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Mulheres perigosas - Mulheres perseguidas.

Esmeralda Rizzo, Ines M. Minardi, Rosana Schwartz


Universidade Presbiteriana Mackenzie.

As Transformações decorrentes da Primeira Acordos entre as nações capitalistas oci-


Guerra Mundial, Revolução Russa e Ter- dentais foram concretizados objetivando essa
ceira Internacional dos Trabalhadores1 provo- expulsão, bem como, reorganizaram as polí-
caram acirramentos de práticas de controle cias e a política repressiva.3
social pelas polícias urbanas e da “inteligên- O controle deveria ser estabelecido,
cia” no mundo ocidental, inquietantes para tanto para crimes comuns, quanto de cunho
pesquisadores das áreas da comunicação, político.4
ciências sociais e história. Os imigrantes no Brasil sofreram sistemati-
O Estado Brasileiro, influenciado pelos camente as ações dessa polícia, por meio de
ideais positivistas necessitava da manutenção mandatos que ordenavam a captura e a ordem
de uma sociedade disciplinada e organizada de prisão de todo e qualquer estrangeiro sus-
para atingir, o que entendiam como um país peito de ações políticas.
“civilizado”.
As oligarquias importaram os valores Foi organizada uma Comis-
morais e estéticos das elites européias e norte- são de Polícia Internacional (...).
americanas no intuito de promover “ordem” Quando estoura a Guerra na Eu-
para conquistar o “progresso”.2 ropa, a sede da Comissão transfere-
Dentro dessa perspectiva, desde o século se para Berlim, (...). Se inau-
XVIII, já era utilizada a extradição de indi- gura, em 1927, a rede radiográ-
víduos considerados pelo sistema, criminosos fica autônoma da Comissão, com
ou “perigosos”. banda de frequência para uso dos
1
serviços internacionais da polícia
CANCELLI, Elizabeth. De uma sociedade poli-
gentilmente concedida pela Confer-
ciada a um Estado policial: o circuito de informações
das polícias nos anos 30. São Paulo, Fundação Perseu ência Mundial de Radioeletricidade
Abramo, 2003. de Washington.5
2
STORCH, Robert D. O policiamento na cidade vi- 3
toriana. São Paulo, Revista Brasileira de História, vol. PANDOLFI, Dulce. Camaradas e com-
5 No 8/9, abril de 1985. 3 A extradição só existia e panheiros:memória e história do PCB. Rio de
era praticada para crimes de deserção, políticos ou re- Janeiro:Relume Dumará, 1995. p. 23
4
ligiosos. Em 1946, foi instituída a extradição formal- MORAES, Denis . O imaginário vigiado: a im-
mente para crimes políticos. prensa comunista e o realismo socialista no Brasil (
1947- 1953). Rio de Janeiro:José Olympio, 1994. p.10.
5
PANDOLFI, Dulce. Camaradas e com-
2 Esmeralda Rizzo, Ines M. Minardi e Rosana Schwartz

