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CRIMINAL. RESP. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. SUSPENSÃO DA
PRETENSÃO PUNITIVA DO ESTADO PELA INCIDÊNCIA DO ART. 15 DA LEI N.º
9.964/00. IMPOSSIBILIDADE. PESSOA JURÍDICA INSCRITA NO REFIS APÓS O
RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. OFENSA AO PRINCÍPIO DA RETROATIVIDADE DA
LEI PENAL MAIS BENÉFICA NÃO-CONFIGURADA. INCIDÊNCIA DA ATENUANTE DE
REPARAÇÃO DO DANO. QUITAÇÃO DO DÉBITO. REEXAME DO CONJUNTO
FÁTICO-PROBATÓRIO. ÓBICE DA SÚMULA 7/STJ. NÃO-CONHECIMENTO.
CONTINUIDADE DELITIVA. AUMENTO. NÚMERO DE INFRAÇÕES. PENA FIXADA NO
MÍNIMO LEGAL. IMPROPRIAMENTE MAJORADA EM FACE DA EXISTÊNCIA DE
PROCESSO EM ANDAMENTO, CONSIDERADOS COMO MAUS ANTECEDENTES.
IMPOSSIBILIDADE. SUSPENSÃO DO PROCESSO. PAES. IMPOSSIBILIDADE NA VIA
ELEITA. RECURSOS CONHECIDOS. DESPROVIMENTO DE UM DOS RECURSOS E
PARCIAL PROVIMENTO DO OUTRO.
I. A suspensão da pretensão punitiva do Estado, nos termos do art.
15 da Lei n.º 9.964/00, somente ocorre quando o ingresso da pessoa
jurídica no REFIS se dá antes do recebimento da denúncia, nos exatos
termos da Lei. Precedente.
II. A não aplicação do art. 15 da Lei n.º 9.964/00 não configura
ofensa ao princípio da retroatividade da Lei penal mais benéfica,
eis que condicionada à inscrição da pessoa jurídica no REFIS antes
do recebimento da denúncia. Precedentes.
III. A Lei n.º 9.964/00 é aplicada, de imediato, nos casos em que
houve a inscrição no programa do REFIS antes do recebimento da
denúncia, ainda que os fatos que geraram o débito tenham ocorrido em
momento anterior ao da vigência da Lei.
IV. Inviável o conhecimento do recurso pela pretensão de aplicação
da atenuante de reparação do dano, sob o argumento de quitação do
débito, ante o inevitável reexame do conjunto fático probatório dos
autos que se faria necessário. Incidência da Súmula n.º 07/STJ.
V. No aumento da pena pela continuidade delitiva, deve-se levar em
consideração o número de infrações cometidas. Precedentes.
VI. O envolvimento em processo ainda em curso não pode servir como
indicativo de maus antecedentes, para o aumento da pena-base.
Precedentes.
VII. Impossibilidade de apreciação na via eleita, mormente em
petição apartada, do pleito de suspensão do processo, pela adesão ao
PAES.
VIII. Recursos conhecidos, para negar-se provimento ao recurso de
Maria de Lourdes Pasquali Guerra e dar-se parcial provimento ao
recurso de Reny Guerra, somente no tocante à exarcebação da
pena-base operada em virtude da presença de maus antecedentes.
STJ- HC 23510 / RJ ; HABEAS CORPUS
2002/0084663-0 Ministra LAURITA VAZ (1120
PUBLICAÇÃO DJ 02.08.2004 p.00437
EMENTA
HABEAS CORPUS. FORNECIMENTO DE PRETECHO DE FALSIFICAÇÃO. SENTENÇA
CONDENATÓRIA. EMENDATIO LIBELLI. PARTICIPAÇÃO EM CRIME DE SONEGAÇÃO
FISCAL NA FORMA CONTINUADA. APELAÇÃO. RESTABELECIMENTO DA IMPUTAÇÃO
ORIGINÁRIA. AUSÊNCIA DE CONTINUIDADE DELITIVA. POSSIBILIDADE DE
SUSPENSÃO DO PROCESSO.
