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RESUMO
INTRODUÇÃO
Nos últimos tempos, o vinil vem retomando seu espaço entre o público, mas
para um tipo de pessoas ele nunca morreu. Na nossa sociedade sempre foi presente a
ideia de coleção, objetos parecido, mas nunca idênticos, agrupados em certas categorias
que fazem sentido no contexto inserido e que não exercem sua função primária, mas
ganham a nova função de ser uma coleção. Como cita Milton Carlos Farina (2006) “o
colecionismo é um tipo diferente de consumo, e o colecionador apresenta um
comportamento diferenciado. Por outro lado, o crescimento da indústria de objetos de
coleção e a entrada de grandes empresas e marcas no mercado de colecionismo
sinalizam para a oportunidade e mesmo a necessidade de pesquisas em marketing
envolvendo essa área de estudo”
[…] o LP passa a ser consumido como livros, ou seja, um suporte fechado passível de
coleção em discotecas privadas – com status de objeto cultural, afinal, julga-se a cultura
musical de uma pessoa pela discoteca que possui. (DE MARCHI, 2005, p. 13)
Nos dias atuais, o MP3 divide espaço na internet com a música via streaming
através de sites ou apps (aplicativos) como o Youtube, Spotify, SoundCloud e Last.fm.
Interessante acompanhar como a música cada vez vai perdendo mais seu caráter como
objeto, tornando sua mídia imaterial. Nesse caso, o senso de propriedade deixa de
existir (QUINES, 2012) pois coloca de lado o elemento colecionável.
Na lógica capitalista, um formato torna-se hegemônico enquanto os anteriores
caem na obsolecência (QUINES, 2012), porém sabemos que os formatos não são
substituídos mas passam a existir simultaneamente, assim como a televisão não engoliu
o rádio e a internet não invalidou o impresso. Apesar das baixas nas vendas do CD, eles
ainda enchem prateleiras e a venda de LP nos EUA subiram de US$181.6 milhões em
2013 para US$346.8 milhões em 2014, um aumento de 54,7%³. Os artistas ainda lançam
seus álbuns em CDs, serviços de MP3 – como o iTunes e Spotify- e também em LP, que
geralmente vem acompanhado de um cupom contendo um código para download do
álbum em MP3. A chegada das mídias virtuais não significa uma crise na indústria
fonográfica, mas sim um período em que ela, novamente, tenta adaptar-se à nova
realidade econômica e tecnológica (De Marchi, 2005).
O que podemos então dizer do público que ainda consume uma mídia sonora
considerada “ultrapassada”? Se a cada novo formato tecnológico a mídia parece ser
melhor e mais prática, o que causa o aumento das vendas de mídias como o disco de
vinil? Será que conveniência é sinônimo de qualidade sonora? Aficionados por vinil e
engenheiros de som alegam sua superioridade sonora em relação ao MP3 e inclusive ao
CD devido à sua natureza analógica:
Uma gravação digital interpreta o sinal analógico até uma determinada taxa […] e mede
cada sinapse com uma certa precisão […]. Isso significa que, por definição, uma
gravação digital não captura a onda sonora completamente. É uma aproximação feita
por uma série de etapas. Alguns sons que possuem transições muito rápidas, como uma
batida de bateria ou um tom do trompete, ficarão destorcidos pois é uma mudança muito
rápida para a taxa de amostragem.4
Figura 1 – Gráfico de comparação entre as ondas sonoras analógicas e digitais. Fonte:
(http://electronics.howstuffworks.com/question487.htm)
Mas por que as gravadoras produziriam um álbum com músicas que não soam
tão boas como deveriam? Na lógica da indústria musical, quanto mais alta a música,
maior a chance de ela chamar a atenção do ouvinte na rádio, por exemplo. Na tentativa
de competir, outras gravadoras também precisam produzir as músicas o mais alto
possível. Esse fenômeno é chamado de Loudness War e começou a partir do início da
década de 90. No documentário “Loudness Wars for our Living in a Media World Class
” (2013) o engenheiro de masterização Michael Romanowksi comenta:
Primeiro de tudo, é uma competição, então um está tentando soar mais alto que o outro,
e é só o que importa para eles. Durante um tempo eu recebia as pessoas aqui enquanto
eu estava masterizando um álbum, e de vez em quando eu recebia alguns que diziam
“Sabe o que mais, antes de tudo preciso que esse álbum seja alto, depois nos
preocupamos em como ele vai ficar”. E é por isso que, para mim, isso é totalmente
errado. Você passa por todas essas etapas para finalizar um álbum [...] e depois vai
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colocar tudo isso em um moedor de carne? (MICHEL ROMANOWSKI,
Nesse cenário, o disco de vinil mantém sua “pureza” sonora, com a faixa
dinâmica intacta e sem risco de compressão por ser uma mídia analógica. Porém, o som
do LP por ser mecânico e prover do atrito da agulha contra os sulcos gera uma
distorção, dependendo da qualidade e do estado dos materiais. Tal distorção
eletromagnética gera os graves envolventes do vinil*, tão elogiado pelos puristas e
saudosistas do formato. Também há o famoso chiado, que incomoda alguns e é visto
com charme por outros. Além dos aspectos técnicos, existe também o lado nostálgico,
artístico, fetichista, curioso e, principalmente, colecionável do vinil. “Na cultura popular
dos anos 80, o avanço do CD e desvalorização do LP contribuiu para a formação de
uma nova subcultura: a dos colecionadores de vinil” (QUINES, 2012).