Segundo a documentação do acervo do DE- As lideranças das classes trabalhadoras


OPS - Departamento de Ordem Política e So- anarquistas ou comunistas eram consider-
cial, reunida no Arquivo Público do Estado adas “desordeiras”, justificando prisões, ex-
de São Paulo, aberta aos pesquisadores, essas tradições e disciplinarizações.8
polícias criaram um serviço essencial de busca
A perseguição aos comunistas,
e repressão aos “suspeitos” de crimes políticos
socialistas e anarquistas era fa-
ou contra a ordem determinada pelo Estado.
tor fundamental para permitir a
Entre as ações das polícias encontradas nessa
disciplinarização da sociedade
documentação, destaca-se a Italiana, com um
brasileira, que deveria obedecer
serviço de fotografia criminal, centralização
aos ditames de um Estado moderno
de informações, e material biográfico refer-
e totalitário.9
ente aos criminosos políticos nos países onde
existiam italianos imigrantes.6 A disciplinarização era o veículo para se
O Brasil, com o recebimento de grandes atingir um Estado moderno e desenvolvido,
fluxos de imigrantes, em vários períodos e sob assim, o comportamento no lar, no mundo pri-
as tensões que ocorreram entre a camada de vado, deveria ser igual ao do mundo público,
trabalhadores nacionais e estrangeiros reivin- do trabalho, da organização da fábrica: com
dicando melhores condições de vida e de tra- funções determinadas para cada ambiente e
balho nas cidades, levaram a adesão da elite para cada elemento da família. No lar a mulher
extremamente conservadora, a essa prática de se constituía no elemento chave, educadora
controle. Essa elite tinha por intuito, con- dos filhos e porto seguro dos seus maridos,
ter as manifestações desses trabalhadores, as- enquanto estes deveriam ser os provedores da
sim como, a organização de entidades de ajuda família.
mútua e associações de bairro, lideradas por Dentro desse imaginário, as manifestações
mulheres. dos trabalhadores, desde os primeiros anos do
Na cidade de São Paulo, a industrializa- século XX, foram consideradas, pelas elites e
ção trouxera, o mundo dos operários, dos imi- classes médias, como perturbadoras da ordem,
grantes, das fábricas, das importações e expor- dos bons costumes, o que justificava o controle
tações, bem como, a participação intensa das das massas e prisões dos “baderneiros” pelo
mulheres no universo das greves, das manifes- aparato policial.10
tações dos trabalhadores, tendo como conse- As polícias deveriam identificar, controlar,
qüência o controle social e a repressão.7 cadastrar os desordeiros e aprender a colher
panheiros:memória e história do PCB. Rio de 8
CANCELLI, Elizabeth. O mundo da violência: O
Janeiro:Relume Dumará, 1995. p. 27 estado policial na era Vargas ( 1930-1945). Tese de
6
CANCELLI, Elizabeth. De uma sociedade poli- doutorado apresentada ao programa de pós-graduação
ciada a um Estado Policial: o circuito de informações em História, Campinas, UNICAMP- 1991. p. 78.
das polícias nos anos 30. São Paulo, Fundação Perseu 9
STORCH, Robert D. O policiamento na cidade vi-
Abramo, 2003. p. 47. toriana. São Paulo, Revista Brasileira de História, vol.
7
STORCH, Robert D. O policiamento na cidade vi- 5 n. 8/9, abril de 1985. p.8.
toriana. São Paulo, Revista Brasileira de História, vol. 10
STORCH, Robert D. O policiamento na cidade vi-
5 n. 8/9, abril de 1985. p.4. toriana. São Paulo, Revista Brasileira de História, vol.
5 n. 8/9, abril de 1985. p.7

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as informações, criando um “aparato repres- hospedar no país e distribuiu tarefas