1. A denúncia contra o Paciente era a do art. 294 do Código Penal,
sem qualquer alusão à pluralidade de ações. O Juiz processante
procedeu à emendatio libelli e condenou-o como partícipe do crime de
sonegação fiscal perpetrado de forma continuada. O aresto da Corte
Estadual restabeleceu a capitulação originária, entretanto, ao
fixar-lhe a pena, aumentou-na em "1/4 pela continuidade".
2. O equivoco exsurge manifesto, pois, inexistindo a considerada
continuidade, não haveria nenhum óbice objetivo a eventual
oferecimento do sursis processual pelo Ministério Público.
3. Ordem concedida para, reformando em parte o acórdão proferido em
sede de embargos de declaração na apelação, determinar que sejam os
autos devolvidos à primeira instância a fim de que haja manifestação
expressa do Ministério Público acerca da possibilidade de suspensão
do processo em relação ao ora Paciente, nos termos do art. 89 da Lei
n° 9.099/95.
Processo
RESP 496551 / SC ; RECURSO ESPECIAL
2003/0013975-0
Relator(a)
Ministro GILSON DIPP (1111)
Orgão Julgador
T5 - QUINTA TURMA
Data do Julgamento
25/05/2004
Data da Publicação/Fonte
DJ 02.08.2004 p.00489
CRIMINAL. RECURSOS ESPECIAIS. OMISSÃO NO RECOLHIMENTO DE
CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL
NÃO-DEMONSTRADA. VIOLAÇÃO A DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS.
IMPROPRIEDADE. ALEGAÇÃO DE EQUÍVOCO NA FIXAÇÃO DA PENA DE MULTA.
AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO LEGAL VIOLADO. NÃO
CONHECIMENTO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 284/STF. DOLO GENÉRICO. ANIMUS
REM SIBI HABENDI. COMPROVAÇÃO DESNECESSÁRIA. CONTINUIDADE DELITIVA
RECONHECIDA. CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL. DENÚNCIA
GENÉRICA. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. RECURSOS PARCIALMENTE
CONHECIDOS E DESPROVIDOS.
I - Impõe-se, para a demonstração da divergência jurisprudencial, a
realização do confronto analítico entre os julgados, de modo a
evidenciar sua identidade ou semelhança, a teor do que determina o
art. 255, §2º do RISTJ, não restando caracterizado o dissídio pela
mera compilação de ementas, tal como ocorrido in casu.
II - A alegação de negativa de vigência a dispositivos
constitucionais não pode ser objeto de recurso especial, tendo em
vista ser competência do Supremo Tribunal Federal a análise de
eventuais ofensas à Constituição Federal, via interposição de
recurso extraordinário
III - Não se conhece do recurso pela alegação de equívoco na fixação
da pena de multa, se o recorrente não indicou qual o dispositivo
legal que teria sido violado. Incidência da Súmula 284/STF.
Precedente.
IV - A conduta descrita no tipo penal do art. 95, "d", da Lei
8.212/95 é centrada no verbo "deixar de recolher", sendo
desnecessária, para a configuração do delito, a comprovação do fim
específico de apropriar-se dos valores destinados à Previdência
Social. Precedentes.
V - Se a omissão criminosa se repete ao longo de vários meses,
resta caracterizada a continuidade delitiva. Precedente.
VI - Não se tem como inepta a denúncia que não descreve,
pormenorizadamente, a conduta dos denunciados, quando não obstrui,
nem dificulta o exercício da mais ampla defesa.
VII - Tratando-se de crimes societários, de difícil individualização
da conduta de cada participante, admite-se a denúncia de forma mais
ou menos genérica, por interpretação pretoriana do art. 41 do CPP.
Precedentes.
VIII - Somente a instrução pode esclarecer e pormenorizar de que
forma os réus participaram dos fatos narrados.