Segundo Farina (2006), não há uma teoria concreta e final sobre colecionismo
ainda pelo fato de existir diversas variáveis para a motivação de colecionar e vários
significados para o prazer de fazer uma coleção. Podemos dizer que a nostalgia pode
influenciar; um sentimento nostálgico ligado a um momento ou a um objeto pode ser a
causa de começar uma coleção. Adultos colecionam brinquedos antigos, ou podem
colecionar pequenos souvenirs a cada vez que viajam a um lugar diferente, ou então
colecionam discos de vinil para lembrar-se dos bons tempos. A extensão do self
também é outro fator importante ao formar uma coleção. “A pessoa não é somente o que
se vê nela, mas também o que se vê nas coisas que possui” (FARINA, 2006, p. 4).
Em específico, quais são as motivações que levam a colecionar discos de
vinil? Antes de tudo devemos notar que existem basicamente dois tipos de
colecionadores de LP: Os chamados “saudosistas”, pessoas mais velhas que viveram a
época do vinil e os colecionadores jovens, que não necessariamente viveram nesse
contexto mas se interessam por LPs. Esse jovens nasceram em um mundo digital,
globalizado, com acesso à tecnologias jamais pensadas por sua contraparte; e se tiveram
algum contato com o disco foi rapidamente ou indiretamente por meio de parentes ou
algum LP jogando em algum canto da casa. “Hoje, os discos assumem diferentes
funções sociais e simbólicas; a busca por esse suporte musical não está mais baseada no
fato de ele ser a mídia padrão de escuta musical” (PORTUGAL, 2013, p. 17). Esses
jovens vivenciam um mundo em que a música está perdendo sua materialidade para os
arquivos digitais e, por mais que possa se criar uma coleção de MP3 organizados por
pasta, eles sentem a necessidade de ter algo físico para tocar e sentir e acabam criando
um “fetiche do objeto” (PORTUGAL, 2013).
Tarcila Martins Portugal (2013) afirma que entre o primeiro contato com o
disco de vinil e o vir a se tornar colecionador, existe um espaço de tempo que podemos
chamar de fase do conhecimento: o ingresso no universo dos discos, o tomar contato
com o objeto, o encantar-se, apreciar, experimentar a música através de um novo meio e
até mesmo comprar um disco ou outro. Alguns passam um tempo comprando e ouvindo
discos sem se considerarem colecionadores. A principal diferença é que o colecionador
é aquele que começa a prestar atenção em outros aspectos do disco além da música, que
tornam aquele artefato mais ou menos propenso a fazer parte de sua coleção.