sivo” que investigaria todos os grupos de tra- e informações iniciais.13
balhadores de esquerda anarquistas, socialis-
tas e comunistas. As relações policiais intensificaram-se en-
tre os países capitalistas e operacionalizou-
A prisão de Sacco e Vanzeti nos se um aparto de informações triangular entre
Estados Unidos, em 1920, são exem- a América Latina, Europa e Estados Unidos,
plos que denotavam a preocupação além de um serviço intenso de vigilância in-
dos vários Estados em neutralizar a ternacional e nacional.14
ação das esquerdas, e dos anarquis- Em 1935, no jornal “A Manhã” aparecia
tas em particular, através da ação a nota de que havia sido o Serviço Secreto
policial e de seu serviço de infor- britânico quem dera informações sobre a ten-
mações.11 tativa de golpe dos comunistas.15
Essas polícias, desde 1927 catalogaram uma
Durante a Era Vargas, surgiu o Estado Poli- significativa relação de nomes de mulheres
cial com uma proposta política de enfrenta- imigrantes italianas no Brasil, principalmente
mento político-ideológico conservador contra de São Paulo, como suspeitas de envolvimen-
esses esquerdistas, estruturado, a partir do uso tos de esquerda.16 Esses documentos pos-
da violência especializada psicológica e física sibilitam compreender as relações dessas tri-
o controle das massas trabalhadoras envolvi- angulações e as ligações entre os comunistas
das com as esquerdas.12 brasileiros e italianos e antifascistas nos dois
países. 17
Os americanos estreitam laços Segundo essa documentação levantada,
com o Brasil e a polícia do Distrito com o estreitamento das relações policiais fir-
Federal, comandada por Filinto madas entre Brasil-Itália, a polícia brasileira
Muller, acreditando que a União So-
13
viética depositara credibilidade na BIONDI, Luigi. Anarquistas italianos em São
Paulo. Cadernos AEL, n 8/9. 1998. p. 117-147.
Revolução no Brasil, prende Eliza 14
TOLEDO, Edilene. O amigo do povo:grupo de
Ewert apelidada de Sabo ou Machla afinidade e a propaganda anarquista em São Paulo nos
Lenczycki, pertencente a um pe- primeiros anos deste século. Mestrado em História
queno grupo de comunistas que es- apresentado ao programa de pós-graduiação da UNI-
taria fazendo viagens pelo país, logo CAMP, IFCH, 1996. p. 128.
15
TOLEDO, Edilene. O amigo do povo:grupo de
da chegada de Olga e Luis Carlos afinidade e a propaganda anarquista em São Paulo nos
Prestes ao Brasil. Eliza era amiga primeiros anos deste século. Mestrado em História
antiga de Olga ajudou o casal a se apresentado ao programa de pós-graduiação da UNI-
CAMP, IFCH, 1996. p. 123.
11
STORCH, Robert D. O policiamento na cidade vi- 16
BIONDI, Luigi. Anarquistas italianos em São
toriana. São Paulo, Revista Brasileira de História, vol. Paulo. Cadernos AEL, n 8/9. 1998. p. 117-147.
5 n. 8/9, abril de 1985. p.5. 17
CANCELLI, Elizabeth. O Mundo da Violência:
12
BIONDI, Luigi. Anarquistas italianos em São o Estado policial na era Vargas (1930-1945). Tese
Paulo. Cadernos AEL, n 8/9. 1998. p. 117-147. de doutorado.Programa de Pós-Graduação em História,
Campinas, 1991. p. 178

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4 Esmeralda Rizzo, Ines M. Minardi e Rosana Schwartz