IX - Hipótese em que não restou demonstrada a ocorrência de prejuízo
no exercício da defesa dos acusados.
X - Recursos parcialmente conhecidos e desprovidos.
Trata-se de recurso especial criminal fundamentado no art. 105, inciso III, letras "a" e "c"
da Constituição Federal, aduzindo negativa de vigência ao art. 71, do Código Penal e art. 1°
da Lei 8.137/90, além de divergência jurisprudencial.
Publique-se.
DECISÃO: por votação unânime, não reconhecer do recurso de Maria Moser Odorizzi e,
conhecendo do interposto por Nilso Odorizzi dar-lhe provimento parcial. Custas na forma
da lei.
Não é inepta a denúncia que descreve com minúcias os fatos e circunstâncias elementares
do crime, satisfazendo os requisitos do art. 41 do CPP, de modo a ensejar a ampla defesa do
acusado.
Em sede de crimes contra a ordem tributária não há necessidade de perícia contábil para
constatar a materialidade dos delitos quando há prova documental, inclusive notificações
fiscais do órgão fazendário.
Age com dolo genérico quem, estando obrigado pela lei tributária a reter os valores do
ICMS sobre as saídas de mercadorias para recolhê-los aos cofres públicos, realiza apenas a
primeira operação, ou seja, retêm os valores informados e apurados nas Guias da
Informações e Apurações, omitindo-se, voluntária e conscientemente, de realizar o
recolhimento dos mesmos.
O não recolhimento do ICMS declarando que integrou o preço das mercadorias vendidas,
tipifica a figura penal prevista no art. 2°, II, da Lei n. 8.137/90.( TJSC D.J.E. - SC- n°
10.307, 28/09/1999. Pág. 16.)
Apelação Criminal n° 99.016641-4, de Itajaí.
Relator: Des. Genésio Nolli.
Juiz Pro : Dr. Alexandre Morais da Rosa.
DECISÃO: por votação unânime, negar provimento ao recurso. Custas na forma da lei.
EMENTA
Descabe acoimar de nulos - por ofensa ao art. 381, III, do CPP - acórdão e sentença de 1°
grau que declinaram expressamente os dispositivos legais alcançados pela conduta
delituosa, os quais se ajustam perfeitamente aos fatos descritos na denúncia.
Não conhecimento do recurso no que toca a alegação de ofensa aos arts. 12, I da Lei 8.137
e 157 do CPP, porquanto a controvérsia sobre ter havido, ou não, prova nos autos do
elevado prejuízo ao erário não comporta exame em sede de recurso especial, a teor da
Súmula 7 do STJ.
Inexistência de violação aos arts. 619 e 620 do CPP, porquanto o Tribunal a quo, em sede
de embargos declaratórios, em nenhum momento se furtou à prestação jurisdicional,
enfrentando de forma clara cada ponto tido como obscuro ou omisso pelo embargante,
restando sobejamente evidenciado que o decisum não ostenta nenhuma incompletude.
Recurso conhecido em parte e nessa parte desprovido. (STJ - D.J.U. sessão 1 N° 199-E,
18/10/1999. PÁG. 252.)
Em que pese o esforço laborado pela acusação, verifica-se que tais fatos não caracterizam
crime, tanto que o próprio Conselho Estadual de Contribuintes, órgão administrativo
competente para julgamento das infrações tributárias, decidiu que sequer ilícito tributário
restou caracterizado, determinando o cancelamento da notificação, pois conforme as bem
lançadas razões daquele julgador, “não há como conferir a meras declarações prestadas por
terceiros, força suficiente para fundamentar a imputação feita à recorrente. Apenas a título
de suposição, poderíamos imaginar a possibilidade das empresas destinatárias não terem
procedido o registro destas notas fiscais, alegando, comodamente, não tê-las recebido” (fl.
372).
