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uma investigação mais detida das características dessas fantasias diurnas revela-
nos como é acertado que essas formações recebam a mesma designação que damos
aos produtos de nosso pensamento durante a noite – ou seja, a designação de
“sonhos”. Elas partilham com os sonhos noturnos um grande número de suas
propriedades e, de fato, sua investigação poderia ter servido como a melhor e mais
curta abordagem à compreensão dos sonhos noturnos. Como os sonhos, elas são
realização de desejos; como os sonhos; baseiam-se, em grande medida, nas
impressões de experiências infantis; como os sonhos, beneficiam-se de certo grau
de relaxamento da censura. Se examinarmos sua estrutura, perceberemos que
como o motivo de desejo que atua em sua produção mistura, rearranja e compõe
um novo todo o material de que eles são construídos (FREUD, 1996a, p. 524/525).
O que é que é o sonho? A reconstituição que o sujeito faz dele seria exata? Que
garantia temos nós de que uma verbalização ulterior não se misturou aí? Todo
sonho não seria uma coisa instantânea, à qual a palavra do sujeito dá uma história?
Freud afasta todas essas objeções, e mostra que não são fundadas. Mostra-o
sublinhando o fato, inteiramente singular, de que, quanto mais o texto que o sujeito
nos dá é incerto, mais ele é certas partes do sonho, que ele, Freud, que o escuta,
que o espera, que está lá para revelar o seu sentido, reconhece justamente o que é
importante. Porque o sujeito duvida, deve-se ter certeza (LACAN, 1986, p. 57).
Ao enunciar o sonho o sujeito elabora e faz uma montagem que lhe é própria, em que
as incidências e as omissões são materiais que formam uma tessitura textual. Essa montagem
dá pistas sobre os elementos que marcam o sujeito e sobre seu funcionamento inconsciente.
Ao mencionar o relato que o sujeito realiza de seu sonho, Lacan diz que
O trabalho por meio de um ensino de arte comprometido com a formação das crianças
como a que se dedicou o professor de Ishann, Ran Shankar Nikumbi, possibilita colocar em
relevo a potência criativa e o resgate de uma força intelectual com o mergulho na experiência
estética, recuperando o verdadeiro sentido do ser criança, há muito perdido nos muros das
escolas que frequentou, que insistiam nas velhas fórmulas, desconhecendo a vida ao ar livre, o
brincar com brinquedos simples como a pipa, o pião, a busca de autonomia pelo desenho, pela
pintura, na interpretação própria de um poema.
O treino rígido imposto pela escola fermentava espaços limitados, com exagero de
regras e rotinas para cabeças sonhadoras e criativas, que cada vez mais cedo foram sendo
podadas e reprimidas, resultando em apatia e tristeza profundas, como o que vivenciou o
personagem principal. Buscava-se a segurança nos moldes das autoridades tradicionais,
proibia-se o questionamento, que abala as certezas, omitindo-se opiniões, questões, discussões
e uma infinidade de caminhos estimulantes e ao mesmo tempo assustadores.
Essa discussão demarca a emergência de mudanças na realidade construída, que figura
no ensino de maneira geral e no papel do educador. A arte pode ser um dos vetores de
recuperação de subjetividades, tanto das crianças quanto dos demais sujeitos envolvidos no
panorama da escola, alcançando pessoas da família e da comunidade. Um filme da grandeza
de “Como Estrelas na Terra – toda criança é especial” é um amplificador de compreensões e
em última instância mostra-se como um dos caminhos para o exercício do olhar sensível para
a infância.
Vale salientar que o cotidiano da escola, conectado ao que a arte permite consolidar
como trabalho de interpretação e entendimento dos sujeitos, consolida uma via de despertar
para a realidade da criança em outros moldes, à medida que pode preconizar o contato com o
pensamento lúdico, imaginativo, a consciência visual, responsável pela construção de um
repertório imagético mais rico e valioso. O salto da repetição para a criação, da visibilidade
para a visualidade torna-se, desse modo, fato consistente no espaço do ensinar, pois capacita
não só a criança, mas os indivíduos submersos neste movimento educativo, a criticar,
imaginar, criar, abstrair, compreender e optar pela convergência de atitudes na experiência
cotidiana dinâmica e grandiosa. As cenas finais no concurso de desenho no internato em que
Ishann se encontrava mostram isso. A confluência de risos, brincadeiras, entendimento entre
alunos e professores, que antes engessados na rotina do ensinar e aprender baseados no
exercício de poder e autoritarismo, aos poucos toma conta do universo da escola em pleno
domingo, em um congraçamento maior, aquele que desperta para a necessidade desse
convívio por meio da arte.
A arte é necessária, segundo Fischer (2002), ainda é válida sua “função” mais basilar:
a de auxiliar o homem na representação de suas necessidades, anseios, ideias e esperanças,
ligadas a um determinado contexto histórico, [auxilia] o ser na busca de seu desenvolvimento
como humano, ou seja, independente da época, a função da arte “concerne sempre ao homem
total, capacita o “eu” a identificar-se com a vida de outros, capacita-o a incorporar a si aquilo
que ele não é, mas tem possibilidade de ser” (Fischer, 2002, p. 19 ).
Com efeito, no contato com a arte que incita o pensamento, a razão e a emoção, o
horizonte que se descortina intensifica a possibilidade da socialização das individualidades, o
Eu limitado liga-se à existência humana coletiva, refletindo a infinita capacidade do ser de
não se limitar a uma vivência rotineira e isolada.
A arte ainda trafega, é preciso ressaltar, na dualidade da identificação e do
distanciamento. O espectador pode ao mesmo tempo encontrar nas obras a continuidade de
suas inspirações, a significação que corresponde aos seus anseios mais íntimos ou a liberdade
de achar-se em terreno absolutamente diferente do que vive em seu cotidiano esmagador. O
que é constante nesse mundo da estética, no ir e vir de identificações ou não, é entender a
fagulha de humanidade que ele acende e sua qualidade libertadora, que torna possível
potencializar os desejos, a rebeldia, a alegria, a tristeza, a genialidade, a magia em crianças e
adultos.
Referências Bibliográficas:
FREUD, Sigmund. Obras psicológicas completas de Sigmund Freud vol. IX. Escritores
Criativos e Devaneios. Rio de Janeiro: Imago, 1996b.
LACAN, Jaques. O Seminário: Livro 1: os escritos técnicos de Freud. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1986.
MACHADO, Ibirá. Como Estrelas na Terra. São Paulo, 13 jun. 2008. Disponível em:
http://cinemaindiano.blogspot.com.br/2008/06/como-estrelas-na-terra.html. Acesso em 1 de
julho de 2014.