fornecia informações sobre as ações an- o Brasil foi considerado "uma potência, em
tifascistas no país e Roma ficava com uma perigo de bolchevização”.21
cópia dessas correspondências.18 No Brasil, foi organizado um serviço de
propaganda anticomunista e nacionalista para
As informações vinham de diver- ser divulgado em todos os Estados. Segundo a
sas fontes em 22 de março de 1928, documentação depositada no Arquivo do Es-
por exemplo, foi relatado um encon- tado, o governo italiano enviava ao gabinete
tro de uma seção do Partido Repub- do chefe de polícia, Filinto Muller, material
licano Italiano, realizada no dia 19 de propaganda considerado útil contra os co-
na casa de um certo Maurelli, na munistas.22
Rua Boa Vista, na capital paulista. Esse material deu origem aos arquivos ital-
O relato, além de denunciar a pre- ianos, que ainda serão submetidos à pesquisa.
sença do Prof. Picarollo, apre- A documentação estaria dividia em materiais
senta toda a estratégia do grupo fotográficos e relatos das ações desses gru-
em relação ao trabalho antifascista. pos.23
São citados como antifascistas em Em 1937, a Direção Geral de Assuntos
São Paulo, Silvio Lodi, Cesare Transoceânicos, em Roma, autorizou as au-
Bernacchia, Luigi Ottobrini, Angelo toridades italianas a comunicarem "qualquer
Cianciosi, Francisco Barone, Ar- notícia que tivessem a respeito do complô co-
turo Centini, Conte Frola, Frisciotti, munista".24
Finocchiaro e Michele Gatti. Na Assim, dentro do espírito de repressão das
época, o principal informante ital- polícias foi selada uma parceria entre o Estado
iano era um repórter do jornal “O brasileiro e o italiano.25
19
Estado de São Paulo”, Meucci. Segundo pesquisadores, a polícia brasileira
entregou seus prontuários para os agentes ital-
Era decisão de Mussolini “jogar
21
um papel importante na luta contra BIONDI, Luigi. Anarquistas italianos em São
Paulo. Cadernos AEL, n 8/9. 1998. p. 117-147.
a propaganda comunista no mundo 22
STORCH, Robert D. O policiamento na cidade vi-
todo. Por isso, já havia sido inici- toriana. São Paulo, Revista Brasileira de História, vol.
ado em Roma um trabalho de orga- 5 No 8/9, abril de 1985.
20 23
nização neste sentido. TOLEDO, Edilene. O amigo do povo:grupo de
afinidade e a propaganda anarquista em São Paulo nos
Com tentativa de golpe comunista, ideal- primeiros anos deste século. Mestrado em História
apresentado ao programa de pós-graduiação da UNI-
izada por Luiz Carlos Prestes e Harry Berger, CAMP, IFCH, 1996. p. 129
24
18 BIONDI, Luigi. Anarquistas italianos em São
Archivio Storico. Polizia Política - Fascicolli
Paulo. Cadernos AEL, n 8/9. 1998. p. 117-147.
172. Relatório para o Chefe de Polícia. Roma, 11 de 25
TOLEDO, Edilene. O amigo do povo:grupo de
fevereiro de 1930.
19 afinidade e a propaganda anarquista em São Paulo nos
BIONDI, Luigi. Anarquistas italianos em São
primeiros anos deste século. Mestrado em História
Paulo. Cadernos AEL, n 8/9. 1998. p. 117-147.
20 apresentado ao programa de pós-graduiação da UNI-
STORCH, Robert D.O policiamento na cidade vi-
CAMP, IFCH, 1996. p. 131.
toriana. São Paulo, Revista Brasileira de História, vol.
5 No 8/9, abril de 1985.