O mesmo argumento – ausência de força probante de declarações de terceiros – também é
suficiente para impor o reconhecimento de inexistência do delito relativo à notificação
518.564-96 (fls. 182), que decorreria da emissão de nota fiscal de remessa de produtos para
Perdigão Agro Industrial S/A sem que esta tivesse efetivamente recebido tais
mercadorias(fl. 195/197), porquanto baseada unicamente com lastro das declarações
emitidas por aquela empresa.
Em relação à notificação 518.563-95 (fl. 144), o Ministério Público afirma que houve
consignação de valor inexato nas Guias de Informaçãoe Apuração do ICMS (vulgo,
“GIAS”), inserindo-se valores diferentes dos efetivamente negociados nas Notas Fiscais
respectivas, o que reduziu o tributo devido em R$ 71.316,55.
Vale destacar que as Guias relativas ao período de junho de 1994 a fevereiro de 1996 foram
tidas como extraviadas, porque segundo noticiam os autos, uma semana após a intimação
do apelado para apresentação desta documentação, teria ocorrido misterioso furto na sede
da empresa, conforme alegado em Boletim de Ocorrência n. 062/96 (fl. 288).
Não obstante a ausência das versões originais, verifica-se que efetivamente houve
discrepância nos valores declarados nas GIA´s e os constantes nas notas fiscais, conforme
se depreende do exame do resumo demonstrativo de fl. 153, elaborado a partir das notas
fiscais enviadas pelos adquirentes dos produtos fornecidos pela empresa do apelado e das
“gias que mensalmente são apresentadas pela empresa ao fisco” (depoimento do fiscal de
tributos estadual Alfredo Rovaris Júnior, fls. 418/419).
Por fim, indicou-se a notificação 518.561-93 (fls. 223), em a qual teria sido apurada a
conduta de emissão de nota fiscal “calçada”, caracterizada pela existência de valores
diferentes da 1a via que acompanha a mercadoria e indica o preço real, em relação às
demais vias, nas quais foram inseridos valores inferiores aos realmente praticados, o que
implica em escrituração à menor e reduz do tributo devido, resultando, no total, em prejuízo
à Fazenda Pública de R$ 131.790,43.
Esta conduta também restou plenamente comprovada, bastando o exame das notas fiscais
acostadas às fls. 230 a 269 para que se verifique a discrepância dos valores nelas inseridos.
Como exemplo, cite-se a nota fiscal n. 000112, cuja 1a via foi remetida pelo comprador ao
Fisco (fl. 230) tem valor total de R$ 3.164, 80, mas foi consignado em sua 2a via, que
permaneceu com a empresa vendedora e serviu para lançamento (fls. 230), o valor de R$
100,00.
Vale lembrar que somente esta divergência já configura o delito, eis que para o tipo penal
em apreço (art. 1o, da Lei n. 8.137/90), basta uma única redução. Assim, as inúmeras
alterações realizadas levam, inequivocamente, à configuração de tantos delitos quantos
foram as condutas, ainda que em continuidade delitiva, porquanto cada uma destas fraudes
reduziu ou suprimiu tributo, nos moldes previstos na Lei n. 8137/90.
As práticas acima descritas configuram claramente o delito de sonegação fiscal tipificado
pelo art. 1o, da Lei n. 8.137/90, como bem apontado pela doutrina que, no caso do imposto
sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de
transporte interestadual e intermunicipal (ICMS), elenca as diversas maneiras de prática
deste crime, dentre elas:
“2.5.1. Aumento indevido de créditos do imposto (ICMS) (..) b) Crédito de imposto
destacado em documentos inidôneos: (..) 2) emitidos por contribuintes já baixados ou
cancelados no Cadastro de Contribuintes dos respectivos Estados (..)
“2.5.2. Redução indevida dos débitos do imposto (ICMS) (..) c) Sub-faturamento, mediante
emissão de documento fiscal: 1) consignando valores inferiores aos praticados na operação
ou prestação” (FRANCISCO RICIERI FONTANELLA, ICMS: Casos mais freqüentes de
evasão fiscal, in RESMESC, n.1, p. 168/169)
Resumindo: verifica-se a comprovação da materialidade no concernente às condutas cuja
conseqüente redução de tributo foram formalizadas nas notificações n. 518.548-80,
518.563-95 e 518.561-93.
