo de
Maria e Cruzeiro Esporte Clube de San- eventos, percebe-se que há baixa proa-
tiago (Quadro 6). tividade dos organizadores e do setor
público para a divulgação dos eventos,
5 Considerações finais principalmente considerando que a di-
vulgação no website da Secretaria de
A análise da região central do Rio Turismo é gratuita. Tal constatação está
Grande do Sul, sob o escopo do setor de em descordo com os achados de estu-
turismo, considerando a categorização diosos que reforçam: (a) a importância
dos municípios realizada pelo Ministé- da disponibilização ampla de informa-
rio do Turismo Brasileiro, demonstrou ções para auxiliar no processo de deci-
que a região está muito abaixo da média são de compra (KOTLER e KEPLER,
brasileira e gaúcha, o que indica que o 2012; HOFFMANN e BATSON, 2006;
setor ainda tem pouca representativida- BOONE e KURTZ, 2009); (b) a neces-
de no desempenho econômico e tem po- sidade de utilização plena da comuni-
tencialidades a serem exploradas. cação para atração de consumidores/tu-
No detalhamento relacionado aos ristas (HOFFMANN e BATSON, 2006;
eventos, verificou-se que na região estu- SHIMP, 2010; URDAN e URDAN,
dada predominam as feiras e exposições 2009); e (c) a relevância do uso da in-
e os eventos gastronômicos e religio- ternet com o intuito de proporcionar
sos, organizados pelas Prefeituras Mu- praticidade, rapidez e interatividade em
nicipais, isoladamente ou em conjunto uma abrangência geográfica ilimitada

SOCIAIS E HUMANAS, SANTA MARIA, v. 29, n. 02, mai/ago 2016, p. 125 - 142
GESTÃO DE TURISMO DE EVENTOS: REFLEXÕES SOBRE OS EVENTOS
DA REGIÃO CENTRAL DO RIO GRANDE DO SUL/BRASIL
141

(TORRES, 2010; BOONE, 2006 e TO- tenham maiores subsídios que embasem
MIKAWA, 2009). as práticas de gestão em turismo, em es-
Em resumo, pode-se inferir que a pecial, a gestão de eventos turísticos. So-
região central tem condições de ampliar mente com sólidos conhecimentos, ges-
a participação do setor de turismo em tão pública comprometida e consequente
sua atividade produtiva, com reflexos participação comunitária, as potenciali-
positivos no desempenho econômico e dades do turismo de eventos realizar-se
social, desde que reconheça a impor- -ão, gerando reflexos positivos no desen-
tância da aproximação com os turistas volvimento econômico, social e cultural
e a profissionalização na divulgação dos locais em que são realizados.
e prestação dos serviços ofertados no
campo do turismo de eventos. A ne-
cessidade de incremento da atividade Referências
turística é consolidada pela relevância
do setor no contexto nacional. Segundo
o Ministério do Turismo, a participação ALLEN, J.; MCDONALD, I.; WIL-
do turismo no PIB brasileiro, em 2014, LIAM, O. Organização e Gestão de
foi de 3,5% (R$ 182 bilhões) e, entre Eventos. São Paulo: Campus, 2003.
os anos de 2003 e 2009, apresentou BAHL, M. Turismo e Eventos. Curiti-
uma expansão de 24,6%. A estimativa ba: Protexto, 2004.
do Ministério é de que o setor será res-
ponsável pela criação de 10,59 milhões BARBOSA, Fabrício Silva; SCAVAR-
de empregos diretos e indiretos no ano DA, Anníbal José. Um modelo concei-
de 2023, o que representará aproxima- tual de megaeventos musicais. CUL-
damente 9,5% do total de empregos no TUR – Revista de Cultura e Turismo,
país (BRASIL, 2016). ano 09, nº 02, p. 135-150, Jun./2015.
Para o sucesso de um evento, é BARRETTO, M. Turismo e Legado
importante o planejamento e a execução Cultural: as possibilidades do plane-
adequada. Como cada evento é único, jamento. Campinas: Papirus, 2000.
suas interações com o ambiente, os par-
ticipantes, o público e o próprio siste- BOONE, L.E; KURTZ, D.L. Marke-
ma de organização necessitam ser bem ting Contemporâneo. São Paulo: Cen-
desenhadas pela equipe profissional, tage Learning, 2009.
envolvendo turismólogos, profissionais BRASIL. MINISTÉRIO DO TURIS-
das relações públicas, jornalistas, e ges- MO. Disponível em http://www.turis-
tores de eventos, por exemplo, conside- mo.gov.br. Acesso em 06/06/2015.
rando que um dos principais apelos de
um evento é a ideia de se estar vivendo CARDOSO, Margarida Lopes. A Im-
uma experiência única, não repetível. portância da Organização de Eventos
Dessa maneira, entidades locais, no Turismo. Porto, 2013. Dissertação
regionais e estaduais deveriam tornar-se (Mestrado em Turismo) - Faculdade de
partes interessadas nos eventos turísti- Letras, Universidade do Porto.
cos, principalmente pelo potencial que DaCOSTA, L. P. et al. (Ed.). Legados
eles têm em atrair visitantes e, assim, de Megaeventos Esportivos. Brasília:
aumentar os seus gastos nas localida- Ministério do Esporte, 2008.
des, bem como pela capacidade que
GETZ, Donald. Event tourism: Defini-
os eventos têm de aumentar o conhe-
tion, evolution and research. Tourism
cimento acerca da região e de acolher
Management, nº 29, pp. 403–428,
novas atividades turísticas.
2008.
Por fim, também é necessário que
mais estudos sejam feitos para que se ob- GETZ, Donald. O evento turístico e o

SOCIAIS E HUMANAS, SANTA MARIA, v. 29, n. 02, mai/ago 2016, p. 125 - 142
Dalva Maria Righi Dotto, Monica Elisa Dias Pons,
142 José Martinho Rodrigues Remedi e Lilian Coradini Cerezer

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