Informações específicas como data de prensagem do disco, sua raridade, gramatura, cor
do vinil, edição, história e originalidade pesam na hora de adquirir o objeto, seja
garimpando em sebos ou procurando na internet. São informações que extrapolam o
senso comum de escolha de um álbum, ao mesmo tempo que esse novo tipo de busca
abre portas para descobertas de músicas além de sua realidade de escuta, gerando um
amadurecimento musical. Outro fator vem da vontade inata de todos que começam uma
coleção: terminá-la. Como não é possível possuir todos os discos do mundo,
colecionadores de vinil focam seus esforços em completar discografias de seus artistas
favoritos e tudo o que é lhes são relacionados. “Isso remete a outro aspecto central do
colecionamento: o objeto único, aquele de excepcional valor, aquele que falta para
completar a coleção” (PORTUGAL, 2013, p. 28), e aí entra o conceito de raridade do
disco e sua elevação de objeto para “artefato sagrado”. Um disco é raro por inúmeros
motivos, as vezes simplesmente por ser uma edição limitada ou então por causa de uma
história curiosa. Por exemplo, o primeiro disco do Roberto Carlos chamado Louco por
Você, teve poucas cópias impressas, foi um fracasso na época e até o próprio cantor o
repudia até hoje. O que deixa a história interessante é que desde então alguns assistentes
do Roberto Carlos ficam circulando pelas capitais do país tentando encontrar esse disco.
Quando o acham, compram, e o quebram na frente do lojista. Esse tipo de lenda urbana
valoriza a raridade do LP, que hoje é considerado um dos disco mais raros do Brasil,
custando na faixa dos 7 mil reais em condições razoáveis. Um disco perde a raridade
quando é relançado em CD ou em vinil, e é um problema sério para os colecionadores,
pois assim o produto perde sua unicidade. Outro ponto interessante desse modelo de
coleção são os rituais que dividem-se em dois momentos: o ritual de busca e o ritual de
escuta (PORTUGAL, 2013). O ritual no conceito da teórica Mariza Peirano:
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Podemos dizer que o mercado olha positivamente para esse nicho. Em 2008
foi reaberta a fábrica brasileira de vinil POLYSOM, que é a única atualmente aberta na
América Latina. Ela possui um selo próprio e hoje está relançando álbuns famosos de
artistas brasileiros e inclusive lançando discos de artistas novos. A verdade é que na
América do Norte e na Europa a cultura do vinil nunca morreu, e agora vem como
reflexo de uma sociedade cada vez mais digital e carente de objetos materiais. O vinil
agora ocupa um lugar importante novamente na indústria musical e tem seu próprio
nicho de mercado, mas creio impossível o disco voltar a ter a importância que teve no
seu auge, pois sua função agora é outra. Ele não tem mais o papel de ser a mídia do
momento para ser consumida, ele se transformou em um refúgio para as pessoas que
querer conhecer mais sobre a música e sua cultura.
1- Alternativa barata para uma ou duas músicas, foi o modelo que trouxe a
popularização do rock’n’roll por seu baixo custo de produção e venda. O termo é
até hoje usado para lançar uma música antes do álbum completo como forma de
marketing para tocar nas rádios;
2- É a etiqueta que vem colada no centro do disco e possui informações como o
nome da gravadora, do artista e as músicas que vem gravadas no disco;
3- Disponível em: (Fonte: http://www.ifpi.org/news/IFPI-publishes-global-vinyl-
market-details);
4- Original: A digital recording takes snapshots of the analog signal at a certain rate
[...] and measures each snapshot with a certain accuracy[…]. This means that, by
definition, a digital recording is not capturing the complete sound wave. It is
approximating it with a series of steps. Some sounds that have very quick
transitions, such as a drum beat or a trumpet's tone, will be distorted because
they change too quickly for the sample rate.;
5- Disponível em: (Fonte: http://www.audioholics.com/editorials/analog-vinyl-vs-
digital-audio);
6- Exceto pelo álbum Miles Davis - Kind of Blue que foi comparado sua versão em
vinil com uma cópia em FLAC, um formato digital com qualidade superior ao
MP3;
7- Na música, o termo normalmente se refere às diferenças de volume, ou nível de
som, entre diferentes partes de uma canção (macro-dinâmica) ou até mesmo
dentro de uma sessão ou frase (micro-dinâmica).
(fonte: http://academiadoprodutormusical.com/blog/84-a-tal-dinamica/);
8- Disponível em: (Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=w9xXzTjBt5c).
REFERÊNCIAS
QUINES, Sarah Oliveira. Admirável vinil novo: o retorno dos discos na era do mp3.
Rio de Janeiro: Contemporânea, 2012.
PEIRANO, Mariza. Rituais ontem e hoje. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003.