3. A autoria imputada ao apelado restou devidamente comprovada.
Inicialmente, deve-se destacar que a responsabilidades tributária e criminal são
independentes, não obstante tratarem, na espécie, de infrações derivadas das mesmas
condutas, porquanto além de aquela ser determinada pela incidência da norma tributária
sobre aspectos fáticos diversos dos previstos nos tipos penais, há, também, regulamentação
normativa própria para cada um destes ramos do direito, sendo estipulados os requisitos
necessários para condenação do agente, bem como as respectivas sanções que lhe serão
aplicadas.
É sabido que a infração à obrigação tributária (principal ou acessória) implica em sanções
completamente diversas daquelas decorrentes de violação da norma penal cuja
responsabilidade decorre exclusivamente da comprovação da culpabilidade do agente (art.
18, do CP), pois nesta há aplicação de penas privativas de liberdade, ao contrário daquela
que, em regra, implica em sanção meramente pecuniária ou administrativa e a
responsabilidade independe da vontade do infrator, bastando a violação à norma tributária
para que lhe seja imposta a sanção.
A própria Lei n. 8.137/90, definidora dos crimes contra a ordem tributária expressamente
prevê que, naqueles crimes cometidos por intermédio de pessoa jurídica, os agentes (=
pessoas físicas) somente respondem se tiverem concorrido para a prática do delito e se o
fizerem com dolo ou culpa:
“Quem, de qualquer modo, inclusive por meio de pessoa jurídica, concorre para os crimes
definidos nesta Lei, incide nas penas a estes cominadas, na medida de sua culpabilidade.”
No mesmo sentido, ao analisar o tema da denúncia genérica nos crimes contra a ordem
tributária, HUGO DE BRITO MACHADO bem conclui que:
“1a) Nos crimes contra a ordem tributária, a descrição da participação de cada um dos
acusados no cometimento delituoso é requisito essencial da denúncia, por imposição das
garantias constitucionais do processo penal;
“2a) Em se tratando de crime cometido por intermédio de pessoa jurídica, a
responsabilidade penal dos dirigentes destas é na medida da culpabilidade de cada um, por
força do que estabelece o art. 11, da Lei n. 8137, de 27.12.90” (Revista Dialética de Direito
Tributário, n. 12, p. 36).
No caso em tela, havendo prova acerca da materialidade dos delitos (consubstanciados em
infrações tributárias formalizadas pelas notificações fiscais respectivas), há fortes
elementos de convicção capazes de atestar a atividade do apelado, assim como seu dolo
direto de reduzir ou suprimir tributo mediante condutas proibidas pelo direito.
Não há dúvida que Luiz Carlos Grazziotin, no interrogatório, afirmou que “quando viaja os
próprios funcionários tinham autorização para emitir notas fiscais (..) que por volta de
92/93 a empresa chegou a ter 30 empregados” (fls. 279/280), sendo sabido, por outro lado,
que a responsabilidade penal é pessoal, intransferível e como tal, “não se pode imputar ao
sócio que outorga procuração a um terceiro, ao que parece, o verdadeiro gerente da
empresa, a prática de ilícitos que o mandatário tenha praticado” (STJ – RHC 58590/YO –
6a Turma, Rel. Min. Anselmo Santiago, DJU 02.6.97, apud, Alfredo de Oliveira Garcindo
Filho, Jurisprudência criminal do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de
Justiça, 5a ed., Curitiba: Editora do Autor, 1999, p. 109).