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ianos, alemães e ingleses 26 e condecorou com Entre 1902 e 1908, organizaram o Jor-
a medalha Croce Corona d’Itália (1941), Gus- nal “Diário Socialista”, em língua italiana
tavo Capanema, ministro da Educação, Fe- e o Avanti !, que se tornariam importantes
linto Muller, Francisco Campos, ministro da veículos propagadores das idéias socialistas
Justiça, Frederico Barros Barreto, presidente no Brasil.31
do Tribunal de Segurança Nacional e Ernanni Os trabalhadores se reconheciam nas ações
Reis, diretor geral do Ministério da Justiça. 27 dos Centros Socialistas italianos32 , que tin-
ham surgido nos vários bairros paulistanos e
Até o advento do sufrágio universal mas- na figura do editor do jornal Avanti ! de São
culino na Itália, o Partido Socialista era pe- Paulo.33
queno, sem expressão, contudo com as fili- A presença de trabalhadoras filiadas aos
ações das mulheres e sua militância começou a Centros Socialistas merece destaque, princi-
crescer a idéia de partido de massa com muitos palmente as tecelãs e as mulheres que par-
filiados.28 ticipavam de sindicatos.34 Essa participação
Os socialistas italianos, em São Paulo, ativa proporcionou as condições necessárias
a partir de 1890, mantinham relação com para a formação da Federação Operária de São
o sindicalismo por intermédio da fundação Paulo, com aproximação na atividade das so-
das ligas sindicais e de resistência, es- ciedades étnicas de socorro mútuo na cidade.35
tiveram presentes na maioria dos proces- é muito extensa, destacando-se os trabalhos de Sheldon
sos organizativos dos trabalhadores, lideraram Leslie Maram, Anarquistas, imigrantes e o movimento
greves e compartilharam direções de sindi- operário brasileiro, 1890-1920. Rio de Janeiro : Paz
catos com os anarquistas ou sindicalistas rev- e Terra, 1979 ; Edilene Toledo, O Amigo do Povo :
grupos de afinidade e a propaganda anarquista em São
olucionários.29 Criaram uma rede organizativa
Paulo nos primeiros anos deste século, mestrado. Uni-
da qual faziam parte diversos grupos de trabal- camp, IFCH, 1993 ; Isabelle Felici, Les italiens dans
hadores italianos, que preocupavam o governo le mouvement anarchiste au Brésil. 1890-1920, doc-
brasileiro.30 torat. Paris III, 1994 ; Christina da Silva Roquette Lo-
26
preato, O espírito da revolta : a greve geral anarquista
TOLEDO, Edilene. O amigo do povo:grupo de de 1917. doutorado. Unicamp, IFCH, 1996 ; Carlo Ro-
afinidade e a propaganda anarquista em São Paulo nos mani, Oreste Ristori : uma aventura anarquista. São
primeiros anos deste século. Mestrado em História Paulo, Annablume, 2002
apresentado ao programa de pós-graduiação da UNI- 31
Cadernos AEL, n° 8/9. (Anarquismo e Anarquis-
CAMP, IFCH, 1996. p. 133 tas), 1998, pp. 117-147.
27
BIONDI, Luigi. Anarquistas italianos em São 32
BIONDI, Luigi. Entre associações étnicas e de
Paulo. Cadernos AEL, n 8/9. 1998. p. 117-147. classe. Os processos de organização política e sindi-
28
TOLEDO, Edilene. Travessias revolucionárias. cal dos trabalhadores italianos na cidade de São Paulo
Campinas:Editora da Unicamp, 2004. p.77 (1890-1920), Unicamp, IFCH, 2002. p. 75.
29
TOLEDO, Edilene. O Amigo do Povo : grupos 33
LOPREATO, Chistina da Silva. O espírito da
de afinidade e a propaganda anarquista em São Paulo revolta: a greve geral anarquista de 1917. Tese de
nos primeiros anos deste século, mestrado. Unicamp, Doutorado apresentada ao programa de pós-graduação
IFCH, 1993. p 95. - IFCH - UNICAMP, Campinas 1996. p.37
30
BIONDI, Luigi. Anarquistas italianos em São 34
ROMANI. Carlso. Oreste Ristori: uma aventura
Paulo. Cadernos AEL, n° 8/9. (Anarquismo e Anar- anarquista em São Paulo, Annablume, 2002.
quistas), 1998, pp. 117-147. A bibliografia sobre o 35
BIONDI, Luigi. Entre associações étnicas e de
anarquismo em São Paulo durante a primeira república classe. Os processos de organização política e sindical

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6 Esmeralda Rizzo, Ines M. Minardi e Rosana Schwartz

