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Relatos da Fábrica 3: Três Conflitos e uma Conversa

Logo depois desses enfrentamentos a líder da linha Z foi


particularmente respeitosa comigo - pelo menos não gritou mais
comigo, pelo contrário falava-me amavelmente.

05/05/2018

Por Zaozao

Desde 2012 é publicada a revista Relatos da Fábrica com reportagens sobre as condições
e a luta dos trabalhadores no Delta do Rio das Pérolas (Zhujiang). O site Gong Chao
SELECIONOU E TRADUZIU (para o inglês e para o espanhol) alguns desses relatos e
agora o Passa Palavra apresenta-os em português. Todos os relatos poderão ser lidos
CLICANDO AQUI.

(Relatos da Fábrica # 8, Novembro de 2014)

Primeiro con ito: Ao retornar depois de ajudar outra linha de produção, não
haviam pessoas su ciente nem para manter a nossa própria linha. Éramos
somente três de nós em nossa estação de trabalho, mas eram requeridas pelo
menos quatro pessoas para seu funcionamento. Pouco depois de começar a
linha sobre essas condições, a líder da linha Z se apressou gritando com nosso
instrutor: “W, sabe qual o volume da produção? Sabe o quão pouco você está
produzindo?” W cou muito nervoso e não sabia o que responder e eu
intervim: “Você quer volume de produção, mas não se incomodou de veri car
quantas pessoas estão na linha? Nem sequer há pessoas o su ciente aqui, você
tem a mesma pessoa primeiro trabalhando nesta estação e depois na outra, e
ainda assim está exigindo mais volume de produção?!” Depois de escutas isso,
Z baixou seu tom, mas continuou falando com o instrutor de maneira brusca:
“Não tem pessoas o su ciente? Se é esse o caso, devia ter dito antes!” Pouco
depois alguém veio ajudar.

Segundo con ito: Quando nosso instrutor W estava


descansando, um instrutor chamado L veio de
outra linha para substituí-lo por um tempo. Foi
pouco depois de começar o trabalho novamente,
mas os materiais ainda não tinham chegado, assim
nós três nos sentamos e começamos a conversar. L chegou apressada com uma
expressão severa. Ela falava de uma forma séria apesar de não estar nos
ameaçando assim o senti: “Vocês deveriam ter um pouco de cuidado, alguém
da administração poderia vir. Se veem que vocês não têm nada para fazer,
reduzem o número de pessoas na linha e no m são vocês os que mais
sofrem.” Eu estava muito furiosa porque não era nossa culpa que não
tínhamos nada para fazer, assim eu disse a ele com alguma rispidez: “Claro,
reduzir o número de pessoas na linha, só há três de nós agora mesmo.
Necessitamos uma pessoa para operar a máquina, uma para que passe os
materiais e mais dois para empacotar, e só temos três de nós! Claro que se
pode reduzir o número de pessoas, mas não nos culpem quando não for
possível terminar os produtos.” Ela parecia irritada e ansiosa ao mesmo
tempo: “Não estou falando só se de vocês especi camente, eles têm feito
cortes no número de empregados ultimamente, vocês também deveriam ser
cuidadosos, não façam eles pensarem muito sobre vocês.” Fiquei ainda mais
furiosa – nem sequer tínhamos pessoa o su ciente, então como que iam
reduzir ainda mais, nalmente disse: “As coisas são como são, eu não posso
fazer nada a respeito, se querem reduzir o pessoal não podemos trabalhar.
Sempre depende dele decidir se vão fazer cortes ou não!” X, que estava de pé
ao meu lado, continuou me puxando pela manga para que eu me calasse, mas
eu não parei. Por que deveria? O que disse que estava errado? Eu não estava
discutindo, eu só estava deixando as coisas claras! L não disse mais nada –
simplesmente foi embora.

Terceiro con ito: Ultimamente não tinham nos atribuído nenhum trabalho
depois do nosso turno, e a princípio parecia que hoje não seria diferente, mas
justo quando nos aprontávamos para terminar o dia, o instrutor W de repente
nos disse que deveríamos fazer uma hora de trabalho a mais. As pessoas de
nossa estação disseram que não iam fazer a hora extra porque não valia a pena.
Apesar de W insistir que zéssemos a hora extra, continuamos nos negando. X
já tinha recolhido nosso lixo. e depois de retirar o lixo normalmente não se
retorna para área de trabalho; basicamente se está fora do trabalho.

Não muito depois que X saiu, a líder da linha Z veio


gritando agressivamente: “Quem não está fazendo
hora extra?” Eu estava de pé do lado dela quando
disse o seguinte: “Ninguém vai fazer hora extra”.
Ela me olhou nos olhos como se dissesse, “Não
estou perguntando para você!” Disse para mim mesmo, “Merda, se não quer
uma resposta não deveria perguntar e todos nós poderíamos ir para casa.”
Então ela se voltou para D, que estava de pé junto comigo, e perguntou para
ele, “Você fará hora extra?” D tinha planos e disse que não. Quando ela se
voltou para mim ngi que não a vi, logo ela foi até o posto da máquina e
perguntou a H, o operador da mesma, se aceitaria a hora extra, mas ele se
negou também. Então, de repente, gritou comigo, “Senhorita, só porque você
não tem uma família para manter e não tem que ganhar dinheiro, não signi ca
que as outras pessoas não precisam fazê-lo, por isso não deveria incitá-las!”
Quando escutei isso me esquentei: “Você perguntou para ele se os incitei? você
acredita que eu poderia fazer isso? Eles não são crianças, eles são adultos! Eles
decidem se querem fazer hora extra, não tem nada a ver comigo!” Porém ela
não queria mostra fragilidade nem que a calassem facilmente, assim disse, “Se
você não quer fazer hora extra só pode representar a si mesma, mas se está
incitando aos outros de acordo com o regulamento da fábrica…” Eu a
interrompi: “SÓ represento a mim mesma! Isso é algum problema?” Mas ela
não ia me escutar e continuou: “Se não quer fazer hora extra de seu nome e
seu número de trabalho ao instrutor e isso será tudo.” Disse a ela,” Certo,
estava fazendo isso mesmo quando você me interrompeu fazendo perguntas.
Já recolhemos as coisas e contamos para você, então qual é o problema
agora?” Isso calou-a e ela saiu andando. Eu estava com um pouco de raiva, por
isso grite pelas costas, “Eu estou incitando as pessoas? Desde quando tenho
capacidade para incitar as pessoas? Você é líder de linha e nem mesmo VOCÊ
tem essa habilidade, então como eu seria capaz de fazer isso? Se eu fosse capaz
de incitar qualquer coisa não seria somente sobre a hora extra. De verdade,
como pode alguém que fala sem pensar chegar, de qualquer jeito, a ser líder de
linha?”

Uma conversa: Logo depois desses enfrentamentos


a líder da linha Z foi particularmente respeitosa
comigo – pelo menos não gritou mais comigo, pelo
contrário falava-me amavelmente. Um dia, me
chamou à mesa do computador para falar. Quando
perguntei qual era o problema, ela me respondeu, que não havia problema e
era só uma pequena conversa. Ela perguntou minha idade, de onde eu era, se
era casada. eu respondi as perguntas dela uma por uma, mas me senti um
pouco confusa e esqueci de perguntas por que tinha me chamado. Finalmente
me perguntou se eu queria continuar na fábrica por muito tempo. Eu disse que
não, que pretendia voltar logo para casa. E depois disso? Bem, então, voltarei
para cá e conseguirei outro emprego.

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