Importante que não se confunda a possibilidade de denúncia genérica nos crimes societários
(aceita pela jurisprudência mas rejeitada por parte da doutrina, cf. Hugo de Brito Machado,
ob. loc. cit., e Ada Pellegrini Grinover et al., in As Nulidades no Processo Penal, 6a ed. rev.
ampl. e atual., São Paulo: RT, 1997, p. 96/97) com condenação de sócio sem comprovação
de sua culpabilidade e participação direta na fraude perpetrada, pois esta exige certeza,
enquanto aquela decorre da impossibilidade de individuação completa e específica da
conduta individual de cada sócio, bem como pelo fato de a denúncia imputar fatos que, no
decorrer da instrução judicial, serão comprovados.
A hipótese dos autos autoriza afirmar com segurança, sem risco de se admitir
responsabilidade penal objetiva, que há certeza, tanto da conduta típica quanto da sua
autoria imputadas ao apelado de forma direta, ou mesmo concurso ao encampar eventuais
preenchimentos de notas calçadas que poderiam ter sido realizadas por servidores quando
ele não estivesse presente (mas os funcionários não iriam proceder tão fora da lei se não
tivessem ordem do empregador).
Há certeza de que o apelado foi o responsável direto pelas fraudes tributárias perpetradas
em nome da pessoa jurídica da qual é sócio, impondo-se, portanto, sua condenação.
É que vale destacar inicialmente o teor da representação emitida pelos Fiscais de Tributos
Estaduais, Alfredo Rovaris Júnior e Francisco José Granemann, no sentido de que : “no dia
06/03/96 recebemos denúncia anônima, por telefone, informando que a citada empresa
estaria emitindo documentos fiscais de forma irregular. No dia seguinte, como pode provar
o Termo de Apreensão lavrado na ocasião, procedemos diligência fiscal no sentido de
constatar se a denúncia tinha fundamento.
“Primeiramente, dirigimo-nos ao escritório cadastrado na SEF como sendo o prestador de
serviços de contabilidade. O citado contador, Sr. Romeu, nos informou que não lhe
pagavam pelos seus serviços e que, por isso, havia devolvido toda a documentação
requisitada. Imediatamente, juntamente com o contador, fomos até a sede da empresa e
exigimos a apresentação de toda a documentação.
“Inicialmente, o Sr. Luiz Carlos, único sócio presente na ocasião, inconformado com a
situação, se mostrou apreensivo e indignado com a exigência, não apresentando os
documentos. Informamos que tinha a obrigação de exibi-los, na forma do disposto no art.
84 do RICMS/SC. Neste momento, apresentou o Registro de Perda de Documentos e
Objetos nº 101/95, emitido em 02/12/95 pela Delegacia de Polícia da Comarca de Santa
Cecília, onde consta a perda de alguns documentos fiscais por ocasião da mudança do
escritório. O RICMS indica, no art. 182 do Anexo III, que a perda dos documentos fiscais
deve ser comunicada ao Fisco 48 (quarenta e oito)
horas da ocorrência. (..) Ao requisitarmos os livros fiscais, o sócio informou que alguns
deles estavam no escritório de contabilidade. (..) Ora, tínhamos acabado de chegar daquele
local. O contador se mostrou apreensivo com a informação e se prontificou a levar, até a
09ª GEREG em Curitibanos, todos os livros fiscais solicitados.
“Uma semana depois, em 14/03/96, com a insistência do contador em não representar a
documentação, nos dirigimos até a sede da empresa e lavramos uma Intimação, onde
fizemos constar todos os livros solicitados, cientificando o sócio naquela data. Lavramos o
Termo de Início de Fiscalização, com data retroativa à 07/03/96, cientificado em 15/03;96
pelo Aviso de Recebimento 475.005.943.
“Causou-nos surpresa quando o contribuinte deu entrada, nesta gerência, do Boletim de
Ocorrência nº 062/96, emitido em 26/03/96 pela Delegacia de Polícia de Santa Cecília,
informando que havia sido arrombada a sede da empresa e, por coincidência, furtados
diversos documentos fiscais, dentre os quais, os constantes da intimação lavrada em
14/03/96 (..) Os livros vinham sendo escriturados por sistema eletrônico e foram furtadas,
inclusive, as cópias de segurança em disquete. Sendo que, inclusive, o contador, não ficou
com nenhuma cópia em seu poder, o que não é comum nestes casos” (fls. 39/40) (GRIFOS
NOSSOS).