As associações de socorro mútuo ítalo- O partido socialista brasileiro criado em


paulista ligadas aos socialistas não temiam o 1902 era uma espécie de federação do PSI no
conflito de classes e tinham um patriotismo de Brasil e foi identificado como Federação do
origem mazziniana e democrática.36 Estudos Estado de São Paulo, mas sem possibilidade
sobre a relação entre política e mutualismo, de crescer na arena eleitoral por ser consti-
destacam a influência exercida pelos italianos tuído em sua maioria por estrangeiros. A Polí-
na classe trabalhadora de São Paulo.37 cia fechava os sindicatos, perseguia os grupos
políticos ítalo-brasileiros, destruía os jornais
Sobre a questão étnica : a pre- operários, limitando a participação mais in-
dominância do elemento italiano no tensa dos jovens operários nas associações e
mundo do trabalho paulista facilitou sindicatos, entre 1917 e 1921.39
os processos de organização, pois Segundo estudos sobre o anarquista Luigi
um caso de difusão, em um território Damiani, o movimento italiano se mantinha
tão grande, de grupos de socialis- em virtude dos laços comunitários e de par-
tas Italianos, como o que ocorreu no entesco criados em São Paulo.40
Estado de São Paulo, não teve par- As atividades propagandistas dos socialistas
alelo em nenhum outro país de imi- italianos, nesse período, contavam com alguns
gração italiana. Por outro lado, lim- grupos: os redatores do jornal Avanti ! de São
itou a transposição deste fenômeno Paulo que declararam: “Defender e difundir a
a outras realidades. A criação de postura intransigente e revolucionária do par-
um partido socialista que ultrapas- tido socialista italiano”.41 As ações do Centro
sasse a fronteira étnica foi o maior Socialista, três organizações de bairro (Água
obstáculo que os militantes social- Branca, Lapa e Brás), diversos militantes nos
istas italianos enfrentaram. Além bairros do Bom Retiro e de Barra Funda 42
de alguns pouquíssimos profission- e um grupo político que durante a greve de
ais liberais brasileiros, os grupos
classe. Os processos de organização política e sindical
socialistas paulistas eram o espelho
dos trabalhadores italianos na cidade de São Paulo –
dos mesmos grêmios do PSI que es- 1890-1920, UNICAMP, IFCH, 2002.p. 18
tavam na Itália. Falar de socialismo 39
BIONDI, Luigi. Entre associações étnicas e de
no Estado de São Paulo significava classe. Os processos de organização política e sindical
falar de imigrantes italianos politi- dos trabalhadores italianos na cidade de São Paulo –
1890-1920, UNICAMP, IFCH, 2002.p. 127
zados.38 40
DAMIANI, Luigi, I paesi nei quali non si deve em-
dos trabalhadores italianos na cidade de São Paulo – igrare. La questione sociale nel Brasile, Milano, Edi-
1890-1920, UNICAMP, IFCH, 2002.p. 27 zioni di “ Umanità Nova ”, 1920. Damiani foi expulso
36
LOPREATO, Chistina da Silva. O espírito da do Brasil no final de 1919.
41
revolta: a greve geral anarquista de 1917. Tese de FIDELLI, Ugo Fedeli &,DAMIANI, Gigi : note
Doutorado apresentada ao programa de pós-graduação biografiche. Il suo posto nell’Anarchismo. Cesena,
- IFCH - UNICAMP, Campinas 1996. p.64. Antistato, 1954 e BEIGUELMANN, Paula Os compan-
37
MARAM, Sheldon Leslie. Anarquistas, imi- heiros de São Paulo. São Paulo, Símbolo, 1977
42
grantes e o movimento operário brasileiro. 1890-1920. Ver seção - Movimento Operário: O Combate dos
Rio de Janeiro : Paz e Terra, 1979 .p.47. anos 1918 e 1919 e os poucos números ainda existentes
a
38
BIONDI, Luigi. Entre associações étnicas e de de Avanti !, 2 serie, de 1919.

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1917 adotou o nome de Centro Maximalista.43 CANCELLI, Elizabeth. De uma sociedade