Estas informações, além de gozarem de presunção de validade, eis que emitidas por
representantes da administração pública, também não foram contestados pelo réu (ora
apelado).
Como se vê, não só o acusado era o único administrador e gerente da empresa (conforme
asseverado pelos fiscais, designado pelo contrato social e admitido pelo réu em seu
interrogatório às fls. 278), como também foi o responsável pelo trato com os agentes
fiscais.
Saliente-se ainda que, na versão defensiva, as emissões de notas fiscais por empregados
eram eventuais, pois "quando viaja os próprios funcionários tinham autorização para emitir
notas fiscais" (fl. 279).
Ora, se algumas notas fiscais eram emitidas durante as eventuais viagens do apelado, resta
claro que além de ele ser o responsável pelas emissões durante os períodos em que estava à
frente do negócio, também lhe cabia o ônus de conferir as operações realizadas durante a
sua ausência, mormente quando lhe era imposto o ônus de fiscalizar a empresa por ser o
sócio-gerente.
Desse modo, ainda que em algumas das fraudes ele não fosse o executor direto
(falsificando as notas fiscais), o sócio-gerente atuou como autor mediato, orientando,
anuindo e encampando as ações que eventualmente tivessem sido cometidas por seus
empregados.
Impende destacar que foge completamente às máximas da experiência do que normalmente
ocorre a atribuição de tais condutas comissivas dolosas a pessoas (funcionários) que,
submetidos ao risco de futura ação penal, nada ganhariam com a inscrição de elementos
inexatos e diversos dos reais nas notas fiscais.
Aliás, não bastasse fugir à lógica do que normalmente ocorre, o réu não comprovou
adequadamente que seus empregados emitiam as notas fiscais, não logrando êxito em
formar o juízo de convencimento necessário para que fosse admitida como verdade sua
versão dos fatos, e como se sabe, "quem afirma um álibi deve comprová-lo, sob pena de,
não o fazendo, ser nenhum o valor probatório da negativa de autoria" (JC 59/288).
Não há dúvida de que, no caso dos autos, o sócio-gerente ora apelado foi o responsável
pelas fraudes perpetradas em prejuízo à Fazenda Pública, mesmo porque "demonstrada,
através de consistente perícia, a prática de inúmeras ações de sonegação fiscal, a
condenação dos diretores da empresa, que não lograram
demonstrar o seu distanciamento em relação aquelas práticas, era impositiva. Sentença
confirmada por seus próprios e jurídicos fundamentos" (TJRS – ACr 697185387 – RS – 2ª
C.Crim. – Rel. Des. Marcelo Bandeira Pereira – J. 20.08.1998).
E, ainda:
"SONEGAÇÃO FISCAL; CRIMES E AUTORIA COMPROVADOS – Tratando-se de
crimes de sonegação fiscal praticados por sócio-gerente, detentor de quase todo o capital
da empresa, caberia a defesa demonstrar de forma cabal a inexistência dos mesmos, para
contrariar a prova escorreita no sentido contrário, mostrada pelos documentos pela
fiscalização tributária, e pelo anexo ao auto de lançamento, onde se explica de maneira
minudente, os mecanismos das fraudes. Condenação mantida" (TJRS – ACr 698597564 –
RS – C. Fér. Crim. – Rel. Des. Sylvio Baptista Neto – J. 10.02.1999).
4. Certas a materialidade e a autoria, resta verificar qual a modalidade de concurso de
crimes restou configurada no caso dos autos.