Esse último grupo, pregava a idéia de que o policiada a um Estado policial: o cir-
movimento operário deveria ser liderado pelas cuito de informações das polícias nos
bases. anos 30. São Paulo, Fundação Perseu
Em análise dos processos de expulsão e dos Abramo, 2003.
prontuários do DEOPS, no Arquivo do Estado
de São Paulo, encontraram-se documentos so- ______________. O mundo da violência:
bre esses grupos e de diversas sociedades ital- O estado policial na era Vargas ( 1930-
ianas de socorro mútuo como a Lega Lom- 1945). Tese de doutorado apresentada ao
barda, a Unione Operaia di Barra Funda, a programa de pós-graduação em História,
União Fraterna da Lapa e Água Branca e a Campinas, UNICAMP- 1991.
Società di Mutuo Soccorso del Cambucy,44 o DAMIANI, Luigi. Damiani, I paesi nei quali
Circolo Socialista Giacomo Matteotti, 45 que non si deve emigrare. La questione so-
atuavam como apoio e proteção de grupos ciale nel Brasile, Milano, Edizioni di
políticos socialistas e comunistas, especial- Umanità Nova, 1920
mente no período da formação da Aliança Na-
cional Libertadora, na década de 1930. FIDELLI, Ugo Fedeli &,DAMIANI, Gigi
Assim, a atuação dos socialistas italianos : note biografiche. Il suo posto
em suas múltiplas atividades, por meio das so- nell’Anarchismo. Cesena, Antistato,
ciedades mutualistas, ligas sindicais e cooper- 1954 e BEIGUELMANN, Paula Os com-
ativas tiveram um papel de destaque, que por panheiros de São Paulo. São Paulo, Sím-
muito tempo foi desconsiderado no processo bolo, 1977.
de construção de uma sociedade democrática
no Brasil. LOPREATO, Chistina da Silva. O espírito
da revolta: a greve geral anarquista de
1917. Tese de Doutorado apresentada
1. Bibliografia ao programa de pós-graduação - IFCH -
UNICAMP, Campinas 1996. p.64.
BIONDI, Luigi. Entre associações étnicas e
de classe. Os processos de organização MARAM, Sheldon Leslie. Anarquis-
política e sindical dos trabalhadores ital- tas, imigrantes e o movimento operário
ianos na cidade de São Paulo – 1890- brasileiro. 1890-1920. Rio de Janeiro :
1920, UNICAMP, IFCH, 2002. Paz e Terra, 1979 .

43
ROSADA, Anna. Serrati nell’emigrazione. 1899- MONTGOMERY, David, The Fall of the
1911. Roma, Editori Riuniti, 1972. House of Labor : The Work Place, the
44
Ver AESP, DEOPS, Prontuário n° 770 e Estatutos State, and American Labor Activism,
da Sociedade de Mutuo Socorro do Cambucy.Fundada 1865-1925, Cambridge : Cambridge
em 27 de fevereiro de 1922. São Paulo, Typographia
University Press, 1987.
Modelo, 1928
45
Ver Arquivo do Estado de São Paulo (AESP), DE-
MORAES, Denis . O imaginário vigiado: a
OPS, Prontuário n° 71.338.
imprensa comunista e o realismo social-

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8 Esmeralda Rizzo, Ines M. Minardi e Rosana Schwartz

ista no Brasil ( 1947- 1953).Rio de Estatutos da Sociedade de Mutuo Socorro do


Janeiro:José Olympio, 1994. Cambucy.Fundada em 27 de fevereiro de
1922. São Paulo, Typographia Modelo,
PANDOLFI, Dulce. Camaradas e compan- 1928.
heiros:memória e hsitória do PCB. Rio
de Janeiro:Relume Dumará, 1995. O Combate dos anos 1918 e 1919

PASCAL, Maria Aparecida. Portugueses em Programa Massimalista del Partito Socialista


São Paulo: A face feminina da imi- Italiano.
gração. São Paulo, Expressão e Arte,
2005.
PRONTUÁRIOS:
RIDOLFI, Maurizio. II PSI e la nascita Del
partido di mass:1892-1922. Bari, Lat- Prontuário n° 770
erza, 1992.

ROSADA, Anna. Serrati nell’emigrazione.


1899-1911. Roma, Editori Riuniti, 1972.

ROMANI. Carlso. Oreste Ristori: uma


aventura anarquista em São Paulo,
Annablume, 2002.

STORCH, Robert D. O policiamento na


cidade vitoriana. São Paulo, Revista
Brasileira de História, vol. 5 No 8/9, abril
de 1985.

VECOLI, Rudolph. Movimento operário e


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JORNAIS, REVISTAS E PER-


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Estatuto da Liga Operária da Construção


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item Estatuto da Liga dos Trabalhadores
do Bráz e Belenzinho, São Paulo, c. 1917

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