Não obstante terem sido realizadas de formas diferentes (apropriação de créditos do ICMS
em operações realizadas com empresas cujas inscrições estavam canceladas no Cadastro de
Contribuintes, consignação de valore inexatos nas Guias de Informação e Apuração, e
emissão de nota fiscal "calçada"), todas condutas realizadas pelo apelado configuram
crimes de mesma espécie, porquanto tipificadas pelo art. 1o, da Lei n. 8.137/90.
Praticadas nas mesmas condições de tempo e lugar, as condutas embora relativas a
documentos diversos, foram executadas de forma semelhantes, qual seja, inserção de
elementos inexatos (diversos dos reais) em documentos fiscais (notas fiscais e GIAS).
Cada um dos documentos alterados configura, por si só, um delito, eis que tal ação já basta
para a incriminação pelo art. 1o, da Lei n. 8.137/90.
Nesse contexto, verifica-se que, em relação à notificação n. 518.561-93, foram emitidas
116 notas fiscais cujos valores da 1a via eram diferentes das consignadas nas demais vias
(vide relação de fls. 225/229).
Em relação a notificação 518.563-95, há certeza da consignação de valores inexatos no que
se refere aos meses de jul./95 a out./95, restando consubstanciadas quatro GIA´s cujos
valores foram declarados a menor (cf. demonstrativo de fl. 153). As diferenças apontadas
nos demais meses consignados neste demonstrativo não são hábeis a indicar a efetiva
concretização do delito pois, sendo negativas, demonstram, apenas, que os agentes fiscais
não conseguiram amealhar todas as notas fiscais dos adquirentes dos produtos
comercializados pelo apelado.
Por fim, em relação à notificação n. 518.548-80, verifica-se a existência de 13 (treze)
operações com a empresa Multimad Ind. Com. Ltda. (fl. 83) e 2 (duas) com Grosser Ind.
Com. de Madeiras Ltda. (fl. 85), resultando, daí, 15 (quinze) ações autônomas.
5.Passa-se à aplicação da pena.
O acusado agiu com culpabilidade comum à espécie; é primário e não há registro de
antecedentes criminais; a sua conduta social é normal; a personalidade já está formada, não
possuindo graves desvios; o motivo do delito foi reprovável, eis que visava diminuir o valor
do tributo devido em prejuízo da Fazenda Pública que, por conseqüência, teve reduzida sua
receita aplicável em benefício da coletividade; as circunstâncias são normais à espécie; a
conseqüência do crime restringiu-se a redução do tributo devido; não houve vítima
específica, sendo a sociedade em geral.
Assim, fixa-se a pena-base pouco acima do mínimo legal em 2 (dois) anos e 4 (quatro)
meses de reclusão e 15 (quinze) dias-multa.
Não há incidência de agravantes e nem atenuantes.
Sem causa de especial diminuição em relação a cada um dos crimes; reconhecida a
continuidade delitiva e face ao expressivo número de crimes, procede-se ao aumento de 2/3
(dois terços), totalizando 3 (três) anos, 10 (dez) meses e 20 (vinte) dias de reclusão em
regime aberto.
Faz jus o sentenciado à substituição da pena privativa de liberdade por duas restritivas de
direito (art. 44, §2o, "in fine", do CP), consistentes em prestação pecuniária no valor de 30
(trinta) salários mínimos (art. 43, I, do CP) e prestação de serviços à comunidade ou a
entidades públicas (art. 43, IV, do CP).
6. DIANTE DO EXPOSTO, conhece-se do recurso e dá-se-lhe provimento para condenar
Luiz Carlos Graziotin nos termos deste acórdão.
Participou do julgamento, com voto vencedor, o Ex.mo. Sr. Des. Jorge Mussi, e lavrou
parecer, pela douta Procuradoria-Geral de Justiça, o Ex.mo. Sr. Paulo Antônio Gunther.
Florianópolis, 16 de maio de 2000.
Alberto Costa
PRESIDENTE, COM VOTO
Amaral e Silva
PRESIDENTE P/ O ACÓRDÃO
Genésio Nolli
RELATOR
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